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Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia

versão impressa ISSN 0430-5027

Finisterra  no.112 Lisboa dez. 2019

https://doi.org/10.18055/Finis17838 

ARTIGO ORIGINAL


 

Uma paisagem em mutação: o caso do bairro dos pescadores em Maputo, Moçambique

 

A landscape in mutation: the case of bairro dos pescadores in Maputo, Mozambique

 

Une paysage en mutation: le cas du bairro dos pescadores à Maputo, Mozambique

 

Una paisaje en mutación: el caso del barrio dos pescadores en Maputo, Mozambique

 

 

Ana Beja da Costa1, Sílvia Jorge2

1 Bolseira da Fundação para a Ciência e a Tecnologia (FCT), investigadora no Linking Landscape, Environment, Agriculture And Food (LEAF) do Instituto Superior de Agronomia, Universidade de Lisboa, Tapada da Ajuda, 1349-017, Lisboa, Portugal. E-mail: anabejacosta@gmail.com

2 Investigadora do Centro de Investigação em Arquitectura, Urbanismo e Design, da Faculdade de Arquitectura, Universidade de Lisboa (Portugal). E-mail: aivlisjorge@gmail.com

 

 

RESUMO

A zona costeira de Maputo representa um dos últimos redutos de terra livre na capital moçambicana, ao mesmo tempo que se torna o bastião de uma nova imagem de cidade, inscrita no ideário neoliberal dominante. Na prática, entre propostas e projectos de intervenção diversos, orientados sobretudo para a lógica de mercado, os bairros autoproduzidos vão tecendo um tecido urbano pr óprio, fruto da sobreposição a sistemas da paisagem, nomeadamente dunas e áreas de mangal. Partindo do pressuposto da existência de uma só paisagem, a humanizada e as suas dinâ micas, propõe-se a leitura da zona costeira de Maputo enquanto sistema, tendo em conta os múltiplos factores naturais e sociais que a marcam e as mudanças das suas dinâmicas ao longo das ú ltimas décadas. Com base num trabalho de campo aprofundado, realizado no quadro de uma investigação de doutoramento em curso, caracteriza-se o tecido urbano autoproduzido em áreas ecologicamente vulneráveis, de forma a identificar e melhor compreender as dinâmicas da paisagem, à luz da (auto)produção do espaço. Tomando como caso-estudo o Bairro dos Pescadores, na Costa do Sol, analisa-se a transformação do tecido (auto)produzido e a sua relação com a paisagem a partir do início do novo milénio, acompanhando a consolidação do actual contexto neoliberal. Ao cartografar as interacções estabelecidas entre a expansão e densificação do tecido urbano e a paisagem onde se insere reflectimos sobre a influência dos seus elementos na forma urbana e o significado que adquirem para os moradores.

Palavras-chave: Tecido urbano; bairro autoproduzido; sistemas de paisagem; mangais; Maputo.

 

ABSTRACT

Maputo’s coastal areas represent one of the last vacant land resources in the Mozambican capital, making it the city’s new image stronghold, embedded in the dominant neoliberal ideology. In practice, among various intervention proposals and projects, most of which guided by a market-led logic, these self-produced neighbourhoods are expanding in a very particular way. This process is intrinsically related to its superposition on local landscape systems, namely on dunes and mangrove areas. Considering that there are only humanized landscapes and their dynamics, this research aims to understand the coastal landscape of Maputo as a system that originated from multiple natural and social factors, with shifting dynamics over the past decades. Grounded on recent fieldwork, undertaken as part of ongoing PhD research, this paper aims to portray a self-produced urban tissue in ecologically vulnerable areas, as a means to understand landscape dynamics in the light of space production processes. Taking Bairro dos Pescadores (Fishermen’s Neighbourhood), in Costa do Sol, as a case study, an analysis of the urban tissue is carried out to include the relationship with the natural landscape, starting from the new millennium, along with the establishment of the current neoliberal context. By mapping the interactions between the expansion and densification of the urban tissue and landscape, we reflect upon the influence of these same elements in the form of the neighbourhood and what they mean to its inhabitants.

Keywords: Urban tissue; self-produced neighbourhood; landscape systems; mangroves; Maputo.

 

RÉSUMÉ

La zone côtière de Maputo représente un des derniers bastions de terre libre dans la capitale mozambicaine, en même temps qu’elle devient le bastion d’une nouvelle image de la ville, inscrite dans le concept néolibéral dominant. En pratique, entre les propositions et les projets d'intervention divers, orientés surtout vers la logique de marché, les quartiers autoproduits tissent leur propre tissu urbain, fruits de la superposition des systèmes paysagers, notamment des dunes et des zones de mangroves. Considérant qu’il n’existe qu’un seul paysage, celui qui est humanis é et caractérisé par ses dynamiques, se propose la lecture de la zone côtière de Maputo comme un système, tenant en compte les multiples facteurs naturels et sociaux qui l’ont marqu é et les modifications de ses dynamiques au fil des dernières décennies. Employant comme base un travail de terrain approfondi, réalisé dans le cadre d’une recherche doctorale, on caract érise le tissu urbain auto-produit dans des zones écologiquement vulnérables, afin d’identifier et de mieux comprendre la dynamique du paysage, à la lumière de (l’auto)production de l’espace. Prenant comme étude de cas le Bairro dos Pescadores (Quartier des Pêcheurs), à Costa do Sol, on procède à une analyse morphologique du tissu (auto)produit et de ses relations avec le paysage à partir du début du nouveau millénaire, accompagnant la consolidation de l’actuel contexte néolibéral dominant. En cartographiant les interactions entre la progression et la densification du tissu urbain et le paysage où il s’insère, on réfléchit à l’influence de ces éléments sur la morphologie du quartier et à la signification qu’ils acquièrent pour les habitants.

Mots clés: Tissu urbaine; quartier autoproduit; systemes paysagers; mangroves; Maputo.

 

RESUMEN

La zona costera de Maputo representa uno de los últimos espacios libres en la capital mozambiqueña, al mismo tiempo, que se convierte en el baluarte de una nueva imagen de ciudad, inscrita en la ideologí a neoliberal dominante. En la práctica, entre diversas propuestas y proyectos de intervención, orientados especialmente por la lógica del mercado, los barrios de producción propia están entretejiendo un tejido urbano propio, fruto de la superposición de los sistemas de paisaje, principalmente, dunas y manglares. Partiendo del supuesto de la existencia de un paisaje único, el humanizado y su din ámica, se propone la lectura de la zona costera de Maputo como sistema, teniendo en cuenta los múltiples factores naturales y sociales que lo marcan y los cambios de sus dinámicas en las últimas d écadas. Basado en un trabajo de campo en profundidad, realizado en el marco de una investigación de doctorado en curso, se caracteriza el tejido urbano de autoproducción en áreas ecoló gicamente vulnerables, con el fin de identificar y comprender las dinámicas del paisaje, a la luz de la (auto) producción del espacio. Tomando como caso de estudio el barrio dos Pescadores, en la Costa do Sol, se analiza la transformación del tejido urbano (auto)producido y su relación con el paisaje desde el inicio del nuevo milenio, acompañando a la consolidación del contexto actual neoliberal. El mapeo de las interacciones establecidas entre la expansión y la densificación del tejido urbano y el paisaje donde se inserta, permite reflexionar sobre la influencia de estos elementos en la forma urbana y el significado que adquieren para quienes lo habitan.

Palabras clave: Tejido urbano; barrio de producción propia; sistemas de paisaje; manglares; Maputo.

 

 

I. INTRODUÇÃO

O problema da urbanização de zonas de elevado valor ecológico é comum a grande parte dos grandes núcleos urbanos do Sul Global (Sousa Santos & Meneses, 2009), entre os quais Maputo, onde frequentemente a vulnerabilidade económica e social se alia à vulnerabilidade ambiental dos grupos de menores recursos (Simon, 2010; du Toit et al., 2018). Neste sentido, o estudo da paisagem assume particular relevância como forma de compreender as rápidas mutações temporais e a expansão urbana das cidades contemporâneas (Waldheim, 2006), em particular junto à linha da costa, com dinâmicas hidrológicas e ecossistemas próprios, como também os assentamentos humanos que aí se desenvolvem. A urbanização por via da autoprodução em cidades costeiras da áfrica Austral, tal como acontece noutros contextos urbanos, é complexa e merece especial atenção tendo em conta as implicações económicas, sociais e ambientais que a proximidade da água representa. Contudo, também pode representar uma oportunidade para repensar estas cidades (De Meulder & Shannon, 2008; 2013), considerando a paisagem como potencial meio de redu ção da vulnerabilidade inerente aos desafios da gestão e da vivência urbana, e os desafios globais, como o aumento da frequência de eventos climáticos extremos (exemplo dos ciclones e tsunamis) e a subida do nível das águas do mar (Forman, 2014; Meyer & Nijhuis, 2014).

Ao nível da capital moçambicana, Maputo, este processo de urbanização acelerada, com particular expressão junto à linha da costa, é marcado, nas últimas décadas, pela adopção e consolidação do ideário neoliberal, nomeadamente por novas formas de ler, planear e produzir cidade, vinculadas à lógica de mercado e à geraçã o de mais valias económicas e financeiras (Oppenheimer & Raposo, 2007; Raposo, Jorge, Viegas, & Melo, 2012; Jorge, 2017). Seguindo o imaginário de outras cidades junto ao mar, como Nova Iorque e São Francisco, na América do Norte, Dubai, no Médio Oriente, ou Hong Kong e Singapura, na ásia, projecta-se para Maputo uma nova imagem de cidade, distante do seu tecido pré-existente, na sua maioria autoproduzido pelos seus habitantes (Jorge & Melo, 2014; Jorge, 2017). Para lá das aspirações, necessidades e especificidades locais, forjam-se e exportam-se outras prioridades e modelos de interven ção, apoiados na construção de grandes infraestruturas e complexos imobiliários, com recurso à criação de parcerias público-privadas. Por um lado, assiste-se à transformação do tecido urbano pré-existente, em alguns casos através de processos de renovação e reassentamento massivos (Jorge, 2015). Por outro lado, terrenos ainda vagos ou com ocupação dispersa, nomeadamente ao longo da costa, como é o caso da planície da foz do rio Incomati, vêem a sua paisagem mudar profundamente com progressivos aterros e a ocupa ção de dunas, áreas de mangal e zonas de inundação temporária (Beja da Costa & Ribeiro, 2017).

é nesta planície que se situa a Costa do Sol, no distrito de KaMavota, um dos últimos redutos de terra vaga na zona costeira, que não ficou alheia à expansão e densifica ção do tecido urbano, quer por via da autoprodução, quer da implementação de projectos inscritos no ideário neoliberal, dirigidos a uma alegada classe média (Mazzolini, 2016). São disso exemplo: a Circular de Maputo – uma estrada com cerca de 20km que atravessa a Costa do Sol em toda a sua extensão –, construída entre 2013 e 2017 pela Chinese Bridge and Road Corporation, com financiamento do Exim Bank (Van Orshoven & Ysenbaardt, 2014); os condomínios fechados Maré, erigido em 2012, ou a Vila Sol II, em 2013 (Morange, Folio, Peyroux, & Vivet, 2012); os complexos hoteleiros Radisson, AFECC ou Glória, concluídos em 2014; ou ainda os centros comerciais Maré, inaugurado em 2010, e o Game, em 2017. Estas intervenções, apoiadas pelo poder p úblico, geram por sua vez novas dinâmicas e processos de ocupação a nível local, promovidos pelos próprios moradores em função das suas necessidades, aspiraçõ es e recursos disponíveis, mas também da pressão demográfica e imobiliária que se faz sentir, alterando forçosamente as dinâmicas naturais e os fluxos urbanos de e para esta zona. As presentes dinâmicas urbanas despoletam um conflito entre a urbanização e o meio natural, tendo em conta a ocupação e coexistência de ecossistemas biodiversos, onde os recursos piscat órios se esvaziam e aumenta a vulnerabilidade às alterações climáticas (Forman, 2014).

Face às tendências globais e às especificidades de Maputo, qual a relação entre a tranformação do tecido (auto)produzido e a paisagem em que se insere? Tomando como caso de estudo o Bairro dos Pescadores, localizado na Costa do Sol, paradigmático pelas mudanças de que tem sido alvo, procura-se aprofundar o conhecimento sobre o seu processo de transformação e respetivo impacto na paisagem, a partir de uma análise cruzada entre: i) a construção de megaprojectos nas suas imediações, nomeadamente a Circular; ii) a expansão e densificação do seu tecido urbano e iii) a ocupação de áreas ecologicamente vulneráveis, especificamente dunas e áreas de mangal. A análise visa reflectir sobre a evolução da forma urbana deste bairro autoproduzido a partir dos elementos físicos da paisagem, nomeadamente a água, o relevo e a vegetação, bem como a sua influência na modelação do traçado urbano. Para além do estudo das alterações de uso do solo (Henriques, 2007), pretende-se, na senda de Fernandes (2015, p. 37) “identificar e perceber o valor do contexto no âmbito dos fenó menos que agem na produção da forma urbana”.

Com base num trabalho de campo aprofundado, centrado no levantamento cartográfico e fotográfico e na realização de entrevistas a lideranças e moradores locais, realizado em 2017 no quadro de uma investigação de doutoramento em curso, propõe-se um diálogo entre duas áreas disciplinares complementares, a arquitectura paisagista e o urbanismo, seguindo uma abordagem qualitativa e iminentemente analítica. A partir da informação recolhida no terreno, foram cartografadas as zonas de mangal e as zonas inundáveis em toda a sua extensão, em ArcGIS, procedendo-se posteriormente à análise do tecido urbano do Bairro dos Pescadores e da sua evolução nas últimas décadas, através de imagens aéreas do Google Earth relativas a tr ês momentos diferentes: 2000, 2010 e 2017. Através da interpretação de sequências cartográficas de várias amostras do tecido urbano do Bairro, restituem-se as alteraçõ es dos sistemas naturais provocadas pelo processo de urbanização em curso e pelas dinâmicas naturais inerentes à linha de costa, bem como a influência destes sistemas naturais na forma do Bairro e a relação dos moradores com os mesmos.

 

II. O BAIRRO DOS PESCADORES: ENTRE OS PLANOS E AS PRÁTICAS

A designação Costa do Sol, área onde se localiza o Bairro dos Pescadores (fig. 1), tem a sua origem em 1975, ano da independência do país. A maioria dos seus habitantes vivia principalmente da pesca e da agricultura, com excepção do Bairro do Triunfo, de cariz mais urbano, construído na década de 1960 para uma classe média, que já na altura implicou o aterro de pâ ntanos, “plantando a semente” da actual expansão urbana (entrevista a Lage, 2015). A partir de 1983, com a intensificação da chamada guerra dos dezasseis anos e o consequente colapso da economia nacional (Geffray, 1991), a Costa do Sol, à semelhança de todo o município de Maputo, começou a receber pessoas vindas de várias regiões do país (DMPUA, 2013b). Mesmo após a assinatura do Acordo de Paz em 1992, os fluxos migratórios entre o campo e a cidade permaneceram, contribuindo, a par do crescimento natural, para a expansão e densificação das áreas peri-urbanas, geralmente por via da autoprodução (Raposo & Salvador, 2008; Jorge & Melo, 2014). Este crescimento demográfico e os decorrentes movimentos de expansão acentuaram-se a partir do início do novo milénio, marcado pelas fortes chuvas de 2000, também elas promotoras de novos processos de ocupação e transformação do território. Com efeito, só nos últimos anos, a população projectada para o distrito de KaMavota passou de 297 657hab em 2007 (INE, 2013) para 331 968hab em 2017 (INE, 2018), reflectindo uma paisagem em mutação.

 

 

O Plano de Estrutura Urbana do Município de Maputo (PEUMM), aprovado em 2008 e ainda em vigor, foi o primeiro realizado após a publicação da recém Política Nacional de Ordenamento do Território (Resolução n.º 18/2007, de 30 de Maio), em 2007. Integra a área da Costa do Sol na estrutura ecológica da cidade, destacando as extensas “zonas húmidas” (mangais), “zonas inundáveis” e “praias”. O Bairro dos Pescadores é considerado uma “área residencial não planificada de baixa densidade” (CMM, 2008, p. 178), prevendo-se já na altura a construção da Circular nas suas imediações, entretanto concluída, e o reforço da ligação de cidades contíguas a Maputo, nomeadamente Matola e Marracuene a norte. Na sequência do PEUMM, surge uma profusão de planos parciais de urbanização para a cidade, entre eles o Plano Parcial de Urbanização da Costa do Sol (fig. 1), concluído em 2013, no qual o Bairro dos Pescadores é apresentado como uma “área de ocupação espontânea”, sendo “que o processo de reordenamento (...) somente será efectuado em casos extremos nos quais estejam em causa as mínimas condições para o estabelecimento de habitações” (DMPUA, 2013a, p. 25). Assim, atribui-se ao Bairro um carácter definitivo, priorizando o acesso de cada talhão a uma via de circulação e à rede de água, electricidade e saneamento. Contudo, estudos e propostas aprovados entretanto pelo Conselho Municipal de Maputo para a Costa do Sol avançam com a construção de condomínios fechados e edifícios em altura ao longo da costa (DMI, 2013), como é o caso do empreendimento Casa Jovem, de quatro a oito pisos, promovido por uma empresa moçambicana com o apoio de parceiros internacionais (Melo, 2015, p. 218).

Paralelamente, o Bairro dos Pescadores atravessa um processo de rápida densificação, em resultado da pressão imobiliária exercida à escala do talhão familiar e da afluê ncia de famílias de menores recursos, que vão ocupando as zonas ecologicamente vulneráveis, de inundação e de mangal, na tentativa de colmatar a falta de recursos económicos atrav és da pesca, da apanha de marisco e do corte de mangal para produção de carvão. Aqui, como noutros bairros da cidade, a ocupação do território por iniciativa da popula ção, em parte proveniente do centro da cidade e das áreas peri-urbanas mais próximas – na sequência, por exemplo, do aumento do agregado familiar ou do aluguer da casa que possuem no local de origem –, é a grande responsável por esta transformação. Os reassentamentos e realojamentos, decorrentes de calamidades naturais, como as cheias de 2000 e 2013, e as acçõ es de qualificação e renovação em áreas próximas do centro, bem como a construção da Circular, impulsionaram igualmente a autoprodução do espaço habitacional (Jorge & Melo, 2014; Jorge, 2017).

Tal como aconteceu noutros bairros da cidade, o tecido urbano desta área prende-se com a origem dos seus habitantes e com os seus modos de vida ‘semi-rural’, tirando da machamba e do mar o seu sustento, nomeadamente com a apanha de ‘caril’ (camarão, ameijoa, caranguejo) nas zonas de transição de marés e nos mangais, para venda e/ou consumo próprio. Como descreve Vanin (2013, p. 149), daí resulta “um tecido urbano de ocupação semi-rural” e baixa densidade. Actualmente, embora o Bairro dos Pescadores mantenha parte das suas características e vitalidade originais (D'Agostino et al., 2015), a tendência face ao processo de gentrificação e densificação em curso é a geração de um conflito com os mangais adjacentes, progressivamente cortados para fins domésticos e aterrados para a delimitação de novos talhões.

Forjaz (2018, p. 11) refere que, ao nível familiar, a grande mudança advém da “segurança renovada” potenciada pelos “melhoramentos incrementais de acessibilidade dentro da estrutura do bairro”, pela “consciência dos limites e potencialidades do domínio territorial das comunidades”, bem como pelo reforço das relações de vizinhança. Num processo já iniciado antes da construção da Circular, a chamada ‘classe média’ da Costa do Sol, face aos grandes investimentos infraestruturais aí realizados e à perspectiva de futuras mais-valias, começaram a organizar-se e a ocupar talhões sem títulos de Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (DUAT), construindo moradias de um a dois pisos como forma de garantir a sua inclus ão na “cidade que está a vir” (Mazzolini, 2016, p. 90). Neste sentido, face à localização estratégica do Bairro dos Pescadores, assiste-se progressivamente à sua valorização imobiliária e à introdução de novas dinâmicas, através: (i) da compra de talhões de maiores dimensões aos ocupantes originais para constru ção de moradias; (ii) da construção de anexos para albergar familiares próximos (processo tradicional) ou de pequenas casas para alugar a terceiros; bem como (iii) do pedido de talhão ao régulo (chefe tradicional) e estruturas locais (secretário de bairro e chefes de quarteirão), sobretudo no caso dos grupos de menores recursos. Nestes casos, são normalmente atribuídos talh ões em zonas de risco de inundação, nos pântanos e mangais, justificados pela falta de opção e carência de espaço livre.

 

III. ANÁLISE E EVOLUÇÃO DA FORMA URBANA

Para a análise do tecido urbano a uma escala mais pormenorizada, seleccionaram-se três amostras que consistem em transectos do Bairro (fig. 2), correspondentes a áreas objecto de maior diferencia ção entre a (auto)produção e densificação do espaço urbano e a sua interpenetração com os sistemas naturais. Assim, partiu-se dos elementos naturais da paisagem, mapeando-se os microrelevos, o coberto arbóreo e todo o processo de urbanização registados nos anos de 2000, 2010 e 2017, nomeadamente as construções de alvenaria e tradicionais, sebes de espinhosa e muros de alvenaria (figs. 3, 4 e 5). A esta mesma escala, sobrepuseram-se, numa sequência cartográfica, as zonas inundáveis e de mangal, de forma a identificar a alteração dos sistemas naturais decorrente do processo de urbanização (figs. 6 e 7). Toda a cartografia foi produzida através de fotointerpretação, tendo por base imagens de satélite do Google Earth dos anos referidos, georreferenciadas e cartografadas com recurso ao ArcGIS 10.4 Esri©. O nome de cada amostra refere-se a pontos de referência no Bairro apreendidos durante o trabalho de campo e que s ão usados frequentemente pelos moradores.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

1. Amostra 1: Mercado dos Pescadores

O núcleo mais antigo situa-se à entrada do Bairro, junto ao Mercado dos Pescadores (fig. 3). Observando os diferentes elementos morfológicos registados em 2000 (primeira linha da fig. 3), verifica-se que as primeiras casas e talhões vedados por sebes de espinhosa surgiram na parte de trás da duna primária que flanqueia a linha de costa e sobre a mesma, em talhões de maiores dimensões (a sul), com muros e construções de alvenaria e tradicionais no seu interior. As duas construções iniciais, paralelas à escola primária, formavam uma praça, delimitada pelas sebes de espinhosa dos talhões vizinhos, excepto a este, marcada pela vegetação mais densa da duna primária. Dez anos mais tarde, em 2010 (segunda linha da fig. 3), nota-se uma disseminação de construções dispersas em torno dos talhões preexistentes e na duna primária, que vê o seu coberto arbóreo reduzir significativamente, bem como a delimitação de novos talh ões com sebes de espinhosa, delineando as ruas e caminhos no interior do Bairro. A oeste, registam-se os primeiros aterros na base da duna e a construção de pequenas casas dispersas, reflectindo um primeiro gesto em direcção à ocupação dos terrenos inundáveis que circundam a duna original.

Em 2017 (terceira linha da fig. 3), a ocupação do espaço exterior aos talhões existentes com novas construções individuais generaliza-se, surgindo novos talhões na duna prim ária, definidos por muros de alvenaria. O mercado expande-se para sul, junto à praia, mas mantém-se com pequenas construções de madeira. Novos aterros são feitos a oeste, desta vez para permitir a construção da Circular, que passa a delimitar o Bairro no seu extremo sul/sudoeste, formando uma nova barreira.

2. Amostra 2: ‘Testemunhas de Jeová’

Nas imediações do edifício das Testemunhas de Jeová, e na faixa que segue até ao mar, atravessa-se uma zona onde os microrelevos das dunas e os mangais se interpenetram (fig. 4). Em 2000 (primeira linha da fig. 4), observa-se aí a existência de um talhão delimitado por um muro de alvenaria e armazéns, bem como outros talhões definidos por sebes de espinhosa, condicionados pela escala da duna, onde se encontram talhões de maiores dimensões a oeste e menores a este. Em 2010 (segunda linha da fig. 4), num dos talhões já demarcado em 2000, aparece um pequeno condomínio fechado e novos talhões de escala familiar ocupam, quase na totalidade, as dunas existentes. Paralelamente, novos aterros avançam para norte, destruindo o mangal, e a zona de praia aumenta em resultado da din âmica litoral e da sedimentação de areias. O coberto arbóreo diminui entre 2000 e 2010, voltando a aumentar em 2017, o que se assume ser derivado da desmatação que acompanha a demarca ção dos talhões, para depois se plantarem novas árvores, que marcam a apropriação do espaço.

Em 2017 (terceira linha da fig. 4), os aterros já existentes em 2010 são ocupados com construções de alvenaria, dispersas e de pequenas dimensões. Surgem igualmente alguns talhões delimitados por sebes de espinhosa nos microrelevos formados artificialmente junto ao mangal, bem como na duna sobranceira à praia, a este. é de referir que, nesta altura, esta faixa de tecido urbano também estava a ser alvo de novos aterros no âmbito da construção da Circular e do complexo Casa Jovem, a oeste.

3. Amostra 3: A caminho de Mapulene

A terceira amostra de tecido urbano considerada situa-se a norte das restantes, na transição entre o Bairro dos Pescadores, nas dunas sobranceiras ao mangal, e Mapulene, a norte, cujo traçado ortogonal dos talhões reflecte directamente a topografia plana da zona inundável que ocupa. Em 2000 (primeira linha da fig. 5), observa-se, tal como na área do Mercado, a existência de casas dispersas e alguns talhões delimitados por sebes de espinhosa nos microrelevos, em áreas inundáveis, estando a duna que delimita o mangal, a este, livre de ocupação. Em 2010 (segunda linha da fig. 5), multiplicam-se as construções de alvenaria dispersas, formando talhões de maiores dimensões, delimitados por muros de alvenaria, circundando os talhões de sebe já existentes em 2000. O coberto arbóreo altera-se com o surgimento de árvores de menor porte, na sequência do corte da vegetação original e da plantação de novas espécies. Nota-se na duna a este o aparecimento de talhões delimitados por sebes de espinhosa e de pequenas habitações de alvenaria e materiais tradicionais. Por fim, observam-se pequenos aterros, que ganham terreno às zonas inund áveis (a norte e ao centro) e ao mangal (a este da duna).

Em 2017 (terceira linha da fig. 5), com a construção da Circular, assiste-se em seu redor à densificação da duna e dos aterros incrementais registados em 2010. Observa-se igualmente a ocupa ção, através de pequenas habitações precárias de materiais tradicionais, da linha de relevo que liga a duna a Mapulene, numa zona baixa e rodeada de áreas inundáveis, tanto a norte, como a sul. Entretanto, o coberto arbóreo plantado cresce e desenvolve-se, atingindo em 2017 maior porte do que em 2010.

 

IV. UMA PAISAGEM EM MUTAÇÃO - CARACTERIZAÇÃO DA PAISAGEM DO BAIRRO DOS PESCADORES

As três amostras de tecido urbano analisadas mostram a progressiva ocupação das dunas, do mangal e, por fim, das zonas inundáveis que as circundam. Em 2000, a ocupação dá-se nas dunas mais afastadas da frente costeira (a oeste), com a construção de casas dispersas de pequena dimensão e a demarcação de alguns talhões por sebes de espinhosa nas zonas mais altas, de forma mais ou menos linear ao longo das linhas de cumeeira (figs. 3, 4 e 5). A localização da ocupação inicial demonstra, por um lado, que os factores ambientais são determinantes na distribuição e estruturação das áreas autoproduzidas (Mendes, 1980); e, por outro, que o relevo, ainda que muito suave, “imprime no traçado urbano os limites naturais do territ ório evidenciando a transição entre zonas com características morfológicas distintas”, como destaca Fernandes, 2015 (p. 39). Estes factores são preponderantes no momento da escolha da fixação das casas, de modo a evitar as cheias e marés, mas também a “potenciar as brisas litorais e, com elas, a ventilação natural das casas” (Mendes, 1980, p. 363).

Em 2010, nota-se uma grande alteração do coberto arbóreo, por degradação e desmatação da vegetação original, coincidente com o que descreve um morador entrevistado: “Tinha muitas árvores e mato, que cortámos” (entrevista a Zacarias, 2017). A plantação de novas árvores, geralmente de fruta, também faz parte deste processo de apropriação do espaço, de conquista da natureza e de demarcação de propriedade. é nesta fase que se começa a observar a ocorrência de aterros em zonas adjacentes à s dunas originais para ocupação à escala do talhão individual, avançando-se sobre o mangal e as zonas inundáveis (fig. 6). As zonas de mangal originais sofrem assim um retrocesso de 2000 para 2010, também devido ao corte para uso doméstico e para construção, passando a zonas inundáveis (ou com mangal muito degradado). Até 2017, assiste-se à progressiva delimitação de talhões e ao recorte cada vez mais rectilíneo das manchas de mangal: “Aqui era um pântano, estava cheio de matope [lama] e eu comecei a entulhar o terreno” (entrevista a Vitória, 2017).

Em 2017, nas zonas inundáveis a oeste, aterros de grande escala viabilizaram a construção da Circular e da Casa Jovem (figs. 6 e 7). Estas grandes intervenções acabariam por legitimar a continuação dos pequenos aterros à escala do talhão individual, conquistando terreno às zonas inundáveis e consolidando o tecido urbano entre as edificações já existentes e os novos limites do Bairro. O coberto arbóreo torna-se mais denso em resultado do aumento do porte das árvores plantadas pelas famílias que aí se foram instalando.

Como descrevem Benárd da Costa e Biza (2012, p.13), não só a criação do espaço habitacional implica práticas sociais e espaciais, como acima de tudo “o lar é um conceito definido culturalmente”. Esta linha de pensamento explica o estabelecimento incremental dos talhões e das casas nas amostras analisadas em 2000, 2010 e 2017, num processo que se vai repetindo em cont ínuo. As construções iniciais são de pequenas dimensões e diferentes materiais – como alvenaria, caniço e zinco, madeira e zinco, palhotas maticadas –, comuns nos bairros autoproduzidos. Progressivamente, as casas originais são substituídas por casas de alvenaria, de maiores dimensões, mantendo geralmente os anexos, ocupados pela cozinha e pela casa de banho. Em alguns casos, demarca-se primeiro o talhão com sebe de espinhosa, em seguida constrói-se a casa e anexos e, finalmente, substitui-se a sebe de espinhosa por muros de alvenaria, reafirmando uma identidade social e uma maior segurança de ocupação, reflectida no recurso a materiais duradouros. Altera-se igualmente o ‘status quo’ da família que o habita (Mendes, 1980; Sousa Morais, 2001; Bénard da Costa & Biza, 2012), aproximando o espaço do lar ao imaginário da ‘casa moderna’ inscrita no imaginário da cidade neoliberal (Mazzolini, 2016). Para uns, o Bairro “agora já é cidade, e é uma cidade bonita” (entrevista a Armindo, 2017), enquanto para outros se perde gradualmente a calma de outrora e o fácil acesso a recursos naturais, importantes para o complemento do rendimento familiar, numa idealização da vida rural. A relativa baixa densidade populacional do Bairro, também característica das zonas rurais, tende a ser vista como algo positivo (Bénard da Costa & Biza, 2012).

Contudo, aqui como em outros bairros autoproduzidos, forma-se progressivamente um tecido orgânico denso (Jorge & Melo, 2014). Como descreve um morador que vive perto do Mercado, o Bairro “era mato e havia macacos. Havia arbustos tipo piri-piri que os macacos comiam; comiam também maçãs e a fruta dos mangais... Agora o mangal já não dá fruta. Antes daqui conseguia-se ver a praia; as casas ocuparam de 2000 para cá (…). E quando vêm já não voltam” (entrevista a Nhassango, 2017). Os interstícios são os canais de comunicação entre talhões – ruas e caminhos – e pontos de referência do Bairro, geralmente equipamentos (mercado, escola, praia, centro de saúde...), mutáveis ao longo do tempo: “O bairro ajuda-me um pouco. Quando vim para aqui era mata mesmo; Agora está um pouco normal” (entrevista a Moreira & Amando, 2017). Nas margens do Bairro, próximas dos mangais, tanto este tecido orgânico, como o mangal, parecem acomodar-se mutuamente. No entanto, esta proximidade e a progressiva ocupação destes espaços constitui um processo periclitante, quer pela sensibilidade dos ecossistemas, quer pelo perigo iminente de inunda ções nas zonas aterradas e ocupadas do mangal. Entre os moradores, há a consciência da função dos mangais como viveiro de espécies aquáticas e de protecção que prestam ao Bairro, o que não invalida a sua ocupação e a densificação de zonas inundáveis a montante. A memória das cheias de 2000 ainda está bem presente na mem ória dos moradores, mas há uma certa resignação, tendendo-se a encarar a ocupação dos mangais e zonas inundáveis como incontornável: “A construção [no mangal] não é coisa boa, mas como não há espaço as pessoas constroem na mesma” (entrevista a Nhassango, 2017). Também o aterro que viabilizou a construção do complexo Casa Jovem teve um enorme impacto no Bairro dos Pescadores. Como testemunham alguns moradores entrevistados, a ocupação da área inundável a montante provoca inundações a jusante, no interior do Bairro: “[a Casa Jovem] dá problemas porque as marés entram na zona onde não entravam” (Armindo, 2017).

 

V. CONCLUSÕES

A progressiva transformação do Bairro dos Pescadores, através da expansão e densificação do tecido preexistente, bem como da ocupação de áreas ecologicamente sens íveis, nomeadamente zonas inundáveis, dunas e mangais, reflecte o momento actual que a cidade atravessa, inscrito no ideário neoliberal e na consequente mercantilização do espaço urbano. O processo de urbanização em curso começou por ser, neste caso, iniciado por pescadores que retiravam do mar e da agricultura o seu sustento, sendo gradualmente conduzido pelos interesses de mercado e pela perspectiva de geração de mais-valias. A pressão demográfica e imobiliária das últimas décadas, bem como a falta de terrenos livres ao nível do município, aumentou a procura de talhões no Bairro dos Pescadores e na sua envolvente próxima, quer para construção de habitação própria, quer de empreendimentos imobiliários, como a Casa Jovem. A construção recente da Circular de Maputo, que atravessa a Costa do Sol e hoje delimita o Bairro, melhorou a sua acessibilidade, mas também acelerou a valorização imobiliá ria. Embora o processo de produção e transformação do tecido urbano ocorra de forma semelhante ao de outros bairros autoproduzidos da cidade, a relação do Bairro dos Pescadores com a paisagem é única.

O Bairro parte da ocupação de uma duna e desenvolve-se ao longo dos cordões dunares que penetram o mangal. As nuances dos microrelevos existentes e acrescentados demonstram o frágil avan ço do tecido urbano, num processo de repetição da ocupação já existente e de resignação perante possíveis desastres que daí possam advir, como inunda ções e erosão. Os moradores têm presente a vizinhança do mangal e da água, bem como as vantagens e os perigos de tal proximidade. Mas é esta relação com o mangal e com a água que distingue e caracteriza o seu Bairro, havendo a consciência colectiva de que não há Bairro sem paisagem. Enquanto isso, o tecido urbano interpenetra progressivamente o mangal, interferindo com os ciclos das marés, as correntes e a condução das águas da chuva, aumentando a vulnerabilidade face à ocorrência de eventos climáticos extremos, como ciclones, e à subida do nível das águas do mar.

Perante este cenário, o Plano Parcial de Urbanização da Costa do Sol define o Bairro dos Pescadores como uma zona habitacional estabelecida, à qual se deve assegurar infraestruturas bá sicas, não antecipando as dinâmicas e transformações de que tem sido alvo, nem os riscos que estas implicam num futuro próximo. O progressivo parcelamento, a construção e amplia ção de habitações, com consequente impermeabilização do solo, ocupação de zonas inundáveis e de infiltração de águas pluviais, conduzem a um ponto de ruptura, tendo em conta uma paisagem cada vez mais fragilizada. Outrora um Bairro calmo, de cariz rural e voltado para a pesca e para a agricultura, é hoje um Bairro em mutação, fruto do avan ço da urbanização e da lógica de mercado, para quem os recursos naturais tendem a ser lidos como obstáculos à imagem de cidade preconizada.

Na complexidade do seu tecido urbano e das vivências que o habitam, e numa perspectiva de análise comprometida com a integração dos elementos da paisagem como uma mais valia para o desenvolvimento urbano sustentável das áreas costeiras, importa reflectir se elementos destes tecidos e desta paisagem resistirão ao processo ‘aluvionar’ – de enchente, no sentido adoptado pela popula ção local – a que o Bairro está sujeito. Se, do ponto de vista técnico, político e institucional, pouco ou nada se tem feito para travar ou contrariar a mutação do Bairro, do ponto de vista da gestão e mobilização local poderá encontrar-se uma solução comprometida com a sua sustentabilidade, tendo em conta as impressões e vivências expressas pelos moradores ao longo do trabalho de campo realizado no âmbito da pesquisa. Nesta perspectiva, e no caso específico do Bairro dos Pescadores, o reforço das relações com a paisagem circundante pode ser considerado e posto em evidência, de modo a gerir o já frágil equilíbrio entre urbanização e natureza, promovendo o sentido de identidade e de pertença dos seus moradores, a sua segurança e a sustentabilidade do Bairro.

 

AGRADECIMENTOS

Gostaríamos de agradecer à Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) pelo financiamento do projeto de doutoramento da autora Ana Beja da Costa no qual se apoia o presente trabalho (SFRH/BD/101053/2014), desenvolvido no LEAF (Linking Landscape, Environment, Agriculture and Food Research Centre) − Instituto Superior de Agronomia, Universidade de Lisboa (UID/AGR/04129/2013), financiado pela FCT atrav és de fundos nacionais. Também gostaríamos de agradecer à FCT e à Aga Khan Development Network, enquanto entidades financiadoras do projecto “Africa Habitat: da sustentabilidade do habitat à qualidade do habitar nas margens urbanas de Luanda e Maputo” (IC&DT/FCT-AKDN/333121392/2018), no qual foi atribuída a bolsa de investigação à autora Sílvia Jorge.

 

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ENTREVISTAS

Armindo. (2017, 11 Outubro 2017) Entrevista nº 21 - Bairro dos Pescadores [Interview #21 - Bairro dos Pescadores]. Entrevistadora: A. Beja da Costa.

Lage, L. (2015, 26 January 2015) Entrevista ao Prof. Luis Lage [Interview to Professor Luis Lage]. Entrevistadora: A. Beja da Costa.

Moreira, J., & Amando, A. (2017, 13 Outubro 2017) Entrevista nº 26 - Bairro dos Pescadores [Interview #26 - Bairro dos Pescadores]. Entrevistadora: A. Beja da Costa.

Nhassango, C. (2017, 03 Outubro 2017) Entrevista nº 9 - Bairro dos Pescadores [Interview #9 - Bairro dos Pescadores]. Entrevistadora: A. Beja da Costa.

Vitória. (2017, 4 Outubro 2017) Entrevista nº 12 - Bairro dos Pescadores [Interview #12 - Bairro dos Pescadores]. Entrevistadora: A. Beja da Costa.

Zacarias, G. (2017, 13 Outubro 2017) Entrevista nº 29 - Bairro dos Pescadores [Interview #29 - Bairro dos Pescadores]. Entrevistadora: A. Beja da Costa.

 

Recebido: maio 2019. Aceite: outubro 2019.

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