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Análise Psicológica

Print version ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica vol.33 no.1 Lisboa Mar. 2015

https://doi.org/10.14417/ap.883 

Estudo normativo da versão Portuguesa do YLS/CMI – Inventário de avaliação do risco de reincidência e de gestão de caso para jovens

Alberto Pimentel1, Jorge Quintas2, Ernesto Fonseca3, Alexandra Serra4

1Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais / Escola de Criminologia, Faculdade de Direito, Universidade do Porto

2Escola de Criminologia, Faculdade de Direito, Universidade do Porto

3Escola de Criminologia, Faculdade de Direito, Universidade do Porto / Departamento de Ciências Sociais e do Comportamento, CESPU

4Departamento de Ciências Sociais e do Comportamento, CESPU

Correspondência

 

RESUMO

O presente artigo reporta os dados do estudo normativo da versão portuguesa do Youth Level of Service/Case Management Inventory (YLS/CMI), instrumento que avalia o risco de reincidência criminal, identifica as necessidades criminógenas e guia a gestão de casos de jovens delinquentes. Foram estabelecidas as normas de interpretação portuguesas do YLS/CMI numa amostra constituída por 2363 jovens em contacto com o sistema de justiça juvenil. A análise de perfis de risco permite diferenciar os jovens em função do sexo, da fase processual, do comportamento criminal e do contexto sociocultural. São discutidas as implicações dos resultados para a avaliação e a gestão de caso de jovens ofensores na área forense.

Palavras-chave: Avaliação do risco, Necessidades criminógenas, YLS/CMI, Delinquência juvenil, Dados normativos.

 

ABSTRACT

This paper reports data from the normative study of the Portuguese version of the Youth Level of Service/Case Management Inventory (YLS/CMI), risk assessment tool designed to assess risk for general recidivism, identify criminogenic needs and guide case management of young offenders. Normative data of Portuguese YLS/CMI were established from a sample of 2363 young offenders from juvenile justice system. Risk profiles analysis allows to differentiate young offenders by gender, procedural phase, criminal behavior and sociocultural context. Implications regarding these results for assessment and case management of young offenders in the forensic area are discussed.

Key-words: Risk assessment, Criminogenic needs, YLS/CMI, Young offender, Normative data.

 

Introdução

A utilização de instrumentos de avaliação do risco de reincidência criminal constitui prática internacional na avaliação de ofensores para efeito de assessoria técnica aos tribunais, bem como na avaliação e intervenção no âmbito da execução de penas e de medidas (Campbell, French, & Gendreau, 2009; Heilbrun, 2009).

O desenvolvimento dos instrumentos de avaliação do risco assenta na premissa de que determinadas características pessoais e ambientais podem ser usadas para predizer o risco da prática futura de atos criminais (Gendreau, Little, & Goggin, 1996; Meredith, Speir, & Johnson, 2007). Após um período de descrença com a possibilidade de avaliar o risco de reincidência criminal e o risco de violência (Monahan, 1981; Steadman & Cocozza, 1974), uma crescente literatura tem-se dedicado à validação de instrumentos destinados a realizar esta complexa tarefa (cf. Andrews & Bonta, 2006).

Os fatores de risco específicos da reincidência criminal têm vindo a ser sintetizados em revisões empiricamente fundadas e, particularmente, através de procedimentos meta-analíticos (cf. Bonta, Law, & Hanson, 1998; Farrington, 2003; Gendreau, Little, & Goggin 1996; Hanson & Morton-Bourgon, 2004; LeBlanc, 2005; Lipsey & Derzon, 1998; Loeber & Hay, 1997; Simourd & Andrews, 1994). O conhecimento cumulativo e, especialmente, a mensuração combinada dos efeitos de múltiplas investigações que incluem medidas de reincidência criminal, permitiram distinguir com acuidade os fatores de risco mais relevantes, os que têm peso moderado e os que devem ser considerados apenas menores ou mesmo irrelevantes (Andrews, Bonta, & Wormith, 2006; Andrews & Bonta, 2006).

O modelo geral psicológico, social e de personalidade do comportamento criminal (Andrews & Bonta, 2006), integra estes elementos da investigação e sintetiza os fatores de risco mais relevantes sob a designação de Big 4: história criminal, suporte social para o crime, personalidade antissocial e atitudes pró-criminais. Numa segunda linha de fatores de risco, encontram-se outros, mais moderados, que conjuntamente com os Big 4 constituem os Central 8: abuso de substâncias, tempos livres, família e educação/ocupação. Acresce-se que os fatores de risco, quando dinâmicos (todos os Central 8, com exceção da história criminal), isto é, suscetíveis de modificação, são entendidos como necessidades criminógenas, que devem ser alvos preferenciais da intervenção. De facto, a intervenção nas necessidades criminógenas de populações delinquentes, quando bem-sucedida, redunda na diminuição do risco e em prevenção criminal efetiva. Dito de outro modo, os instrumentos de avaliação do risco/necessidades criminógenas servem para estabelecer a probabilidade da prática de crimes e para identificar as condições pessoais e circunstâncias que podem ser mudadas para reduzir a ocorrência desses atos.

A evolução dos instrumentos de avaliação do risco permitiu a definição de quatro gerações. Na primeira geração, a avaliação de risco baseia-se no julgamento clínico não estruturado, geralmente de pendor psicopatológico. A segunda geração é caraterizada pela utilização de elementos atuariais, definidos pela ligação empírica entre fatores de risco e medidas de outcome, especialmente as de reincidência criminal. Os instrumentos de segunda geração são geralmente baseados em fatores de risco estáticos e têm suporte teórico limitado. A terceira geração ultrapassa estas duas limitações atendendo a fatores de risco dinâmicos/necessidades criminógenas fundadas teoricamente. Finalmente, na quarta geração, os instrumentos ligam a avaliação de risco/necessidades criminógenas e a gestão de casos, integrando o processo de gestão do risco/necessidades criminógenas, a seleção de modos de intervenção e a avaliação da evolução do sujeito (Andrews, Bonta, & Wormith, 2006; Harris & Rice, 2007; Luong, 2007).

Está já bem estabelecida empiricamente a capacidade de diversos instrumentos de avaliação do risco/necessidades criminógenas de prever o comportamento criminal com, pelo menos, moderada precisão, bem como a sua superioridade preditiva relativamente aos julgamentos clínicos tradicionais (cf. Ægisdóttir et al., 2006; Dawes, Faust, & Meehl, 1989; Grove, Zald, Lebow, Snitz, & Nelson, 2000; Quinsey, Harris, Rice, & Cormier 1998; Westen & Weinberger, 2004). A questão, na atualidade, é menos se se podem utilizar instrumentos de base atuarial do que debater quais os melhores métodos e instrumentos de avaliação (cf. Campbell, French, & Gendreau, 2007, 2009; Gendreau, Goggin, & Smith, 2002; Hanson, 2005; Salekin, Rogers, & Sewell, 1996; Singh & Fazel, 2010; Walters, 2003).

Na área da delinquência juvenil, a evolução de instrumentos específicos de avaliação do risco e das necessidades criminógenas está, contudo, genericamente menos desenvolvida, face aos progressos na área dos adultos. Um dos principais motivos decorre do facto de os instrumentos serem tendencialmente concebidos para populações adultas e só depois adaptados de forma a incorporarem fatores de risco específicos da delinquência juvenil (cf. Douglas & Kropp, 2002; Gendreau, Little, & Goggin, 1996; Marczyk, Heilbrun, Lander, & DeMatteo, 2003; Olver, Stockdale, & Wormith, 2009; Schmidt, Hoge, & Gomes, 2005). É precisamente este o caso do YLS/CMI (Hoge & Andrews, 2002; Hoge, Andrews, & Leschied, 2002), que é um instrumento de avaliação do risco e das necessidades criminógenas de quarta geração.

O YLS/CMI foi criado para avaliar os níveis de risco de reincidência de delinquentes juvenis e as suas necessidades criminógenas. A formulação dos itens que compõem a primeira parte deste instrumento resulta da introdução dos fatores de risco de reincidência identificados, de forma largamente consensual, na literatura específica da delinquência juvenil. Estes fatores foram integrados na lógica da versão original do Level of Service Inventory – Revised (LSI; Andrews & Bonta, 1995) para adultos e suas evoluções posteriores, designadamente o Level of Service – Case Management Inventory (LS/CMI; Andrews, Bonta, & Wormith, 2004), que incorporam na avaliação de riscos e necessidades criminógenas itens que refletem os principais preditores da criminalidade em adultos.

O YLS/CMI tem origem no Canadá (cf. Catchpole & Gretton, 2003; Gossner & Wormith, 2007; Hoge & Andrews, 2002; Jung & Rawana, 1999; Rowe, 2002; Schmidt et al., 2005; Vieira, Skiling & Peterson-Badali, 2009; Welsh, Schmidt, McKinnon, Chattha, & Meyers, 2008) e, progressivamente, foi utilizado em diversos outros países, designadamente nos EUA (Flores, Travis, & Latessa, 2003; Marczyk et al., 2003, 2005; Onifade, Davidson, Campbell, Turke, Malinowski, & Turner, 2008; Righthand, Prentky, Knight, Carpenter, Hecker, & Nangle, 2005), na Austrália (Thompson & Pope, 2005; Thompson & Putnins, 2003), na Irlanda (Davies & Gailey, 2005), em Espanha (Gómez, Garrido, & Cieza, 2008), no Reino Unido (Marshall, Egan, English, & Jones, 2006), em Inglaterra (Rennie & Dolan, 2010) e no Chile (Fundación Paz Ciudadana, 2010).

Os dados normativos originais do YLS/CMI resultam de um trabalho de investigação, desenvolvido na Universidade de Lakehead (Jung, 1996, citado por Jung & Rawana, 1999). Os dados baseiam-se numa amostra de 264 jovens ofensores (173 do sexo masculino e 91 do sexo feminino) a quem foram aplicadas medidas tutelares institucionais ou não institucionais. A idade média dos jovens é de 14.3 anos (DP=1.11), variando entre os 12 e os 17 e, no total do inventário, a pontuação média é de 11.38 (DP=8.32). As pontuações no total do YLS/CMI são nos estudos posteriores sempre superiores às pontuações apresentadas no estudo original. Por exemplo, Flores et al. (2003), numa extensa amostra de 1679 jovens a cumprir medidas institucionais e comunitárias, apresenta pontuações médias totais de 19.84. Marczyk et al. (2003), numa amostra de 95 jovens do sexo masculino que, por circunstâncias agravantes previstas em legislação especial, são acusados de crimes no âmbito sistema de justiça para adultos, obtém uma pontuação média de 20.14 (DP=7.70). Schmidt et al. (2005), numa amostra de 107 jovens ofensores referenciados pelo Tribunal para avaliação de saúde mental, apresentam pontuações médias de 16.9 (DP=9.30). Bechtel, Lowenkamp e Latessa (2007) apresentam pontuações médias no YLS/CMI de 21.48 (DP=7.23) para uma amostra de 4482 jovens a cumprir medidas institucionais e comunitárias. Onifade et al. (2008), numa amostra de 328 jovens, que cumpriam medidas comunitárias nos EUA, apresentam uma pontuação média de 16.3. Welsh et al. (2008), com jovens referenciados para o Tribunal para avaliação da saúde mental, verificam uma média de 16.81 (DP=9.24). Vieira et al. (2009), com 122 jovens referenciados para avaliação de saúde mental pelo Tribunal, verificam uma média de 17.26 (DP=9.44). Rennie e Dolan (2010), com uma amostra de 140 jovens masculinos referenciados por apresentarem um diagnóstico de desordens de conduta, verificam pontuações médias de 27.30 (DP=8.39).

Os resultados comparativos por sexo são contraditórios quanto à superioridade dos níveis de risco de rapazes ou de raparigas. Por exemplo, Jung e Rawana (1999) e Schmidt et al. (2005) não encontram diferenças significativas entre as pontuações médias dos jovens do sexo masculino e as das jovens do sexo feminino. No estudo de Jung e Rawana (1999), as raparigas têm uma média de 11.93 (DP=8.40) e os rapazes de 11.09 (DP=8.31) e no estudo de Schmidt et al. (2005) as pontuações médias são de 19.1 (DP=8.7) para as raparigas e de 15.7 (DP=9.5) para os rapazes. O estudo de Flores et al. (2003) apresenta pontuações significativamente superiores nas raparigas (M=20.86) comparativamente aos rapazes (M=19.56; p<.05). Pelo contrário, o estudo de Onifade et al. (2008) verifica que as raparigas têm uma média significativamente inferior (M=14.3) aos rapazes (M=16.9; p<.05).

Globalmente, as pontuações médias no YLS/CMI são mais elevadas em amostras institucionais por comparação com amostras na comunidade. Por exemplo, Flores et al. (2003), em dois departamentos institucionais de justiça juvenil no Ohio, apresenta pontuações médias de 25.12 e 21.45, enquanto que no departamento de probation a pontuação média de 15.62, sendo as diferenças significativas (p<.05). Bechtel et al. (2007) apresentam pontuações médias na amostra de cumprimento de medida institucional de 23.08 (DP=6.29) e de cumprimento de medida na comunidade de 16.60 (DP=7.70), sendo as diferenças muito significativas (p<.001). Acresce, ainda, o facto de, neste estudo, as diferenças significativas nas pontuações entre os dois tipos de medida se estenderem a todos os domínios do YLS/CMI, excetuando o relativo à educação/emprego.

As propriedades psicométricas do YLS/CMI foram examinadas em diversos estudos com resultados satisfatórios no que respeita à fiabilidade (cf. Catchpole & Greton, 2003; Gómez, Garrido, & Cieza, 2007; Marczyk et al., 2003; Schmitd, Hoge, & Robertson, 2002; Thompson & Pope, 2005) e validade concorrente, discriminativa e preditiva (Catchpole & Gretton, 2003; Flores et al., 2003; Onifade et al., 2008; Rowe, 2002; Schmidt et al., 2005). A versão portuguesa do YLS/CMI apresenta indicadores de concordância intra-observadores (CCI=.99) e inter-obervadores (CCI=.97) excelentes e indicadores de consistência interna (α=.93) bons (Pimentel, Quintas, Fonseca, & Serra, 2009, 2011).

 

Processo de adaptação portuguesa do YLS/CMI

Em abril de 2008, a Direção Geral de Reinserção Social, atual Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (DGRSP), promoveu a adaptação e validação de um instrumento de avaliação dos riscos/necessidades criminógenas de jovens ofensores em Portugal. Pretendeu-se implementar uma avaliação padronizada que auxiliasse os técnicos na determinação do nível de risco de continuação da atividade delitiva, na identificação das necessidades criminógenas e fatores de responsividade e na focalização da intervenção dos jovens ofensores tendo em conta essas necessidades criminógenas. O instrumento deveria ser utilizado na avaliação de programas e formas de intervenção e na busca de perfis de risco em diversas tipologias de delinquência juvenil.

A opção recaiu sobre o Youth Level Service/Case Managment Inventory (Hoge & Andrews, 2002), que é um dos instrumentos de avaliação dos riscos/necessidades mais utilizados a nível internacional na jurisdição de menores, salientando-se, como apresentado anteriormente, uma já significativa literatura empírica que avalia as respetivas capacidades psicométricas.

Para a determinação da validade intercultural do instrumento, procedeu-se a um conjunto de tarefas de forma a garantir as equivalências linguísticas, conceptuais e psicométricas. Assim, a qualidade final do processo de adaptação e de validação do instrumento original, foi garantida através da realização das seguintes atividades: (i) tradução/retroversão do instrumento para a língua portuguesa; (ii) acreditação de profissionais tendo em vista a aplicação do instrumento; (iii) estudo piloto com o objetivo de testar a fiabilidade, designadamente inter e intra-observadores; (iv) estudo principal para determinar os valores normativos portugueses, examinar as propriedades psicométricas e estabelecer perfis de risco/necessidades criminógenas (Pimentel, Quintas, Fonseca, & Serra, 2009, 2011, para mais detalhes).

O processo de tradução do instrumento para a língua portuguesa baseou-se nas linhas orientadoras apresentadas por Beaton, Bombardier, Guillemin e Ferraz (2002) para a adaptação intercultural de instrumentos de medida. O processo, gentilmente facilitado por Robert Hoge, autor do inventário, iniciou-se com o pedido à empresa que detém os direitos do instrumento, MHS – Multi Health Sistems, Inc. (outubro de 2008), a receção das suas orientações, a tradução independente por 3 especialistas, retroversão independente por 2 especialistas, o envio da tradução/retroversão para a MHS (junho, 2009), a receção de autorização da versão experimental (julho, 2009) e a adoção, em novembro de 2009, da versão definitiva da tradução/retroversão, que foi atualizada face às recomendações do revisor oficial da MHS (YLS/CMI, tradução portuguesa por Fonseca, Quintas, Serra, Coelho, & Pimentel, 2010). Esta versão final foi, assim, aprovada e autorizada pela MHS.

O processo de acreditação de aplicadores iniciou-se através da realização de uma ação de formação de 28 horas, em março de 2009, realizada por Robert Hoge, dirigida a um grupo de 18 profissionais que foram acreditados como formadores. Posteriormente, foram realizadas 16 ações de formação, de 14 horas, destinadas a cerca de 180 profissionais, que os formaram como utilizadores do instrumento.

 

Método

 

Amostra

No presente estudo participaram 2363 jovens em contacto com a DGRSP, com uma média de idades de 15.60 (DP=1.37), um mínimo de 12 anos e um máximo de 21 anos de idade. Quanto ao sexo, 85% dos jovens são do sexo masculino (n=1998) e os restantes 15% são do sexo feminino (n=365). São de nacionalidade portuguesa 91% dos jovens, sendo os restantes 9% de nacionalidade estrangeira No que respeita à fase processual, 1835 jovens (78%) encontravam-se na fase de inquérito, 335 jovens (14%) em medidas tutelares educativas em execução na comunidade e 193 jovens (8%) em medidas de internamento. Nas medidas de internamento, foram incluídos 35 jovens internados em centro educativo em medida cautelar de guarda, embora formalmente se encontrassem na fase de inquérito.

 

Procedimentos

O YLS/CMI foi aplicado por técnicos superiores da DGRSP, com formação específica para o efeito, das Delegações Regionais do Norte, Centro, Lisboa, Algarve, Açores e Madeira e ainda dos Centros Educativos de Santa Clara, de Santo António, dos Olivais, do Mondego, da Bela Vista, de Navarro de Paiva, Padre António de Oliveira e da Madeira.

A aplicação do YLS/CMI foi realizada, entre maio de 2010 e abril de 2011, nas Equipas de Reinserção Social e nos Centros Educativos relativamente a cada um dos jovens em que foi iniciada uma intervenção por parte da DGRSP. Na fase de inquérito, o YLS/CMI foi aplicado aos novos pedidos de relatório social, de relatório social com avaliação psicológica e de perícia sobre a personalidade. O instrumento foi ainda aplicado às novas medidas tutelares educativas de execução na comunidade e em internamento.

Adicionalmente, foram recolhidos dados relativos ao processo atual (por exemplo, tipo de crime, data dos factos, número de crimes), aos antecedentes criminais e aos aspetos sociais e demográficos (por exemplo, meio habitacional, estatuto sócio-económico e caracterização da área residencial). O preenchimento do YLS/CMI e das questões adicionais foi realizado em plataforma informática especialmente criada para o efeito na DGRSP.

 

Instrumento

O instrumento utilizado foi o YLS/CMI (Hoge, Andrews, & Leschied, 2002), tradução portuguesa por Fonseca, Quintas, Serra, Coelho e Pimentel (2010), versão definitiva autorizada pela MHS. O YLS/CMI é constituído por 7 secções: (i) Avaliação dos riscos e das necessidades; (ii) Resumo dos riscos e das necessidades; (iii) Avaliação de outras necessidades e considerações especiais; (iv) Avaliação pessoal do nível geral de risco/necessidades do jovem; (v) Nível de contacto; (vi) Plano de gestão do caso; (vii) (Re)avaliação da gestão do caso.

A primeira secção, avaliação dos riscos e das necessidades, é constituída por 42 itens distribuídos por oito domínios: (1) Delitos e medidas anteriores e atuais; (2) Contexto familiar/Práticas parentais; (3) Educação/ Emprego; (4) Relação com os pares; (5) Abuso de substâncias; (6) Tempos livres; (7) Personalidade/Comportamento; (8) Atitudes/Orientação. Cada item do YLS/CMI é codificado como presente (1) ou ausente (0), sendo possível calcular uma pontuação por domínio e uma pontuação final, variando esta entre 0 e 42 pontos. Na segunda secção do inventário, Resumo dos riscos e das necessidades, são efetuados os cálculos para determinar o nível de risco de reincidência. No que respeita à pontuação final são definidos 4 categorias de risco: Risco Baixo (0 a 8); Risco Moderado (9 a 22); Risco Alto (23 a 34) e Risco Muito Alto (35 a 42).

Na terceira secção do inventário, Avaliação de outras necessidades e considerações especiais, são assinaladas a presença ou ausência de outras necessidades e considerações especiais relacionadas com a família/os pais do jovem e com o jovem. Na quarta secção, avaliação pessoal do nível geral de risco/necessidades do jovem, o técnico, caso divirja do nível de risco obtido no inventário, estima, justificando devidamente, o nível de risco dos jovens, ação conhecida pela expressão override.

As últimas três secções do inventário incidem sobre a gestão do caso. Na quinta secção, Nível de contacto, determina-se o nível de contacto com o jovem. Na sexta secção, Plano de gestão do caso, elabora-se o plano de gestão do caso, assinalando os objetivos e as ações para os atingir. Finalmente, a sétima secção, (Re)avaliação da gestão do caso, permite a reavaliação da gestão do caso, através da sinalização de mudanças nos níveis de risco, dos níveis de contacto com o jovem e dos progressos ou revisões do plano.

O YLS/CMI deve ser cotado por técnicos, devidamente credenciados, que devem utilizar toda a informação disponível sobre o jovem avaliado, designadamente através de entrevistas com o jovem, revisão dos registos dos processos e informação obtida de fontes colaterais.

No presente estudo foram apenas utilizadas as duas primeiras secções do YLS/CMI.

 

Resultados

 

Dados normativos

Os dados normativos portugueses obtidos neste estudo estão sintetizados no Quadro 1 que apresenta a estatística descritiva da amostra e a relativa à combinação das variáveis sexo e situação processual. A pontuação média obtida no YLS/CMI é 12.11 (DP=8.68) e a mediana é de 11. O teste U de Mann-Whitney revela diferenças altamente significativas entre sexos (U=311544.000; p<.001), sendo as pontuações no inventário de risco/necessidades criminógenas dos jovens do sexo masculino (M=12.44; DP=8.70; Md=11) significativamente superiores face às jovens do sexo feminino (M=10.31; DP=8.36; Md=8). Refira-se, contudo, que as diferenças entre sexos, examinadas por teste U de Mann-Whitney, estão apenas presentes na fase pré-sentencial (U=184503.500; p<.001), fase em que as pontuações médias dos rapazes são de M=11.09 (DP=8.30; Md=10) e as pontuações das raparigas são de M=8.73 (DP=7.71; Md=6). Nas medidas comunitárias e nas medidas de internamento não há diferenças significativas entre sexos na pontuação total do YLS/CMI (p>.05).

 

 

A diferenciação dos resultados por fases processuais evidencia a capacidade discriminativa do instrumento. Segundo o teste Kruskal-Wallis, as pontuações totais do YLS/CMI são, como se esperava, significativamente diferentes em função da fase processual (H=317.464; p<.001). Na fase de inquérito, as pontuações totais são mais baixas (M=10.72; DP=8.25; Md=9) do que nas medidas na comunidade (M=13.34; DP=7.00; Md=13), sendo ambas bastante inferiores às obtidas nas medidas de internamento (M=23.21; DP=6.75; Md=24). Distinguindo estes resultados, por tipo específico de medida tutelar, verifica-se que nas medidas comunitárias as pontuações mais baixas surgem nas tarefas a favor da comunidade (M=9.97; DP=7.46; Md=8) e na imposição de obrigações (M=11.74; DP=7.43; Md=10), enquanto que as medidas de acompanhamento educativo têm as pontuações mais altas (M=14.80; DP=6.42; Md=14). Nas medidas tutelares de internamento, as pontuações são mais baixas no regime aberto (M=19.12; DP=7.50; Md=21) relativamente ao regime semiaberto (M=23.10; DP=6.85; Md=24) e ao fechado (M=23.41; DP=5.51; Md=25).

Considerando os níveis de risco propostos na versão original do inventário, 40.7% dos participantes têm nível baixo (pontuação entre 0 e 8), 44.6% moderado (9-22), 14.5% alto (23-34) e, apenas, 0,3% muito alto (35-42), conforme o Gráfico 1

 

 

Os resultados por domínio do YLS/CMI, cujas estatísticas descritivas são apresentadas no Quadro 2, mostram que as diferenças identificadas no total do inventário entre sexos e situação processual tendem a ocorrer em todos os domínios.

 

 

Com efeito, as pontuações de todos os oito domínios do YLS/CMI, segundo o teste Kruskal-Wallis, são significativamente diferentes em função da fase processual (H>=86,180; p<.001). O padrão de diferenças entre as fases, testado em sucessivas comparações com o teste U de Mann-Whitney, apresenta pontuações significativamente inferiores na fase de inquérito por comparação com as medidas (U>=224065.000; p<.003) e significativamente inferiores nas medidas tutelares educativas em execução na comunidade em relação às medidas tutelares educativas de internamento (U>=13760.000; p<.001). Apenas em dois domínios Educação/Emprego (U=298005.000; p=.367) e Abuso de Substâncias (U=296113.500; p=.104) as pontuações observadas na fase de inquérito não se diferenciam das encontradas nas medidas tutelares educativas em execução na comunidade.

Para a variável sexo, segundo o teste U de Mann-Whitney, com exceção do domínio Tempos Livres (U=304552.000; p=.456), o sexo masculino apresenta, em todos domínios, pontuações significativamente superiores ao sexo feminino (U>=224065.000; p<.001).

 

Análise diferencial de perfis de risco

A análise dos perfis diferenciais de risco neste estudo incide essencialmente sobre duas grandes dimensões: (i) aspetos relacionados com o comportamento criminal, concretamente o tipo de crime cometido, a colocação ou não em centro educativo e a presença de antecedentes criminais; (ii) variáveis relacionadas com o contexto sociocultural do jovem, como a zona de proveniência, a nacionalidade, a situação socio-económica da família (tomando em consideração a profissão/ocupação, formação e fontes de rendimento do progenitor ou da pessoa que tem o jovem a seu cargo), o tipo de meio habitacional (urbano, suburbano e rural) e a associação da comunidade de residência a problemas sociais, nomeadamente o tráfico e consumo de drogas, a delinquência, as tensões étnicas e a existência de bandos de jovens.

No Quadro 3 são apresentados as pontuações do YLS/CMI nas subamostras e os testes estatísticos destinados a examinar diferenças em aspetos relacionados com o comportamento criminal. No que diz respeito ao tipo de atividade delituosa, verificam-se diferenças significativas no total do YLS/CMI (H=234.823; p<.001). Os jovens que praticam crimes violentos (M=16.57; DP=9.53; Md=18) e roubos (M=16.74; DP=8.54; Md=17) são os que apresentam pontuações mais elevadas.

 

 

As pontuações totais do YLS/CMI diferem em função do tipo de unidade orgânica da DGRSP que colaborou no estudo (H=307.281; p<.001). As pontuações totais médias do YLS/CMI preenchida nos Centros Educativos (M=22.71; DP=6.61; Md=24) são, como seria de esperar, mais elevados do que os encontrados nas diferentes equipas das Delegações Regionais, cujas médias variam entre o máximo de 13.50 na Delegação Regional da Madeira e o mínimo de 7.90 na Delegação Regional do Alentejo.

Já no que se refere à existência de antecedentes criminais, 662 indivíduos apresentam antecedentes criminais e 1701 jovens não têm qualquer antecedente. Os jovens que apresentam antecedentes criminais têm pontuações totais do YLS/CMI, em média, cerca de duas vezes mais elevados (M=18.31; DP=7.53; Md=18) do que os jovens que não têm antecedentes (M=9.70; DP=7.86; Md=8), tendo a diferença entre estes dois grupos significado estatístico (U=242340.500; p<.001).

As pontuações totais do YLS/CMI encontradas em subamostras definidas através de diversas variáveis contextuais são apresentados no Quadro 4. Os jovens de nacionalidade estrangeira, largamente minoritários (n=218), têm pontuações moderadamente superiores no inventário (M=13.29; DP=8.67; Md=11.5) do que os de nacionalidade portuguesa (M=11.29; DP=8.72; Md=11), sendo essa diferença significativa (U=208034.500; p=.026).

 

 

A avaliação do estatuto socioeconómico dos agregados de origem destes jovens revela ainda que os níveis Baixo (M=14.83; DP=8.27; Md=14.5) e Médio-baixo (M=11.47; DP=8.53; Md=10), largamente predominantes na amostra (73%), têm pontuações no total do YLS/CMI muito superiores relativamente aos escalões Médio (M=6.62; DP=6.62; Md=4), Médio-alto (M=4.18; DP=5.73; Md=2) e Alto (M=1.2; DP=2.17; Md=0). Há diferenças significativas entre os grupos considerados (H=336.925; p<.001).

No que diz respeito ao meio habitacional, os jovens oriundos do meio urbano (M=13.13; DP=9.00; Md=12) e suburbano (M=12.37; DP=8.45; Md=11), apresentam pontuações superiores no total do YLS/CMI relativamente aos jovens do meio rural (M=9.21; DP=7.90; Md=7,5), tendo as diferenças entre estes grupos significado estatístico (H=55.645; p<.001).

Quanto ao tipo de zona residencial, 25% dos jovens habitam em bairro social. As pontuações do YLS/CMI para estes jovens são significativamente mais elevadas (M=15.13; DP=8.55; Md=15) do que os dos jovens que não habitam em bairro social (M=11.18; DP=8.50; Md=10), sendo a diferença significativa (U=312044; p<.001).

Quanto à comunidade de proveniência destes jovens, procurou-se ainda verificar em que medida as pontuações encontradas no YLS/CMI se encontravam associados à perceção da presença de problemas sociais. Assim, os jovens provenientes de comunidades associadas ao consumo de drogas (M=15.67; DP=8.23; Md=16) têm pontuações significativamente superiores (U=309345; p<.001) aos jovens provenientes de comunidades não associadas ao consumo de drogas (M=10.72; DP=8.48; Md=9).

Os jovens originários de comunidades associadas à delinquência possuem pontuações totais do YLS/CMI (M=15.71; DP=8.30; Md=16) superiores aos jovens oriundos de zonas não associadas à delinquência (M=10.27; DP=8.31; Md=8), sendo a diferença entre os dois grupos significativa (U=324145; p<.001).

Os jovens originários de comunidades associadas a tensões étnicas apresentam pontuações superiores de pontuação total do YLS/CMI (M=14.75; DP=8.38; Md=15) face aos jovens residentes em comunidades não associadas a este tipo de problemas (M=11.82; DP=8.69; Md=11), sendo esta diferença significativa (U=192699.500; p<.001).

Finalmente, os jovens residentes em zona associadas à existência de bandos de jovens têm pontuações superiores (M=16.14; DP=8.30; Md=17) comparativamente aos residentes em comunidades não associadas à existência destes bandos (M=11.04; DP=8.48; Md=10), sendo a diferença significativa (U=257339; p<.001).

 

Discussão

No presente estudo foram estabelecidos os dados normativos da versão portuguesa do YLS/CMI, numa extensa amostra constituída por jovens cujo processo se encontra na fase de inquérito ou por jovens a cumprir medidas tutelares educativas na comunidade ou em meio institucional. A pontuação média total é de 12.11 (DP=8.68). As pontuações médias totais presentes na literatura internacional variam 11.38 (DP=8.68; Jung & Rawana, 1999) e 27.3 (DP=8.68; Rennie & Dolan, 2010), sendo que na maior parte dos estudos estas pontuações se situam entre 16 e 21 (cf. Bechtel et al., 2007; Flores et al., 2003; Marczyk et al., 2003; Onifade et al., 2008; Schmidt et al., 2005; Vieira et al., 2009; Welsh et al., 2008). Os valores normativos apresentados neste estudo são, assim, similares aos originais (Jung & Rawana, 1999) constantes no manual do YLS/CMI (Hoge, Andrews, & Leschied, 2002), mas sempre inferiores a toda a restante literatura relativa ao instrumento. A preponderância de casos da fase pré-sentencial na amostra recolhida em Portugal, por confronto com amostras institucionais e, por vezes, com amostras selecionadas em função da presença de problemas de saúde mental associados à delinquência (e.g., Rennie & Dolan, 2010) será um fator determinante para a compreensão destes resultados.

As pontuações globais de risco/necessidades na fase de inquérito são mais baixas do que as obtidas após a determinação da medida. De igual modo, e em conformidade com o habitualmente encontrado na literatura (cf. Bechtel et al., 2007; Flores et al., 2003), as pontuações de risco/necessidades criminógenas são claramente mais elevadas nas medidas de internamento comparativamente com as medidas na comunidade. Acresce que a superioridade das pontuações de risco/necessidades criminógenas dos jovens em medidas de internamento é comum ao sexo masculino e feminino, bem como se estende aos diversos domínios do instrumento. O facto de as pontuações de YLS/CMI aumentarem à medida que se avança na fase processual e para medidas tutelares mais gravosas revela a validade discriminativa do instrumento, de forma congruente com o apresentado na literatura (e.g., Flores et al., 2003; Onifade et al., 2008; Schmidt et al., 2005).

No presente estudo, na amostra global e na fase de inquérito, os rapazes têm pontuações no YLS/CMI significativamente superiores às das raparigas, o que está de acordo com os resultados apresentados por Onifade et al. (2008). Contudo, em cumprimentos de medidas na comunidade ou em cumprimento de medidas de internamento, tal como nos estudos de Jung e Rawana (1999) e de Schmidt et al. (2005), não há diferenças entre os jovens do sexo masculino e as jovens do sexo feminino nas pontuações do YLS/CMI. Estes resultados parecem indicar que à medida que a seleção do sistema de justiça se operacionaliza, designadamente pela passagem das diferentes fases processuais, as raparigas tendem a apresentar resultados de risco de reincidência criminal semelhantes aos obtidos pelos rapazes.

Sendo as raparigas minoritárias nas populações judiciais, importará, contudo, futuramente acrescentar participantes femininas nas medidas tutelares de execução na comunidade e, especialmente, nas medidas de internamento para estabelecer valores normativos mais sólidos. Deste modo, devem ser usados com a maior precaução os valores normativos apresentados para estes grupos específicos, devendo ser evitadas conclusões comparativas que se baseiem estritamente nesses resultados.

O YLS/CMI demonstra ainda capacidade discriminativa entre subamostras tendo em conta uma análise criminal retrospetiva, o tipo de atividade delitiva e um conjunto de variáveis contextuais. Os jovens com antecedentes criminais, que praticam crimes violentos, de nacionalidade estrangeira, de níveis sócio-económicos mais baixos, meios urbanos, provenientes de bairros sociais e de comunidades associadas a diversos problemas sociais tendem a apresentar pontuações superiores no total do instrumento. A presença dessas caraterísticas diferenciadoras dos jovens tendo em conta o seu contexto de integração social serão, assim, presumivelmente associadas a níveis de risco de reincidência criminal e necessidades criminógenas superiores, mas esta constatação não impede a necessidade estrita de, para cada jovem, esses níveis serem testados através da utilização criteriosa do instrumento.

 

Conclusão

Os valores normativos apurados no presente estudo são globalmente semelhantes aos da amostra normativa canadiana original do YLS/CMI, mas claramente inferiores à restante literatura internacional sobre o instrumento. Comprovando a esperada diferenciação dos valores normativos em face do tipo de amostra selecionada no sistema judicial, observam-se pontuações inferiores nos jovens em fase de inquérito face aos jovens a cumprir medida tutelar na comunidade e pontuações bastante inferiores nestes dois grupos em relação aos jovens a cumprir medida de internamento.

Estes resultados permitirão ao utilizador do instrumento, particularmente nos contextos de avaliação forense, fornecer indicações mais precisas e orientadas sobre os níveis de risco do jovem, bem como sobre o elenco das necessidades criminógenas que devem ser atendidas. Na fase pré-sentencial, a utilização do instrumento permitirá detetar com maior acuidade os casos de delinquência transitória e de menor risco que merecerão uma intervenção mínima do sistema de justiça, de pendor educativo, distinguindo-os das situações de maior risco que implicam intervenções mais intensas, de forma a serem adequadas a uma efetiva prevenção criminal (cf. Andrews & Bonta, 2006). Nos casos dos jovens que cumprem medidas tutelares educativas, a utilização do YLS/CMI permitirá testar os respetivos níveis de risco de forma comparativa com dados nacionais e definir concretamente perfis de necessidades criminógenas que devem presidir aos planos de supervisão imprescindíveis a uma correta execução da medida.

O uso do YLS/CMI pode, assim, aumentar a transparência das decisões judiciais, minimizando as intervenções estritas do sistema de justiça para casos em que essa atuação é desnecessária ou mesmo contraproducente (e.g., desjudicializando) e intensificar as ações de supervisão judicial com intervenção técnica especializada, provida de forma humana e eficaz, para os casos que efetivamente dela necessitam.

A amostra do presente estudo é constituída pelos novos casos em contacto com o sistema de justiça durante o período de um ano, sendo uma das amostras mais robustas da literatura internacional. Contudo, ainda assim, a principal limitação a contornar consiste nas fragilidades presentes em subamostras específicas que embora minoritárias no sistema judicial são relevantes. É este o caso das raparigas a cumprir medidas tutelares educativas, particularmente de internamento, bem como é também o caso de grupos minoritários (e.g., estrangeiros, minorias étnicas), cujos efetivos são necessariamente mais reduzidos. Com o progressivo incremento dos efetivos dessas subamostras espera-se obter uma compreensão mais aprofundada sobre os seus efeitos na determinação do risco de reincidência criminal. Refira-se que a ênfase na diferenciação de grupos populacionais não visa identificar os mais vulneráveis. Pelo contrário, trata-se de garantir aos jovens provenientes dos diversos contextos sociais, uma avaliação transparente das suas necessidades criminógenas e o estabelecimento de níveis de supervisão e de cuidado ajustados, com o fim de prevenir a delinquência futura.

Finalmente, refira-se que a experiência de utilização de um instrumento deste tipo nas práticas institucionais, alargada a um amplo grupo de técnicos, merece a atenção da comunidade científica no que respeita às implicações do uso de avaliações de risco de reincidência criminal e de necessidades criminógenas, no planeamento das intervenções e, de forma mais global, nas práticas de atuação no campo da justiça juvenil.

 

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CORRESPONDÊNCIA

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Jorge Quintas, Escola de Criminologia, Faculdade de Direito, Universidade do Porto, Rua dos Bragas, 223 4050-123 Porto. E-mail: joliveira@direito.up.pt

 

Financiado pela Direção Geral de Reinserção e Serviços Prisionais (ex Direção geral de Reinserção Social.

 

Submissão: 21/04/2014 Aceitação: 01/11/2014

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