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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica vol.32 no.1 Lisboa mar. 2014

https://doi.org/10.14417/ap.740 

Comportamentos extra-diádicos nas relações de namoro: Diferenças de sexo na prevalência e correlatos

Alexandra Martins*, Marco Pereira*, Maria Cristina Canavarro*

* Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra

Correspondência

 

RESUMO

O presente estudo teve como objetivo avaliar as diferenças de sexo nas taxas de prevalência e nos correlatos dos comportamentos extra-diádicos (CED) offline e online, durante o namoro. A amostra foi constituída por 494 participantes (156 homens e 338 mulheres) com uma idade média de 23.38 anos (DP=3.41). O protocolo de avaliação incluíu os seguintes instrumentos de auto-resposta: Inventário de Comportamentos Extra-Diádicos e Medida Global da Satisfação Relacional e Medida Global da Satisfação Sexual. Cerca de 63.5% dos homens e 56.5% das mulheres reportou já se ter envolvido em CED offline e 46.2% dos homens e 39.3% das mulheres já se envolveu em CED online, sendo que esta diferença não foi significativa. Para ambos os sexos, já ter sido infiel a um parceiro e menor satisfação relacional foram preditores importantes do envolvimento em CED offline e online. Para os homens, pertencer à religião Católica e história prévia de infidelidade do pai foram preditores significativos dos CED online. Entre as mulheres, o número de parceiros sexuais nos últimos dois anos associou-se significativamente ao envolvimento extra-diádico offline. Embora homens e mulheres cada vez se aproximem mais no que respeita às taxas de prevalência, os correlatos do envolvimento em CED diferem em função do sexo. Sugestões para investigação futura são apresentadas à luz destes resultados.

Palavras-chave: Comportamentos extra-diádicos, Diferenças de sexo, Prevalência, Relação de namoro.

 

ABSTRACT

The purpose of the present study was to assess sex differences in prevalence rates and in correlates of offline and online extra-dyadic behaviors (EDB) during dating. The sample consisted of 494 participants (156 men and 338 women) with a mean age of 23.38 years (SD=3.41). The assessment protocol included the following self-report instruments: Extradyadic Behaviors Inventory and Global Measure of Relationship Satisfaction and Global Measure of Sexual Satisfaction. About 63.5% of men and 56.5% of women reported having already been involved in offline EDB and 46.2% of men and 39.3% of women have already been engaged in online EDB, and this difference was not statistically significant. For both sexs, having been unfaithful to a partner and lower relational satisfaction were important predictors of involvement in offline and online EDB. Among men, belonging to the Catholic religion and prior history of the father’s infidelity were significant predictors of the EDB. Among women, the number of sexual partners in the last two years was significantly related with offline EDB. Although men and women are converging in terms of the rates of prevalence, the correlates of engagement in EDB differ according to sex. Suggestions for future research are presented in view of these findings.

Key-words: Extra-dyadic behaviours, Sex differences, Prevalence, Dating relationships.

 

INTRODUÇÃO

Numa relação amorosa, alguns comportamentos, como por exemplo as relações sexuais, são considerados aceitáveis apenas para as duas pessoas envolvidas nessa relação (Luo, Cartun, & Snider, 2010). Os indivíduos envolvidos numa relação amorosa possuem, em geral, uma compreensão implícita do grau em que o seu envolvimento em determinados comportamentos interpessoais é esperado como sendo exclusivo ao parceiro (Wiederman & Hurd, 1999). Assim, “quando um indivíduo se envolve em tais comportamentos exclusivos com alguém fora da relação primária, esses comportamentos são denominados de ‘comportamentos extra-diádicos’” (CED; Luo et al., 2010, p. 155).

Nesta área, a investigação tem-se focado essencialmente nos CED dos indivíduos casados ou a cohabitar. A literatura sobre os CED durante o namoro é mais limitada, sobretudo devido às dificuldades em definir relação de namoro (Hansen, 1987; McAnulty & Brineman, 2007). Para McAnulty e Brineman, estas relações normalmente não possuem um compromisso formal para a exclusividade sexual e emocional, que caracteriza o casamento, portanto a violação desta exclusividade pode ser mais difícil de definir. Embora a investigação no âmbito das relações de namoro seja relativamente recente, é durante este período que as pessoas podem, pela primeira vez, violar as expectativas de exclusividade. Nesta linha, os CED observados durante o namoro podem ter implicações subsequentes nas expectativas sobre o casamento e no comportamento (Wiederman & Hurd, 1999).

Em estudos prévios, enquanto durante o casamento a prevalência dos CED, nos homens, variou entre os 21% e os 52% e, nas mulheres, entre os 12% e os 29% (Kontula & Haavio-Mannila, 1995; Lewin, 2000; Træen & Stigum, 1998; Wiederman, 1997a), durante o namoro a prevalência destes comportamentos parece ser mais elevada (Luo et al., 2010; Wierderman, 1997a; Wiederman & Hurd, 1999), tendo alguns estudos encontrado uma prevalência superior a 70% (Allen & Baucom, 2006; Yarab, Sensibaugh, & Allgeier, 1998). Estes valores elevados têm sido, sobretudo, associados aos níveis mais baixos de compromisso que caraterizam as relações de namoro, comparativamente às relações conjugais (Edin, Kefalas, & Reed, 2004).

Algumas limitações da investigação nesta área justificam o presente estudo. Primeiro, a maioria dos estudos não apresenta uma definição operacional clara dos CED (Luo et al., 2010), usando terminologia vaga como “comportamento romântico ou sexual” (Allen & Baucom, 2006, p. 309). Segundo, existe um maior foco nos comportamentos sexuais (e.g., Atkins, Baucom, & Jacobson, 2001; Mark, Janssen, & Milhausen, 2011), apesar da relevância em se considerar um espectro mais amplo de comportamentos, tanto sexuais como emocionais (e.g., Roscoe, Cavanaugh, & Kennedy, 1988; Whitty, 2003; Wiederman & Hurd, 1999; Yarab et al., 1998). Terceiro, poucos estudos têm analisado o envolvimento extra-diádico online (Merkle & Richardson, 2000; Whitty, 2003), apesar do número de relações românticas online estar a aumentar e os indivíduos descreverem, frequentemente, estas relações como íntimas e tão “autênticas” como qualquer relação presencial (Merkle & Richardson). Por último, a investigação baseia-se, maioritariamente, em indivíduos casados, sobretudo atendendo às potenciais consequências da infidelidade, em particular o divórcio (Amato & Rogers, 1997; Betzig, 1989).

Dado o potencial impacto negativo que os CED podem ter na estabilidade de uma relação (e.g., término da relação; Harris, 2002) e no bem-estar individual (e.g., confiança pessoal e sexual diminuída; Charny & Parnass, 1995), vários estudos têm tentado perceber quais os fatores que colocam os indivíduos em risco de CED. Globalmente, os fatores mais estudados centram-se em variáveis sociodemográficas, intrapessoais e interpessoais.

Variáveis sociodemográficas

O sexo é a variável mais estudada no contexto da infidelidade, quer relativamente à definição, quer à incidência e prevalência destes comportamentos (Mark et al., 2011). No contexto das relações de namoro, têm sido reportadas taxas de prevalência mais elevadas para os homens do que para as mulheres (e.g., Allen & Baucom, 2004; Hansen, 1987; Wiederman & Hurd, 1999). Porém, estas taxas parecem declinar à medida que o contacto se torna mais íntimo fisicamente (McAnulty & Brineman, 2007). Também na modalidade online, as diferenças de sexo parecem assumir especial relevância. Vários estudos sugerem que o sexo masculino é o que mais tende a envolver-se em relações românticas mediadas pelo computador (e.g., Cooper, Delmonico, & Burg, 2000;Wysocki, 1998). As diferenças de sexo parecem, no entanto, ser atenuadas quando a infidelidade é definida como abrangendo uma maior diversidade de comportamentos, em vez de apenas a relação sexual (Brand, Markey, Mills, & Hodges, 2007). Numa revisão da literatura, Allen et al. (2005) mostraram que as diferenças de sexo estão a diminuir nas coortes sucessivamente mais jovens, ou seja, o “intervalo” entre os homens e mulheres, no que concerne à taxa de infidelidade, tem estreitado (e.g., Wiederman, 1997a).

A existência de dois tipos de infidelidade é um aspeto consensual: a sexual (i.e., envolvimento numa relação sexual com outra pessoa para além do parceiro) e a emocional (i.e., apaixonar-se por outra pessoa que não o parceiro primário; Miller & Maner, 2008). Também neste âmbito, se encontram evidências sobre as diferenças de sexo, sugerindo-se que os homens, mais provavelmente que as mulheres, têm casos apenas sexuais e as mulheres, mais que os homens, apenas emocionais (Glass & Wright, 1985).

Outra variável relevante diz respeito à religiosidade (Allen et al., 2005; Atkins et al., 2001; Mattingly, Wilson, Clark, Bequette, & Weidler, 2010; Treas & Giesen, 2000). A infidelidade tem sido, de forma consistente, mais reportada por indivíduos que não têm afiliação religiosa comparativamente aos que têm (Burdette, Ellison, Sherkat, & Gore, 2007; Forste & Tanfer, 1996), ainda que outros tenham reportado resultados contraditórios. Por exemplo, Hansen (1987) mostrou que a religiosidade (definida como a importância da religião para o indivíduo e a frequência de idas à igreja) não se encontrava correlacionada com a infidelidade para os homens, mas encontrava-se negativamente associada para as mulheres. Por sua vez, Liu (2000) referiu que tal correlação existe apenas para os homens, mas não para as mulheres. Já nos estudos de Mark et al. (2011) e de Wiederman e Hurd (1999), a religiosidade não se associou ao envolvimento extra-diádico.

Também a educação tem recebido atenção na literatura sobre os CED. Embora um nível de educação elevado se encontre associado a atitudes mais liberais em relação à sexualidade e a atitudes de aceitação face à infidelidade (Forste & Tanfer, 1996), a relação entre a educação e a infidelidade real é menos clara (Allen et al., 2005). Enquanto alguns estudos encontraram maior probabilidade de infidelidade entre os indivíduos com educação superior (e.g., Atkins et al., 2001; Buunk, 1980), outros encontraram resultados contrários (e.g., Choi, Catania, & Dolcini, 1994) ou nenhuma associação significativa (e.g., Træen, Holmen, & Stigum, 2007).

História relacional: Experiências anteriores e duração da relação

Em relação à história relacional prévia, McAlister, Pachana e Jackson (2005) verificaram que os participantes numa relação de namoro exclusiva que tinham experienciado intimidade sexual com um maior número de parceiros sexuais, também reportaram uma maior inclinação extra-diádica para ter sexo e beijar. Em outros estudos (Træen et al., 2007; Treas & Giesen, 2000), um maior número de parceiros sexuais prévio mostrou-se um preditor significativo da ocorrência de relações sexuais extra-diádicas. Para alguns indivíduos, o número de parceiros sexuais pode estar associado à idade de início da atividade sexual. Por exemplo, para Grello, Welsh e Harper (2006) aqueles que têm a primeira relação sexual mais precocemente envolvem-se com maior facilidade em relações sexuais com parceiros casuais. Porém, no estudo de McAlister et al., a idade do primeiro encontro sexual não se correlacionou com o envolvimento extra-diádico.

A investigação no contexto das relações de namoro não tem avaliado especificamente a duração da relação como preditor dos CED (McAlister et al., 2005). Um estudo de Hicks e Leitenberg (2001) revelou que as fantasias sobre o envolvimento sexual extra-diádico se associaram positivamente à duração da relação. Este resultado está na linha do documentado em estudos com indivíduos casados ou a coabitar, cujas relações mais longas se associaram com uma maior probabilidade de infidelidade (Træen et al., 2007; Træen & Stigum, 1998). No contexto do namoro, do nosso conhecimento, apenas o estudo de McAlister et al. estudou esta variável, porém, esta não se revelou um preditor significativo da inclinação extra-diádica nem para beijar nem para ter sexo. Na análise por sexo, entre as mulheres, as relações primárias mais longas parecem ter uma maior associação à infidelidade do que as relações mais curtas, observando-se este resultado para as mulheres casadas, a coabitar e a namorar (Forste & Tanfer, 1996). Hansen (1987) não encontrou esta associação entre as mulheres a namorar. Por sua vez, para os homens a namorar, quanto mais longo o tempo de namoro, maior a probabilidade de se envolverem em atividades sexuais com outra pessoa.

Também a história relacional dos pais tem sido alvo de atenção, havendo evidência de um risco aumentado de envolvimento extra-diádico para os indivíduos cujos pais se envolveram em infidelidade (Amato & Rogers, 1997; Platt, Nalbone, Casanova, & Wetchler, 2008). Num estudo recente (Havlicek, Husarova, Rezacova, & Klapilova, 2011), os autores verificaram que entre os homens, a existência de história prévia de infidelidade do pai se associou a maior infidelidade e intenções neste sentido, ao passo que entre as mulheres não se observou qualquer associação com significação estatística.

Em relação à história prévia de infidelidade, ainda que poucos estudos se tenham debruçado sobre esta variável, tem sido referido que os indivíduos com comportamentos prévios de infidelidade aprovam mais facilmente as relações extra-diádicas do que aqueles que não os tiveram (Thompson, 1984; Wiederman, 1997a). O estudo de Banfield e McCabe (2001) mostrou que o envolvimento extra-diádico passado foi um forte preditor do envolvimento extra-diádico futuro. Wiederman e Hurd (1999) também encontraram que os participantes que se tinham envolvido em CED sexuais uma vez tinham maior probabilidade de se envolver novamente.

Variáveis interpessoais

Entre as variáveis interpessoais, a satisfação relacional e a satisfação sexual têm recebido especial atenção no contexto dos CED (Havlicek et al., 2011). Em diversos estudos, uma reduzida satisfação relacional e sexual com o parceiro primário mostrou-se associada a maior motivação para o envolvimento em CED (Banfield & McCabe, 2001; Buss & Schackelford, 1997; Træen & Stigum, 1998; Treas & Giesen, 2000). A baixa satisfação com a relação, para além de ser um dos motivos mais citados para a ocorrência de CED (Roscoe et al., 1988), tem também sido consistentemente apontada como preditora do envolvimento extra-diádico (McAlister et al., 2005). Considerando o sexo dos participantes, tem sido referido que enquanto a associação entre os CED e a satisfação relacional parece ser particularmente importante para as mulheres (Glass & Wright, 1985), a insatisfação sexual parece estar mais relacionada com os CED nos homens (Liu, 2000; Mark et al., 2011).

O presente estudo

Face ao exposto, este estudo tem como principal objetivo avaliar a prevalência dos CED e possíveis correlatos (sociodemográficos, relativos à história relacional e interpessoais) do envolvimento extra-diádico durante a relação de namoro, nas modalidades offline (i.e., CED presenciais) e online (i.e., CED mediados pelo computador), averiguando ainda as diferenças de sexo, quer na ocorrência destes comportamentos quer nos seus correlatos.

MÉTODO

Participantes

A amostra final do presente estudo foi composta por 494 participantes. Em termos de critérios de inclusão, definiu-se que os participantes tinham de ter a idade mínima de 18 anos, ser heterossexuais e estar numa relação de namoro exclusiva há pelo menos três meses. No total, responderam 1158 participantes ao protocolo de avaliação. Foram excluídos das análises 205 participantes que referiram não namorar, cinco participantes com idade inferior a 18 anos, seis participantes que reportaram outra orientação sexual, 82 participantes que reportaram ter uma relação aberta e 366 participantes que não preencheram completamente a bateria de avaliação.

A amostra foi composta por 156 homens e 338 mulheres com uma idade média de 23.38 anos (DP=3.41; amplitude: 18-43 anos). A maioria dos participantes frequentava o ensino superior e residia no meio urbano. No momento da participação no estudo, os homens namoravam, em média, há cerca de 31 meses e as mulheres há cerca de 37 meses. O Quadro 1 sumaria as características sociodemográficas da amostra.

 

 

A análise comparativa das variáveis demográficas revelou que os homens e as mulheres se distinguiam significativamente em termos de habilitações literárias, no tempo de namoro, na prática religiosa, bem como na importância da religião na vida e na tomada de decisões. Concretamente, os homens apresentavam menores habilitações, namoravam há menos tempo, referiram não ser praticantes da sua religião, bem como reportavam menor importância da religião na vida e na tomada de decisões. Não foram encontradas diferenças significativas entre os homens e as mulheres em termos de idade, da residência e da religião.

Instrumentos

No presente estudo foi utilizado uma bateria de avaliação constituída por uma ficha de dados sociodemográficos e de questões relativas à história sexual, relacional e familiar, e pelos dois instrumentos de auto-resposta que descrevemos em seguida.

Inventário de Comportamentos Extra-Diádicos (ICED), no original Extradyadic Behaviors Inventory (Luo, Cartun, & Snider, 2010). O ICED consiste num inventário de auto-resposta, que inclui 23 itens para avaliar os CED na modalidade presencial ou cara-a-cara (offline) e 13 itens para avaliar os CED mediados pelo computador (online). Os sujeitos devem reportar a frequência com que se envolveram em cada um dos comportamentos descritos, com alguém do sexo oposto, durante a sua relação atual. Neste questionário foi adotada a escala de cinco pontos de Wiederman e Hurd (1999): 1 – Não tive este comportamento porque não quis; 2 – Não tive este comportamento porque não houve oportunidade; 3 – Tive este comportamento apenas uma vez; 4 – Tive este comportamento mais do que uma vez com a mesma pessoa; e 5 – Tive este comportamento com diferentes pessoas. Os estudos da versão Portuguesa encontram-se em curso.

Medida Global da Satisfação Relacional e Sexual (Lawrance & Byers, 1998). Na Medida Global da Satisfação Relacional (MGSR) é solicitado aos participantes para classificarem o seu relacionamento respondendo à questão: “Em geral, como descreveria a sua satisfação global com o(a) seu(sua) companheiro(a)?”. Os indivíduos avaliam o seu relacionamento através de cinco escalas bipolares de sete pontos, com 1 indicando insatisfação e 7 indicando satisfação. Na Medida Global de Satisfação Sexual (MGSS), os participantes são solicitados a responder à questão “Na globalidade, como descreveria a sua relação sexual com o(a) seu(sua) companheiro(a)?”, devendo classificar o seu relacionamento, também de acordo com a escala acima mencionada. No presente estudo, o valor do alfa de Cronbach da MGRS foi de .92 para os sexos masculino e feminino. A consistência interna da MGSS foi de .91 para o sexo masculino e de .94 para o sexo feminino.

Procedimentos

Os participantes desta investigação foram recrutados através de dois métodos: em contexto comunitário (n=174) e através de um questionário online (n=320). Relativamente ao primeiro método, procedeu-se a um contacto com os indivíduos em diferentes espaços exteriores das faculdades da Universidade de Coimbra (UC). A confidencialidade dos dados e garantia do anonimato das respostas aos questionários encontrava-se descrita no consentimento informado e foi também reforçada verbalmente pelo investigador. A todos os participantes foi entregue um envelope, no qual deveriam colocar os questionários após preenchimento e depois selar. Foi, igualmente, explicado aos participantes que não necessitavam de preencher o questionário online, uma vez respondido em suporte papel.

Simultaneamente, procedeu-se à recolha de dados através de um questionário online, alojado no site da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da UC. Foi ainda criada uma página na rede social Facebook relativa a este estudo, onde se encontravam explicados os objetivos do estudo, os critérios de inclusão, assim como o papel dos participantes e dos investigadores. Na mesma página era divulgado o link que direcionava para o endereço onde constava o protocolo de avaliação.

Análises estatísticas

O tratamento estatístico dos dados foi realizado com software IBM SPSS v. 20.0. Recorremos ao teste do Qui-Quadrado para comparação de dados categoriais e ao teste t de Student para comparação, por sexo, nas variáveis de natureza contínua. Para a associação das variáveis contínuas recorremos aos coeficientes de correlação de Pearson. Por fim, e separadamente para o sexo masculino e feminino, recorremos à análise da Regressão Linear Múltipla (método enter) para identificar que variáveis em estudo se associavam aos CED. Nesta análise no primeiro passo incluíram-se as variáveis sociodemográficas e relativas à história relacional e sexual dos participantes com um valor de p<.20 nas análises univariadas; no segundo passo incluíram-se os resultados das medidas globais de satisfação relacional e sexual. A magnitude dos efeitos foi analisada através do d de Cohen (variáveis contínuas) e o V de Cramer (variáveis categoriais), adotando as convenções seguintes: efeito pequeno: d de Cohen=.20, V de Cramer=.01; efeito médio: d de Cohen=.50, V de Cramer=.03; efeito grande: d de Cohen=.80, V de Cramer=.05 (Cohen, 1992).

RESULTADOS

Caracterização da história sexual e relacional

No Quadro 2 encontram-se os dados relativos à história sexual e relacional. Foi possível observar a existência de diferenças entre os sexos no que respeita ao número de namoros ao longo da vida, número de namoros nos últimos dois anos e número de parceiros sexuais nos últimos dois anos. Enquanto a maioria dos homens teve três ou mais namoros ao longo da vida (44.3%), a maioria das mulheres teve entre um e dois namoros (55%). Em relação ao número de parceiros sexuais nos últimos dois anos, a maioria dos homens (62.2%) e das mulheres (68%) não tiveram nenhum parceiro sexual, porém, mais homens do que mulheres tiveram quatro ou mais parceiros sexuais nos últimos dois anos. Em relação à idade de início da vida sexual nãos e observaram diferenças significativas entre homens e mulheres.

 

 

Relativamente à história prévia de infidelidade por parte do parceiro, observaram-se diferenças entre homens e mulheres. A maioria dos homens (69.5%) e mulheres (60.1%) afirmaram que o parceiro não foi infiel. Já em relação à infidelidade do próprio participante em relações anteriores, não se observaram diferenças significativas entre os sexos. Quanto à história prévia de infidelidade parental, não se verificaram diferenças significativas entre os grupos. A maioria dos homens (88.1%; 68.2%) e das mulheres (91.8%; 74.2%) afirmaram que a mãe e o pai, respetivamente, não foram infiéis, porém, em ambos os grupos a resposta de suspeita/certeza quanto à infidelidade foi mais elevada relativamente ao pai.

Prevalência de comportamentos extra-diádicos

Os Quadros 3 e 4 mostram a percentagem de homens e mulheres que se envolveram em cada CED, nas modalidades offline e online, respetivamente. De modo a simplificar a apresentação dos resultados, as cinco categorias iniciais foram agrupadas em três categorias principais: nunca ocorreram CED na relação atual (categorias 1 e 2); ocorreram CED apenas uma vez (categoria 3); e ocorreram CED várias vezes (categorias 4 e 5).

 

 

 

Relativamente aos CED presenciais, podemos observar uma grande variabilidade na taxa de incidência dos CED (cf. Quadro 3). Nos homens, a taxa de incidência variou entre 7% (sexo anal) e 42.3% (queixas sobre o parceiro/relação). Nas mulheres, a taxa variou entre 1.5% (masturbou-se na presença da outra pessoa) e 40.5% (queixas sobre o parceiro/relação). A análise comparativa revelou a existência de diferenças significativas em 16 dos 23 CED offline. No total, 35.6% dos homens e 43.5% das mulheres referiram nunca se terem envolvido em nenhum dos CED presenciais durante a atual relação, c2=2.13, p=.145, V de Cramer=.07.

Em relação aos CED online, a percentagem no sexo masculino variou entre 5.7% (teve um parceiro de “reserva”) e 34.6% (queixas sobre o parceiro/relação). Para as mulheres, a percentagem variou entre 0.6% (visitou um site de encontros) e 27.2% (queixas sobre o parceiro/relação). A análise comparativa revelou a existência de diferenças significativas em 8 dos 13 CED (cf. Quadro 4). No cômputo geral, 53.8% e 60.7% dos homens e mulheres, respetivamente, referiram nunca se terem envolvido em nenhum dos CED online durante a atual relação, c2=2.04, p =.154, V de Cramer=.06.

Associação entre variáveis em estudo e os CED

Entre os homens, as variáveis idade, religiosidade, educação, idade de início da vida sexual e duração da relação atual não se correlacionaram significativamente com o total de CED offline e online. Em relação às medidas de satisfação, verificou-se que a satisfação relacional apresentou uma correlação significativa com os CED offline (r=-.41, p<.001) e online (r=-.47, p<.001) e que a satisfação sexual apresentou uma correlação significativa com os CED offline (r=-.23, p<.01) e online (r=-.25, p<.01).

No que respeita à história relacional e sexual, os homens que tiveram alguma parceira sexual nos últimos dois anos (excluindo a relação atual) revelaram um resultado médio significativamente mais elevado na modalidade offline (M=13.54, DP=18.98), t(79.210)=-2.93, p<.01, do que os que não tiveram nenhuma parceira (M=5.67, DP=10.32), não sendo significativa a diferença nos CED online. Os homens que mencionaram ter sido infiéis à(s) sua(s) parceira(s), em relações anteriores, apresentaram um resultado médio de CED significativamente mais elevado, do que aqueles que não mencionaram ter sido, tanto na modalidade offline (M=16.45, DP=20.03 vs. M=5.82, DP=10.76), t(53.511)=-3.33, p<.01, como na online (M=7.48, DP=10.08 vs. M=2.48, DP=5.25), t(52.878)=-2.98, p<.01).

Não foram encontradas diferenças significativas no que respeita à residência, religião, número de namoros ao longo da vida, infidelidade por parte da(s) parceira(s), em relações anteriores, e infidelidade da mãe e do pai, em ambas as modalidades.

No sexo feminino, as variáveis idade, educação, religiosidade, idade de início da vida sexual e duração da relação atual não se correlacionaram significativamente com o total de CED tanto offline como online. Em relação às medidas de satisfação, observou-se que a satisfação relacional apresentou uma correlação estatisticamente significativa com os CED offline (r=-.17, p<.01) e online (r=-.27, p<.001) e que a satisfação sexual apresentou uma correlação significativa apenas com os CED online (r=-.15, p<.01).

Relativamente à história relacional e sexual, as mulheres que tiveram três ou mais namoros ao longo da sua vida (excluindo a relação atual) revelaram um resultado médio significativamente mais elevado na modalidade offline (M=6.08, DP=11.72), t(142.411)=-2.00, p<.05, do que aquelas que tiveram apenas um ou dois namoros (M=3.65, DP=6.85), não sendo significativa a diferença em relação aos CED online. As mulheres que tiveram algum parceiro sexual nos últimos dois anos (excluindo a relação atual) apresentaram um resultado médio significativamente mais elevado na modalidade offline (M=6.97, DP=12.96), t(125.274)=-2.88, p<.01, do que as que não tiveram nenhum parceiro (M=3.23, DP=5.48), não sendo significativa a diferença nos CED online. As mulheres que referiram ter sido infiéis em relações anteriores apresentaram um resultado médio de CED significativamente mais elevado, do que aquelas que não referiam ter sido, tanto na modalidades offline (M=8.49, DP=13.71 vs. M=3.32, DP=6.39), t(83.687)=-3.17, p<.01, como na online (M=3.32, DP=5.08 vs. M=1.49, DP=2.94), t(89.095)=-2.98, p<.01.

Em ambas as modalidades de CED, não foram encontradas diferenças significativas entre os grupos relativamente à residência, à religião, à infidelidade por parte do(s) parceiro(s) em relações anteriores, e à infidelidade da mãe e do pai.

Análises multivariadas: Modelos de regressão múltipla

Os resultados relativos aos correlatos dos CED, separadamente para o sexo masculino e feminino, encontram-se nos Quadros 5 e 6, respetivamente.

 

 

 

No sexo masculino, quanto ao envolvimento em CED offline, verificou-se que as variáveis número de parceiros nos últimos dois anos e história prévia de infidelidade foram variáveis significativas, explicando 14.4% da variância. Quando adicionadas as variáveis de satisfação relacional e sexual, apenas a história prévia de infidelidade se manteve significativa e a satisfação relacional explicou 12.1% da variância adicional. No total, já ter sido infiel a uma parceira e uma menor satisfação com a atual relação encontraram-se associadas a maior envolvimento em CED offline, explicando 26.6% da variância total (cf. Quadro 5).

Relativamente ao envolvimento em CED online, observou-se que apenas a história prévia de infidelidade se mostrou significativa, explicando 11.6% da variância. Quando adicionadas os indicadores de satisfação relacional e sexual, a história prévia de infidelidade manteve-se significativa e as variáveis religião, infidelidade do pai e satisfação com a relação mostraram-se estatisticamente significativas, explicando 21.5% da variância adicional. No total, já ter sido infiel a uma parceira, pertencer à religião Católica, história de infidelidade paterna e menor satisfação com a relação atual mostraram-se associadas a maior envolvimento em CED online, explicando 33.1% da variância (cf. Quadro 5).

No sexo feminino, verificou-se que o número de parceiros nos últimos dois anos e a história prévia de infidelidade foram variáveis significativas, explicando 7.5% da variância do envolvimento em CED offline. Quando acrescentadas as variáveis satisfação relacional e satisfação sexual, as variáveis parceiros e história prévia mantiveram-se significativas. A satisfação relacional apenas foi marginalmente significativa (p=.059). No total, um maior número de parceiros nos últimos dois anos e já ter sido infiel a um parceiro em relações anteriores encontraram-se associados a um maior envolvimento em CED offline, explicando 9.6% da variância total (cf. Quadro 6).

Relativamente aos CED online, observou-se que apenas a história prévia de infidelidade foi uma variável significativa, explicando 6.8% da variância. Quando adicionadas as variáveis de satisfação, a história prévia de infidelidade manteve-se significativa e a satisfação relacional explicou 5.3% da variância adicional. No total, já ter sido infiel a um parceiro e uma menor satisfação com a relação atual mostraram-se associadas a maior envolvimento em CED online, explicando 12.1% da variância.

DISCUSSÃO

O presente estudo tem como objetivos avaliar a prevalência dos CED e estudar os seus possíveis correlatos sociodemográficos, relativos à história relacional e interpessoais, nas modalidades offline e online, durante a relação de namoro. Dado que a investigação no contexto das relações de namoro é relativamente recente e mais limitada, o presente estudo oferece um importante contributo para uma abordagem mais compreensiva do envolvimento extra-diádico no contexto de namoro.

Quanto à taxa de prevalência dos CED, as taxas encontradas aproximam-se das referidas por outros estudos em contexto de namoro (e.g., Hansen, 1987). Porém, as taxas de CED offline (63.5% nos homens e 56.5% nas mulheres) e online (46.2% nos homens e 39.3% entre as mulheres), comparativamente às obtidas no estudo de Luo et al. (2010), são relativamente mais baixas. Por sua vez, tendo como referencial os estudos com indivíduos casados ou em coabitação (e.g., Kontula & Haavio-Mannila, 1995; Lewin, 2000), as taxas de prevalência observadas neste estudo são mais elevadas, podendo refletir o menor grau de compromisso que caracteriza as relações de namoro (McAnulty & Brineman, 2007).

Relativamente às taxas de incidência dos CED específicos, verifica-se uma grande variabilidade, o que poderá estar relacionado com o instrumento utilizado, em si, bastante compreensivo deste construto. Porém, é importante que na interpretação dos resultados relativos à prevalência dos CED, e de acordo com o apontado pelos autores deste instrumento (Luo et al., 2010), se tenha em consideração a definição do conceito, o espaço temporal em que decorrem e as idiossincrasias da amostra. Nesta linha, é importante também ter em atenção que, como referem McAnulty e Brineman (2007), definições mais amplas tendem a alcançar estimativas mais elevadas. Neste estudo, e consistente com estudos prévios em contexto de namoro (e.g., Wiederman & Hurd, 1999), as taxas de CED parecem declinar à medida que o contacto se torna fisicamente mais íntimo.

Relativamente às diferenças de sexo, observa-se que apesar de os homens reportarem um total de CED maior do que as mulheres, tanto na modalidade offline como na online, as diferenças de sexo dos resultados globais não são significativas, o que é consistente, por exemplo, com os resultados obtidos por Brand et al. (2007) e Thompson (1984). Tal como a literatura tem evidenciado (e.g., Wiederman, 1997a), nos últimos anos as diferenças de sexo parecem estar a diminuir. Por um lado, devido à grande diversidade e especificidade de comportamentos (tanto sexuais como não-sexuais) incluídos no nosso estudo. Por outro, devido aos possíveis efeitos relacionados com atitudes mais liberais face à sexualidade resultantes das mudanças sociais mais recentes (Havlicek et al., 2011).

Apesar das diferenças de sexo nos resultados totais não serem significativas, a análise isolada de cada comportamento, permite verificar que os homens apresentam percentagens mais elevadas que as mulheres. Por exemplo, quando observamos alguns CED sexuais na modalidade presencial (e.g., “recebeu estimulação genital”; “sexo vaginal”), verifica-se que os homens apresentam valores significativamente mais elevados que as mulheres, dado que é consistente com a literatura (e.g., Glass & Wright, 1985). Na modalidade offline, uma possível explicação para esta observação pode estar relacionada com os riscos associados à atividade sexual (que envolve um contacto genital). Os homens podem ter maior controlo sobre os riscos associados a uma gravidez indesejada e a doenças sexualmente transmissíveis, uma vez que podem optar unilateralmente pelo uso do preservativo. Já as mulheres podem não se sentir confortáveis em abordar este aspeto com o parceiro sexual extra-diádico, uma vez que uso do preservativo necessita, normalmente, da cooperação dos homens (McAlister et al., 2005). Por sua vez, e consistente com outros estudos (Brand et al., 2007), nos CED em que não existe qualquer envolvimento sexual (e.g., “queixas sobre o parceiro/relação”; “passou tempo com alguém”) as diferenças entre os sexos não se mostram significativas. Na modalidade online, porém, as diferenças de sexo necessitam de maior exploração futura, porque apesar de alguns estudos (e.g., Cooper et al., 2000; Wysocki, 1998) sugerirem que os homens são os que mais tendem a envolver-se em relações românticas mediadas pelo computador, do nosso conhecimento, apenas o estudo de Luo et al. (2010) apresentou taxas de CED online para homens e mulheres.

No nosso estudo verificou-se que, entre os homens, a história de infidelidade prévia, em ambas as modalidades, pertencer à religião Católica e a história de infidelidade paterna, na modalidade online, encontram-se associadas ao envolvimento extra-diádico. Já entre as mulheres, foram significativas a história de infidelidade prévia, em ambas as modalidades, e o número de parceiros sexuais, na modalidade offline. Tal como referido na literatura (Banfield & McCabe, 2001; Wiederman, 1997a; Wiederman & Hurd,1999), a história de infidelidade prévia associa-se de forma significativa aos CED. Este padrão de comportamento repetitivo, para alguns indivíduos, pode refletir um baixo compromisso com a relação; um efeito limite (“threshold effect”, McAnulty & Brineman, 2007, p. 101), isto é, uma vez que a pessoa “já pisou a linha”, qualquer transgressão subsequente parece menos séria; ou outras características individuais, como a permissividade sexual (McAnulty & Brineman, 2007). Por sua vez, e consistente com os nossos resultados, também o número de parceiros sexuais tem sido associado ao envolvimento em CED (McAlister et al., 2005; Træen et al., 2007; Wiederman, 1997b); porém, no nosso estudo, a relação entre o número de parceiros sexuais e o envolvimento em CED parece ser especialmente evidente entre as mulheres, ainda que estas, comparativamente aos homens, reportem menos parceiros sexuais. Do nosso conhecimento, os estudos prévios não fizeram uma separação por sexo ao analisar esta associação, portanto é possível que o padrão de associação seja diferente consoante o sexo.

No que concerne ao envolvimento em CED online, entre os homens, pertencer à religião Católica é um preditor significativo, constituindo um resultado contrário ao que tem sido observado em estudos anteriores (e.g., Burdette et al., 2007; Forste & Tanfer, 1996), nos quais o envolvimento extra-diádico é mais reportado por indivíduos que não têm uma afiliação religiosa (embora estes estudos tivessem apenas considerado os comportamentos numa modalidade presencial). Face a este resultado, é possível que os indivíduos que pertencem à religião Católica, pela exposição contínua a mensagens que condenam o envolvimento extra-diádico, sejam levados a procurar um local (o ciberespaço) que, pela liberdade que proporciona, permite, por exemplo, obter gratificação sexual de forma mais fácil e anónima (Underwood & Findlay, 2004).

Quanto à história relacional dos pais, apenas a infidelidade do pai se relaciona com o envolvimento em CED para os homens (i.e., filhos). Entre as mulheres (i.e., filhas) não se observou qualquer associação significativa, tal como em outros estudos que analisaram estas variáveis (Havlicek et al., 2011; Platt et al., 2008). Estes últimos interpretaram este resultado sugerindo que os filhos veêm o pai com um modelo para o seu comportamento no futuro. Mahl (2001) refere que alguns marcadores de ajustamento negativos (e.g., relações mais curtas) se encontram associados às crenças que muitos filhos de pais divorciados têm sobre as relações românticas. Estas explicações sugerem a possibilidade de transmissão geracional destes comportamentos. Outra explicação possível relaciona-se com a heritabilidade da tendência face ao envolvimento extra-diádico (i.e., nível de sociosexualidade; Havlicek et al., 2011). Esta explicação genética é suportada por um estudo de gémeos, que mostra um componente genético relativamente elevado para a sociosexualidade (Bailey, Dunne, & Martin, 2000). Com efeito, tanto aspetos genéticos como desenvolvimentais e socioculturais podem ter um papel importante na explicação deste resultado, porém, é fundamental mais investigação, nomeadamente de natureza longitudinal.

Entre os homens verifica-se que a satisfação relacional é um preditor significativo do envolvimento em CED, em ambas as modalidades, ao passo que nas mulheres é apenas preditora dos CED na modalidade online. Apesar deste resultado demonstrar a relevância desta variável nas relações de namoro, tal como outros estudos já tinham revelado (Drigotas, Safstrom, & Gentilia, 1999; McAlister et al., 2005), era esperado que a satisfação com a relação fosse um preditor significativo de CED presencias para as mulheres. Também a variância explicada pela satisfação relacional foi menor nas mulheres que nos homens. Estes dados remetem para o estudo de outras variáveis que possam estar explicar o envolvimento em CED nas mulheres, como por exemplo o compromisso com a relação ou a qualidade das alternativas (Banfield & McCabe, 2001; Drigotas et al., 1999; McAlister et al., 2005).

A associação entre a satisfação relacional e o envolvimento em CED online é, no entanto, coerente com os resultados do estudo de Underwood e Findlay (2004), que mostrou que a maioria dos participantes relatou maior satisfação com o seu parceiro extra-diádico online do que com a sua relação primária presencial. Os autores sugeriram que tanto homens como mulheres se sentiam insatisfeitos sexualmente, porém, era na modalidade online que se sentiam mais compreendidos e disponíveis para falar sobre qualquer assunto e para partilhar sentimentos. Por outras palavras, as características da Internet, como o anonimato, parecem potenciar uma oportunidade para o desenvolvimento da intimidade, que talvez não seja percebida como estando em falta na relação primária presencial (Whitty, 2003), mas que provavelmente se associa à satisfação relacional e sexual do casal.

Entre as variáveis sociodemográficas, não foi encontrada uma associação entre a religiosidade e o envolvimento em CED. Porém, este resultado acaba por ser consistente com os encontrados nos estudos de Wiederman e Hurd (1999) e de Mark et al. (2011). De facto, apesar da maioria dos participantes pertencer à religião Católica, a maioria também é não praticante e não reportou uma importância da religião na vida e na tomada de decisões determinante, o que pode ser relevante para explicar este resultado. Já a educação não surge associada ao envolvimento em CED. Contudo, refira-se que a amostra deste estudo é muito homogénea a este nível, a grande maioria dos participantes frequenta o ensino superior, o que pode atenuar a potencial relação entre as variáveis.

Por sua vez, a idade de início da atividade sexual e a duração da relação de namoro não se correlacionaram significativamente com o envolvimento em CED; estes resultados são consistentes com os do estudo de McAlister et al. (2005), também realizado no contexto de namoro, e no qual os autores também hipotetizaram a existência de uma associação.

Quanto à satisfação sexual, a associação com o envolvimento em CED foi significativa apenas nos modelos univariados, o que é coerente com o estudo de Mark et al. (2011). Neste estudo, a satisfação sexual correlaciona-se negativamente com o envolvimento extra-diádico entre os homens, em ambas as modalidades, e entre as mulheres apenas na modalidade online. Este resultado é consistente com a literatura, que sugere que a satisfação sexual parece ser mais relevante para o sexo masculino, do que para o feminino (e.g., Liu, 2000; Banfield & McCabe, 2001), mas menos relevante que a satisfação relacional (Mark et al., 2011).

Em síntese, este estudo possibilita uma avaliação compreensiva das taxas de prevalência e das variáveis associadas com a ocorrência de CED nas relações de namoro, temas escassamente estudados, sobretudo em Portugal. Como Buss e Schackelford (1997) já tinham sugerido, as variáveis demográficas não parecem ser as melhores preditoras dos CED. Já as variáveis relativas à história relacional e as interpessoais são variáveis relevantes na explicação do envolvimento extra-diádico. Um dos principais contributos deste estudo tem a ver com a inclusão da modalidade online, sendo que nesta modalidade os indivíduos parecem sentir-se abertos para partilhar sentimentos e disponíveis para obter gratificação sexual, assumindo assim um papel importante na compreensão destes comportamentos.

Este estudo ultrapassa algumas das limitações apontadas na investigação realizada neste âmbito, principalmente pela adoção de uma conceptualização e medida dos CED que inclui indicadores comportamentais específicos e não-ambíguos, o que, por sua vez, reduz a ambiguidade nas respostas. A recolha da amostra em contexto comunitário e via Internet são outro ponto forte deste estudo, pois a investigação sugere que a desejabilidade social é reduzida nos estudos em que a amostra é online, especialmente para questões sexuais mais sensíveis, em comparação com investigações que utilizam os tradicionais questionários de papel e caneta (Pealer, Weiler, Pigg, Miller, & Dorman, 2001; Turner et al.,1998).

Contudo, apresenta também limitações, que importam mencionar por implicarem prudência na interpretação dos resultados. Primeiro, trata-se de uma amostra de conveniência, assim, a taxa de prevalência reportada no presente estudo, provavelmente, não garante representatividade na população. Segundo, o formato de auto-resposta dos instrumentos utilizados no estudo pode levar a respostas distorcidas por parte dos participantes. Dada a natureza sensível deste tópico, é possível que os participantes não sejam completamente verdadeiros nas suas respostas, ou seja, os resultados podem estar influenciados pela desejabilidade social. Como referem Blow e Hartnett (2005), enquanto alguns participantes podem sobre-reportar, outros podem sub-reportar a sua realidade. A este propósito, Whisman e Snyder (2007), ao comparar a taxa de CED baseada numa auto-entrevista assistida pelo computador e a obtida partir de uma entrevista cara-a-cara, verificaram uma redução significativa na taxa de comportamentos quando eram usadas entrevistas cara-a-cara, sugerindo que o método particular com que se avalia os CED tem um grande impacto na sua taxa. Neste sentido, é possível, como referido, que a recolha via questionário online possa ter, de algum modo, possibilitado resultados mais fiáveis.

Do ponto de vista da investigação futura, seria importante uma maior ênfase na análise dos CED na modalidade online, bem como no estudo de um conjunto mais amplo de variáveis (e.g., interpessoais, personalidade). A investigação que permita avaliar padrões de envolvimento extra-diádico ao longo do tempo também é importante, pois, tal como defendem McAnulty e Brineman (2007), poderá ser a melhor forma de compreender o curso do tempo das causas e dos efeitos destes comportamentos.

 

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Submissão: 27/09/2013 Aceitação: 13/10/2013

 

Correspondência

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Alexandra Martins, Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra, Rua do Colégio Novo, 3001-802 Coimbra. E-mail: alexandrafrsmartins@gmail.com

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