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Análise Psicológica

versão impressa ISSN 0870-8231

Aná. Psicológica v.27 n.4 Lisboa out. 2009

 

Sindicato Nacional dos Psicólogos: Um caso de mudança

Marco Pinto Barreiros(*)

Patrícia Jardim da Palma (*)

RESUMO

O presente estudo procura analisar de que forma foi o Sindicato Nacional dos Psicólogos influenciado, a nível organizacional, pelos factores que potenciaram os principais momentos de mudança ocorridos ao longo da sua história. O objectivo central do trabalho é descrever um traçado histórico da instituição, centrado nos seus principais momentos de mudança. Ao nível bibliográfico, o estudo apresenta o seu contributo no seu contexto específico, ou seja, descrevendo a história da instituição, sob o ponto de vista de um fenómeno organizacional – a mudança. Inerente ao objectivo, surgiu a necessidade de identificar a fase do ciclo de vida organizacional em que se encontra o SNP, de acordo com o modelo de Hisrich e Peters (2002). Este é um estudo de caso de carácter essencialmente descritivo. Com base em dados recolhidos a partir de entrevistas, documentos de arquivo e outra documentação, concluiu-se que a história do SNP se centra em sete momentos essenciais, encontrando-se a instituição, no presente, numa fase de renascimento, ou mesmo numa nova fase de crescimento, de acordo com o referido modelo.

Palavras chave: Estudo de caso, Mudança organizacional, Sindicato Nacional dos Psicólogos.

 

ABSTRACT

This study aims to analyze how the Portuguese National Union of Psychologists (Sindicato Nacional dos Psicólogos) has been influenced in organizational terms by the factors that have brought about the principal changes in its history. The central aim of the study is to provide a historical outline of the institution’s history, focused on its principal moments of change. By doing so, the study accomplishes it’s theoretical contribute by analyzing the history of the institution from an organizational phenomenon’s point of view – change. Inherent to completing this central aim was the need to identify which organizational life-cycle phase the SNP is currently in, as per the Hisrich and Peters model (2002). This case study is, primarily, descriptive in nature. Based on data collected from oral interviews, archives and other documentation, the study concludes that the history of the SNP has been influenced by seven key moments, and that in terms of the above-mentioned model, the institution is currently in a rebirth phase, or possibly even in a new growth phase.

Key words: Case study, National Union of Psychologists, Organizational change.

 

 

INTRODUÇÃO

O presente artigo constitui um estudo de caso do Sindicato Nacional dos Psicólogos portugueses, abordando a sua história, do ponto de vista de fenómenos organizacionais, como a mudança ou o ciclo de vida organizacional. Assim, foi elaborado um estudo de carácter descritivo, dado o contexto específico no qual foi efectuado e dada a existência de escassos estudos de cariz semelhante. Desta forma, não foram estabelecidas quaisquer hipóteses, tendo os fenómenos emergido no decorrer da realização do estudo.

O presente estudo revela-se pertinente na medida em que pretende analisar os principais momentos de mudança ocorridos ao longo da história da instituição. Esta análise permitirá ao Sindicato Nacional dos Psicólogos possuir, do ponto de vista organizacional e, mais concretamente, da mudança, uma visão da sua história. O estudo justifica-se, também, pelo facto de abordar uma ONG que não tinha ainda sido alvo de qualquer estudo, acrescentando algumas conclusões a um sector específico, inserido nas temáticas das mudanças e do ciclo de vida das organizações. De um modo mais específico, o estudo descreve a história da instituição, sob o ponto de vista de um fenómeno organizacional – a mudança, apresentando, assim, o seu contributo para o conhecimento teórico. Esta especificidade permite o seu encaixe na literatura existente na temática da mudança e do ciclo de vida organizacional na qual, aliás, se sustenta. Neste âmbito, a descrição do ciclo de vida de uma ONG sob o ponto de vista da mudança organizacional representa uma perspectiva inovadora.

MUDANÇA ORGANIZACIONAL

Na sociedade pós-capitalista, a mudança passou a fazer parte da vida das organizações. As mudanças organizacionais podem estar associadas a uma multiplicidade de objectivos. Em função do objectivo proposto, também varia o nível ao qual a mudança é implementada (Tosi & Carroll, 1982). Desta forma, mudanças ao nível individual encontramse habitualmente associadas a aquisição de competências ou adopção de determinados comportamentos. Mudanças ao nível grupal visam a promoção de competitividade interna ou o aumento dos índices de cooperação e, quando o objectivo se prende com questões tão abrangentes como os valores ou a cultura organizacional, verifica-se, necessariamente, a intervenção ao nível da organização.

Importa esclarecer que os níveis de mudança não são estanques, sendo que uma mudança num nível mais abrangente obrigará, muito provavelmente, a mudanças nos níveis que o antecedem. Aliás, de acordo com Caetano (2001), a intervenção ao nível individual é mesmo essencial, quando os objectivos passam por aumentos de produtividade. O mesmo nível de intervenção é, também, defendido por Cummings, Mohrman, Mohrman, e Ledford (1985), autores que preconizam que uma das funções da organização é a promoção de determinados padrões de comportamento.

Segundo Caetano (2001), o conceito de mudança organizacional representa as diferenças possíveis de verificar, ao longo do tempo, em diversas dimensões de uma organização, através da análise dessas dimensões em momentos ou períodos distintos da sua existência. Já para Van de Ven e Poole (1995, p. 516), o conceito traduz-se por uma sequência repetitiva de formulação, implementação, avaliação e modificação dos objectivos, com base naquilo que foi aprendido ou desejado pela organização”. Tendo sido alvo de várias concepções teóricas, importará salientar a de Kurt Lewin (1951), que definiu o modelo “Descongelamento, mudança e recongelamento”. Para o autor, a insatisfação face ao estado de uma organização, ostentada por elementos desafiantes, portadores de informação recolhida no exterior, conduz ao enfraquecimento do sistema de valores da organização, bem como de todos os outros factores que contribuem para a manutenção do “status quo”. Mecanismos como a desconfirmação, a indução de culpa e a criação de segurança psicológica, definidos por Schein (1982), poderão estar associados a este processo. A condução do processo de mudança chega então à segunda fase, verificando-se a implementação de novos valores, comportamentos e atitudes. Por fim, o recongelamento corresponde a uma fase de estabilização das mudanças introduzidas, através da generalização de procedimentos e aprendizagens implicados pela mudança. Porras e Silvers (1991) adoptam uma visão substancialmente diferente, ao definirem um modelo de mudança planeada que assume o conceito de mudança organizacional enquanto resposta a um estímulo ambiental relevante. Para os autores, existem dois níveis de intervenção num processo de mudança organizacional: um mais abrangente, transformação organizacional; e um menos abrangente, desenvolvimento organizacional. Este último corresponde a um modelo de mudança mais tradicional, até há pouco considerado sinónimo de mudança planeada. O primeiro, transformação organizacional, assume proporções diferentes, podendo incluir, de acordo com os autores, a própria visão da organização.

A mudança organizacional é influenciada por factores como a relação com a envolvente, a dinâmica das unidades que constituem a organização e as relações estabelecidas entre essas unidades, bem como processos políticos associados a lutas pelo poder ou pela representatividade ou ainda pelos recursos organizacionais (Kanter, 1992). Para Lawrence (1998), e neste mesmo contexto, mudar uma organização implica, necessariamente, mudar as pessoas e as relações entre si estabelecidas.

Tipos de mudança organizacional

Porras e Robertson (1994), definem a tipologia das mudanças organizacionais de acordo com dois vectores: a abrangência da mudança e o facto de ser planeada ou não.

De acordo com a Figura 1, verifica-se que os autores postulam quatro classificações possíveis para as mudanças organizacionais: incremental, evolucionária, transformacional e revolucionária. Esta classificação resulta da colocação da mudança nos dois factores de análise acima referidos. Assim, uma mudança organizacional de primeira ordem planeada denomina-se incremental, uma mudança organizacional de segunda ordem planeada designa-se transformacional, uma mudança de primeira ordem não planeada denomina-se evolucionária e uma mudança de segunda ordem não planeada designa-se revolucionária. Será importante referir que as mudanças de segunda ordem implicam uma maior abrangência do que as mudanças de primeira ordem. De acordo com os autores, as mudanças de primeira ordem influenciam, essencialmente, os níveis pessoal e grupal da organização, num impacto reduzido da perspectiva organizacional, sendo que as mudanças de segunda ordem se aplicam a níveis funcionais mais abrangentes, incluindo o organizacional, fazendo sentir os seus efeitos de uma forma inequívoca.

 

FIGURA 1

Classificação das mudanças organizacionais (adaptado de Porras e Robertson, 1994)

 

Apesar de classificadas de formas diferentes, as mudanças organizacionais não deverão ser perspectivadas como fenómenos isolados, totalmente independentes de mudanças de outro tipo. Aliás, a teoria do equilíbrio pontuado (Abernathy & Utterback, 1978; Gersick, 1988; Tushman & Rosenkopf, 1992; Tushman e Anderson, 1986; Tushman & Romanelli, 1985) defende mesmo que as mudanças radicais ocorrem no culminar de um período bastante rico em mudanças incrementais, marcando, normalmente, o início de um novo ciclo organizacional. O equilíbrio deste ciclo organizacional é novamente garantido a partir de pequenas mudanças incrementais, que visam a adaptação da organização à envolvente. Brown e Eisenhardt (1997) adoptam uma perspectiva diferente, propondo um modelo de mudança contínua, de acordo com o qual as organizações podem iniciar um processo de mudança rápida e constante, através, por exemplo, da criação e lançamento de novos produtos, num esforço de adaptação que se pretende eficaz.

Tratando-se de entidades constantemente expostas ao meio que as rodeia, e em permanente interacção com o mesmo, os processos de mudança organizacional são influenciados por diversos factores, de naturezas variadas. Assim, impõe-se uma análise mais cuidada dos mesmos.

Factores de mudança e obstáculos à mesma

Kanter (1983) define cinco factores de mudança essenciais: desvios da tradição, que podem resultar de acasos, através da introdução de pequenas variações num processo habitual, variações essas que passam a constituir uma base experimental; eventos críticos ou encorajadores, de natureza externa, que requerem uma resposta rápida por parte da organização; decisões estratégicas, tomadas com o objectivo de lidar com os factores acima descritos; impulsionadores individuais, que implementam e motivam a implementação das decisões tomadas; e veículos de acção, que constituem os mecanismos de comunicação de processos, ao alcance da organização. Num processo de mudança, uma organização deverá contar com todos estes factores o que, a acontecer, redundará na “instituição da inovação”. Também a cultura é apontada como factor de mudança. Para Schein (1990), a cultura é perpetuada através de processos de socialização, auxiliando a organização a manter os comportamentos e atitudes desejados, eliminando os restantes. Curioso é verificar que o mesmo autor define o mesmo factor como um obstáculo poderoso aos processos de mudança organizacional. Este construto degenera frequentemente em resistência à mudança chegando, frequentemente, a impossibilitá-la. Muitos autores se debruçaram sobre esta temática, tendo, por exemplo, autores como Hannan, Pólos, e Carroll (2003) identificado a opacidade e a aspereza, suportados no conceito de arquitectura organizacional. Já Cunha, Rego, Cunha, e Cabral-Cardoso (2004) apresentaram factores como a resistência à mudança e as relações de poder.

Todos os factores referidos podem assumir grande importância no processo de análise do papel de uma mudança no ciclo de vida de uma organização. Esta integração é fulcral para a realização do presente estudo, dado o carácter dos seus objectivos.

A ABORDAGEM DO CICLO DE VIDA ORGANIZACIONAL

A perspectiva de Hisrich e Peters

Uma das abordagens que mais atenção merece na realização do presente estudo é a abordagem do ciclo de vida. Van de Ven e Poole (1995, citados por Caetano, 2001), definem esta interpretação teórica através da metáfora orgânica, metáfora a partir da qual surge o conceito ciclo de vida. Assim, considera-se que as organizações atravessam um ciclo de vida, que implica diversas fases: criação, crescimento, maturação e declínio. Esta não é, no entanto, a única forma de materializar o ciclo de vida de uma organização, como se pode verificar a partir da observação da Figura 2:

 

FIGURA 2

Ciclo de vida de uma organização (adaptado de Hisrich e Peters, 2002)

 

Através da análise da Figura 2, verifica-se que a perspectiva de Hisrich e Peters (2002) é ligeiramente diferente. Estes autores concebem um ciclo de vida constituído por quatro momentos principais: a criação, o início do crescimento, o crescimento acelerado e maturação. Na fase denominada criação, que, de acordo com os autores, pode durar entre cinco a sete anos, o crescimento é relativamente reduzido. O pouco crescimento da organização nesta fase encontra-se associado às dificuldades naturais que qualquer organização encontra na definição inicial da sua estratégia e na sua implementação no sector de mercado em que se situa. Dever-se-ão ter em consideração todos os obstáculos colocados, tanto a nível financeiro como logístico, a uma organização nos primeiros anos da sua existência.

Seguidamente, surge a fase que os autores intitulam início do crescimento. Segundo os mesmos, esta fase poder-se-á estender por mais cinco anos e representa o momento em que a organização, depois de garantir uma posição tão segura quanto possível, arranca para um período relativamente próspero da sua existência. Aqui, verifica-se já uma definição estratégica relativamente segura que perspectiva a obtenção do visado sucesso. Numa terceira fase, denominada fase do crescimento acelerado, a linha estratégica adoptada recolhe os seus resultados. É nesta fase que a organização mais prospera, evidenciando um crescimento que nunca antes se tinha verificado neste ciclo. Finalmente, a organização atinge a fase de maturação. Neste período verifica-se uma estagnação no que diz respeito ao rendimento da organização (é importante considerar que o sucesso de diferentes organizações se afere através de indicadores também eles diferentes), sendo que o futuro da organização vai depender da sua capacidade de se rejuvenescer, adaptar e entrar de novo numa fase de grande prosperidade. Perspectivam-se, então, duas alternativas para a organização: pode não revelar qualquer tipo de mecanismo adaptativo e continuar na fase de maturação, que, inevitavelmente, degenera num período de declínio no que concerne a produtividade organizacional, podendo inclusivamente conduzir a organização ao seu fim ou, por outro lado, pode encetar processos de mudança adaptativos, que lhe permitam reforçar a sua capacidade competitiva. Se este for o percurso trilhado, a organização terá a capacidade de se rejuvenescer, o que a conduz a uma nova fase de crescimento acelerado (Hisrich & Peters, 2002). Deduz-se, deste modo, que, a partir de um determinado momento da sua existência, depois de sobreviverem à fase da criação e de se estabelecerem no mercado, as organizações são continuamente forçadas a revelar mecanismos de mudança evolutivos, que lhes permitam acompanhar o ambiente competitivo apresentado pela envolvente.

Apesar de se verificarem algumas diferenças, o modelo de Hisrich e Peters muito tem a ver com o modelo de Van de Ven e Poole (1995, citados por Caetano, 2001). Assim, os últimos assumem também um modelo caracterizado por quatro fases, tal como referido anteriormente: criação, crescimento, maturação e declínio. Desta forma, os autores definem a criação tal como Hisrich e Peters o fazem, sendo a descrição do crescimento também ela idêntica. As principais diferenças ocorrem a partir da definição da terceira fase. Para Van de Ven e Poole, o crescimento representa apenas uma fase, seguida imediatamente pela maturação e, posteriormente pelo declínio. A fase de maturação descrita pelos autores é idêntica à fase com o mesmo nome no modelo de Hisrich e Peters. No entanto, no modelo destes últimos, esta fase é apenas a quarta.

Têm sido conduzidos, ao longo das últimas décadas, estudos que aplicam o paradigma do ciclo de vida organizacional a organizações de grandes dimensões, de carácter lucrativo. Tem sido essa, aliás, a pedra angular da construção de praticamente toda a bibliografia que foca esta temática. Deste facto são exemplos estudos como o de Kallunki e Silvola (2006), que abordou questões relacionadas com o ciclo de vida organizacional em 105 empresas finlandesas. É neste particular que o presente estudo se destaca dos demais, ao procurar aplicar esse mesmo paradigma a uma organização sem fins lucrativos, a um Sindicato, nomeadamente, ao Sindicato Nacional dos Psicólogos Portugueses.

ORGANIZAÇÕES SEM FINS LUCRATIVOS

De acordo com Barros (1997), as organizações sem fins lucrativos apresentam, do ponto de vista económico, uma série de características distintivas. Assim, existe um factor que define todas essas características. Segundo o autor, este reside no facto de não se verificar distribuição de lucros gerados pela actividade e por uma actividade conducente ao bem-estar social, sendo a oferta, portanto, definida por serviços e bens semi-públicos ou semi-privados. Este sector acaba, então por se situar entre os sectores público e privado, numa posição particularmente vantajosa para desenvolver actividades outrora da responsabilidade do Estado. Para Drucker (1990), a característica essencial das organizações em fins lucrativos é a missão, o cumprimento dos seus objectivos, sendo que estes deverão ser actualizados com a regularidade exigida pela situação. Como exemplo, o autor apresenta a instituição escolar, que se encontra em profunda crise pelo facto de não ter actualizado a sua missão primordial: massificar a frequência escolar entre os jovens. Apresenta-se, a seguir, uma definição internacional do Sector Não Lucrativo, de acordo com Salomon e Anheier (1992):

 

FIGURA 3

Classificação internacional do sector não lucrativo (adaptado de Salomon e Anheier, 1992)

 

Diversos autores propuseram modelos teóricos acerca da função económica das organizações sem fins lucrativos e os traços enumerados com maior frequência prendiam-se com a maior fiabilidade apresentada por estas organizações, pelo facto de não procurarem o lucro, com o preenchimento de necessidades específicas não cobertas pelo sector público e com a desigualdade sócio-económica, factor este que contribui para o aumento da importância das organizações sem fins lucrativos. Estes traços emergem das teorias propostas por Weisbrod (1988), por exemplo.

O presente trabalho incide sobre o Sindicato Nacional dos Psicólogos, uma organização que, em concordância com Salomon e Anheier (1992), está inserida no grupo 10.

Apresentou-se, assim, como um desafio abordar uma organização que se enquadra neste perfil de acordo com os paradigmas teóricos acima apresentados. Desta forma, aplicaram-se ao Sindicato Nacional dos Psicólogos modelos relevantes para as temáticas de mudança e de ciclo de vida organizacional, de acordo com os objectivos a seguir expostos.

OBJECTIVOS DO ESTUDO

O presente estudo apresenta um objectivo essencial: descrever o traçado histórico do Sindicato Nacional dos Psicólogos, tendo por base os principais momentos de mudança ocorridos ao longo da existência da instituição. Este objectivo, para além de uma contextualização do Sindicato, permite ainda uma análise com vista a hipotetizar acerca dos factores que poderão ter potenciado os referidos momentos de mudança. De modo a alcançar este objectivo, identificou-se a necessidade de verificar em que fase do ciclo de vida organizacional se encontra o Sindicato, o que representa ainda uma possibilidade de projectar o futuro da instituição, tendo por base o modelo de ciclo de vida adoptado para a realização do presente estudo (modelo de Hisrich & Peters, 2002). Para o cumprimento deste objectivo torna-se importante não só o referido modelo, mas também os modelos teóricos associados à temática da mudança organizacional, citados no capítulo respectivo. Ao nível teórico, pretendeu-se que o presente artigo apresentasse o seu contributo descrevendo a história da instituição sob o ponto de vista de um fenómeno organizacional – a mudança.

MÉTODO

Delineamento

O presente trabalho constitui um estudo de caso de carácter descritivo. De acordo com Yin (2001), o estudo de caso é a estratégia mais adequada a adoptar quando se verifica um controlo reduzido sobre os eventos e os fenómenos abordados, ou seja, quando a evolução das variáveis estudadas é independente da acção do investigador, o que se verifica no presente trabalho. Assim, “o estudo de caso permite uma investigação para se preservar as características holísticas e significativas dos eventos da vida real” (Yin, 2001). Podendo também adquirir um carácter explicativo, o presente estudo serviu-se, de forma mais insistente, das suas vertentes descritiva e exploratória. Será importante considerar, também, que, de acordo com Platt (1992), o estudo de caso é uma ferramenta exclusivamente exploratória, não podendo ser utilizada para a confirmação ou infirmação de hipóteses. Ultrapassando a simples análise histórica, o estudo de caso permite associar evidências provenientes de múltiplas origens, examinando comportamentos contemporâneos e dados históricos, sempre sem controlo sobre os comportamentos relevantes. Segundo Schramm (1971, 21), “a principal tendência em todos os tipos de estudos de caso, é que tenta esclarecer uma decisão ou um conjunto de decisões: o motivo pelo qual foram tomadas, como foram implementadas e com que resultados”. Esta perspectiva introduz o tópico da decisão e da análise dos resultados da sua implementação, o que se pode tornar relevante num estudo que versa processos de mudança organizacional. Esta estratégia de investigação não é, no entanto, resumível a este factor. Dado o seu carácter abrangente (não se limita a um simples levantamento de dados), permite investigar um ou mais fenómenos inseridos no seu contexto da vida real, ainda que a fronteira entre aqueles e esta não esteja claramente definida. De acordo com os critérios definidos pelo autor, o presente trabalho constituirá um estudo de caso único e holístico pois, por um lado, a temática específica foi raramente estudada, sendo o estudo, por si só, suficiente para responder à questão colocada e, pelo outro, atentará na natureza global da organização.

Ainda segundo Yin (2001), para a correcta realização de um estudo de caso concorrem vários factores (e não necessariamente pela ordem apresentada). O primeiro prende-se com as qualidades que o estudo deverá apresentar: validade de constructo, que deverá ser assegurada através da utilização de múltiplas fontes ao longo da realização do trabalho (no presente estudo, foram entrevistados diversos sujeitos, cuja informação facultada foi cruzada com os resultados de uma análise documental); a validade interna, que neste caso é dispensável pois o estudo assume um carácter essencialmente descritivo/exploratório; a validade externa, na qual a generalização efectuada não é estatística, mas sim teórica, através da integração da informação num determinado modelo (neste caso particular, consideram-se modelos inseridos nas temáticas da mudança organizacional e no ciclo de vida organizacional); e a replicabilidade, garantida através do desenvolvimento de um sistema de anotação das fontes e documentações consultadas. Seguidamente, importa atentar também nas características do investigador que, de acordo com o autor, deverá fazer boas perguntas, ser bom ouvinte, revelar-se adaptável e flexível, ter uma noção clara das questões em estudo e ser imparcial face a noções pré-concebidas, por exemplo, a nível teórico.

Igualmente importante na elaboração de um estudo de caso é a consulta de várias fontes de evidências. Das apontadas por Yin (2001), recorreu-se a três durante a realização do presente estudo: realização de entrevistas, consulta de arquivos e análise documental. Neste último caso, utilizou-se a documentação colocada à disposição pelo SNP.

O trabalho conta com a realização de três fases, inteiramente qualitativas, de recolha de dados. A primeira implica a aplicação do primeiro guião de entrevista (guião I), a segunda constitui-se como uma fase de análise documental, ficando a aplicação do segundo guião de entrevista (guião II) destinada à terceira fase de recolha de dados.

Amostra

1ª Fase de recolha de dados: amostra constituída por quatro participantes associados, em diferentes momentos históricos, ao Sindicato Nacional dos Psicólogos. Os participantes apresentam idades compreendidas entre os 45 e os 75 anos, possuindo habilitações literárias, pelo menos, ao nível do Mestrado em Psicologia, sendo que a maioria possui Doutoramento, encontrando-se ligada a funções de docência universitária.

3ª Fase de recolha de dados: amostra igualmente constituída por quatro participantes (dois deles já entrevistados na primeira fase de recolha de dados) associados, também, à Direcção do Sindicato, em diferentes momentos da sua história. Mais uma vez, os participantes apresentam idades compreendidas entre os 45 e os 75 anos, possuindo habilitações, pelo menos, ao nível do Mestrado em Psicologia, sendo que a maioria possui Doutoramento, encontrando-se ligada a funções de docência universitária.

Instrumentos

Foram utilizados dois guiões de entrevista, um preliminar, e um segundo, bem como todo o material colocado à disposição pelo Sindicato Nacional dos Psicólogos, como por exemplo, arquivos históricos, actas de reuniões, documentações estatutárias ou relatórios de congressos e encontros nacionais promovidos pela referida instituição. Na Tabela 1 encontram-se os objectivos e fontes utilizadas para a construção dos guiões de entrevista:

 

TABELA 1

Objectivos e fontes utilizadas para a construção dos guiões de entrevista

 

Procedimento

Numa primeira fase, foram efectuadas quatro entrevistas preliminares, cuja análise de conteúdo revelou os principais momentos de mudança ao longo da história do Sindicato Nacional dos Psicólogos. Seguidamente, procedeu-se à análise de toda a documentação colocada à disposição pelo Sindicato, através da qual se esperava, por um lado, a obtenção de dados relevantes para a construção do guião de entrevista a ser aplicado aos elementos constituintes da amostra e, pelo outro, uma sistematização histórica centrada nos referidos momentos de mudança organizacional. A partir deste ponto, foi efectuado um cruzamento entre a informação fornecida pela documentação disponibilizada e os dados obtidos por meio das entrevistas, efectuando-se uma análise de conteúdo, da qual foram extraídos os resultados do estudo.

Os contactos para as entrevistas foram efectuados por via telefónica, com o apoio de um actual dirigente do Sindicato, ligado à história do mesmo desde a sua criação. As entrevistas, de tipo semi-directivo, foram efectuadas nos consultórios privados ou nos domicílios dos participantes, tendo-se recorrido a um gravador para efectuar a gravação da entrevista, gravação essa previamente autorizada pelos participantes. Procedeu-se, seguidamente, à transcrição das entrevistas e respectiva análise, tendo por base o modelo proposto por Huberman e Miles (1994).

De acordo com os referidos autores, para quem este tipo de investigação qualitativa constitui um trabalho de natureza criativa, subjectiva e não padronizada, verificam-se vários passos no decorrer de uma análise deste género. Assim, o primeiro deles é a identificação de conteúdos que apresentem semelhanças entre si, conteúdos que possam ser agrupados. Posteriormente, e como resultado desta distinção, surge um momento de codificação, materializado na definição de categorias mais amplas a nível conceptual, que abrangem os conteúdos semelhantes entre si. É, neste momento, importante referir que os conteúdos apresentados foram fracturados e isolados do contexto em que se encontravam no texto original. Após o agrupamento e codificação em categorias, procede-se a uma contabilização dos conteúdos agrupados, após a qual se segue um novo período de diferenciação. Nesta fase, verifica-se uma análise mais cuidada dos conteúdos de cada categoria, o que permite, normalmente, a formação de sub-categorias. Ainda segundo Huberman e Miles (1994), um novo período de codificação deve estar inerente ao processo de organização lógica dos dados. Através desta organização lógica, os dados tornam-se mais facilmente compreensíveis e, para além disso, relacionáveis com a literatura. Foi precisamente este o processo levado a cabo no decorrer do presente estudo, aquando da sistematização e análise dos resultados provenientes das entrevistas efectuadas.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

A organização

A colocação da descrição da organização na secção destinada aos resultados e discussão do presente estudo justifica-se através de um único facto: a caracterização da organização foi, com efeito, um dos resultados do trabalho, pois não existia qualquer forma de descrição pormenorizada a priori. Desta forma, as duas primeiras fases da metodologia, correspondentes à aplicação de um guião de entrevista e à consulta de documentação histórica colocada à disposição pelo Sindicato Nacional dos Psicólogos serviram, essencialmente, para caracterizar a referida instituição, sob a perspectiva histórica e funcional, isto é, permitiram uma análise útil para o presente estudo (tanto através da caracterização da organização como no precioso auxílio na definição do ciclo de vida da mesma) de acordo com pontos de vista diversos.

Assim, o contexto sócio-político aquando do aparecimento do Sindicato Nacional dos Psicólogos, em 1972, foi descrito como turbulento, dada a iminência de uma revolução em Portugal e da mudança de regime político, ambiente este aliado a um estado praticamente embrionário da Psicologia em Portugal, que não era, ainda, vista como uma ciência independente. Deste modo, a instituição acaba por surgir enquanto aglutinadora e defensora da classe, na perspectiva de ser formada, em Portugal, uma verdadeira comunidade científica de Psicologia. A organização passou, ao longo da sua história, por períodos turbulentos e por períodos prósperos, cuja sucessão será abordada, com maior detalhe, adiante. Foram aprovados Estatutos em três ocasiões: 1972, 1975 e 1981. Estas datas são coincidentes com alguns dos momentos identificados por este estudo como momentos marcantes na história da instituição, o que, por si só, constitui um dado de análise relevante. Assim, e numa leitura mais próxima destes três momentos, verifica-se a preocupação do Sindicato em definir os seus objectivos e o seu âmbito de actuação, bem como os critérios de aceitação de novos sócios, de acordo com a situação na qual se encontrava envolvido. Este factor é coerente com os resultados obtidos, que apontam para causas maioritariamente externas, no respeitante à ocorrência dos principais momentos de mudança da história da organização.

Concluiu-se que as principais diferenças verificadas, no que diz respeito aos objectivos do Sindicato Nacional dos Psicólogos, são introduzidas pela aprovação dos Estatutos em 1975, facto que se deverá, muito provavelmente, ao ambiente sócio-político vigente no país nessa data. Assim, nesta altura, são introduzidos nos objectivos da instituição conceitos como solidariedade ou reivindicações colectivas. Ganha também peso o carácter associativo do Sindicato, ao assumir-se, em definitivo, como um instrumento de representação e defesa da classe trabalhadora. Em contrapartida, desaparecem as funções políticas anteriormente atribuídas aos organismos corporativos, e perdem também relevo os pareceres emitidos por solicitação do Estado, pelo que o Sindicato Nacional dos Psicólogos deixa de ser, a partir deste momento, um organismo de controlo dos profissionais que representa. Para além destes objectivos principais, dos Estatutos aprovados em 1975 constam ainda competências de carácter claramente laboral, como a fiscalização e reclamação da aplicação de leis e convenções colectivas de trabalho, a intervenção nos processos disciplinares instaurados aos associados pelas entidades patronais, a intervenção em caso de despedimento e a prestação de assistência sindical, através de apoio sindical ou outro que se considere pertinente, nos casos de conflitos resultantes de relações de trabalho. O mesmo movimento de libertação e abertura motiva a mudança de designação do Sindicato, que nesta fase se denomina Sindicato Nacional dos Profissionais de Psicologia. Esta mudança é imposta pelo âmbito da instituição. O Sindicato passa a acolher, a partir de 1975, técnicos de orientação profissional e responsáveis pela aplicação de testes psicométricos, bem como todos os diplomados pelo Instituto Superior de Psicologia Aplicada, e não apenas doutores em Filosofia com dissertações elaboradas num ramo da Psicologia, como anteriormente.

As mudanças introduzidas, no capítulo das competências e objectivos do Sindicato Nacional dos Psicólogos, em 1981, são mais subtis. Deste documento fazem parte todos os objectivos aprovados em 1975, sendo feitas algumas introduções, nomeadamente ao nível do acompanhamento dos processos de atribuição de carteira profissional, do controlo deontológico do exercício da profissão e do acompanhamento de carreiras. As grandes alterações são verificadas no que diz respeito àqueles que podiam integrar o Sindicato. O movimento de abertura é ligeiramente corrigido, sendo necessário, para integrar o Sindicato Nacional dos Psicólogos, ter concluído um curso de Psicologia, em Portugal ou no estrangeiro, reconhecido pelo Ministério da Educação. São, então, excluídos os elementos que, até à data, não tivessem concluído uma licenciatura reconhecida em Psicologia. O mesmo não acontece com os profissionais habilitados com licenciatura, que exerceram até 1975. Desta forma, o Sindicato demonstra um carácter mais unitário, não excluindo aqueles que já eram seus associados, seleccionando, no entanto, de uma forma mais rigorosa, o reconhecimento e habilitação profissional de cada psicólogo.

Foram, também, recolhidos dados relativos à evolução do número de sócios do Sindicato ao longo da sua história, apresentando-se os resultados na Tabela 2:

 

TABELA 2

Evolução do número de novos sócios do SNP

 

Através da leitura da Tabela 2, verifica-se que o número de novos sócios do Sindicato iniciou a sua queda no decorrer da década de 80, tendo atingido o seu número mínimo na década de 90: 310. A década de 2000 revela uma inversão desse processo, iniciado há cerca de 20 anos, com o aumento do número de novos sócios para 500. Será importante referir que o primeiro dado, que aponta 688 sócios ao Sindicato na década de 70, se reporta a um período posterior à ocupação de 1975.

História e ciclo de vida

Associada ao cumprimento dos objectivos propostos para o presente estudo, surge a análise dos principais momentos de mudança ocorridos ao longo da história do Sindicato Nacional dos Psicólogos em Portugal. Esta leitura permitirá, como referido anteriormente, efectuar um traçado histórico da instituição, bem como identificar a fase do ciclo de vida das organizações que ela presentemente atravessa. Tais dados revestem-se de grande importância ao nível de uma análise ao futuro próximo do Sindicato. Desta forma, as mudanças encontradas foram classificadas de acordo com o sistema proposto por Porras e Robertson (1994): incremental, evolucionária, transformacional e revolucionária. As duas primeiras constituem mudanças de primeira ordem, sendo que as duas últimas são mudanças de segunda ordem. Após a análise de conteúdo efectuada aos dados fornecidos pelos entrevistados, chegou-se ao seguinte quadro:

Após a recolha e a sistematização dos dados realizada de acordo com a Tabela 3, procedeu-se à selecção, de entre todos os momentos de mudança referidos pelos entrevistados, daqueles considerados principais. Esta selecção teve por base a classificação dos momentos em si, sendo que praticamente todos os seleccionados se constituem como mudanças de segundo grau, de acordo com a classificação proposta por Porras e Robertson (1994) e, também, o contributo de um perito. O perito, actual dirigente do Sindicato Nacional dos Psicólogos, encontra-se ligado à instituição desde a sua génese encontrando-se, desta forma, numa posição privilegiada para validar os momentos de mudança que emergiram como resultados. Assim, este estudo contemplará como os principais momentos de mudança ocorridos ao longo da história do Sindicato Nacional dos Psicólogos, os seguintes: criação do Sindicato Nacional dos Psicólogos, momento que permite definir os estatutos, objectivos e directrizes da organização aquando da sua formação, extremamente importante para compreender todos os processos de mudança posteriormente desenrolados; ocupação do Sindicato Nacional dos Psicólogos, momento que implicou um corte radical com todos os princípios estratégicos e funcionais pelos quais se regia o Sindicato até então e, como tal, de grande importância no contexto deste estudo; as duas mudanças de designação, para Sindicato Nacional dos Profissionais de Psicologia, e o retorno a Sindicato Nacional dos Psicólogos, pois tratam-se de alterações de denominação que implicaram consequências profundas no que diz respeito à estrutura da organização; a adesão à Confederação Geral dos Trabalhadores Portugueses – Intersindical Nacional (CGTP-IN) que, apesar de se tratar de uma mudança de primeira ordem, esteve na origem de alterações de importância ocorridas no decorrer dos anos 80; a perda de atribuição da carteira profissional, que se constitui como um sério revés aos propósitos do Sindicato Nacional dos Psicólogos e a adesão à EFPA (European Federation of Psychologists’ Associations), cuja escolha se justifica pelo início do processo de adaptação às directrizes europeias.

 

TABELA 3

Mudanças ocorridas ao longo da história do Sindicato Nacional dos Psicólogos

 

No caso do presente estudo, estas mudanças assumiram ainda um papel adicional: constituíram elementos de grande importância na caracterização da história do Sindicato Nacional dos Psicólogos, desde o momento da sua fundação, contribuindo, também, para a descrição do ciclo de vida da organização.

Fase do ciclo de vida

De acordo com os resultados obtidos ao longo da realização das três fases que constituíram a metodologia do presente estudo, poder-se-á afirmar que o Sindicato Nacional dos Psicólogos se encontra, actualmente, numa fase de recriação ou renascimento ou, ainda, numa nova fase de crescimento. Esta classificação é feita de acordo com o modelo proposto por Hisrich e Peters (2002), seleccionado pelo facto de ser o mais recente dos modelos apresentados no enquadramento teórico, bem como pela preferência por um modelo que contemple apenas quatro fases. O modelo proposto pelos referidos autores é, então, composto, pelas seguintes fases: criação, início do crescimento, crescimento acelerado e maturação.

Os dados obtidos após a aplicação do segundo guião de entrevista, referentes à categoria denominada adesão à EFPA, demonstram que, neste momento, está assegurada não apenas a sobrevivência do Sindicato, como também um aumento crescente da sua actividade no âmbito das suas funções. Para esta situação contribuem, essencialmente, dois factores: o facto de ser o Sindicato Nacional dos Psicólogos a organização que representa Portugal na EFPA (será importante relembrar que a Federação apenas admite uma associação por país) e a participação portuguesa em comissões de trabalho tão relevantes como a Ética, os Testes e as Psicoterapias. O primeiro factor transforma o Sindicato numa instituição fundamental no capítulo da ligação da prática de Psicologia em Portugal à prática de Psicologia levada a cabo na Europa, representando, desta forma, quaisquer elementos, colectivos ou individuais, que queiram expressar as suas ideias ou sugestões junto da EFPA. O segundo factor, sendo, também ele, veiculado através do SNP, acaba por contribuir no processo de reforço do poder reivindicativo da instituição, no que diz respeito aos padrões de qualidade da prática e do ensino de Psicologia em Portugal.

Para reforçar esta classificação, da análise efectuada aos outputs obtidos a partir do primeiro guião de entrevista aplicado, consta também a referência à adesão à EFPA como um momento de viragem, contemporâneo do início da (lenta) recuperação levada a cabo pelo SNP, depois da grave crise da década de 80.

Assim, e numa perspectiva de caracterização do ciclo de vida organizacional do Sindicato Nacional dos Psicólogos, e ainda de acordo com o modelo proposto por Hisrich e Peters (2002) pode afirmar-se que existe um momento de criação da instituição claramente identificado, tanto a nível documental como pelos entrevistados: 1972. Posteriormente, principalmente após a ocupação do SNP, em 1975, e da sua primeira mudança de designação, ocorrida no mesmo ano, o Sindicato inicia o seu crescimento, tanto a nível do número de sócios, como a nível da intervenção laboral, propondo-se inclusivamente à mediação de conflitos que envolvessem relações de trabalho. O início da década de 80, a segunda mudança de designação e a inversão da evolução do panorama político ocorrida nesta fase mergulham o Sindicato numa grave crise, durante a qual, poderia, inclusivamente, ter fechado as suas portas. Enquadrada no modelo proposto pelos referidos autores, o Sindicato entrava na sua fase de declínio, durante a qual demonstrou pouca disponibilidade para apoiar os seus associados, perdeu um grande número de sócios e o privilégio da atribuição da carteira profissional. Este facto pode ser justificado pela maior exclusividade imposta no Sindicato após a sua segunda mudança de designação, em 1981, e pelo facto de fazer parte da CGTP-IN, associação de sindicatos claramente identificada à esquerda, numa perspectiva política. Assim, o Sindicato foi vítima de uma política anti-sindical generalizada à qual, dada a sua reduzida dimensão, não resistiu. Um terceiro factor que contribuiu para a perda de interesse dos psicólogos no Sindicato que os representava poderá estar associado ao facto do reconhecimento dos cursos de Psicologia nalgumas universidades ter sido já alcan-çado, pelo que, para muitos, o Sindicato tinha já servido o seu propósito. No final da fase de declínio, o Sindicato era uma instituição dificilmente contactável, sem funcionários a tempo inteiro, moribunda, tal como descrita pelos entrevistados. Nesta altura, a defesa dos interesses dos psicólogos estava, na sua maioria, entregue à CGTP.

Foi nesta altura, no final da década de 80, que se esboçou uma reacção, com a adesão à EFPA que, após vários anos de avanços e recuos, acabaria por se revelar frutífera. Este período de forte indefinição poderá ter constituído o início da “recriação” do Sindicato. Actualmente, o Sindicato Nacional dos Psicólogos surge, tal como anteriormente referido, como o elo de ligação de Portugal à Europa, através da sua representação na EFPA, como uma instituição de carácter científico respeitável, atestado pela participação nas comissões de trabalho da Federação Europeia, apresentando-se também como uma organização a tempo inteiro, com funcionários exclusivos, apta à resolução dos problemas da classe profissional que representa e com os seus resultados consolidados. Assim, e segundo o modelo de Hisrich e Peters (2002), o Sindicato Nacional dos Psicólogos exibe, nesta fase, as características típicas de uma organização na sua fase de crescimento. Será importante recordar que, de acordo com os autores, a fase do crescimento se caracteriza pelo seguimento de uma estratégia definida, associando-se a um período próspero da organização, o que está acontecer com o Sindicato Nacional dos Psicólogos, após a adopção de uma estratégia firme de identificação com as estruturas europeias que lhe são correspondentes. Coerentes com a caracterização efectuada, bem como com a descrição das fases feita pelo modelo, são, também, os dados obtidos relativamente à evolução do número de sócios do Sindicato, que desceu no momento de maior crise, entre as décadas de 80 e 90, tendo recuperado, encontrando-se em crescendo, na década de 2000.

Perspectivas futuras

A perspectivação futura da evolução do Sindicato Nacional dos Psicólogos foi efectuada tendo por base o modelo de ciclo de vida organizacional, proposto por Hisrich e Peters (2002). Assim, as características potencialmente exibidas pela organização nos diferentes cenários propostos são as previstas pelo modelo apresenum ponto de sobejo interesse: os factores que contribuíram para a crise dos anos 80 foram essencialmente externos. Uma nova crise, desta natureza, a suceder, ficar-se-ia a dever a factores maioritariamente internos, o que contribui para a caracterização do estado de maior estabilidade atingido pelo Sindicato Nacional dos Psicólogos, cerca de 20 anos volvidos. De qualquer das formas, esta perda de representatividade iria, por sua vez, contribuir para o desinvestimento a realizar à dimensão europeia, entrando o SNP numa espiral de crise que poderia, por seu turno, culminar de dois modos diferentes:

– No primeiro modo, ressurgiriam os mecanismos de mudança adaptativa, esperançosamente a tempo de salvar a instituição, tal como sucedeu na crise ocorrida durante a década de 80. Os mecanismos práticos e estratégicos a implementar são, neste caso, imprevisíveis, pois tudo seria dependente do estado em que a organização se encontrasse, bem como das opções colocadas perante os seus dirigentes. Numa perspectiva teórica, e sempre de acordo com o modelo de Hisrich e Peters (2002), uma estratégia bem sucedida poderia repetir, na continuação do seguimento da lógica proposta pelos autores, o sucesso atingido há cerca de 20 anos, quando se optou pela via europeia. O SNP apareceria numa nova fase de recriação, seguida de reinício do crescimento, culminada por uma fase tão prolongada quanto possível de crescimento acelerado. Recuperaria ao nível do número de novos associados, surgindo com novo vigor nas tarefas reivindicativas que lhe competem. O reconhecimento implícito nestes acontecimentos permitir-lhe-ia recuperar o seu papel na EFPA, enquanto interlocutor privilegiado das preocupações da classe em Portugal

– No segundo modo tudo se manteria de forma idêntica. A perda crescente de representatividade e a diminuição do número de novos sócios mergulharia o Sindicato numa profunda crise, da qual acabaria por não conseguir sair. Terminaria, muito provavelmente, em morte organizacional, apesar desta ser uma fase que não é prevista pelo modelo preferencialmente utilizado no decorrer da realização do presente estudo.

Será de grande importância referir que os cenários apresentados são meras extrapolações feitas com base nos pressupostos do modelo de ciclo de vida organizacional proposto por Hisrich e Peters (2002), não constituindo qualquer tipo de sugestão estratégica endereçada à instituição. Estas extrapolações foram baseadas em dois pilares essenciais: a capacidade ou incapacidade futura do SNP para pôr em prática os mecanismos adaptativos referidos pelos autores no seu modelo; o percurso histórico do Sindicato, tal como analisado no presente trabalho, que demonstra que nas fases em que esses mecanismos foram aplicados, a organização conseguiu crescer, o mesmo não sucedendo quando esses mecanismos se mantiveram inactivos. Esta associação entre o modelo teórico utilizado e os resultados obtidos pelo estudo, que descrevem e analisam a história da instituição, torna plausíveis os cenários apresentados. É, também, importante ter em consideração que as previsões efectuadas assumem a manutenção das condições externas ao Sindicato, insinuando que este se movimentará num ambiente social e organizacional semelhante ao vigente hoje em dia, manutenção essa que poderá não se verificar.

Considera-se, no entanto, de grande pertinência avaliar até que ponto determinadas estratégias poderão ser ou não eficazes no processo de crescimento de uma organização, dado que tal perspectivação pode constituir um ponto de verdadeiro interesse para o tecido organizacional.

Ao nível teórico, o contributo do presente estudo centra-se no facto de descrever o ciclo de vida de uma ONG sob o ponto de vista de um fenómeno organizacional: a mudança. É neste sentido que se insere na literatura existente acerca de mudança e ciclo de vida das organizações.

 

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(*) Instituto Superior de Psicologia Aplicada, Lisboa.

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