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Finisterra - Revista Portuguesa de Geografia

versão impressa ISSN 0430-5027

Finisterra  no.105 Lisboa ago. 2017

https://doi.org/10.18055/Finis9824 

ARTIGO ORIGINAL


 

Entre subsídios e turismo: Instituições e poder na gestão dos governing the baldios of the Peneda-Gerês National Park

 

Between tourism and greening subsidies: institutions and power governing the baldios of the Peneda-Gerês National Park

 

Les subsides et le tourisme: institutions et pouvoir dans la gestion des communaux du parc national de la Peneda-Gerês

 

 

Ana Luísa Luz1

1 Doutoranda no Centro Interdisciplinar de Ciências Sociais, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Avenida de Berna, 26-C / 1069-061 Lisboa. E-mail: luzanalu@gmail.com

 

 

RESUMO

Os baldios são terras comunitárias historicamente geridas para pastagem e recolha de recursos essenciais à sobrevivência das populações de montanha, constituindo-se igualmente como base dos sistemas agrícolas de subsistência. Em Portugal localizam-se hoje sobretudo nas montanhas do norte do país. A modernização tecnológica da agricultura, a florestação pelo Estado Novo (1938-1968), a emigração nos anos 1950-1960s e o decorrente declínio da actividade agrícola, criaram uma nova conjuntura económica e social para os baldios. Em 1986 a adesão de Portugal à União Europeia (UE) e a submissão à Política Agrícola Comum (PAC) reflectiu-se também nestes espaços e respectivas instituições. Entrevistas semiestruturadas, efectuadas nos trinta baldios existentes no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), permitiram analisar o tipo de uso e de utilizadores e as estratégias de gestão implementadas nos baldios desta região. Sobretudo em áreas protegidas e adaptando-se a directivas da UE, o baldio começa a assumir um papel relevante na conservação da natureza e do património cultural. Ao mesmo tempo o turismo apresenta-se cada vez mais como uma panaceia para as dificuldades do mundo rural. Nos baldios do PNPG, embora o turismo tenha presença e os subsídios auxiliem a manutenção dos espaços naturais e culturais, verifica-se que o baldio não acede às contrapartidas geradas por essa procura, ainda que as comunidades dela beneficiem indirectamente. Até que ponto o turismo constitui uma alternativa eficaz à produção agrícola irá depender em grande parte da vontade dos compartes e da capacidade negocial dos órgãos gestores dos baldios.

Palavras-chave: Baldios; turismo; propriedade; Parque Nacional da Peneda-Gerês; PAC.

 

ABSTRACT

Baldios are lands usually integrated in subsistence farming systems and historically managed by the local communities for pasture and collection of livelihoods. In Portugal, today, these common lands are located mainly in the country’s northern mountain ranges. Multiple events such as the technological modernization of agriculture, the afforestation by the dictatorial Estado Novo (1938-1968), the massive emigration in the 1950-1960´s and the consequent decline of the agricultural sector, created a new economic and social conjuncture with consequences over the use of the common lands. In 1986 Portugal’s adherence to the European Union (EU) and submission to the Common Agricultural Policy (CAP) also influenced the use of the common lands and the functioning of its institutions. Semi-structured interviews were performed on the thirty baldio units located in the Peneda-Gerês National Park (PGNP) in order to perceive their usage and its subjects, as well as the management strategies implemented in those common lands. As an adaptation to the EU’s directives, the baldios are starting to assume a relevant role on the conservation of nature and maintenance of the cultural heritage, especially in protected areas. Simultaneously, tourism is increasingly accepted as a panacea for some of the problems of rural areas. In the baldios of the PGNP, although tourism is present and subsidies from the EU help to maintain the natural and cultural spaces, it is found that the baldios do not benefit from the revenue generated by touristic activities, even though members of the communities benefit indirectly from them. The extent to which tourism is an effective alternative to agriculture production is largely dependent on the commoners’ will and on the negotiating skills of the baldios’ managing bodies.

Keywords: Common lands; tourism; property; Peneda-Gerês National Park; CAP.

 

RÉSUMÉ

Les communaux sont des espaces communautaires traditionnellement consacrés au pâturage, à la production de ressources essentielles pour les montagnards et servant aussi de base aux systèmes agricoles de subsistance. Au Portugal, ils se localisent aujourd’hui surtout dans les montagnes do Nord. La modernisation technique de l’agriculture, le reboisement effectué par l’Estado Novo (1938-68), l’émigration des années 1950 et 1960 et le déclin des activités agricoles ont donné aux communaux un nouveau cadre économique et social. L’adhésion du Portugal à l’Union Européenne (UE) en 1986, son acceptation de la Politique Agricole Commune (PAC), marquent aussi ces espaces et leurs institutions. Les entrevues effectuées dans les 30 communaux gérés par le Parque (PNPG) ont permis d’analyser leurs types d’usage et d’utilisateurs, ainsi que leurs stratégies de gestion. Selon les directives de l’UE, et surtout dans les aires protégés, les communaux commencent à être un efficace instrument de conservation de la Nature et du Patrimoine culturel. Le tourisme est, lui aussi et de façon croissante, un remède aux difficultés du monde rural. Mais, relativement au PNPG et en dépit du tourisme et des subsides aidant à la conservation des espaces naturels et culturels, les communaux qui y sont situés ne jouissent pas eux-mêmes de ces avantages, bien que les communautés d’habitants en bénéficient indirectement. Jusqu’où le tourisme constituera-t-il ici une alternative efficace à la production agricole, c’est ce qui dépendra surtout du choix des habitants et de la capacité de négociation des organes de gestion des communaux.

Mots clés: Communaux; tourisme; propriété; Parc National Peneda-Gêres; PAC.

 

 

I. INTRODUÇÃO

Este estudo enquadra-se no debate em torno da gestão de recursos comuns, mais especificamente dos baldios, terras comunitárias outrora inseridas nos sistemas agrícolas de subsistência e que hoje se encontram numa fase de transição. Os baldios em Portugal localizam-se em zonas rurais despovoadas e votadas a isolamento geográfico, acentuado pela escassez histórica de vias de comunicação, onde iniciativas que favoreçam o desenvolvimento local se tornam fundamentais. Neste estudo focam-se os baldios inseridos no Parque Nacional da Peneda-Gerês (PNPG), estabelecido maioritariamente em propriedade comunitária, onde o turismo tem vindo a ganhar importância. Este artigo propõe uma reflexão sobre a actual utilização do espaço do Parque (e dos baldios) por empresas de animação turística e sobre o papel assumido pelo Instituto da Conservação da Natureza e Florestas (ICNF) no controlo e/ou dinamização dessa utilização. Por outro lado analisa-se a posição dos compartes, legítimos utilizadores e gestores dos baldios, e discute-se o lugar do regime de propriedade nas relações que se estabelecem entre as comunidades locais, o ICNF e as empresas de animação turística.

Na secção introdutória que se segue sumariza-se o quadro conceptual associado aos direitos de propriedade, gestão comunitária e capacidade de acção colectiva e faz-se uma breve descrição da história recente dos baldios focando particularmente os aspectos que determinaram o actual panorama jurídico e institucional.

 

II. QUADRO CONCEPTUAL

1. Recursos comuns, direitos de propriedade, acção colectiva

A gestão local e autónoma de recursos por comunidades ou grupos de utilizadores tem integrado desde sempre o funcionamento das comunidades humanas em todo o mundo. No início do século XIX as terras comunitárias eram uma realidade comum na Europa ocidental (Iriarte-Goñi, 2002; Bravo & De Moor, 2008; Pemán & De Moor, 2013). Em contextos pré-industriais as terras comunitárias assumiam um papel central na organização da produção, constituindo um complemento à agricultura e a outras actividades económicas (Behar, 1984; Iriarte-Goñi, 2002). Grande parte dos sistemas de recursos usados por múltiplos indivíduos pode ser classificada de recursos comuns, isto é, recursos que geram quantidades finitas de unidades de recurso, cujo consumo/uso por uma pessoa é subtraído da quantidade disponível para todas (Ostrom, 1990). A gestão de recursos comuns está dependente da noção de propriedade e de direitos de propriedade. De acordo com Bromley (1992), o termo “propriedade” refere-se à reivindicação de um fluxo de benefícios, enquanto “direito de propriedade” corresponde à reivindicação de um fluxo de benefícios que um órgão superior, geralmente o Estado, aceita defender, atribuindo deveres a quem possa ambicionar ou interferir nesse fluxo de benefícios (Bromley, 1992, p. 4). Outras instituições, que não o Estado, podem validar os direitos de propriedade, nomeadamente em situações em que os direitos de propriedade derivam do direito consuetudinário, de leis religiosas ou de outros quadros normativos (Meinzen-Dick & Knox, 1999; Meinzen-Dick & Di Gregorio, 2004). Contudo, nem as regras locais nem as estatais detêm poder total em determinado contexto, nem operam isoladas umas das outras. Pelo contrário, os direitos de propriedade resultam de uma interacção complexa entre vários tipos de enquadramentos legais (Meinzen-Dick & Knox, 1999).

Os trabalhos desenvolvidos sobre a gestão dos recursos de propriedade comum até às décadas de 1970-80 partiram do princípio que “a propriedade de todos é propriedade de ninguém”, e que os utilizadores competiriam continuamente por uma parcela maior do recurso, em detrimento de si mesmos, do recurso e da sociedade (Ciriacy-Wantrup & Bishop, 1975, p. 1). Estabeleceu-se assim a tendência na literatura económica para confundir os conceitos de recurso comum em livre acesso e de recursos comuns governados por regimes de propriedade comunitária (Ciriacy-Wantrup & Bishop, 1975). No primeiro caso o uso desconsidera quaisquer regras, não existindo restrições ao acesso nem o dever de contribuir para a existência do recurso (Ciriacy-Wantrup & Bishop, 1975; Ostrom, 1990; Bromley, 1992). Assume-se aqui que a probabilidade de sobreuso é grande, o que, numa situação limite, conduz à destruição do recurso (Hardin, 1968; Ostrom, 1990) Pelo contrário, o conceito de propriedade comunitária implica que utilizadores potenciais que não sejam membros de um grupo de utilizadores coiguais, sejam excluídos (Ciriacy-Wantrup & Bishop, 1975). Esta confusão conceptual levou a que autores como Garret Hardin defendessem o fim trágico dos recursos geridos por comunidades. No seu artigo The tragedy of the commons publicado na revista Science em 1968, Hardin defende que a gestão comum de recursos tende sempre para a sua destruição uma vez que a tendência de cada indivíduo interveniente é procurar tirar o maior proveito pessoal do recurso. Dessa forma, não existindo uma liderança forte que assegure a criação e o cumprimento de regras – o Estado por exemplo –, o sobreuso e consequente destruição do recurso são inevitáveis. O trabalho de Hardin veio despoletar uma discussão académica profunda sobre a viabilidade de instituições gestoras de recursos comuns Em 1990 Elinor Ostrom publica o livro Governing the Commons (1990), que se tornou emblemático na defesa das instituições postas em causa por Hardin. Em Governing the Commons, Ostrom desafia a ideia de “tragédia” associada à gestão de recursos comuns ao apresentar os resultados de estudos desenvolvidos por si e pela sua equipa revelando instituições criadas por comunidades em diversas partes do mundo para a gestão de recursos comuns. De acordo com Ostrom (1990), e como o próprio Hardin veio a admitir mais tarde (Hardin, 1998), embora a reflexão deste autor fosse relevante e consistente no que se refere a sistemas em livre acesso, este não se adaptava à realidade apresentada e defendida pela autora e, por tantos outros autores que se vieram a pronunciar desde a publicação de The Tragedy of the Commons (Ciriacy-Wantrup & Bishop, 1975; Feeny, Berkes, McCay, & Acheson, 1990; Berkes, Feeny, McCay, & Acheson, 1989; Bromley, 1992; Singleton & Taylor, 1992; McCay & Jentoft, 1998; Agrawal, 2001). Admitindo que nem todas as instituições são eficazes e duradouras na gestão de recursos comuns, Feeny et al. (1990) ressalvam que casos de insucesso existem em todos os tipos de regime de propriedade.

No contexto da gestão de recursos naturais, o processo de decisão acerca do uso dos recursos e a sua regulamentação, resultam já da acção colectiva, ou seja, da acção voluntária desenvolvida por um grupo para atingir um objectivo comum (Meinzen-Dick & Di Gregorio, 2004). Nos regimes de propriedade comunitária a acção colectiva é necessária para gerir o recurso, capacidade que sai reforçada pela partilha de direitos de propriedade entre os indivíduos da comunidade. Manter os direitos de propriedade adquiridos pode também requerer acção colectiva, especialmente no caso de recursos à escala da paisagem e onde actores externos desafiam os direitos locais (Meinzen-Dick & Knox, 1999).

2. Os baldios: evolução recente das relações institucionais e situação jurídica

Em Portugal os baldios estavam associados aos sistemas agrícolas de subsistência. Serviam para apascentar o gado, para recolha de mato para as camas dos animais, cujos resíduos eram posteriormente usados como fertilizante nas terras, e para recolha de lenha, madeira, mel e carvão, que complementavam o rendimento familiar (Brouwer, 1995; Baptista, 2010). O apascentamento do gado era feito em comum através do sistema da vezeirai, ancorado num sistema de regras criado localmente, que incutia direitos e deveres aos participantes. Também a recolha de recursos era regrada segundo os usos e costumes locais através de limitações temporais, geográficas e relativas à quantidade recolhida, pretendendo assim assegurar-se os recursos, seguindo um princípio de sustentabilidade. Apesar de se constituírem como elementos de subsistência e de bem-estar comunitários, os baldios foram perspectivados por vários governos como um entrave ao desenvolvimento do país. Como tal, várias iniciativas governativas fizeram alterar o estatuto de baldio como forma de propriedade e gestão comunitárias (Henriques, 1983). A iniciativa mais impactante do ponto de vista político, social e económico ocorreu entre 1938 e 1968 quando o Estado Novo impôs a florestação maciça e a apropriação dos baldios. Esta política, juntamente com a gradual inserção da agricultura em relações de mercado, a introdução de novas tecnologias (ex.. fertilizantes e adubos químicos) e o fluxo de emigração iniciado nos anos 1950-1960, levaram à gradual desarticulação das comunidades rurais com os baldios, quebrando-se a relação de dependência até aí estabelecida (Brouwer, 1995; Baptista, 2010). Após o 25 de abril de 1974 as circunstâncias políticas tornaram-se propícias ao retorno dos baldios às populações. Em 1976 foi publicada a primeira Lei dos Baldios (Decreto-Lei nº39/1976 de 19 de Janeiro) onde constava a regulamentação organizativa do baldio que previa Assembleias de Compartes, a eleição de um Conselho Directivo e a adopção de um de dois modelos possíveis de gestão: em colaboração com o Estado ou em regime de autogestão. Procurando assegurar o apoio do Estado previsto na lei para a gestão da floresta, a grande maioria das Assembleias de Compartes optou pela cogestão (Radich & Baptista, 2005). Contudo, esse apoio ficou aquém do esperado (Baptista, 2010), o que se reflectiu no estado de abandono da floresta, cuja responsabilidade é, muitas vezes, apenas atribuída aos compartes. Desde 1976 houve várias tentativas de alteração da Lei dos Baldios, pretendendo-se destituir as comunidades rurais dos seus direitos de propriedade (Baptista, 2010). Em março de 2014 foi aprovada a proposta de lei dos grupos parlamentares CDS-PP e PSD (com maioria absoluta na Assembleia da República) que altera pontos fulcrais que suportam a gestão comunitária. A maior controvérsia gerou-se em torno da alteração do conceito de comparte. De acordo com a Lei nº72/2014 de 2 de Setembro (que viria alterar o Decreto-Lei nº68/1993 de 4 de Setembro) “São compartes todos os cidadãos eleitores, inscritos e residentes nas comunidades locais onde se situam os respetivos terrenos baldios ou que aí desenvolvam uma atividade agroflorestal ou silvopastoril”. Para além de ser um conceito difuso, põe de lado os usos e costumes locais que sempre pautaram a definição dos utilizadores dos baldios e que garantiam o direito de exclusão local de utilizadores. Por outro lado, os limites dos baldios não correspondem aos limites administrativos das freguesias, já que foram estipulados de acordo com os usos e costumes. Esta lei foi fortemente contestada pelo movimento associativo dos baldios e encontra-se hoje em processo de revisão.

Em paralelo, a criação de áreas protegidas, que em Portugal abrange sobretudo as zonas montanhosas, onde se encontra a maior área de baldios, tem sido descrita por alguns autores como um processo de re-territorialização das zonas periféricas por parte do Estado, expandindo a sua autoridade como única entidade legítima de gestão ao estabelecer normas de acesso e uso (Vaccaro, 2008). Para Vaccaro, enquanto territorialização se refere à redefinição pública dos limites territoriais e das normas de acesso aos recursos naturais, re-territorialização será a reorganização estatal de um espaço já dominado, em maior ou menor medida, por instituições públicas (Vaccaro, 2008).

Segundo Haesbaert (2007), qualquer processo de desterritorialização – tido na literatura como sendo sobretudo um processo desenraízador, conducente à perda de controlo de grupos subalternizados sobre o seu território (Haesbaert, 2014) - constitui na verdade um processo de criação de novos territórios - re-territorialização -, uma vez que o homem é um “animal territorial por natureza” (Haesbaert, 2007, p. 20). Nas palavras do autor “o que existe, de fato, é um movimento complexo de territorialização, que inclui a vivência concomitante de diversos territórios - configurando uma multiterritorialidade” (Haesbaert, 2007, p. 20). Contudo, quando os vários territórios que compõem essa multiplicidade se inscrevem de forma hierárquica no espaço, a perda de segurança ou controlo sobre os seus territórios acontece àqueles “mais precariamente territorializados” (Haesbaert, 2007, p. 20). É portanto nesta dimensão social da desterritorialização que, no ponto de vista de Haesbaert, o termo terá melhor aplicação. Neste sentido, a criação de áreas protegidas, mais do que ecológico, é um projecto político, com importantes consequências sociais e económicas que envolvem alterações profundas do sistema local de propriedade, restabelecendo direitos, legitimidades e jurisdições e que implica a inserção de instituições públicas na gestão do território (Vaccaro, 2008). Esta ideia é seguida por autores como Vallejo (2002), Heidrich (2009) e Ferreira e Mello (2016), e vai ao encontro do conceito de territorialidade apresentado e discutido por Sack (1983) como “tentativa de afectar, influenciar, ou controlar acções, interacções ou acesso, afirmando ou tentando reforçar o controlo sobre uma área geográfica específica” (Sack, 1983, p. 1). Tentativa perpetrada, por exemplo, pelo Estado aquando do estabelecimento de áreas protegidas, acrescenta-se aqui. Para Vaccaro (2008) a subordinação das zonas rurais da Europa às políticas europeias representa a mais recente onda de re-territorialização.

Em 1986 Portugal aderiu à União Europeia (UE) submetendo o seu sector agrícola à regulação da Política Agrícola Comum (PAC) que passou a ser, desde então, o principal factor de influência no sector agrícola em Portugal. Com a reforma da PAC em 2000, a política de desenvolvimento rural, baseada na multifuncionalidade, sustentabilidade, competitividade e dispersão da atividade agrícola em todo o território, assumiu-se como uma componente essencial do modelo agrícola europeu, reforçada após 2013 na Estratégia Europa 2020, que pretende:

“ (…) Restaurar, preservar e melhorar os ecossistemas agrícolas e florestais (biodiversidade, água, solo) (…) Promover a inclusão social, a redução da pobreza e o desenvolvimento económico (facilitar a criação de emprego, promover o desenvolvimento local (…) ”. (Parlamento Europeu, 2016).

Estas directrizes servem de guião ao Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) em Portugal para 2014-2020. No PDR os Apoios Zonais (AZ) de Carácter Agroambiental (denominados Intervenções Territoriais Integradas - ITI - no programa anterior) têm o objectivo de restaurar, valorizar e proteger a biodiversidade no âmbito da Rede Natura 2000 e apoiar os agricultores que, “numa lógica de gestão activa, assumam compromissos agroambientais em zonas inseridas na Rede Natura 2000 com valores naturais específicos” (Portaria 56/2015, de 27 de fevereiro, capítulo III, artigo 14º).

As alterações políticas e socioeconómicas referidas até aqui promoveram novos usos no baldio (ex. produção de energia, instalação de antenas, turismo) e a perda de importância das actividades tradicionais (ex. actividades que contribuem directamente para as economias dividuais dos compartes, como recolha de mato, de lenhas, de madeira, o pastoreio, o fabrico de carvão, de mel, etc.).

Os baldios deixaram de ter um papel central nas economias de cada morador da comunidade, para passarem a estar associados ao benefício do conjunto dos compartes, através da geração e posterior gestão de receitas. Baptista (2010) refere a existência de três economias actualmente nos baldios: a economia rentista associada ao grupo de utilizadores autorizados; as actividades tradicionais que suportam as economias individuais dos compartes e a economia associada ao uso livre do baldio por parte de várias entidades. Para o autor o controlo do acesso livre para fins de animação turística ou recreativa, e a sua integração na economia dos baldios, deverá ser parte integrante de uma estratégia para a afirmação dos direitos de propriedade e legitimação da propriedade comunitária (Baptista, 2010). Outros autores realçaram o potencial papel dos baldios no desenvolvimento local, encarados como espaço de oportunidade (Simões & Cristóvão, 2012; Frazão, 2013). Contudo, a evolução da terra (outrora) agrícola para um espaço de consumo pressupõe a adaptação das comunidades locais aos novos usos que vão preenchendo os vazios deixados pelo abandono progressivo da agricultura.

 

III. MÉTODOS

Entre maio e outubro de 2015 efectuaram-se entrevistas semiestruturadas a membros dos Conselhos Directivos (CD) nas 30 unidades de baldio, inseridas parcial ou integralmente no território do PNPG. Em cada baldio entrevistou-se um elemento do CD, excepto em duas aldeias em que a reunião/entrevista decorreu com mais do que um membro do órgão gestor (ex. Travassos do Rio em que esteve presente o presidente da Assembleia de Compartes (AC) e Lamas de Mouro em que estiveram presentes quatro elementos do CD e AC). Ao longo destas entrevistas pretendeu-se caracterizar o baldio, designadamente no que se refere às características físicas e usos do baldio, aos seus utilizadores, às dinâmicas com o meio envolvente (ex. Estado, autarquias) e à instituição que os gere. Paralelamente efectuaram-se entrevistas semiestruturadas a dois funcionários do ICNF, um integrado na Estrutura Local de Apoio (ver nota V) e um técnico de acompanhamento das equipas de sapadores florestais e também comparte num baldio. Com estas abordagens pretendeu-se obter outra perspectiva da dinâmica ICNF/baldios (além da dos compartes). Assim as questões focaram sobretudo os pontos que permitiram compreender a forma como a dinâmica entre estas instituições acontece na actualidade, tanto ao nível da prevenção de incêndios, como ao nível do acesso às ajudas da UE dos agricultores do Parque. Entrevistou-se igualmente um antigo presidente do PNPG e o presidente da Federação Nacional de Baldios. No decurso do trabalho e também em contextos paralelos (ex. seminários) estabeleceram-se conversas informais com compartes e membros do movimento associativo dos baldios, a nível nacional e internacional (ex. Galiza).

O principal intuito deste artigo prende-se com a análise das questões relacionadas com a gestão dos baldios do PNPG na actualidade, tendo em atenção os seus vários utilizadores. Tratando-se de um Parque Nacional são vários os níveis institucionais actuantes, tornando esta situação particularmente interessante para os objectivos que aqui se propõem. O PNPG foi criado em 1971 com fins educativos, turísticos e científicos através do Decreto-Lei nº187/71, de 8 de Maio e abrange 69 596 hectares, 22 freguesias, distribuídas por cinco municípios incluídos em três distritos: Melgaço, Arcos de Valdevez e Ponte da Barca (Viana do Castelo), Terras de Bouro (Braga) e Montalegre (Vila Real) (ICNF, 2016). De acordo com os dados do Recenseamento Geral da População de 2001, a população do Parque rondava os 11 000 habitantes (ICNB, 2010). Ao longo do século passado esta região perdeu muita população, como consequência da emigração, que ali se fez sentir com mais força nas décadas de 1960 e 1970 (perdendo 12,4% e 21,6% da população, respectivamente). Durante a década de 1990, a tendência negativa manteve-se, ao contrário da tendência nacional e do norte em particular. Em 2001 o sector terciário era já o principal sector de actividade (39,3%), verificando-se a perda de importância do sector primário (24,9%), que em 1991 era ainda o sector com maior número de empregados (52,6%) (ICNB, 2010).

Favorecido pelas transformações socioeconómicas e demográficas caracterizadoras da generalidade das zonas rurais interiores, o turismo de natureza tem vindo a ganhar importância em Portugal, designadamente nas áreas protegidas, sendo hoje considerado um dos segmentos mais promissores e com maior crescimento. O PNPG não é excepção, constatando-se no seu território um aumento do número de visitantes e o alargamento das actividades turísticas (ex. desportivas; de contemplação da paisagem e dos recursos) e dos promotores de serviços turísticos (ICNB, 2008; Gomes, 2014). De acordo com Gomes (2014) no período de 2007 a 2013 o número de visitantes aumentou cerca de 50%, o que coincidiu com a criação das Portas do Parqueii. Foi também neste período que se registou um aumento notório no número de visitantes estrangeiros (50% de crescimento não linear ao longo do período de 1996 a 2011, sendo mais claro o aumento a partir de 2007), reflexo da adesão do PNPG à rede Pan Parksiii e consequente inclusão no roteiro dos grandes operadores turísticos especializados em turismo de natureza (Gomes, 2014). Sendo o PNPG uma instituição pública inscrita num território que é maioritariamente propriedade comunitária (71% baldios; 21,6% área privada e 7,4% mata nacional), verifica-se contudo que o turismo é principalmente explorado por entidades privadas. Neste estudo questiona-se a forma como estas iniciativas se inserem no contexto da propriedade comunitária e do desenvolvimento local.

 

IV. RESULTADOS

1. Gestão do baldio

Nos dias de hoje a gestão dos baldios do PNPG centra-se: i) na gestão e recuperação de pastagens e de infraestruturas úteis ao pastoreio, inseridas nas medidas agroambientais do PDR; ii) na distribuição da área de pastagem de baldio pelos produtores da comunidade para acesso aos pagamentos directos da UE; e iii) na gestão da floresta.

As Intervenções Territoriais Integradas (ITI) foram introduzidas com o PRODER 2007-2013iv. Os apoios das ITI, destinados aos baldios do PNPG, visavam a gestão do pastoreio, cujo financiamento dependia da área do baldio considerada pelo Estado como elegível para pastagem. Pressupunha-se a prévia organização dos compartes em Assembleia com eleição do Conselho Directivo (CD). No âmbito de cada ITI, foi criada uma estrutura de natureza técnica, a Estrutura Local de Apoiov (ELA), que se assumia como um instrumento de apoio ao acompanhamento e gestão desta medida. Ao aceder às ITI os compartes dos baldios do PNPG tinham que cumprir alguns compromissos gerais, entre os quais: i) manter a área agrícola livre de infestantes arbustivas em toda a área declarada; ii) manter as árvores, os muros de pedra posta e outros elementos patrimoniais importantes para a paisagem; iii) manter os pontos de água acessíveis à fauna, e iv) manter a vegetação arbórea e arbustiva ao longo das linhas de água (PRODER 2007-2013, p. 244). As medidas agroambientais no PNPG têm-se concretizado sobretudo com a limpeza de matos nas áreas de pastagem (ponto i) e manutenção dos elementos patrimoniais considerados no ponto ii). No PDR 2014-2020 o Apoio Zonal (AZ) do PNPG continua a apoiar a gestão do pastoreio nas áreas de baldio. Contudo, medidas nacionais inspiradas no novo regulamento da UE (1307/2013) para os pagamentos diretos aos agricultores, resultaram na aplicação de um coeficiente de redução da elegibilidade de 50% nas áreas de “prados e pastagens permanentes com predominância de vegetação arbustiva caracterizadas por práticas de pastoreio de carácter tradicional em zonas de baldio” (Portaria nº 57/2015, de 27 de fevereiro, anexo II, p. 1244) e na exclusão total de áreas de floresta, zonas queimadas, rochas, água, etc.. Estas medidas tiveram um impacto substancial na extensão da área elegível para pastagem em zonas de montanha. Refira-se que na prática local de pastoreio, os animais são deixados no monte livremente durante os meses de verão, encontrando pasto não apenas em zonas de vegetação herbácea, mas também em zonas de mato, entre pedras e sob coberto florestal. Na ausência de terra própria suficiente para a produção animal, os produtores utilizam a área do baldio (elegível para pastagem), em hectares, para perfazer a área mínima necessária para aceder aos subsídios à produção animal. Assim a redução da área do baldio elegível para pastagem dificulta, por um lado, o acesso aos pagamentos directos dos produtores; por outro, diminui o valor monetário e os benefícios locais (ecológicos e sociais) provenientes da implementação da medida ITI/AZ. A distribuição dos hectares elegíveis como pastagem no baldio pelos produtores da comunidade é feita pelo órgão gestor do baldio, que tem em conta o número de produtores e o efectivo animal. Um comparte de Montalegre explica as contradições implícitas na definição de áreas elegíveis:

“O IFAP vi diz que foi imposição da comunidade europeia, já tivemos informações contraditórias. Fizeram uma visualização fotográfica, viram como é que era o terreno e reduziram as zonas de albufeiras, os caminhos, os afloramentos rochosos. Ou seja se olharmos de cima aqui na nossa serra só se vê rocha, embora nós tenhamos as cabras lá todo o ano nessa rocha (…) eles dizem que não tem forrageira. Mas pronto, está-se a tentar mudar isso, andamos aí na luta porque precisávamos mesmo desses hectares para fixar as pessoas aqui. (…). Depois de ser feita essa leitura aplicaram uma redução de 50% à área forrageira, só que no nosso caso foi muito mais que isso, no Parque alguns tiveram mais que 90%vii de corte da área forrageira.” (Comparte da região de Montalegre).

Face à alteração dos critérios de elegibilidade das pastagens, os compartes mobilizaram-se, com o apoio da Federação Nacional de Baldios, e elaboraram um manifesto subscrito por todos os CD e autarquias da zona do PNPG e pelas associações que trabalham com os baldios do Parque. De acordo com os compartes, o governo não se demoveu e o impacto nas ITI manteve-se. Contudo o governo viu-se obrigado a minimizar o impacto que a redução nas áreas elegíveis para pagamentos directos teria sobre os produtores, reduzindo para isso a área mínima obrigatória por animal.

A maioria dos baldios do Parque recorre a empresas contratadas localmente para efectuar as limpezas das pastagens previstas nas ITI/AZ. O valor anualmente entregue aos compartes garante a mão-de-obra. Sobrando, o montante é empregue na gestão do baldio, aquisição de equipamento (ex. tractor; carro para vigia do baldio) e muitas vezes em benefício da aldeia, como se verifica no discurso do presidente da Junta de Freguesia (JF) e da Mesa da Assembleia de Compartes de um baldio da região de Montalegre:

“Nós temos a tal ITI e temos uma verba. Se nós conseguirmos fazer o trabalho [as limpezas das áreas de pastagem] com os sapadores é dinheiro que estamos a poupar, ou então tentar negociar com a empresa que for fazer, e esse dinheiro aplicamos na limpeza de estradões, ou recuperação dos tanques dos pontos de água para as vacas beberem, imagine, se há um telhado de uma igreja que está a precisar (…), ou mesmo uma infraestrutura que seja necessária na aldeia, por exemplo, tínhamos aqui um rego que estava a causar muitos problemas à aldeia e [entre] a Junta e o baldio chegámos a acordo e fizemos a obra.” (Presidente da Junta de Freguesia (JF) e da Mesa de Assembleia de compartes de um baldio da região de Montalegre).

Em 1999 o governo fomentou a criação de equipas de sapadores florestais a nível nacional como forma de contribuir para a prevenção de incêndios. Por incentivo do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade (ICNB) na altura, muitos baldios do PNPG têm hoje a seu cargo equipas de sapadores florestais. O plano de Sapadores Florestais (Decreto-Lei n.º 179/99, de 21 de maio) incidiu especialmente nos espaços florestais privados e nas áreas baldias de todo o país, estando hoje as equipas mais concentradas na zona norte e centro, em concordância com a distribuição das manchas florestais (ICNF, 2016). Segundo o ICNF (comunicação oral, 2015) existem no Parque cerca de 12 a 13 equipas de sapadores associadas a baldios. As equipas são formadas por cinco pessoas, homens ou mulheres, preferencialmente oriundas da região onde virão a trabalhar. Em alguns casos a equipa é partilhada por baldios da mesma freguesia. Nem todos os baldios quiseram na altura aderir ao programa, verificando-se casos de empréstimo de serviços entre baldios. Hoje as opiniões dos compartes dividem-se relativamente à relevância destas equipas. Um comparte declara:

“Fazem um trabalho excepcional, trabalho que as pessoas à primeira vista não vêem mas depois quando chega a altura da verdade… olhe, os incêndios reduziram 70 a 80%, fazem as limpezas (…). Se for preciso no período em que é permitido fazem alguma queimada para depois no verão não termos esses incêndios que por aí se vêem. E quando há um incêndio, porque há sempre, são os primeiros a actuar. (…) Acho que foi das melhores coisinhas, aí sim, o Parque trabalhou.” (Comparte da região de Montalegre).

Por outro lado, um comparte de outro baldio do concelho de Montalegre argumenta:

“A equipa, em termos de trabalho, não era muito visível, e depois nós acabávamos com o dinheiro das ITI. O que íamos buscar em trabalho não nos compensava, nós com pouco dinheiro fazíamos o mesmo trabalho.” (Comparte da região de Montalegre).

Quando o trabalho florestal não requer o seu tempo integral, as equipas são também usadas em outros trabalhos relevantes para a freguesia, como a limpeza de caminhos e de estradas, em algumas obras da aldeia:

“Se não fossem as equipas de sapadores as freguesias estava tudo ao abandono, porque ninguém limpa nada (…). Tudo o que é estradas, até nas próprias povoações (…), nós fazemos tudo, fazemos limpeza de canos e das estradas.” (Presidente da JF e do CD de um baldio da região de Arcos de Valdevez).

Ao fim de um ano, pagar o salário e restantes custos associados a cinco pessoas (ex. segurança social) e aos equipamentos (ex. manutenção da viatura, combustível) só é possível com o montante que os compartes conseguem fazer sobrar das ITI, com a venda de madeira, ou, nalguns casos, com o apoio das autarquias:

“Hoje o Estado não nos dá dinheiro [suficiente] para podermos [fazer] sobreviver os sapadores. Os CD não conseguem arranjar dinheiro para pagar. Nós ainda damos uma certa quantia, mas é preciso andarmos aí de volta de algumas instituições, a Câmara ou outras, para podermos sustentar essas pessoas. A questão é que são 5 pessoas que andam a trabalhar, se um dia acabar são 5 empregos que vão ao ar.” (Comparte da região de Montalegre).

Ainda assim, a importância da criação local de postos de trabalho nestas equipas é realçada. No período crítico de incêndios os sapadores dedicam-se prioritariamente ao “serviço público”, ou seja, à prevenção ou combate a incêndios, deixando de estar disponíveis para os trabalhos do baldio. Assim, o ICNF contribui com uma verba anual para cada uma das equipas de sapadores, sendo os restantes encargos cobertos pelos baldios. O PNPG, através do então ICNB, participava igualmente no pagamento das equipas, contribuição que cessou em 2013 com a fusão do ICNB com a Autoridade Florestal Nacional e consequente criação do ICNF (Despacho n.º 16143/2013).

A gestão da floresta para produção (ex. pinheiro-bravo) limita-se à gestão da regeneração natural do pinheiro bravo. Nos baldios em cogestão, 40% da receita conseguida com a venda de madeira é entregue ao Estado (ICNF)viii . Contudo, os compartes resumem a actuação do ICNF na floresta à selecção de árvores para abate e negociação da respectiva venda. Porém, verificam-se alguns casos de plantações em que o ICNF ou outras entidades fornecem as árvores e o baldio custeia a plantação:

“Fizemos plantação de à volta de 10 000 árvores, uma plantação de carvalhos em colaboração com a Quercus (…). Fizemos mais duas plantações, uma à volta de 4 000 árvores, também carvalhos, cedros, também com a Quercus, e depois nossa mesmo foi com a ajuda do engenheiro X (…) que nos arranjou aí bastantes árvores, tudo à nossa custa essa plantação.” (Comparte da região de Terras-do-Bouro).

As plantações efectuadas nos baldios do PNPG são em regra com espécies autóctones, sem intuito de criar rendimento. O investimento na floresta de produção não é incentivado pelo ICNF. Por outro lado, o receio dos fogos e a expectativa da partilha da receita com o Estado, considerada desadequada face à ausência do ICNF na gestão florestal, tem conduzido à falta de interesse dos compartes em investir na floresta de produção.

2. O turismo e a trama institucional e jurídica: ICNF, PAC e compartes

O PNPG é hoje um dos destinos turísticos mais procurados em Portugal, procura que tem vindo a aumentar (ICNB, 2008; Gomes, 2014). Neste âmbito, as directivas europeias e políticas nacionais consideram relevante a recuperação do património cultural local como “elementos caracterizadores da paisagem”. Assim, estruturas como casas de abrigo de pastor, parques e troncos de maneio, mariolas, pontos de abeberamento para a fauna, vedações, percursos de pastoreio, fojo do lobo, cilha dos ursos, poios e currais, têm sido recuperadas recorrendo aos investimentos não produtivos associados aos pagamentos agroambientais (PRODER 2007-2013, p. 249).

A deslocação no Parque, entre aldeias ou ao longo da serra, implica a passagem inevitável por baldios. Os balios são áreas extensas que atingem milhares de hectares. Na zona do PNPG em particular registam uma média de 3 300 hectares, considerando as 30 unidades de baldio inseridas no Parque e quatro localizadas na zona limítrofe. Ao contrário dos limites entre baldios, que não se impõem ao transeunte, na mata pública a passagem do limite de propriedade não é apenas evidente, como é obrigatório o pagamento de uma taxa de passagem. Aqui o uso abusivo ou o excesso de carros ou pessoas é expressamente controlado. Salvo iniciativas excepcionais de pouca monta e algumas ideias de projectos, não se verifica nos compartes a mobilização para controlar e beneficiar economicamente do acesso e uso dos baldios por utilizadores externos. Na perspectiva dos compartes, a paisagem como recurso para contemplação parece estar associada a um bem de livre acesso, não quantificável. As pessoas podem e devem entrar, caminhar e desfrutar, desde que não estraguem. Já os recursos que nela se produzem, as madeiras, o pasto, os matos, tudo isso tem dono, é da comunidade, e o seu uso deve ser controlado e gerido. Esta posição está patente no discurso dos compartes:

“Não [cobramos], a associativa de caça e pesca não [paga], e também há muitas [associações] por aí que fazem trilhos e que andam aí constantemente e que também não pagam nada. Nunca optámos por isso, repara que os baldios também ganham com isso, e acho que se calhar afastávamos as pessoas (…). Alguém está a ganhar dinheiro, mas o baldio nunca cobrou nada a ninguém, mantemos tudo limpinho, tudo o que é trilhos (…). É lógico [que ganhamos com a presença dos visitantes] são os cafés, [é] tudo. O que faz funcionar uma coisa faz funcionar a outra, as coisas encostadas funcionam, se não há encosto nada funciona. Passam lá, investem, gastam nos cafés, dormem na Peneda muitas vezes, lá no hotel.” (Comparte da região de Arcos de Valdevez).

A economia do baldio é posta em segundo plano, em prol das economias individuais daqueles que criaram condições para tirar proveito da presença dos visitantes (ex. donos de cafés, restaurantes, pensões). Taxar a visitação poderá beneficiar a economia do baldio, mas, na perspectiva dos compartes, pode pôr em causa as iniciativas individuais.

A falta de motivação dos compartes para gerir o acesso livre de visitantes aos baldios abre espaço para um número considerável de empresas privadas de animação turística (ex. BTT, desportos aquáticos, percursos pedestres). Esta coexistência despoleta contudo alguma objecção localmente:

“Não, nós não proibimos o [uso do baldio]. Só às vezes temos um bocadinho de [preocupações], é que há muito pessoal que agarra nas moto-quatro e nas motas e metem-se aí pelos caminhos acima e às vezes andam para aí a fazer buracos.” (Comparte da região de Arcos de Valdevez).

“Já chamei várias vezes à atenção da [nome da empresa], porque eles lá nos crossings com a bicicleta que eles têm, a gente nota às vezes que os caminhos estão todos escavacados, todos estragados.” (Comparte da região de Terras do Bouro).

Passeios de cavalo, jeep e mota são igualmente referidos pelos compartes como sendo organizados pelas empresas de animação sem preocupação aparente em cuidar dos recursos, maioritariamente mantidos pelos compartes.

Tratando-se de um Parque Nacional, o Plano de Ordenamento (PO) estabelece outra camada de regras que limita os usos dentro da área protegida. Contudo, subjacentes ao PO estão os objectivos estabelecidos para a criação do Parque, que não assentam necessariamente nos usos e costumes das populações que usam e gerem os baldios.

Não obstante, é principalmente sobre estas populações que as consequências de um uso desadequado recaem, como se verifica no caso dos percursos e caminhos. As autarquias, através da organização de eventos, também tiram partido dos baldios (ex. feiras do gado). Igualmente, o Parque, através do ICNF, no que respeita à visitação, tem assumido posições que transgridem o limite da propriedade comunitária. Em seguida descrevem-se exemplos que ilustram a relação entre o ICNF e os baldios.

O parque de campismo de Travanca, no concelho de Arcos de Valdevez foi construído nos anos oitenta do século XX numa zona onde está instalada uma casa florestal dos tempos da florestação pelo Estado Novo. O Estado assumiu que se tratava de terreno público, embora o terreno integrasse o baldio de Cabana Maior. Ao ser confrontado pela JF, que na altura geria o baldio, o Estado não aceitou o regime de propriedade. O caso foi para tribunal e a JF ganhou o processo. Actualmente o parque de campismo encontra-se em funcionamento e não paga qualquer renda ou indemnização ao baldio. Segundo um comparte, presidente da JF na altura da construção do parque de campismo:

“Nunca os obrigámos a pagar nada, nós quisemos foi clarificar a situação. Aquilo não dá para pagar os salários ao pessoal. Chegou-se à conclusão que não era justo, ou tinha que o parque deixar de funcionar, ou tínhamos que deixar o parque funcionar e ter a possibilidade de conseguir um posto de trabalho ou dois, temporário, para alguém da freguesia.”

Hoje o parque de campismo é gerido pela Associação Regional de Desenvolvimento do Alto Lima (ARDAL)ix , uma junção de várias entidades, entre as quais a Câmara Municipal de Arcos de Valdevez. Verifica-se que de facto existem cinco ou seis pessoas da região empregadas na recepção (em 2015 a dificuldade de recrutar pessoal localmente levou à contratação de pessoas do Porto para a recepção), na gestão da limpeza e na logística do local, ainda que. O parque encontra-se aberto só no período estival, restringindo-se a oferta de trabalho a esse período. Não obstante, a negociação, que obrigou à reivindicação dos compartes, teve um papel importante na gestão colaborativa entre compartes e ICNF de um espaço reclamado pelas duas instituições.

Um outro caso que ilustra as relações institucionais e jurídicas entre o ICNF e os baldios refere-se às casas florestais, construídas nos baldios florestados pelo Estado Novo (1938-1968) para habitação dos guardas que fiscalizavam os usos do monte e os trabalhos de florestação. Enquanto o Estado defende que as casas são propriedade pública, os compartes contestam a posse estatal. Alguns juristas defendem que as casas, estando em terreno baldio, são dos compartes, e instam à sua ocupação (Bica, comunicação oral, I Jornadas conjuntas em territórios comunitários, 2016). A indefinição dos direitos de propriedade gera discórdia e tem conduzido à degradação desse património, por falta de uso e impossibilidade de reversão da situação. Esta insatisfação é manifestada pelos compartes:

“Não nos facilitam nada. Mesmo as casas florestais, um património que está delapidado, onde tudo roubam. Tudo o que é pedras, rios, não se importam, [mas] se a gente tomar conta daquilo [da casa florestal], ou a JF ou os baldios, não podemos. Portanto está tudo ao deus dará, está tudo sem rei nem roque (…) as casas florestais deviam ser para a freguesia, para os CD. Eu já pedi a nossa que era para os sapadores, que era para a zona de caça, que era para o CD, mas não tivemos resposta (…), já há anos.” (Comparte da região de Arcos de Valdevez)

Em alguns casos, menos frequentes, as casas estão a ser usadas pela população: na Gavieira, a casa é hoje a sede da JF e em Paredes do Rio estabeleceu-se uma casa de pernoita para visitantes. Numa destas freguesias existem outras dez casas florestais ao abandono, umas das quais foi vendida a um particular mas, segundo o presidente da JF e do CD do baldio, “não está vendida porque ninguém consegue registar, a casa é do Estado mas o espaço é da freguesia”.

O último caso que se apresenta para ilustrar a relação institucional entre o baldio e o ICNF refere-se à criação das Portas do Parquevi , conceito criado e implementado em 2004 para promover o contacto entre o visitante e o Parque/ICNF. Nestas zonas geram-se receitas, com a venda de lembranças, mapas e acesso a actividades, que revertem a favor da entidade que gere a porta (ex. ICNF, Câmara Municipal). Algumas destas portas estão localizadas em baldios, onde os compartes vêem o acesso e usufruto da paisagem como direitos não taxáveis. Não obstante, numa das portas os compartes reivindicaram uma parte da taxa paga pelos visitantes. Diz o presidente da JF e também do CD do baldio: “este território é nosso, isto está tudo na área do baldio”, justificando a iniciativa. A taxa cobrada, que hoje reverte em parte para o baldio, garante ao visitante o acesso ao Parque e uma visita guiada por funcionários da Câmara ao castelo e espigueiros da aldeia. Paralelamente os compartes têm investido na melhoria dos trilhos no baldio. A organização e reivindicação dos compartes garantiu-lhes não só o acesso a uma parte dos benefícios proporcionados pela iniciativa do ICNF e autarquia, mas também o controlo das entradas no baldio.

Ao longo dos meses de trabalho de campo constatou-se a existência de várias associações criadas pelos moradores, mesmo nas povoações mais isoladas. Surgiram por diferentes razões: por facilitar o acesso a financiamentos (ex. recuperação do património edificado) ou, recorrendo às palavras de um comparte da zona de Ponte da Barca, “com a extinção das freguesias, a saída das JF, achámos que devia haver alguém que defendesse os interesses das pessoas”, ao referir-se à associação de moradores da sua aldeia. Estas associações, independentemente do que motivou a sua formação, mantêm-se a funcionar, a maioria com o objectivo de preservar os valores naturais e culturais locais e de contribuir para o bem-estar da comunidade:

“Temos aí uma associação (…) para o desenvolvimento daqui da aldeia e [para] manter as tradições. Fazemos a matança do porco, o trilho do medronheiro, plantação dos currais na serra (…), muitas actividades.” (Comparte da região de Montalegre).

Embora hoje existam entidades formadas pela parceria entre diferentes instituições (ex. ARDAL) que fomentam a colaboração entre diferentes actores, parece existir um hiato entre a acção destas instituições e a das associações baseadas nas aldeias. A inclusão destas associações naquelas parcerias poderia alavancar a integração dos compartes nas iniciativas de dinamização dos espaços comunitários. Por outro lado, constatou-se em aldeias como Fafião, Cabril e Pitões das Júnias no concelho de Montalegre ou Ermida no concelho de Terras do Bouro, a aproximação das gerações mais jovens a cargos de direcção nas entidades gestoras dos baldios. Assim, a capacidade que falta aos mais velhos para integrar os novos usos na gestão do baldio, poderá ser encontrada nestes jovens e nestas associações. A mudança geracional poderá potenciar outro tipo de relacionamento e sinergias com os restantes actores do PNPG, de que são exemplo as empresas de animação turística e as próprias instituições estatais.

 

V. DISCUSSÃO

Pelo que foi apresentado até aqui podem avançar-se alguns aspectos da gestão actual dos baldios com influência sobre o tecido económico-social da região. A criação de emprego está associada às equipas de sapadores. Adicionalmente, para as limpezas das pastagens, recorre-se, sempre que possível, a empresas sedeadas na região, fomentando o tecido empresarial local. Numa outra vertente, o baldio como suporte da produção animal permite: i) o acesso aos pagamentos directos da PAC a produtores sem terra ou com terrenos com área insuficiente, garantindo-lhes a possibilidade de manter a sua unidade de produção; e ii) a instalação de jovens agricultores pertencentes à comunidade. Por outro lado, medidas como as ITI/AZ, que permitem o uso do montante remanescente da limpeza da pastagem em benefício da aldeia e freguesia, constituem mais um benefício para as comunidades locais, sobretudo perante o orçamento reduzido das autarquias. Estas medidas contribuíram também para reactivar o trabalho colectivo, ao exigir que comunidades ainda não organizadas em Assembleia e CD, constituíssem a sua entidade gestora como condição para terem acesso às ITI/AZ. A partir daí, toda e qualquer decisão associada ao baldio seria tomada pela Assembleia de Compartes e posta em prática pelo CD.

O crescente trabalho burocrático associado aos baldios, derivado também da gradual integração destes territórios nos programas de financiamento, tem levado à formação de associações que fornecem apoio informativo e administrativo aos órgãos de gestão dos baldios. A decrescente capacidade do ICNF em garantir este apoio aos proprietários inseridos no PNPG é indissociável desta questão. De qualquer modo, a presença destas associações hoje instaladas na região, tem um papel importante na criação de postos de trabalho e no fornecimento de um serviço de proximidade aos compartes, que contribui para a melhoria do funcionamento do sistema de subsídiosx.

No que diz respeito à inclusão do turismo nas actividades do baldio, verifica-se a integração dos agricultores/compartes nas estratégias de gestão da paisagem propostas pela UE, que têm implícita a ideia de espaço de consumo. Contudo, no que diz respeito às iniciativas locais, a ideia de uma paisagem rentável não foi ainda apropriada pela generalidade dos compartes. Associada a esta questão poderá estar também a alteração relativamente recente da função do baldio na comunidade, de provedor da economia de cada morador para gerador de receitas em benefício do grupo. Como se viu, as iniciativas dos membros da comunidade para tirar partido do turismo são priorizadas, em detrimento da ideia de provento a reverter para o baldio como instituição, mantendo-se o monte como provedor das economias individuais dos moradores. Não obstante, constatou-se a existência de iniciativas dos compartes que buscam já a colaboração com os restantes actores para tirar partido da conjuntura criada, em benefício do baldio (ex. receita da Porta do Parque a reverter também para o baldio).

Nas comunidades do PNPG o tempo é de transição e, não assumindo os compartes um papel activo no controlo e gestão dos novos usos dos baldios, o número de empresas de animação turística que acedem aos baldios vai crescendo e o usufruto dos recursos vai sendo privatizado em benefício sobretudo de actores externos. Neste processo há dois intervenientes que beneficiam directamente: i) a empresa que desenvolve a sua actividade; e ii) o ICNF que concretiza, por delegação de funções, uma das medidas que se propôs cumprir no Parque, a de “manter um plano de visitação que cumpra fins culturais, educativos e recreativos”, e que recebe a taxa de licença requerida à empresa. Contudo não se verifica a participação activa do ICNF ou das empresas na manutenção do baldio, que recai maioritariamente sobre os compartes.

O Parque/INCF é visto pelos intervenientes externos como a autoridade máxima sobre o território, e a sua conivência, e das autarquias, no perdurar dessa situação, parece estar a contribuir para a permanência do controlo dos baldios por parte do Estado. Situações como a manutenção da tutela das casas florestais ou a demarcação de portas de acesso ao Parque em pleno baldio pelo ICNF, parecem ser indissociáveis desse status quo instituído e integrado pela generalidade da sociedade civil, que assume o território do Parque como propriedade pública. Paralelamente, a incapacidade ou falta de vontade ou de autorreconhecimento de legitimidade, das populações em se organizarem para controlar o acesso livre das actividades turísticas e de lazer em seu benefício, vem reforçar aquela situação. A evolução da situação de livre acesso ao baldio, para além de pôr em risco a manutenção dos recursos usados, ao não definir regras de uso (Ciriacy-Wantrup, 1975; Ostrom, 1990; Bromley, 1992), tenderá a comprometer a própria propriedade comunitária (Vaccaro, 2008; Baptista, 2010).

 

VI. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A submissão do sector agrícola à PAC sujeitou a paisagem rural às orientações da política europeia. Embora hoje se verifique o envolvimento das populações locais na manutenção da paisagem numa lógica de gestão activa, através de esquemas de subsídios, essa gestão atende à ideia de paisagem defendida pela PAC, pelo Parque Nacional, e procurada pelos visitantes.

As comunidades do PNPG constituem hoje uma população escassa e envelhecida que assiste a alterações profundas num sistema de que foi parte integrante mas do qual vem sendo apartada. Ampliar a capacidade de negociação e poder reivindicativo dos compartes num ambiente institucional complexo como é o PNPG, parece ser fundamental para a defesa da propriedade comunitária. Relativamente a estas questões verificam-se hoje duas tendências que poderão vir a ter um papel chave: i) verifica-se ainda, em muitos baldios do PNPG, a existência de uma ligação forte dos compartes ao monte e laços sociais importantes nas comunidades, que se confirma nas inúmeras associações que se vêm criando nas várias aldeias do PNPG e na participação dos jovens nos órgãos de gestão em alguns baldios; e ii) o movimento associativo dos baldios apresenta hoje uma dinâmica que se tem evidenciado nas lutas mais recentes, como a contestação à nova Lei dos Baldios e ao recente corte nas áreas elegíveis para pastagem. O movimento tem servido de plataforma para a discussão e reclamação dos direitos dos compartes, e pode ser um apoio instrumental na afirmação dos compartes do PNPG.

 

AGRADECIMENTOS

A autora agradece a Joana Sousa, Iva Pires, Patrícia Colucas e Vítor Luz o trabalho de revisão que ajudou a melhorar este manuscrito.

 

FINANCIAMENTO

Este trabalho foi apoiado pela Fundação para a Ciência e Tecnologia com a Bolsa de Doutoramento SFRH/BD/61381/2009.

 

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Recebido: setembro 2016. Aceite: janeiro 2017.

 

 

NOTAS

i A vezeira é a prática de pastoreio em comum em que os proprietários dos animais levam o gado para a serra - baldio - e cuidam do gado à vez, passando a responsabilidade por todos os membros. A vezeira ainda é hoje praticada em algumas aldeias como Fafião no concelho de Montalegre, ou Vilar da Veiga e Ermida no concelho de Terras do Bouro, embora o número de animais e de pastores seja hoje bastante menor face aos tempos áureos da agricultura e pastorícia. Também a recolha de recursos do baldio (e.g. madeira, lenha, matos, uso do espaço para instalação de colmeias, etc.) se mantém hoje regrada segundo os usos e costumes locais.

ii As Portas do PNPG foram criadas com o objectivo de proporcionar a recepção, a informação, a retenção e a condução orientada dos visitantes no Parque. Foram concebidas para ser os centros privilegiados na informação e enquadramento dos visitantes, na oferta de actividades e programas de visita específicos e também na educação e sensibilização ambiental do público em geral. As Portas estão estrategicamente localizadas na periferia do Parque, nas suas principais entradas, e são estruturas importantes para o ordenamento e gestão do fluxo de visitantes (ADERE, 2016).

iii A organização PAN PARKS pretende criar uma rede da vida selvagem na Europa onde estruturas de turismo se encontrem equilibradas com o desenvolvimento sustentável e a protecção ambiental. Para isso segue uma estratégia de auditorias e de verificação efectuando a certificação de parques que seguem padrões específicos. A sua acção é ainda combinada com o provimento de protecção política a nível local e da Europa http://www.panparks.org/2015/10/pan-parks-foundation-for-europes-wilderness/

iv Quando foram efectuadas as entrevistas (maio-outubro de 2015), as medidas descritas e discutidas com os entrevistados referiam-se às do PRODER 2007-2013, dado que as candidaturas ao PDR 2020 ainda não tinham sido aprovadas.

v De acordo com a Portaria n.º 596-B/2008, de 8 de julho que regula a aplicação da acção n.º 2.4.1 a Estrutura Local de Apoio (ELA) é a estrutura de natureza técnica criada com o objectivo de promover a dinamização e aconselhamento técnico das populações alvo da respectiva ITI” (p. 4264-(4)). A ELA do PNPG é composta pelas seguintes entidades: Associação dos Baldios do PNPG; Associação dos Criadores de Bovinos da Raça Barrosã; Associação para a Cooperação entre Baldios; Cooperativa Agrícola de Arcos de Valdevez e Ponte da Barca; Cooperativa Agrícola dos Produtores de Batata para Semente de Montalegre; Direcção Regional de Agricultura e Pescas do Norte e Instituto de Conservação da Natureza e Florestas.

vi Embora o IFAP seja referido como a instituição por detrás destes procedimentos, de acordo com o ICNF (comunicação oral, 2016) é o Gabinete de Planeamento, Políticas e Administração Geral que estabelece as medidas, o IFAP apenas fiscaliza.

vii O impacto do coeficiente de redução em cada baldio dependeu da dimensão da área do baldio com predominância de matos e da área de floresta, rocha, água, zonas queimadas, etc.

viii Segundo o ICNF (comunicação oral, 2016), embora a lei preveja a entrega de 40% das receitas da madeira ao Estado apenas nos povoamentos plantados pelo Estado nos baldios em cogestão, na prática verifica-se que se assume os 40% para todos os povoamentos florestais, independentemente da sua origem, existentes nos baldios em cogestão no território do Parque, uma vez que o ICNF assume encargos em todos eles (ex. sapadores).

ix Curiosamente, em junho de 2016, o parque de campismo abriu sob a gestão da JF de Cabana Maior, do CD dos baldios de Cabana Maior e da ARDAL. Este poderá vir a ser um exemplo de parceria entre instituições com benefícios para a gestão colaborativa entre os vários actores do território do Parque.

x Poderia questionar-se a lógica ou a validade de um sistema que se apoia em percursos burocráticos tortuosos que tornam imprescindível o recurso aos serviços prestados por estas associações. Contudo este trabalho foca-se apenas na forma como os órgãos de gestão dos baldios se organizam para gerir a realidade que lhes é apresentada e a forma como o sistema que se cria à volta destas interacções contribui (ou não) para o desenvolvimento local.

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