SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.28 número1Ideias ortográficas de Madureira Feijó e de Soares Barbosa índice de autoresíndice de assuntosPesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Indicadores

Links relacionados

  • Não possue artigos similaresSimilares em SciELO

Compartilhar


Revista Diacrítica

versão impressa ISSN 0807-8967

Diacrítica vol.28 no.1 Braga  2014

 

RECENSÃO

ALMEIDA, Carla Aurélia de (2012), A Construção da Ordem Interaccional na Rádio: Contributos para uma análise linguística do discurso em interacções verbais.

Com Prefácio do Professor Doutor José Madureira Pinto

Porto, Afrontamento, Biblioteca das Ciências Sociais/Plural, ISBN 978-972-36-1324-7.

M. Emília Pereira*

*Universidade do Minho, Braga, Portugal

memilia@ilch.uminho.pt

 

O campo da análise linguística da fala tem, com Almeida (2012), um contributo académico seguro e autorizado, de que importa, pois, reter conceitos e fazer notar aditamentos no âmbito descritivo específico. O objeto de estudo vem referido como interação, em observância aos estudos de pragmática linguística, sedimentados na academia francesa desde há cerca de três décadas. Estes ter-se-ão também feito herdeiros da tradição etnometodológica americana, donde há que remontar aos anos setenta para identificar publicações de sociologia, antropologia e sociolinguística, como precursoras, competentemente listadas na bibliografia final.

Na medida em que as epígrafes do livro A construção da ordem interacional na rádio: contributos para uma análise linguística do discurso em interações verbais de J.Heritage e I. Hutchby fazem ainda escola na atualidade, pois que encontram eco em manuais e revistas, percebe-se a escolha editorial de forma breve da tese de doutoramento, defendida em 2005. De igual modo que o título e subtítulo da presente edição vinculam a autora ao objeto, tal como perspetivado num determinado tempo que nos é mais ou menos contemporâneo (os dados da interação na rádio tiveram origem num período de 1997 a 2001) e, o que bastante mais importa, a vinculam a um espaço-tempo académico, cumpre reproduzir o subtítulo original, “padrões de organização sequencial, atos e estratégias de discurso, relações interativas e interlocutivas”. Este mais visivelmente dava conta de um trabalho académico de descrição linguística com base no discurso, fala ou interação real pois carreava a terminologia estabelecida no domínio. Passados uns quantos anos (mas, de um tempo académico que se fez de acelerações várias), a linguista inscreve o trabalho na Análise de Discurso, o que fica metodologicamente assente nas páginas iniciais e indiscutível em toda a análise proposta: nos exemplos analisados com os recursos descritivos discursivos e nas conclusões, momento explícito de exposição do que a investigadora visa fazer aceitar aos seus leitores, público especializado, ou informado.

Com o benefício de ter descrito aspetos de natureza fática ou ritual, após o que atinge o cerne da interação levada a cabo, ou encaminhada pelo moderador perante a vontade prévia e deliberada de participar de um dado ouvinte, Carla Almeida identifica estratégias de alinhamento na conversação, o que especifica em fase, sob o termo desenvolvimento. É aí que radica a ordem interacional, «o posicionamento dos interactantes em relação a um tópico específico». Copio um tanto mais, de modo a que a escolha metodológica pela qual a autora conclui fique disponível para discussão ulterior: «Assim, o estudo do modo como se constrói o consenso e o conflito nas interações exige o enfoque analítico não só nas ações discursivas das diferentes intervenções, mas também na gestão das estratégias discursivas desenvolvidas em função das trocas específicas, como as que atendem aos aspetos relacionais/ rituais e que, de um modo geral, dizem respeito ao sistema da delicadeza que visa efeitos relacionais» (sublinhados meus).

Em sintonia com o transcrito e, ainda, com os dois parágrafos em que as citações de autoridade nos fazem perceber uma identidade académica partilhada, pois que a investigadora vem a salientar «a dimensão argumentativo-retórica da linguagem em acção», devo encontrar um espaço, porventura, não cabalmente preenchido no livro. A acomodação intersubjetiva lança desafios que carecem ainda de descrição. Esta tenderá a seguir as vias alternativas, no que apenas ratifica, adicionalmente, aquela aqui explorada. Assim, o que fica de fluxo, ou dinâmica discursiva, dependerá também do que é discutido e não tão visivelmente de indícios deixados pelos sujeitos na interação. Por definição, indícios de natureza interativa ou interacional são marcas de um locutor que se inscreve no seu discurso. Matérias há em que aqueles devem ficar ausentes. I.e., não se definirá toda a interação, se não se contemplar também o que, sendo uma virtualidade, não vem a atualizar-se. Atender, pois, menos ao sujeito – que no limite, nunca se alheia do seu discurso (homo loquens) – e centrar a análise interacional no assunto, na configuração de sentido, no que as línguas naturais especificamente estão orientadas para construir e, adicionalmente, no que um uso diferenciado faz reconhecer é percurso a empreender na mesma área de estudos.