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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica vol.29 no.2 Lisboa abr. 2011

 

Vinculação à mãe e ligação aos pares na adolescência: O papel mediador da auto-estima

M. Rocha*; C. P. Mota**; P. M. Matos***

** Bolseira de pós-doutoramento da Fundação para a Ciência e Tecnologia (SFRH/BPD/47876/2008), Investigadora do Centro de Estudos em Gestão e Economia, Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Católica Portuguesa, Centro Regional do Porto;

** Investigadora do Centro de Psicologia da Universidade do Porto / Professora Auxiliar na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro;

*** Investigadora do Centro de Psicologia da Universidade do Porto / Professora Auxiliar na Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade do Porto

Correspondência

 

RESUMO

De acordo com a teoria da vinculação, a qualidade da relação com as figuras parentais desempenha um papel fundamental na forma como os jovens se percebem a si e aos outros, contribuindo a qualidade destes laços para o desenvolvimento da auto-estima e dos laços que se constroem posteriormente com os pares. O objectivo deste estudo é observar a contribuição da qualidade da vinculação à mãe na predição da ligação aos pares, tendo em conta a hipótese do papel mediador da auto-estima, numa amostra de 742 adolescentes de ambos os géneros, entre os 13 e os 23 anos (M=17,09; DP=1,84), provenientes de famílias intactas e famílias com pais divorciados. O estudo recorreu ao Questionário de Vinculação ao Pai e à Mãe (Matos & Costa, 2004), ao Inventory of Parental and Peer Attachment (Armsden & Greenberg, 1987), e ainda à Rosenberg’s Self-Esteem Scale (Rosenberg, 1965). Todos os questionários apresentam valores adequados, quer de consistência interna, quer de ajustamento às análises factoriais confirmatórias de 1ª ordem. Os resultados, obtidos através da metodologia das equações estruturais, são indiciadores da qualidade da vinculação à mãe enquanto preditora, directa e indirecta, da qualidade da ligação aos pares. No modelo testado, a auto-estima é predita positivamente pela qualidade do laço emocional e negativamente pela inibição da exploração e individualidade e ansiedade de separação na vinculação à mãe. Os resultados são ainda concordantes com o papel mediador da auto-estima na associação entre qualidade da vinculação à mãe e ligação aos pares.

Palavras-chave: Adolescência, Auto-estima, Mediação, Pares, Vinculação à mãe.

 

ABSTRACT

According to attachment theory, the quality of relationships with parental figures play a key role in the way young people perceive themselves and others, contributing also to self-esteem development of to the relational ties built with peers. The main purpose of this study is to evaluate the contribution of the quality of attachment to mother in the prediction of the construction of peers bonds, taking into account the hypothesis of the mediating role of self-esteem, in a sample of 742 adolescents from both sexes, between 13 and 23 years (M=17.09, SD=1.84), from intact and divorced families. The study used the Attachment Questionnaire to the Father and Mother (Matos & Costa, 2004), the Inventory of Parental and Peer Attachment (Armsden & Greenberg, 1987) and also the Rosenberg’s Self-Esteem Scale (Rosenberg, 1965). All questionnaires presented appropriate psychometric qualities, with good internal consistency and adequate fit indexes (1st order confirmatory factor analysis). Results were obtained through structural equations methodology, and are indicative of quality of attachment to the mother as direct and indirect predictor of the quality of peers’ relationships. In the model tested, self-esteem is positively predicted by the mother’s quality of emotional bond, and negatively by inhibition of exploration and individuality and separation anxiety. The results are also consistent with the mediating role of self-esteem on the association between quality of attachment to mother and attachment to peers.

Key-words: Adolescence, Attachment to mother, Mediation, Peers.

 

INTRODUÇÃO

Embora a literatura tenha vindo a assumir a importância de outras figuras significativas para além da mãe, nomeadamente o pai e elementos da família alargada, no desenvolvimento emocional das crianças, os dados da qualidade da vinculação à mãe têm sido a fonte maior na formulação dos princípios básicos da teoria da vinculação (vide, Ainsworth, 1969, 1989a,b; Bowlby, 1988, 1990, 1998). Hoje em dia continuam a ser realizados estudos no intuito de compreender os efeitos do papel da mãe ao longo do desenvolvimento do sujeito enquanto criança, adolescente e adulto. O presente estudo foca-se na adolescência, onde se sucedem os estádios desenvolvimentais a partir dos quais é possível integrar novos elementos significativos na vinculação. A imagem que os adolescentes criam de si e dos outros, prende-se com a qualidade da vivência das relações que estabelecem com as figuras significativas e em particular com a figura cuidadora (normalmente a mãe), pelo que uma abordagem teórica centrada na aquisição de um sentido de estima pessoal torna-se pertinente. A auto-estima surge como uma variável associada ao desenvolvimento psicossocial dos jovens, tornando-se particularmente relevante na adolescência, implicando, de acordo com uma perspectiva ecológica, fortes associações no estabelecimento das relações fora do âmbito parental, nomeadamente na relação com os pares.

A participação da qualidade de vinculação à mãe na construção da auto-estima

A abordagem da construção da auto-estima enquanto resultado (também) do estabelecimento de relações de vinculação significativas, posteriormente constituídas em modelos internos dinâmicos, não é nova (Bowlby, 1988). Deste modo, a percepção pessoal do sujeito de si enquanto merecedor de cuidados e amor e a forma como compreende a imagem dos outros (enquanto consistentes e disponíveis na prestação de cuidados que prestam), tem mantido aberta uma linha de investigação, aparentemente inesgotável (Griffin & Bartholomew, 1994a,b; Mota, 2008; Peixoto, 2004; Rocha, 2008; Trzesniewski, Robins, Roberts, & Caspi, 2004, entre outros).

Com Ainsworth (1969) enfatizou-se a importância da qualidade da relação criada entre a figura materna e filhos, quer ao nível do desenvolvimento presente, quer no futuro relacional dos sujeitos. Foi ainda com Mary Ainsworth que se introduz o conceito de sensibilidade materna face aos sinais da criança de procura de proximidade. A sensibilidade materna é descrita como complementar ao comportamento de vinculação, nomeadamente a procura de apoio ou careseeking. Esta sensibilidade por parte da figura de vinculação prende-se com a capacidade de interpretar os sinais da criança, nem sempre claros, e com a consequente resposta satisfatória às necessidades transmitidas (Claussen & Crittenden, 2000). Assim a sensibilidade materna surge como conceito chave da teoria da vinculação na compreensão das diferenças ao nível da segurança durante o primeiro ano de vida (Bakermans-Kranenburg, van IJzendoorn, & Juffer, 2003; de Wolff & van IJzendoorn, 1997). É a partir desta associação entre necessidades exibidas e provimento das mesmas, que o sujeito psicológico desenvolve em cada relação significativa a certeza (ou não) de que aquela figura estará disponível para o incentivar a fazer coisas diferentes ou novas ajudando-o a conhecer-se melhor a si próprio. De outro modo, funcionará para o sujeito enquanto base segura (Ainsworth, 1967; Trinke & Bartholomew, 1997).

Ao longo do ciclo de vida, os modelos internos dinâmicos vão sendo construídos, reconstruídos e activados, apresentando-se como uma influência decisiva nas escolhas pessoais realizadas. Na adolescência, a escolha dos pares ou do par amoroso pode representar um reflexo disto mesmo, na medida em que parece existir uma procura de elementos significativos de si nos outros significativos, confirmando deste modo o modelo de segurança nas relações pessoais (Holmes, 2001), e a construção de bases seguras noutros domínios relacionais diversos dos dos pais.

Assim, é de todo pertinente abordar a adolescência sob o ponto de vista da qualidade da relação “mãe-adolescente” e da base segura, tentando compreender o modo como o próprio sistema de vinculação se vai desenvolvendo ele também. Neste contexto, adolescentes seguros são caracterizados pela possibilidade de se autonomizarem e avaliarem as suas relações com as figuras parentais de forma afectuosa, discutindo eventuais desacordos num contexto relacional caracterizado pela harmonia e pelo apoio. O adolescente seguro é livre para explorar a sua autonomia no desacordo, sabendo que que os pais manterão a relação, o que por seu turno se torna preditivo dos níveis de auto-estima e de auto-eficácia percebidas (Allen, MacElhaney, Land, Kupermic, Moore, O’Beeirne, & Kilmer, 2003). Esta perspectiva retrata uma visão desenvolvi mental, capaz de diferenciar dois pólos complementares: por um lado, a necessidade de segurança emocional da criança e mais tarde do adolescente e, por outro lado, a capacidade dos pais ou figuras prestadoras de cuidados para estarem disponíveis e assegurarem o bem-estar dos seus filhos.

As associações positivas entre os domínios relacionais da vinculação aos pais e aos pares, e destes com a auto-estima têm vindo a ser testados empiricamente de forma robusta (Diener & Diener, 1995; Laible, Carlo, & Roesch, 2004; Way & Robinson, 2003; Wilkinson, 2006; Wilkinson & Parry, 2004). A internalização de modelos positivos dos prestadores de cuidados e a utilização destes como base segura a partir da qual é possível explorar-se a si e ao mundo parecem ser factores protectores da auto-estima pessoal, em específico na adolescência. Os pressupostos teóricos em torno do desenvolvimento apoiam justamente esta ideia, na medida em que a auto-estima tendencialmente decresce durante a transição da infância para o início da adolescência; neste período, os jovens estão expostos a um turbilhão de mudanças físicas, cognitivas e sociais que contribuem decisivamente para o processo de formação da identidade e do auto conceito (Fedman & Elliot, 1990).

De acordo com Pinheiro e Ferreira (2001), a percepção de aceitação da família (particularmente dos pais) e dos amigos apresenta fortes associações com a auto-estima. Por seu turno, uma percepção elevada quer de aceitação quer de auto-estima parecem associar-se a uma vinculação segura, confirmando a hipótese de que os modelos de vinculação podem ser significativos para a avaliação global do self. Assim, verifica-se que um contexto relacional de segurança estável constitui um recurso de aprendizagem, dando lugar posterior à possibilidade da exploração do mundo exterior. Uma exploração em contexto seguro auxilia o relacionamento com os “outros”, fornecendo um importante indicador de maturidade emocional (Dubois, Felner, Brand, Adan, & Evans, 1992).

Contributo da vinculação à mãe para a construção dos contextos relacionais com os pares

A investigação empírica tem vindo consistentemente a observar a qualidade de vinculação aos pais enquanto um dos preditores da qualidade relacional com os pares (Bartholomew & Horowitz, 1991; Benson, McWey, & Ross, 2006; Hazan & Zeifman, 1994, 1999; Klohnen, Weller, Luo, & Choe, 2005; Mota, 2008; Ryan, La Guardia, Solky-Butzel, Chirkov, & Kim, 2005). Em Portugal, estudos recentes (e.g., Mota & Matos, 2009; Rocha, 2008) sublinham a importância da qualidade dos laços emocionais construídos com os pais, em particular com a mãe, no desenvolvimento da auto-estima. Uma percepção positiva de si parece repercutir-se no bem-estar dos adolescentes, demonstrando maior disponibilidade pessoal no estabelecimento de contactos com o contextos relacionais diversos dos parental, nomeadamente com os pares (vide também Booth & Amato, 2001). Estudos longitudinais revelam ainda que os adolescentes que funcionam com modelos internos dinâmicos seguros são mais populares no grupo de pares, têm um maior número de amigos que os adolescentes inseguros, demonstrando ainda maior disponibilidade para novos relacionamentos (Lieberman, Doyle, & Markiewicz, 1999). A relação com os pais e a forma como os adolescentes integram esta relação no seu hardware relacional, cria modelos internos capazes de favorecer uma procura do adolescente em direcção aos pares, apoiando a ideia da transferência da vinculação dos pais para os pares (e.g., Hazan & Shaver, 1994; Hazan & Zeifman, 1994; Trinke & Bartholomew, 1997; Weiss, 1991) ou de alargamento da rede de vinculação para cumprimento de funções de vinculação (Friedlmeier & Granqvist, 2006; Rocha, 2008). Ao longo da adolescência vão surgindo novas figuras na rede relacional, estas, potencialmente significativas no preenchimento de necessidades afectivas. Falámos essencialmente dos pares amigos e do par amoroso. As relações de qualidade com os pares criam nos adolescentes sentimentos de procura de proximidade, relações essas que desempenham um papel importante no desenvolvimento pessoal e social do adolescente. Em alguns casos esta proximidade traduz-se em procura de apoio, conforto e partilha íntima que se caracteriza pela reciprocidade, podendo estas relações vir a ser percebidas como relações de vinculação (Meeus, Osterwegel, & Vollebergh, 2002; Nickerson & Nagle, 2005). Não se percepciona quer teórica, quer empiricamente um carácter de concorrência da qualidade das figuras parentais com a dos pares significativos, pelo contrário advoga-se que ambos os tipos de figuras têm papéis específicos que sugerem complementaridade no preenchimento das necessidades dos sujeitos. É claramente um pressuposto da teoria de vinculação que os modelos iniciais vão suportando a construção das lentes emocionais e cognitivas com as quais é possível percepcionar o self e os outros; que neste percurso desenvolvimental existem processos de rigidificação, quer pela repetição das condições da segurança da própria relação, quer pela atenção dirigida, que influenciam a experiência emocional dos contextos relacionais além dos parentais. Mas é também claro que a introdução de contextos alternativos de segurança pode providenciar as condições para a revisão dos modelos internos dinâmicos, potenciando a plasticidade necessária à adaptabilidade pessoal (para revisão consulte-se Rocha, 2008).

Assim, partindo da concepção que o desenvolvimento dos jovens é pautado pela qualidade da ligação aos pares, e atendendo a que qualidade da vinculação parental parece ser essencial para o desenvolvimento psicossocial dos adolescentes (Mota, 2008), assume-se a relevância de testar a existência de variáveis mediadoras nesta associação. Assim o testar do papel mediador da autoestima pode ajudar a compreender o processo de associação entre qualidade da relação com a mãe e a qualidade relacional com os pares.

ESTUDO EMPÍRICO

Objectivos e hipóteses

De acordo com o modelo conceptual da auto-estima enquanto sub-produto da vinculação aos pais, e dos estudos que verificam associações consistentes entre a qualidade de vinculação aos pais e a vinculação aos pares, pretende-se observar os efeitos da vinculação à mãe na auto-estima e na relação com os pares, numa amostra de adolescentes portugueses. A partir deste enquadramento, é também esperado que a auto-estima desempenhe um papel mediador entre a qualidade relacional de ambos os contextos. São esperadas mediações de carácter parcial, já que se considera que embora a auto-estima seja fruto (também) da vinculação aos pais, a auto-estima constitui-se como preditor per se das relações com os pares.

MÉTODO

Participantes

O estudo é composto por 742 adolescentes a frequentar o ensino secundário (Mano escolar=10.34; DP=1.4), com idades compreendidas entre os 13 e os 23 anos (M=17.09; DP=1.8), 389 do género feminino (52.4%) e 353 (47.6%) do género masculino. Do total dos participantes, 647 (87.3%) provêm de famílias intactas e 94 (12.7%) de famílias divorciadas. A idade do pai varia entre os 32 e os 76 anos (M=46.23; DP=5.9), a idade da mãe varia entre os 34 e os 58 anos (M=43.54; DP=4.8) com uma escolaridade compreendida entre o analfabetismo e o ensino superior (para pai e mãe, respectivamente, 42.7%/ 45.5% – do 1º ao 4º ano do 1º ciclo; 14.9%/14.8% – 5º e 6º ano do 2º ciclo; 33.7%/31% – 7ºao 12º ano do 3º ciclo; 0.4%/0.4% têm frequência universitária; 4.4%/5.1% têm cursos superiores e 0.1%/0.1% são analfabetos).

Instrumentos

Todos os instrumentos foram sujeitos a análise das propriedades psicométricas, nomeadamente, análise da consistência interna (alfa de Cronbach acima de .70) e análise factorial confirmatória de primeira ordem (AFC). AAFC apresentou índices de ajustamento aceitáveis, segundo os valores de corte preconizados para estas análises (vide Bollen, 1986; MacCallum, Widaman, Preacher, & Hong, 1999; Yuan, 2005), quer de CFI (acima de .90), quer de SRMR e RMSEA (de valor inferior ou igual a .08).

Questionário de Vinculação ao Pai e à Mãe – QVPM (Matos & Costa, 2001). É um questionário constituído na sua forma revista por 30 itens que traduzem afirmações sobre as relações familiares. Procura avaliar as representações de vinculação dos adolescentes e jovens adultos aos pais, focalizando três dimensões: a Qualidade do laço emocional (QLE, 10 itens), a Ansiedade de separação (AS, 10 itens) e, por último, a Inibição da exploração e individualidade (IEI, 10 itens). O formato da resposta implica uma escala tipo Likert de seis pontos, que é realizada para o pai e mãe respectivamente. No presente estudo utilizaram-se apenas os dados relativos à qualidade da vinculação com mãe. Os Alfas de Cronbach para a presente amostra apresentam-se em seguida: IEI=.79; QLE=.90; AS=.82. As análises factoriais confirmatórias de primeira ordem apresentam índices de ajustamento adequados aos dados para a versão da vinculação à mãe (CFI=.969, SRMR=.053, RMSEA=.075).

Inventory of Peer and Parental Attachment – IPPA (Armsden & Greenberg, 1987, adaptação de Ferreira & Costa, 1998, cit. in Ferreira, 1998). É um questionário de auto-relato que tem como objectivo avaliar a qualidade das relações de vinculação com os pais e com pares em adolescentes e jovens adultos. Neste estudo, utilizou-se apenas a versão pares, sendo esta constituída por 25 itens distribuídos ao longo de 3 dimensões: Confiança (CON de 10 itens); Comunicação (COM de 8 itens); e Alienação (ALI de 7 itens). O formato de resposta é de tipo Likert em 6 pontos. Os Alfas de Cronbach para a presente amostra foram de: CON=.80; COM=.82 e ALI=.71. A análise factorial confirmatória apresentou índices de ajustamento adequados para o modelo (CFI=.963, SRMR=.034, RMSEA=.084).

Rosenberg’s Self-Esteem Scale (Rosenberg, 1965, adaptação de Rocha & Matos, 2003, cit. in Rocha, 2008). Trata-se de uma escala constituída por 10 itens que visam avaliar a auto-estima global, mediante uma escala de tipo Likert em 6 pontos. O Alfa de Cronbach para a presente amostra é de .85. A análise factorial confirmatória apresenta índices de ajustamento adequados (CFI=.976, SRMR=.054, RMSEA=.057).

Foi ainda utilizada uma ficha demográfica, onde se incluíram informações sócio-demográficas acerca dos adolescentes, mas também dados de identificação familiar, nomeadamente idade, profissão, escolaridade e estado civil das figuras parentais.

Procedimento

Tratando-se de um estudo transversal, a recolha dos dados foi realizada num só momento em escolas secundárias da região norte e centro de Portugal. Esta amostra é uma amostra mista já que composta por elementos recrutados quer numa área urbana quer numa outra mais interior ou rural. A aplicação teve lugar em tempo lectivo, sendo apoiada pela equipa de investigação. Aquando da administração foram apresentados os objectivos gerais do estudo, pelo que, tratando-se de uma administração colectiva, foram dadas instruções estandardizadas de esclarecimento no que diz respeito ao preenchimento dos questionários de auto-relato, realçando em todo momento o carácter sigiloso da informação inerente aos questionários, assim como a índole voluntária da participação no estudo. A ordem dos questionários foi invertida aleatoriamente, no intuito de prevenir efeitos de contaminação de resposta por ordem de preenchimento.

Estratégia de análise de dados

Os dados foram analisados de acordo com a metodologia da modelagem de equações estruturais – SEM, com recurso ao programa estatístico EQS (6.1.). Esta análise permite a interpretação de resultados tendo em conta a inclusão de várias dimensões numa mesma equação estrutural, compondo relações de causalidade e interdependência entre as variáveis, decompondo os efeitos totais em efeitos directos e indirectos e testando os índices de ajustamento no modelo global (Shipley, 1999). Tratando-se de uma técnica confirmatória, mais do que exploratória, pretendeu-se determinar a validade do modelo teórico construído especificamente para este estudo.

O modelo inicial teve em conta todas as relações possíveis entre as variáveis, i.e., as variáveis exógenas que definem a qualidade de vinculação à mãe como preditoras quer da auto-estima, quer das três dimensões da qualidade relacional com os pares. Do mesmo modo, a auto-estima era também preditora, em concomitância com a equação anterior, das dimensões da vinculação aos pares.

Foram testados os efeitos indirectos/mediadores da auto-estima analisando a decomposição dos efeitos do modelo através dos valores dos testes z para as variáveis relevantes com uma probabilidade acoplada de 95%. Em análises adicionais, utilizou-se o teste de Wald a posteriori, verificando do prejuízo da retirada de parâmetros não significativos para o valor do Qui-quadrado. Assim, no modelo final apenas são considerados os parâmetros resultantes desta operação.

O método utilizado nas análises foi o de máxima verosimilhança, tendo sido previamente testada a normalidade das distribuições das variáveis utilizadas, recorrendo à análise dos gráficos de normalidade (Q-Q Plot), desta feita com recurso ao programa SPSS (versão 15). Esta análise verificou uma contiguidade considerável, tendo em conta o carácter psicológico das variáveis em análise.

O modelo final apresentou índices de ajustamento dentro dos valores críticos aconselhados, a referir CFI acima de .90, assim como os índices de SRMR e RMSEA com valores abaixo de .08 (vide Byrne, 2006). A magnitude dos valores observados para o modelo final serão apresentados enquanto valores beta estandardizados, embora sejam avançados os valores z, erro padrão e beta não estandardizados (totais e indirectos) de modo a caracterizar a decomposição de efeitos.

RESULTADOS

Tendo em conta a estratégia de análise de dados descrita anteriormente, foi testada a significância dos caminhos do modelo total (vide Figura 1). Após a testagem do modelo inicial [χ2=441.810(132), p=.000; CFI=.954; SRMR=.042; RMSEA=.057] e, a respectiva análise da comparação de Wald para a retirada dos parâmetros não significativos que não faziam variar significativamente o valor do Qui-quadrado [χ2=5.262(3), p=.153], surge um modelo incluso1, onde foram mantidas todas as dimensões latentes, porém onde foram retirados os parâmetros βCOM.IEI (z=-1.674, EP=.063, p>.05; χ2=3.269, p=.071), βCOM.QLE (z=-.446, EP=.132, p>.05; χ2=.199, p=.656) e, βALI.ASD (z=-579, EP=.072, p>.05; χ2=1.755, p=.185).

No modelo final são apresentados os caminhos directos significativos no que respeita à equação de medida (vide Figura 2). Os índices de ajustamento encontram-se adequados aos dados recolhidos [χ2=447.074(135), p=.000; CFI=.953; SRMR=.045; RMSEA=.056]. É a partir deste modelo que foi analisada a decomposição de efeitos. Assim, os resultados directos (valores beta estandardizados) indicam que as três dimensões da vinculação à mãe se constituíram como preditoras significativas da Auto-estima, no sentido aguardado teoricamente. Deste modo, quer a Inibição da exploração e da individualidade, quer a Ansiedade de separação predizem de forma fraca e negativa a Auto-estima (β=-.24 e β=-.26, respectivamente), enquanto que o preditor mais robusto (moderado e positivo) da Auto-estima é a Qualidade do laço emocional na relação com a mãe (β=.41). Por outro lado, verifica-se que a Auto-estima é um preditora directa, no sentido aguardado pela literatura, das dimensões que avaliam a qualidade relacional com os pares, i.e., de forma fraca e positiva no que respeita à Comunicação (β=.15) e à Confiança (β=.23), de modo fraco a moderado e, negativamente, na Alienação com os pares (β=-.30).

Uma nota apenas para os resultados correlacionais, que se encontram dentro do que também é teoricamente esperado, pese embora com um valor para a associação entre a Confiança e a Comunicação cujo valor é indiciador de multicolinariedade, porém, que se coaduna quer com os estudos iniciais de Armsden e Greenberg (1987), onde o valor r de Pearson era bastante elevado entre estes mesmos constructos (r=.76). De qualquer forma os testes t efectuados para uma mesma amostra, indicaram que as dimensões tinham médias significativamente diversas uma da outra [MCOM.=4.68, DP=.761, t(741)=167.40, p=.000; MCON.=4.84, DP=.727, t(741)=181.53, p=.000], indicando que não se estaria a avaliar um constructo similar. De resto, não existe o inconveniente do erro eventual do modelo, já que não se trata de variáveis independentes mas das variáveis exógenas finais.

Quanto aos efeitos directos da qualidade da vinculação à mãe nas dimensões da qualidade relacional com os pares, estes aconteceram de forma significativa por parte da Inibição da exploração e individualidade na Confiança e na Alienação, de acordo com o esperado com valores entre o fraco a moderado e de sinal contrário (respectivamente, βCON.IEI= -.09 e βALI.IEI=.13). A Qualidade do laço emocional prediz, embora de modo fraco, directa e significativamente, quer a Confiança (βCON.QLE=.12), quer a Alienação (βALI.QLE=-.21). Por último, a Ansiedade de separação prediz fraca, e curiosamente positivamente, quer a Alienação (βALI.ASD=.26), quer a Comunicação (βCOM.ASD=.18). Assim, cedo se levantou a hipótese de que se estava perante um efeito de supressão na equação, desde logo porque os resultados eram indiciadores de que quanto maior a Ansiedade de separação na relação com a mãe, maior seria o grau de Comunicação com os amigos, o que não se enquadra de a priori, na teoria da vinculação.

As respostas encontram-se na análise da decomposição de efeitos (vide Figura 3.), verificando-se, a existência de um efeito indirecto, de sinal contrário ao relatado anteriormente, i.e., negativo, embora fraco, porém significativo entre Ansiedade de separação e Comunicação, mediado pela Auto-estima [βCOM.ASD (zTOT.=3.342, EP=.034, p<.05, βNON.=.114; zIND.=-2.306, EP=.014, p<.05, βNON.=-.032)].

Iniciou-se então o procedimento de retirada das dimensões da equação, faseadamente, de modo a verificar qual o supressor da associação. A análise indicou a existência de uma associação positiva e baixa entre Ansiedade de separação e Auto-estima em termos de coeficiente de validade (r=.07, p>.05), enquanto que o valor estandardizado da regressão desta associação é negativo e significativo (β=-.26, p>.05).

A variável Qualidade do laço emocional tem, por seu turno, uma associação significativa e positiva com a Auto-estima, quer no valor do coeficiente de validade, quer no valor estandardizado da regressão (respectivamente, r=.14, p<.05 e β=.41, p<.05). O valor da correlação entre QLE e ASD é elevado (rQLE.ASD.=.77). Esta é por isso uma situação que configura uma supressão de rede, ou sobreposta (cross-over) por parte de QLE (vide Chen & Krauss, 2004; Conger, 1974; Horst, 1941; MacKinnon, Fairchild, & Fritz, 2007; Maassen & Bakker, 2001; Paulhos, Robins, Trzesniewski, & Tracy, 2004; Tzelgov & Henik, 1991). Estes valores, por seu turno, fazem com que os valores beta estandardizados, directos e indirectos da variável preditora (ASD) na variável critério Comunicação aos pares sejam, pelo anteriormente referido, de sinal divergente, por outras palavras, apresentando-se no modelo enquanto mediação inconsistente (MacKinnon e colabora dores, 2007). Será então uma situação em que a variância irrelevante de ASD que explica a Comunicação é removida, por acção do supressor em rede QLE, revelando a verdadeira eficácia do preditor no critério.

A decomposição de efeitos encontrou ainda efeitos mediados através da Auto-estima, (i) da Ansiedade de separação na Alienação (positivo e baixo) [βALI.ASD (zTOT.=3.666, EP=.077, p<.05, βNON.=.282; zIND.=2.813, EP=.023, p<.05, βNON.=.065)], (ii) da Qualidade do laço emocional na Alienação (negativos e baixo) e, (iii) na Confiança (positivo e baixo) [respectivamente (zTOT.=-3.094, EP=.199, p<.05, βNON.=-.369; zIND.=-3.314, EP=.038, p<.05, βNON.=-.137) e (zTOT.=4.337, EP=.048, p<.05, βNON.=.206; zIND.=3.358, EP=.027, p<.05, βNON.=.092)] e, finalmente (iv), da Inibição da exploração e da individualidade na Alienação (positivo e baixo) [βALI.IEI (z=3.122, EP=.059, p<.05, βNON.=.184; zIND.=3.314, EP=.019, p<.05, βNON.=.064)].

Ainda a propósito da decomposição de efeitos, referem-se ainda os efeitos indirectos (simples), negativo e baixo da Ansiedade de separação na Confiança aos pares (zIND.=-2.670, EP=.016, p<.05, βNON.=-.044) e, do efeito, igualmente negativo e baixo da Inibição da exploração e individualidade na Comunicação (zIND.=-2.737, EP=.012, p<.05, βNON.=-.032); finalmente, da existência de um efeito indirecto, positivo e baixo, da Qualidade do laço emocional na Comunicação aos pares (zIND.=2.742, EP= .025, p<.05, βNON.=.068).

DISCUSSÃO

Os resultados confirmaram as hipóteses levantadas acerca do valor preditivo das dimensões da qualidade de vinculação à mãe, quer na Auto-estima, quer na qualidade relacional com os pares enquanto dimensões de Comunicação, Confiança e Alienação. Confirmaram-se ainda as hipóteses quer da auto-estima enquanto preditor das três dimensões da qualidade da relação com os pares, quer ainda da sua qualidade mediadora na associação entre ambos os contextos relacionais, pese embora com retirada de alguns dos caminhos directos preditos na hipótese inicial.

Destes resultados parece concluir-se que a imagem global que os adolescentes criam de si mesmos pode ter um importante contributo da qualidade da relação de vinculação que constroem com a mãe. Assim, funcionamentos pessoais marcados por Inibição da exploração e individua li dade e pela percepção de uma autonomia deficitária no processo de separação, podem dificultar o processo de desenvolvimento psicossocial dos jovens pela diminuição da Auto-estima. Ao contrário, a Qualidade do laço emocional evidencia um efeito positivo e moderado no desenvol vimento da auto-estima, reforçando a ideia de que na adolescência o “detachment” é apenas aparente, mantendo-se a ligação com a mãe uma fonte relevante de segurança para os jovens.

Os estudos que associam a qualidade de vinculação aos pais com a qualidade relacional com os pares na adolescência apoiam os resultados obtidos relativamente às associações encontradas entre a qualidade da vinculação à mãe e a qualidade de vinculação aos pares (e.g., Nickerson & Nagle, 2005). A Inibição da exploração e individualidade apresenta um efeito directo e negativo, embora baixo, sobre a Confiança e um efeito directo positivo na Alienação. Talvez porque os adolescentes que percebem condicionamentos ao desenvolvimento da sua individualidade na relação com a mãe constroem, potencialmente, imagens internas dos outros enquanto não disponíveis ou inconsistentes na sua prestação de cuidados. Consequentemente, este padrão relacional na relação com a mãe pode enviesar os relacionamentos com pares, pautando-os de emoções de alienação e consequentemente de menor confiança na relação. Por seu turno, a Qualidade do laço emocional tem um efeito directo e positivo na Confiança e negativo na Alienação. Por último, constatou-se que a dimensão de Ansiedade de separação tem um efeito directo e positivo nas dimensões de Alienação e Comunicação, este último resultado, que debateremos em detalhe. Nesta medida, adolescentes que apresentam dificuldades ao nível do processo de separação emocional à mãe, parecem procurar maior apoio no grupo de pares, especialmente no que diz respeito a procura de partilha e reciprocidade (Nickerson & Nagle, 2005; Rocha, 2008). Todavia quando a ansiedade assume contornos mais elevados, o afastamento face ao grupo de pares pode desenvolver-se (Black, 2002). Esta questão deve ser entendida tendo em conta níveis de ansiedade de separação elevados que ultrapassam o limiar de ansiedade necessária e saudável no processo natural de separação-individuação das crianças e jovens. Assim, uma elevada ansiedade de separação remete para níveis de vinculação ansiosa (desenvolvida por sujeitos nos quadrantes preocupados e amedrontados, na concepção prototípica de vinculação de Bartholomew (1990; Bartholomew & Horowitz, 1991) aumentando os valores de Alienação na relação com os pares.

Os efeitos da Auto-estima nas dimensões utilizadas na avaliação da qualidade relacional aos pares, foram, como seria de esperar, positivos, quer na Comunicação, quer na Confiança e negativos relativamente à Alienação. O papel da Auto-estima apresenta-se assim como uma dimensão que claramente potencia ou dificulta o desenvolvimento de relações seguras com os pares. Num período desenvolvimental onde o factor grupo se constituiu como contexto de vida primordial, as construções pessoais de si como merecedor de cuidados e dos outros enquanto bases e portos seguros confiáveis, influenciam sem qualquer dúvida a abordagem relacional dos elementos do bando, os pares.

Valerá a pena discutir, com alguma minúcia, os resultados referentes à propriedade supressora da Qualidade do laço emocional relativamente à associação entre a Ansiedade de separação e Auto-estima. De facto, a estatística permitiu observar o que está subjacente em termos teóricos, de outro modo, uma Qualidade de laço emocional implica de facto uma Ansiedade de separação, já que a operacionalização do laço em termos comportamentais se observa quer no grau de ansiedade nas situações de activação do sistema, quer no recurso a base e porto seguros que da figura o sujeito pessoal realiza. Por isso mesmo o modelo integra a forte associação entre ambos os constructos. Sendo a Auto-estima uma variável que teoricamente se associa à qualidade de vinculação aos pais, desde logo pela imagem internalizada que o sujeito faz de si, mas com certeza da comparação de si que faz com os outros (Bowlby, 1988; Mota, 2008; Rice & Delwo, 2002; Rocha, 2008; Trzesnieeswski e colaboradores, 2004), aguardava-se que o seu papel fosse mediador, isto é, que parte da variância das dimensões da qualidade de vinculação à mãe que explicam a qualidade de vinculação aos pares, seria explicada pela intervenção da Auto-estima. Na predição da Auto-estima, a Qualidade do laço emocional e a Ansiedade de separação à mãe, introduzidas enquanto variáveis controladas, permitem observar que quanto mais elevada a primeira, maior robusta e positiva a Auto-estima, porém, quanto maior a associação entre ambos os preditores, maior a possibilidade de que a Auto-estima sofra uma influência negativa por parte da Ansiedade de separação, já que, se com níveis elevados, poderá funcionar, não como forma adaptativa do sistema de vinculação, mas sim enquanto “oponente” à criação de uma saudável imagem de si enquanto merecedor(a) de cuidados e carinho. Note-se contudo, que quando os efeitos dos preditores não se encontram controlados, as associações com a Auto-estima são ambas positivas e de magnitude baixa (sem significância no caso da AS). Testa-se assim empiricamente a necessidade de introduzir ambas as variáveis neste tipo de modelos.

Porém, este fenómeno transportou um outro. As associações entre a Ansiedade de separação e a Comunicação na relação com os pares amigos evidenciavam um efeito directo positivo, contudo, um efeito mediado pela Auto-estima, desta feita negativo. A presença de uma qualidade inconsistente da mediação é contudo suportada pelos dados bibliográficos. De facto, o que parece estar a acontecer é que o valor negativo, que acontece pelo somatório dos produtos entre os parâmetros da Auto-estima e AS e da primeira com a Comunicação, aparece como um revisor do valor da variância da AS que de facto explica a Comunicação com os pares. Em termos teóricos, os resultados são indicadores de uma associação entre a vinculação aos pais e a vinculação aos pares (Black, 2002; Carlivati, 2001, 2003; Margolese, Markiewicz, & Doyle, 2005). Deste modo, é uma Ansiedade de separação baixa que parece influenciar significativamente a qualidade da Comunicação aos pares amigos, sendo desvendada a verdadeira magnitude da influência positiva da AS na variável critério da relação com os pares. A leitura teórica é por isso realizada com base na premissa de que quanto mais elevada a AS, menor o sentido pessoal de valência, e assim sendo, mantendo os níveis de Ansiedade e separação na relação com a mãe a um nível baixo embora significativo, maior a possibilidade de que o sujeito psicológico aborde com segurança o contexto relacional com os pares, no que respeita à qualidade e extensão da comunicação.

Além destes efeitos mais complexos, a Auto-estima parece ainda mediar parcialmente as associações entre, (i) Inibição da exploração e individualidade e os critérios Confiança e Alienação, (ii) Qualidade do laço emocional e os critérios Confiança e Alienação e, (iii) Ansiedade de separação e Alienação. Parece-nos importante referir a importância de cada preditor dos valores da qualidade relacional com pares nesta equação, i.e., dado que as mediações encontradas são parciais, a retirada ou do mediador ou do preditor não se adequa à realidade dos dados. De outro modo ainda, no contexto desenvolvimental da adolescência (e nos que lhe sobrevêm, cremos) quer a vinculação à mãe, quer a Auto-estima têm o seu próprio papel não sendo possível dissociar uma ou outra dos modelos pessoais de desenvolvimento. De acordo com os nossos resultados estão os de Huntsinger e Luecken (2004), sugerindo que a auto-estima pode funcionar enquanto mediador entre a qualidade da vinculação aos pais e os comportamentos saudáveis dos jovens, e de Rocha (2008) que observou este efeito mediador quer na associação qualidade de vinculação ao pai, quer à mãe e qualidade relacional com os pares.

Limitações e pistas para futuras investigações

Embora os resultados obtidos neste estudo tenham trazido um contributo, que cremos relevante para futuras investigações, o seu desenho transversal não permite o acesso à compreensão de processos psicológicos que lhe estão subjacentes, o que se constitui numa óbvia limitação.

No entanto, de novo foram encontrados resultados que permitem confirmar a consistência na associação entre a qualidade de vinculação aos pais, neste caso à mãe, e a vinculação aos pares, contribuindo para o alargamento teórico da vinculação na adolescência. Mais ainda, a observação teórica da Auto-estima enquanto variável que se desenvolve face à relação parental e por sua vez é também ela capaz de influenciar a qualidade das relações com os pares, alarga o campo de pesquisa da auto-estima sob o ponto de vista da vinculação.

Uma das questões aberta com este trabalho, e que deverá ser explorada em futuros trabalhos, é da réplica dos interessantes resultados acerca da supressão e da mediação inconsistente. Além de permitir retirar ilações interessantíssimas acerca da necessidade de integrar nos estudos as dimensões ou variáveis que teoricamente devem aparecer conjuntamente como preditoras, sob pena do mascarar dos reais efeitos dos preditores sobre os critérios, permite ainda defender a análise cuidada da decomposição de efeitos como forma de compreensão do real, tantas vezes descurada nos estudos empíricos porque de algum modo desvalorizada (vide Kenny, 2008; MacKinnon, Krull, & Lockwood, 2000; MacKinnon et al., 2007; Maassen & Bakker, 2001; Paulhos et al., 2004).

Por último, uma réplica deste estudo com os dados relativos ao pai resultaria numa imagem mais completa das associações entre vinculação a pais e pares e auto-estima. A figura paterna é na teoria da vinculação, muitas vezes “esquecida” (Rocha, 2008). Seria impossível testar num modelo as associações entre ambos os contextos relacionais com pais e as restantes variáveis preditoras e critério, já que as questões da multicolineriedade e da parcimónia se colocam (Hair, Anderson, Tatham, & Black, 1998), no entanto, em futuros estudos esta será uma análise que se pretende efectuar.

 

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Correspondência

A correspondência relativa a este artigo deverá ser enviada para: Magda Rocha, Investigadora do Centro de Estud os em Gestão e Economia, Faculdade de Economia e Gestão, Centro Regional do Porto, Pólo da Foz, Rua Diogo Botelho, 1327, 4169-005 Porto. E-mail: psi.magdarocha@gmail.com

Trabalho realizado no âmbito do projecto da Fundação para a Ciência e Tecnologia- PTDC/PSI/65416/2006.

 

NOTAS

1No original, “nested model”.

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