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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica vol.33 no.1 Lisboa mar. 2015

https://doi.org/10.14417/ap.832 

Preditores da qualidade de vida numa amostra de mulheres com cancro da mama

Helena Sousa1, Marina Guerra1, Leonor Lencastre1

1Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto

Correspondência

 

RESUMO

Objetivo: Analisar a relação das variáveis alexitimia, espiritualidade, assertividade, ansiedade, depressão e qualidade de vida, com o objetivo de construir um modelo preditor da qualidade de vida numa amostra de mulheres com cancro de mama. Método: A amostra inclui 85 mulheres com cancro de mama dum hospital do Porto, com uma média de 47 anos e maioritariamente casadas. As doentes foram avaliadas através de 6 instrumentos de autopreenchimento: Questionário Sociodemográfico e Clínico; Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS); Escala de Alexitimia de Toronto (TAS-20); Escala de Avaliação da Espiritualidade; Escala de Assertividade de Rathus e Quality of Life Questionnaire (EORTC QLQC-30, v.3.0). Resultados: Os resultados indicam que estas mulheres são mais alexitímicas do que a população normativa e que uma das estratégias de coping adaptativas a que recorrem é a esperança/otimismo. Não apresentam sintomatologia depressiva acentuada, sendo a componente ansiosa a mais evidente. A avaliação que apresentam em relação à sua qualidade de vida global parece ser positiva. O modelo preditor obtido exclui o efeito das crenças espirituais/religiosas e da assertividade e salienta a importância da alexitimia como fator de risco e da esperança/otimismo como fator protetor da qualidade de vida de mulheres com cancro de mama, depois de controladas as variáveis ansiedade e depressão.

Palavras-chave: Cancro de mama, Alexitimia, Espiritualidade, Assertividade, Qualidade de vida.

 

ABSTRACT

Aims: To characterize the variables alexithymia, spirituality (beliefs dimension and hope/optimismdimension) and assertiveness in the quality of life of women with breast cancer. Methodology: The sample is composed by 85 women with breast cancer from a Hospital of Porto,with an average age of 47 years old and mostly married. The patients completed 6 questionnaires:Sociodemographic and Clinical Questionnaire; Hospital Anxiety and Depression Scale (HADS);Toronto Alexithymia Scale (TAS-20); Spirituality Evaluation Scale; Rathus Assertiveness Scale andThe European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire(EORTC QLQC-30, v.3.0).Results: The results indicate that alexithymia is negatively correlated with the hope/optimismdimension and with assertiveness and that all of these three variables are correlated to quality of life.It also demonstrates the existence of a positive correlation between age and quality of life and anegative correlation between the number of schooling years with alexithymia and beliefs dimension.The predictive model tested demonstrates the influence of alexithymia and hope/optimism dimensionin the quality of life of women with breast cancer, even after controlling anxiety and depression.

Key-words: Breast cancer, Alexithymia, Spirituality, Assertiveness, Quality of life.

 

Introdução

O cancro de mama é a doença maligna que mais afeta o sexo feminino, estimando-se que ao longo da vida uma em cada nove mulheres venha a desenvolver esta patologia (Fernández-Delgado et al., 2008). O avanço tecnológico ao nível das ciências médicas tem proporcionado um crescente otimismo no tratamento da doença oncológica e no aumento da sobrevida. Apesar disto, o cancro de mama continua a ser um acontecimento de vida adverso e potencialmente traumático, com um tratamento prolongado e incerto, acompanhado por elevadas exigências pessoais e sociais, com um impacto profundo e duradouro na qualidade de vida (Montarezi, 2007).

Com vista a uma melhor identificação dos fatores que poderão ter interferência com o risco de disfunção psicossocial nesta população, é fundamental conhecer as variáveis que poderão colocar em risco ou proteger a qualidade de vida (Silva, Bettencourt, Moreira, & Canavarro, 2011).

Na literatura destacam-se particularmente dois fatores de risco: a ansiedade e a depressão. O cancro de mama tem vindo a relacionar-se com o desenvolvimento de perturbações de humor (Costa-Requena, Rodriguez, & Fernández-Ortega, 2012; Hulbert-Williams, Neal, Morrison, Hood, & Wilkinson, 2012; Hung et al., 2013; Montarezi, 2007; Stafford et al., 2013), o que torna fundamental a avaliação e inclusão destas duas variáveis nos diferentes estudos que se debruçam sobre o impacto da doença.

Este artigo considera também fatores da personalidade que poderão influenciar o coping com a doença, baseando-se na existência de alguns comportamentos de um certo tipo de personalidade – a personalidade do Tipo C – associados ao cancro (Patrão & Leal, 2004; Vazquez, Rodriguez, & Álvarez, 2003). Relacionados com este tipo de personalidade, surgem em destaque dois fatores de risco: a alexitimia e a falta de assertividade. Relativamente à alexitimia (dificuldade na expressão emocional), a análise desta estratégia de coping repressiva e mal adaptativa (Iwamitsu et al., 2003), merece interesse pela sua correlação negativa com diferentes dimensões da qualidade de vida, como por exemplo a dor (Shibata et al., 2014) e a fadiga (Gritti et al., 2010).

Relativamente às variáveis protetoras destaca-se o papel da espiritualidade e da assertividade. De acordo com a revisão sistemática elaborada por Veit e Castro (2013), os estudos sobre o impacto da espiritualidade na adaptação à doença oncológica são escassos. A espiritualidade é apresentada por alguns autores enquanto estratégia de coping adaptativa (Stanton, Danoff-bur, & Huggins, 2002) e como uma das principais variáveis associadas à qualidade de vida do doente oncológico (Lim & Yi, 2009).

Em relação à assertividade (expressão de direitos, emoções, sentimentos e pensamentos), considerada como um traço individual positivo, o seu estudo é pertinente uma vez que há poucos estudos que se foquem no seu papel enquanto variável positiva (Patrão & Leal, 2004; Vazquez et al., 2003).

Apresentamos, de seguida, uma descrição mais detalhada de cada uma das variáveis psicológicas em estudo.

 

Ansiedade e depressão

A doença oncológica é um importante fator de risco no desenvolvimento de perturbações de humor (Hung et al., 2013). A presença da comorbilidade psicológica nesta população parece, no entanto, variar consoante as fases de adaptação à doença oncológica (Costa-Requena et al., 2012). A literatura indica que sobretudo numa fase inicial, a maioria das mulheres experiencia algum grau de perturbação emocional e reações emocionais negativas, comuns e adaptativas (Pais-Ribeiro et al., 2007; Silva, Moreira, & Canavarro, 2010). Estima-se que na fase de diagnóstico e durante os tratamentos a prevalência de sintomas depressivos e ansiógenos ronde os 40% (Zabora, BrintzenhofeSzoc, Curbow, Hooker, & Piantadosi, 2001), sendo que em 15.7% dos casos poderá diagnosticar-se uma depressão major e em 53.2% uma ansiedade clinicamente significativa (Costa-Requena et al., 2012; Silva et al., 2010). A incidência desta sintomatologia tem vindo a ser associada não só à doença, mas também aos seus tratamentos intrusivos que provocam alterações na imagem corporal, na intimidade e na sexualidade (Hung et al., 2013), mas também a outras causas como o medo da recidiva (Pinto & Ribeiro, 2006; Vickberg, 2001) e o medo da morte (Patrão, Leal, & Maroco, 2008).

A presença desta comorbilidade psicológica tem repercussões importantes na adesão terapêutica e na qualidade de vida, podendo influenciar os resultados dos tratamentos (Hung et al., 2013), o tempo de hospitalização (Johnston, 1997), a esperança de recuperação (Brothers & Andersen, 2009) e as taxas de mortalidade (Reich, Lesur, & Perdrizet-Chevallier, 2008).

 

Alexitimia

Na década de 80, há estudos que referem a existência de um tipo de personalidade encontrado com frequência em doentes com cancro – a personalidade do Tipo C (Patrão & Leal, 2004; Taylor, 2000; Vazquez et al., 2003), caracterizada pela inexpressividade emocional. Os indivíduos que apresentam uma capacidade introspetiva diminuída e um estilo cognitivo caraterizado por uma forte dificuldade na expressão emocional e na distinção entre emoções e sensações corporais são considerados alexitimicos (Fonte, 1993). A alexitimia ou “sem palavras para os sentimentos” (Fernandes & Tomé, 2001, p. 97) é um coping repressivo, de evitamento, de negação (Lieberman & Goldstein, 2006) e mal adaptativo (Iwamitsu et al., 2003). Por outro lado, uma boa expressão de emoções está associada a um maior bem-estar psicossocial, a uma maior autoconfiança e assertividade, a um espírito mais lutador e a uma melhor qualidade de vida (Mantani et al., 2007).

A importância da expressão emocional e as suas consequências ao nível físico e mental tem vindo a ser cada vez mais estudada pela Psico-Oncologia, devido ao seu papel crítico na doença (Fonte, 1993). A nível internacional, há um estudo que compara um grupo de mulheres com cancro de mama com um grupo de controlo (mulheres sem doença), concluindo que as mulheres com cancro de mama são significativamente mais alexitímicas (Manna et al., 2007). A nível nacional, encontramos apenas um estudo que indica uma prevalência da alexitimia em mulheres com cancro de mama duas vezes superior à da população normativa (Guerra, Pinto, & Mariano, 2007). No entanto, a associação entre a alexitimia e a doença oncológica mantém-se controversa (Gritti et al., 2010; Jensen-Johansen et al., 2013; Mantani et al., 2007). Alguns artigos indicam correlações negativas entre esta variável e diferentes domínios da qualidade de vida (Gritti et al., 2010; Shibata et al., 2014).

 

Espiritualidade

A influência da espiritualidade na saúde tem sido alvo de um número crescente de estudos, apontando para um efeito benéfico desta variável tanto a nível físico como mental (Oman & Thoresen, 2005). A inclusão da dimensão espiritual nas definições de qualidade de vida relacionada com a saúde reflete o alargamento da noção de espiritualidade que não se restringe à dimensão religiosa.

Espiritualidade e religiosidade são conceitos diferentes, embora seja necessário entendê-los como multidisciplinares e interdependentes (Zinnbauer & Pargament, 2005). A religião é institucional, fundamentada por crenças e rituais, referindo-se ao grau de participação ou de adesão da pessoa às práticas religiosas (Oman & Thoresen, 2005), enquanto a espiritualidade é um constructo mais amplo (Pinto & Ribeiro, 2007), pessoal, subjetivo, um processo dinâmico e experiencial e que pode ou não, coexistir com a prática religiosa (Lim & Yi, 2009; Pinto & Ribeiro, 2007).

Ambas constituem estratégias de coping adaptativas que auxiliam na procura do sentido para a vida, da esperança e do bem-estar face a uma doença grave, como o cancro de mama (Pinto & Ribeiro, 2007). Segundo Romero e colaboradores (2006), o coping espiritual-religioso está relacionado com uma melhor saúde, maior bem-estar psicológico, melhor qualidade de vida (Kandasamy, Chaturvedi, & Gmenor, 2011), por se associar à manutenção da autoestima, do otimismo (Gall, Guirguis-Younger, & Charbonneau, 2009), da esperança (Ebright & Lyon, 2002) e de estratégias mais adaptativas perante a doença.

 

Assertividade

A assertividade é um constructo com duas dimensões: a frequência dos comportamentos assertivos e a tensão, ansiedade e desconforto associados a esses comportamentos. Existem quatro estilos de comportamentos interpessoais: o assertivo, o ansioso, o indiferente e o não-assertivo (Hinnen, Hagedoorn, Ranchor, & Sanderman, 2008). Uma das caraterísticas da personalidade do Tipo C associada ao cancro é a falta de assertividade (Vazquez et al., 2003), pelo que limitar-nos-emos a distinguir entre o estilo assertivo e o não-assertivo, uma vez que constituem o foco de interesse para o presente trabalho. Sendo assim, enquanto variável positiva, um estilo de comportamento interpessoal assertivo é marcado pela afirmação de um self seguro e coerente e por um sentimento de conforto perante as situações que impliquem a abertura aos outros. Esses comportamentos associam-se a uma frequência elevada de respostas assertivas e a uma baixa tensão. Em contrapartida, os comportamentos interpessoais de não-assertividade caraterizam-se por tentativas voluntárias de exprimir os sentimentos e pensamentos, mas com uma grande dificuldade ao fazê-lo (Vazquez et al., 2003). Associa-se a um forte sentimento de desconforto e de tensão (Hinnen et al., 2008), tal como na alexitimia (Manna et al., 2007).

As mulheres com cancro de mama menos assertivas parecem experienciar menores níveis de satisfação interpessoal, em comparação com as mulheres mais assertivas. O evento stressante e ameaçador que constitui o diagnóstico de um cancro poderá contribuir para esta insatisfação. Estas mulheres terão maior dificuldade em exprimir os seus medos e as suas limitações pessoais, em confiar nos outros, em promover a proximidade e a intimidade, experienciando frequentemente mais solidão e falta de controlo emocional nas suas relações interpessoais, bem como uma maior dificuldade em resolver problemas interpessoais (Hinnen et al., 2008). Deste modo, desenvolvem também uma atitude mais negativa face ao cancro relacionada com elevados níveis de distress psicológico e por isso, apresentam uma menor qualidade de vida (Gerasimčik-Pulko, Pileckaitė-Markoviene, Bulotienė, & Ostapenko, 2009).

 

Qualidade de vida

Não há uma definição consensual de qualidade de vida, existem sim, diferentes propostas que variam consoante os autores. Devido ao interesse crescente pela qualidade de vida no âmbito da doença, surge a “qualidade de vida relacionada com a saúde” (Pimentel, 2006, p. 25) que representa as respostas individuais aos efeitos da doença, englobando a dimensão física, psicológica, social e espiritual, bem como a avaliação da eficácia dos serviços de saúde (Dow, Ferrell, Leigh, Ly, & Gulasekaram, 1996; Pimentel, 2006; Pinto & Ribeiro, 2006).

Na área da oncologia, os estudos de avaliação da qualidade de vida apresentam diferentes conclusões. Há autores que defendem a importância da avaliação desta variável no cancro de mama (Patrão et al., 2008; Pimentel, 2006), uma vez que esta patologia se destaca pela incidência no sexo feminino e está associada a uma série de consequências biopsicossociais que têm vindo a prejudicar a mulher, nomeadamente a nível laboral, familiar (Taylor, 2000), social (Holland & Holahan, 2003) e pessoal (físico, na autoimagem e na vida sexual) (Safarinejad, Shafi, & Safarinejad, 2013). Outros estudos relatam que a qualidade de vida das mulheres com cancro da mama é melhor do que seria de esperar (Lopes, Ribeiro, & Leal, 1999). Ter esperança, suporte social, espiritualidade, sentido de utilidade, felicidade e satisfação, são as variáveis que melhor equilibram a qualidade de vida nesta população (Dow et al., 1996). Por outro lado, a incerteza (Fallowfield, 1997), o distress (Zabora et al., 2001), os pensamentos ruminativos (Dupont, Bower, Stanton, & Ganz, 2014), a ansiedade e a depressão (Lim & Yi, 2009), também se relacionam, mas negativamente.

Mais estudos sobre a qualidade de vida são fundamentais para o conhecimento do impacto da doença, da sua evolução, da eficácia e da adaptação dos doentes aos tratamentos e aos seus efeitos colaterais (Paredes et al., 2008).

 

Objetivo

Este estudo pretende analisar a relação das variáveis alexitimia, espiritualidade, assertividade, ansiedade, depressão e qualidade de vida, com o objetivo de construir um modelo preditor da qualidade de vida.

 

Método

 

Participantes

A amostra é constituída por 85 mulheres com cancro de mama utentes de um hospital do Grande Porto, com uma média de 47 anos de idade, casadas (76.5%), com filhos (71.8%) e com um nível médio de escolaridade de 10 anos e meio. A maioria (44.7%) encontra-se entre o 2º e o 6º mês após o diagnóstico clínico, predominando as mulheres mastectomizadas (63.5%) que realizaram quimioterapia (89.4%), e radioterapia (71.8%).

 

Instrumentos

Foram utilizados 6 instrumentos de autopreenchimento para a recolha de dados neste estudo. O Questionário Sociodemográfico e Clínico inclui duas secções, a primeira relativa aos dados sociodemográficos e a segunda destinada às características clínicas da amostra.

 

A Hospital Anxiety and Depression Scale – HADS traduzida e adaptada para a população portuguesa por Pais-Ribeiro e colaboradores (2007), é um instrumento constituído por 14 itens divididos em 2 subescalas cotadas separadamente: uma relativa à ansiedade (itens impares) e outra para a depressão (itens pares). O intervalo de resultados possíveis varia entre 0 e 21 pontos para cada subescala. O estudo de adaptação portuguesa considerou como ponto de corte para a presença de ansiedade ou depressão um resultado igual ou superior a 11 pontos (Pais-Ribeiro et al., 2007). Ao nível das suas qualidades psicométricas, a versão portuguesa da HADS revelou-se um instrumento válido e consistente (valores de alpha de Cronbach de .76 e .81, respetivamente para a ansiedade e para a depressão) na avaliação das variáveis a que se propõe.

 

A Escala de Alexitimia de Toronto de 20 itens TAS 20 é escala mais utilizada mundialmente na avaliação do construto alexitimia (Torres et al., 2011). Trata-se de um instrumento já adaptado para a população portuguesa (Prazeres, Parker, & Taylor, 2000) composto por 20 itens. A cotação dos resultados obtém-se através do seu somatório, variando de 20 a 80. São considerados alexitímicos os indivíduos com resultados superiores ou iguais a 61 e não alexitímicos os sujeitos com resultados inferiores ou iguais a 51 (Prazeres et al., 2000) Os resultados compreendidos entre 52 e 60, inclusive, correspondem a uma zona fronteira. A versão utilizada possui ainda uma boa consistência interna (0.798) (Prazeres et al., 2000).

 

A Escala de Avaliação da Espiritualidade (Pinto & Ribeiro, 2007) contém 5 itens medidos numa escala de 4 pontos. A análise das propriedades psicométricas confirmou a existência de duas dimensões: crenças espirituais/religiosas (itens 1 e 2) e esperança/otimismo (itens 3, 4 e 5) que explicam 75,23% da variância total. A dimensão crenças integra os itens que traduzem a valorização das crenças espirituais/religiosas na atribuição de sentido à vida, enquanto a dimensão esperança/otimismo integra itens que correspondem a um sentido positivo da vida norteado pela perspetiva de um futuro com esperança e numa redefinição de valores de vida. O alpha de Cronbach conclui que a dimensão crenças espirituais/religiosas apresenta índices mais elevados e consistentes (.92) do que a dimensão esperança/otimismo (.69) (Pinto & Ribeiro, 2007). Estas dimensões determinam também o modo de cotação do instrumento, sendo que este procedimento é efetuado através da média dos itens de cada uma delas, pelo que quanto maior o valor obtido, maior a concordância com a dimensão avaliada (Pinto & Ribeiro, 2010).

 

A Escala de Assertividade de Rathus adaptada para a população portuguesa por Detry e Castro (1996), é um instrumento que tem como principal objetivo medir as mudanças que ocorrem no comportamento assertivo, baseado em 30 afirmações. Segundo o artigo original, os valores podem variar entre -90 e +90, sendo a média de referência da população portuguesa de -1.83 (DP=23.67) (Detry & Castro, 1996). Os estudos das qualidades psicométricas demonstraram que os resultados encontrados na amostra portuguesa são bastante comparáveis aos originais, revelando valores fiáveis e que justificam a sua utilidade.

 

O The European Organization for Research and Treatment of Cancer Quality of Life Questionnaire – EORTC QLQC-30 (v. 3.0) é um instrumento com 30 itens utilizado internacionalmente para avaliar a qualidade de vida relacionada com a saúde em pessoas com cancro (Aaronson et al., 1993). Trata-se de uma medida geral e por isso, existem também vários módulos específicos. É composto por uma medida da qualidade de vida global (itens 29 e 30), por 4 escalas funcionais (funcionamento físico, de papel/desempenho, emocional, cognitivo e social), por 3 escalas de sintomas (fadiga, náuseas/vómitos e dor), e por 6 itens de sintomas (dispneia, insónia, perda de apetite, obstipação, diarreia e dificuldades financeiras). Os resultados são transformados em valores de 0 a 100, obtidos através de algoritmos próprios. Em Portugal, as suas propriedades psicométricas foram estudadas por Ribeiro, Pinto e Santos (2008), sendo os valores de fidelidade apropriados, variando de .57 a .88., considerando o número reduzido de itens.

 

Procedimento

O projeto foi aprovado pela Comissão de Ética de um hospital do Grande Porto e a amostra foi constituída por todas as mulheres com cancro de mama que compareceram à consulta desde início do mês de Fevereiro até Maio de 2012 e que se predispuseram a participar no estudo. Os critérios de exclusão foram a apresentação de défices cognitivos e/ou motores que dificultassem o preenchimento dos questionários. As doentes foram abordadas na sala de espera da Clinica da Mama e convidadas ao preenchimento dos questionários num gabinete desta clinica, após lhes ter sido explicado o principal objetivo do estudo, salientando o caráter voluntário da participação e a confidencialidade.

O tratamento dos dados foi efetuado com o software Statistical Package for Social Sciences (SPSS), versão 19.0.

 

Resultados

A Tabela 1 apresenta a caracterização das variáveis alexitimía, espiritualidade, assertividade, ansiedade e depressão na amostra de mulheres com cancro de mama.

 

 

Ao analisar os resultados obtidos, verifica-se que a prevalência da alexitimia no nosso estudo é de 47.1%, tendo em conta os valores de corte estabelecidos por Taylor e colaboradores (1997, como citado em Torres et al., 2011). Considerando o valor encontrado no estudo de Prazeres e colaboradores (2000) da adaptação da TAS-20 à população portuguesa (M=36.7), e depois de realizado o teste t de Student, confirma-se que as mulheres com cancro de mama da nossa amostra revelam níveis de alexitimia significativamente superiores (M=58.7) aos da população normativa [t(84)=14,04, p<.01].

Em relação à espiritualidade, na dimensão crenças espirituais/religiosas as participantes apresentam um valor médio de 3.26 e na dimensão esperança/otimismo de 2.84. Trata-se de valores elevados, tendo em conta os valores mínimo 1 e máximo 4 da Escala de Avaliação da Espiritualidade (Pinto & Ribeiro, 2007). O teste t de Student para amostras emparelhadas, revela que o valor médio da dimensão crenças espirituais/religiosas é significativamente superior ao valor médio da dimensão esperança/otimismo [t(84)=3.77, p<.001].

Relativamente à assertividade, as participantes apresentam uma média de -3.53, valor que, quando comparado com a população normativa do estudo de Detry e Castro (1996), revela que não existem diferenças estatisticamente significativas [t(84)=-.54, p=.59, ns].

Para avaliar a comorbilidade psicológica das mulheres com cancro de mama da nossa amostra, foram analisados os níveis de ansiedade e de depressão, medidos pela HADS. No que diz respeito à ansiedade, e considerando o ponto de corte de 11 como indicador de perturbação significativa, podemos verificar que 28.2% das mulheres da nossa amostra apresenta níveis clinicamente significativos de ansiedade. Relativamente à depressão, constatámos que apenas uma minoria das mulheres evidencia níveis clinicamente significativos de depressão (9.4%).

Por fim, a média da qualidade de vida global das nossas participantes é de 60.69. Tendo em conta que os valores padronizados do QLQC-30 variam entre 0 e 100, conclui-se que as mulheres da nossa amostra têm uma perceção moderada da sua qualidade de vida global.

As análises correlacionais referem-se às associações das variáveis psicológicas em estudo entre si (alexitimia, espiritualidade, assertividade, ansiedade e depressão) e também, à associação dessas variáveis com a perceção da qualidade de vida global das participantes. A Tabela 2 apresenta os valores correlacionais obtidos.

 

 

Com o objetivo de construir um modelo preditor da qualidade de vida utilizando as variáveis psicológicas em estudo, realizou-se uma regressão múltipla hierárquica apresentando-se na Tabela 3 o sumário de alguns valores obtidos. Não foram integradas correlações nem inferiores a .30, nem superiores a .70 (Pallant, 2001), pelo que foram incluídas apenas as variáveis alexitimia, esperança/otimismo, ansiedade e depressão.

 

 

O modelo 1 com as variáveis ansiedade e depressão explica 26% da variância da qualidade de vida (r2=.262). Depois de inseridas também as variáveis alexitimia e esperança/otimismo , o modelo 2 com todas as variáveis passa a explicar 43% da variância total (r2=.434). Destes 43% de variância total da qualidade de vida, 17,2% são atribuídos às variáveis alexitimia e esperança/otimismo, depois de controladas as variáveis ansiedade e depressão ou seja depois dos efeitos das variáveis ansiedade e depressão terem sido removidos (r2 “mudança”=.172). Estas variáveis explicam uma variância adicional na qualidade de vida de 17,2%. Esta contribuição é estatisticamente significativa como indicado pela significância do valor de F [F(2,80)=12.11, p<.001]. O modelo 2 como um todo, incluindo os dois blocos de variáveis, é significativo, como se pode concluir depois de realizada a ANOVA [F(4, 80)=15.32, p<.001].

Na Tabela 4 apresenta-se a contribuição de cada variável para a equação do modelo.

 

 

Como se pode ver na Tabela 4, apenas a alexitimia e a dimensão esperança/otimismo da espiritualidade apresentam uma contribuição estatisticamente significativa. Por ordem de importância, a esperança/otimismo apresenta um valor superior (β=.38, p=.001) ao da alexitimia (β=-.33, p=.002). Nem a depressão nem a ansiedade apresentam uma contribuição única, quando os feitos de sobreposição de todas as variáveis são estatisticamente removidos.

 

Discussão

Após uma revisão da literatura sobre o impacto psicossocial do cancro de mama, selecionamos algumas variáveis psicológicas como potenciais fatores de risco (alexitimia, ansiedade e depressão) ou de proteção (espiritualidade e assertividade) na qualidade de vida das mulheres com esta patologia. Começando pela caracterização dessas variáveis, os resultados encontrados comprovam a existência de um elevado número de mulheres alexitimicas na nossa amostra (47.1%), sendo essa percentagem mais do que o dobro da existente na população normativa que se situará entre os 10 e os 20% (Fernandes & Tomé, 2001; Guerra et al., 2007). Tal resultado poderá sugerir que uma grande percentagem das nossas participantes tem dificuldades no coping com tarefas emocionais exigidas ao longo do processo de adaptação à doença oncológica.

Relativamente à espiritualidade, os resultados sugerem as nossas participantes recorrem com frequência a estratégias de coping com base nas crenças espirituais/religiosas. A isso não serão alheios fatores de ordem cultural, onde a dimensão religiosa/espiritual é em geral mais relevante nas mulheres, pelo que se pode inferir que utilizam mais frequentemente esses recursos (Pinto & Ribeiro, 2010). Na realidade, esta pode ser uma reação esperada nos doentes oncológicos, dado que se trata de uma doença que muitas vezes apresenta um prognóstico incontrolável e incerto, funcionando o recurso à religião e à procura do divino como uma forma de apoio e de conforto (Gall et al., 2009).

No que concerne à assertividade as participantes deste estudo apresentam valores normativos, não parecendo menos assertivas do que uma população saudável.

A comorbilidade psicológica aparece na amostra com 28.2% das participantes com sintomatologia ansiosa e 9.4% com sintomatologia depressiva, o que corrobora a ideia de que se tratam de reações comuns ao cancro de mama (Andersen & Golden-Kreutz, 1997). Nos nossos resultados, está também presente a ideia de que a sintomatologia depressiva parece ser mais baixa do que a sintomatologia ansiosa, estando em concordância com outros estudos (Silva et al., 2010; Vahdaninia, Omidvari, & Montarezi, 2010), salientando que a resposta ansiosa parece ser a reação negativa mais comum perante um evento stressante como o cancro de mama.

Na análise da qualidade de vida, verifica-se que as participantes têm uma perceção moderadamente positiva da sua qualidade de vida global (60.69 numa escala de 100 pontos). Resultados semelhantes são encontrados nos dois únicos estudos portugueses que também utilizam o QLQC-30 como instrumento de mediação desta variável (Rebelo, Rolim, Carqueja, & Ferreira, 2007; Ribeiro et al., 2008). Tal parece sugerir que a doença oncológica pode afetar menos a qualidade de vida do que aquilo que geralmente se pensa (Lopes et al., 1999; Sprangers et al., 2002, como citado em Pinto & Ribeiro, 2006) e que apesar do cancro de mama ser um acontecimento de vida potencialmente traumático, as doentes tendem a revelar padrões de funcionamento normais, o que pode ser um importante indicador da sua capacidade de resiliência (Knobf, 2007).

Ao analisar a relação das variáveis psicológicas em estudo com a qualidade de vida global, os resultados parecem indicar a existência de alexitimia nas mulheres com cancro de mama da nossa amostra, o que poderá prejudicar a adaptação à doença, uma vez que a alexitimia está associada a maiores níveis de ansiedade e de depressão, menor esperança/otimismo, menor assertividade e uma menor qualidade de vida. Estes resultados estão em concordância com a literatura que sustenta que a alexitimia apresenta tendencialmente uma associação negativa com assertividade (Bekker, Croon, vanBalkom, & Vermee, 2008). A alexitimia parece vir aliada a uma expressividade emocional negativa e de evitamento, aspetos prejudiciais na adaptação à doença (Iwamitsu et al., 2003). Por outro lado, compromete a boa expressão de emoções que parece estar associada a um maior bem-estar psicossocial e a uma melhor qualidade de vida (Mantani et al., 2007).

Analisando a correlação da espiritualidade com as outras variáveis em estudo, verificamos que a dimensão da esperança/otimismo apresenta algumas correlações a valorizar. Conclui-se que a esperança e o otimismo parecem ser benéficos para as mulheres da nossa amostra, pois as participantes que mais utilizam esta estratégia apresentam menores níveis de ansiedade, depressão, alexitimia e melhor perceção da sua qualidade de vida global.

A assertividade parece ter efeitos positivos, pois quanto mais assertivas são as mulheres da nossa amostra, menos alexitimicas, ansiosas e deprimidas parecem ser. O comportamento interpessoal assertivo parece apresentar um self seguro, coerente, enquanto comportamentos interpessoais de não-assertividade, estão associados a sentimentos de desconforto e de tensão (Hinnen et al., 2008). Um resultado surpreendente foi a não correlação da assertividade com a qualidade de vida global, resultado este que eventualmente poderá ser atribuído a algumas fragilidades do instrumento utilizado para medir a assertividade.

Relativamente à ansiedade e à depressão, além das correlações já referidas, verifica-se que quanto mais ansiosas e deprimidas as nossas participantes, pior parece ser a avaliação que fazem da sua qualidade de vida global. Estes resultados salientam o papel prejudicial da comorbilidade psicológica na qualidade de vida das mulheres com cancro de mama e corroboram a importância de uma avaliação precoce desta sintomatologia na prática clínica, com o intuito de orientar os objetivos terapêuticos para a procura de estratégias de gestão da ansiedade e de combate ao humor deprimido.

Tendo em conta a análise destas correlações e os valores obtidos nas regressões múltiplas reportados na secção dos resultados avançamos para um modelo preditor da qualidade de vida que atribui à alexitimia e à dimensão esperança/otimismo um papel saliente na qualidade de vida das mulheres com cancro de mama que participaram neste estudo. Tal parece sugerir que o coping focado na esperança e no otimismo assume um poder protetor contra as repercussões do cancro de mama na qualidade de vida das nossas participantes, talvez por se traduzir em estratégias como a aceitação realista da doença, a procura ativa de meios para lidar com a mesma, o foco em aspetos positivos e a tentativa de encarar a situação como uma opção de desenvolvimento pessoal (Silva et al., 2011; Veit & Castro, 2013). Por outro lado, a alexitimia e o coping de evitamento e de negação das emoções associadas ao cancro de mama pode ser um importante fator negativo que parece sugerir que as situações de repressão/supressão emocional não anulam o sofrimento, nem o tornam mais suportável (Oliveira, Castro, Almeida, & Moutinho, 2013), mas que podem dificultar a adaptação das participantes à doença oncológica.

Estes resultados parecem mostrar que a comorbilidade psicológica, por si só, não é suficiente para explicar a adaptação à doença, sendo necessário ter em conta a influência de outras variáveis como a alexitimia e o contributo de variáveis positivas como a esperança/otimismo enquanto fatores de risco/proteção na qualidade de vida destas mulheres como se verificou no modelo preditor encontrado.

 

Conclusão

Os resultados encontrados neste estudo mostram que estas mulheres parecem ser mais alexitímicas do que a população normativa e que uma das estratégias de coping adaptativas a que recorrem é a esperança/otimismo. Não parece existir uma sintomatologia depressiva acentuada, sendo a sintomatologia ansiosa a mais evidente. Além disso, a avaliação que estas mulheres apresentam em relação à sua qualidade de vida parece ser positiva.

O principal objetivo do estudo relaciona-se com a obtenção de um modelo preditor da qualidade de vida tentando identificar fatores protetores ou debilitantes. As variáveis que o modelo aponta com maior peso na explicação da qualidade de vida são a alexitimia e a dimensão esperança/otimismo da espiritualidade. Em relação à alexitimia, este estudo parece reforçar a sua importância nas doenças físicas, sendo necessária a exploração da sua relação com as diferentes fases da doença oncológica. O papel atribuído à dimensão crenças espirituais/religiosas e à assertividade enquanto variáveis protetoras não se evidencia neste estudo, sugerindo-se a realização de mais estudos noutras patologias, amostras e com outros instrumentos. Quanto à espiritualidade, destaca-se a dimensão esperança/otimismo quando comparada com a dimensão crenças espirituais/religiosas. Tal poderá sugerir que, para as mulheres da nossa amostra, a esperança/otimismo é uma estratégia de coping adaptativa e protetora da sua qualidade de vida, mesmo perante todos os desafios que a doença implica para o seu funcionamento global.

De um modo geral, apesar do cancro de mama ser encarado como um evento potencialmente traumático, com todas as repercussões físicas, sociais, pessoais e laborais que implica para a mulher e para a sua família, prevalece nas mulheres deste estudo uma perceção positiva da qualidade de vida global. Tal resultado poderá apontar para uma elevada capacidade de resiliência destas mulheres e também de desenvolvimento de estratégias que facilitam a adaptação à doença, como é o caso da esperança/otimismo.

Refletindo agora sobre potenciais limitações deste estudo, em primeiro lugar, poderíamos falar na natureza correlacional de algumas análises realizadas que poderiam limitar a atribuição de eventual causalidade. No entanto, e com o objetivo de ultrapassar essa limitação e aprofundar a relação das variáveis para avançar para fatores preditores da qualidade de vida, recorreu-se a análises de regressões múltiplas hierárquicas que, ao controlar variáveis, permitem avançar para a predição. Uma limitação poderá estar relacionada com os instrumentos utilizados. Ainda que todos revelassem boas qualidades psicométricas demonstrativas da sua validade, não podemos deixar de tecer algumas críticas a alguns aspetos que dificultaram a sua aplicação, cotação e interpretação dos resultados, em especial no que se refere à Escala da Assertividade de Rathus (Detry & Castro, 1996; Rathus, 1973). Verificamos algumas dificuldades no preenchimento por parte das doentes, considerando difícil a perceção de algumas das situações hipotéticas apresentadas, bem como a sua difícil aplicabilidade ao quotidiano da maioria das participantes (e.g., Item 18 “Se um conferencista famoso e conceituado diz qualquer coisa que eu acho inexato, gostaria que o público ouvisse, também, o meu ponto de vista.”).

Com base nos resultados obtidos retiram-se algumas conclusões integrativas que se traduzem em implicações para a prática psicológica com doentes oncológicos, salientando a importância do treino de estratégias de coping positivas como a esperança/otimismo. O treino desta dimensão da espiritualidade enquanto estratégia de coping pode associar-se a práticas como o mindfullness, modalidade que tem vindo a demonstrar os seus efeitos positivos na qualidade de vida, humor, sono, fadiga, dor e medo de recidiva dos doentes oncológicos (Shennan, Payne, & Fenlon, 2011). Quanto à alexitimia, as intervenções deverão ir no sentido da promoção de uma maior consciência emocional e reconhecimento das sensações corporais (Torres, 2005), uma vez que os estudos tendem a mostrar uma associação negativa entre esta variável e diferentes dimensões da qualidade de vida (perceção da dor, fadiga) (Taylor, Parker, Bagby, & Acklin, 1992). Sugerem-se auto-monitorizações dos sintomas e a nomeação de emoções associados a esse mal-estar, em paralelo com a discussão das cognições associadas. Devem ser incentivadas intervenções que explorem uma melhor aceitação das emoções, recorrendo a reflexões de sentimentos pela verbalização gradual (Torres, 2005).

Concluindo, as intervenções psicossociais deveriam promover a identificação de formas habituais de coping com a doença, focando o ensino e reforço de estratégias ativas. Por outro lado, chama-se a atenção dos profissionais de saúde para as mulheres que recorrem a um coping de evitamento, uma vez que este poderá funcionar como um fator de risco na qualidade de vida destas mulheres, a quem devem ser ensinadas formas mais adaptativas de lidar coma a doença (Silva et al., 2011).

Por último e para terminar, e apesar das limitações deste estudo, pensa-se que, ao reforçar o papel das variáveis positivas no enfrentar da doença, dando desta forma ênfase a uma perspetiva alternativa à tradicional nálise do processo de ajustamento à doença que se debruça apenas sobre a ausência de variáveis negativas (e.g., depressão, ansiedade), este estudo pode constituir uma mais-valia para a compreensão mais alargada do impacto psicossocial desta doença, que apesar de todos os avanços na medicina, continua a ser uma das mais temidas pela sociedade.

 

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CORRESPONDÊNCIA

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Helena Sousa, FPCE, Universidade do Porto, Rua Alfredo Allen, 4200-135 Porto. E-mail: helena.mendonca.sousa@gmail.com

 

Submissão: 07/04/2014 Aceitação: 02/11/2014

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