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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.224 Lisboa set. 2017

 

ARTIGO

A constituição do saber profissional: uma contribuição interdisciplinar sobre a dualidade do uso social do conhecimento

The constitution of professional knowing: an interdisciplinary contribution on the duality of social use of knowledge

 

Telmo Caria*

*Departamento de Economia, Sociologia e Gestão da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, Quinta de Prados, Folhadela, 5000-801 Vila Real, Portugal. E-mail:tcaria@utad.pt

 

RESUMO

O artigo tem como objetivo desenvolver os fundamentos sociocognitivos de uma teoria do saber profissional que assenta na seguinte hipótese: o saber profissional tem uma forma dual de conhecer que permite a coexistência de saberes pouco conscientes do fazer e do pensar com princípios e conhecimentos abstratos e formais em contextos de ação e em situações práticas, sem nunca os fundir ou separar totalmente. Esta forma dual de usar conhecimento distingue-o de outros usos sociais do conhecimento e do próprio conceito geral de conhecimento profissional. Para este efeito, o artigo procura desenvolver uma proposta teórica de diálogo interdisciplinar entre algumas correntes da psicologia cognitiva e algumas teorias sociais mais consagradas sobre a dualidade na estruturação da vida social.

Palavras-Chave: saber profissional; dualidade sociocognitiva; poder cultural e simbólico; sistemas e operações cognitivos.

 

ABSTRACT

The article aims to develop the foundations of a sociocognitive theory that is based on the following hypothesis: professional knowledge has a dual form of knowing which allows the coexistence of tacit knowledge of doing and thinking with principles and abstract and formal knowledge in action contexts and practical situations, without merging or separating them completely. This dual way of using knowledge distinguishes it from other social uses of knowledge and from the general concept of professional knowledge. For this purpose, the article seeks to present a theoretical proposal for interdisciplinary dialogue among some branches of cognitive psychology and some of the most renowned social theories on the duality in the structuration of social life.

Keywords: professional knowledge; socio-cognitive duality; cultural and symbolic power; cognitive systems and operations.

 

INTRODUÇÃO

 

Há cerca de 17 anos iniciei uma linha de investigação sobre o saber profissional.1 Tinha por referência central uma problematização teórica dos quadros de pensamento da sociologia da educação à luz das contribuições da antropologia da educação (Caria, 2007a). Procurava pensar o conhecimento que era objeto de transmissão e aprendizagem cultural e escolar para além da abordagem sociológica, dado considerar que esta disciplina pensava por demasiadas vezes os processos de socialização e de aprendizagem apenas por referência ao modelo escolar de conhecimento (mesmo quando o objetivo era a crítica e a desconstrução desse modelo) e às hierarquias sociais de desigualdade de poder cultural e simbólico (Caria, 1999, 2012a).

Esta orientação inspirou-se nas contribuições que na década de 1990 foram dadas por Bernard Lahire (1993) e por Raúl Iturra (1990), quanto às formas de uso do conhecimento escolar e não escolar, conceptualizadas, respetivamente, como “relação escritural” com o conhecimento e “tecnologias do pensamento social”. Ambos os autores, com esta abordagem pretendiam analisar a aprendizagem cultural proveniente das formas escritas de conhecer e de codificar o conhecimento (alfabeto, gramática, aritmética, geometria, princípios jurídicos do direito, princípios ideológicos da política, diversas formas de representação gráfica, etc.), colocando em segundo plano a tradicional análise sociológica das desigualdades de acesso à transmissão do conteúdo do conhecimento escolar (Caria, 2005b; 2006). A exemplo do que, então, já acontecia com a sociologia do conhecimento, tratava-se de pensar o objeto conhecimento em novos termos: a aprendizagem cultural do conhecimento na perspetiva da diversidade das formas de uso social e da diversidade das procuras sociais existentes, para além das formas institucionalizadas de poder cultural (Coulter, 1989).

Entretanto, a partir dos vários estudos etnográficos que fomos desenvolvendo no Brasil e em Portugal, sobre as culturas e as identidades práticas inscritas nos contextos de trabalho profissional (Caria e Silva, 2013; Loureiro, 2008; Caria,2000; 2011; Granja, 2008; Pereira, 2008; Montes, 2013; Caria, 2011; Filipe, 2008; Fartes, 2014, Fartes et al., 2011, Ramos, 2014), fomos percebendo que a relação entre a teoria dos académicos e dos formadores de profissionais (de professores, de assistentes sociais e outros profissionais vocacionados para uma relação interpessoal com os utentes e cidadãos) e os saberes práticos das profissões2não se poderia reduzir a uma relação pedagógica e didática de reflexão crítica sobre os modelos educativos dominantes (transmissivos, formais e culturalmente arbitrários) ou a uma relação teórico-ideológica de crítica dos poderes institucionais que suportam as prescrições das estratégias públicas e dos poderes da ciência e da universidade que suportam as definições legítimas de cultura e conhecimento.

Para poder encontrar soluções teóricas para a complexidade do problema com que ia lidando, decidi seguir o conselho de Stephen Turner (2007) e de Clifford Geertz (2000) de procurar fazer dialogar a teoria social da cultura e do conhecimento com os avanços que têm ocorrido nas últimas quatro décadas nas ciências cognitivas. Este artigo dá conta desta aproximação interdisciplinar e sintetiza o que temos procurado fazer de uma forma dispersa em outros trabalhos (Caria, 2010); (Caria, César e Biltes, 2012) e (Caria e Ramos, 2015). Assim, poderei dizer que este artigo pretende desenvolver os fundamentos sociocognitivos de uma teoria do saber profissional que assenta na seguinte hipótese: o saber profissional tem uma forma dual de conhecer que permite a coexistência de saberes tácitos do fazer e do pensar com princípios e conhecimentos abstratos e formais em contextos de ação e em situações práticas, sem nunca os opor ou fundir. Esta forma dual de usar conhecimento distingue-o de outros usos sociais do conhecimento e do próprio conceito geral de conhecimento profissional, sendo inspirada numa visão fenomenológica sobre o conhecimento que recusa as dicotomias entre ciência e senso comum 3e que ao mesmo tempo admite a continuada existência de um hiato entre a experiência vivida quotidiana e a sua tradução e expressão racional em conhecimento abstrato e reflexivo (Rodrigues, 1993).

O saber profissional, como qualquer outro saber de ação, é um processo de conhecer em ato (knowing) que dilui os conteúdos de conhecimento e significações no fluxo da transitoriedade da vida quotidiana (Pais, 1993), sem nunca aspirar a ser um produto cultural ou ideológico que se possa transmitir a outros sem convocar a experiência de quem o usa em situação prática. No entanto, no processo de conhecimento da ação usa regulamente sistemas abstratos de conhecimento (SAC)4,dado que o desenvolvimento histórico do poder cultural e simbólico do trabalho profissional nas sociedades modernas implica uma continuada reflexividade na e para a ação com os leigos, utentes e cidadãos dos serviços profissionais.

Grosso modo, uma teoria dual do saber profissional parte da hipótese de que na sua génese e desenvolvimento histórico o uso do conhecimento no trabalho profissional nunca consegue superar a divisão entre teoria e prática, ainda que continuadamente faça coexistir as duas sem nunca as opor ou as fundir. Logo, como fundamentaremos ao longo do artigo, o saber profissional, ao contrário do conhecimento profissional, não depende de uma qualquer estrutura, sistema, padrão ou regra de poder cognitivo e/ou simbólico, pois apenas é objetivável na ordem e na contingência da intersubjetividade (Caria, 2013b, 2014a).

Para este efeito, o artigo começa por relembrar que o saber na ação é um velho tópico de reflexão filosófica e que já incluía uma formulação dual para pensar o uso social do conhecimento. Mostro que esta hipótese dual para o saber está relacionada com várias teorias e autores consagrados da psicologia cognitiva, embora a sua articulação com as ciências sociais dependa de uma visão fenomenológica sobre a mente humana.

Para melhor se entender esta articulação entre a psicologia cognitiva e as ciências sociais, faço, em seguida uma releitura das teorias da dualidade social com o objetivo de tornar consistente a hipótese complementar de que a dualidade na estruturação da sociedade é tanto mais validada quanto mais se validar a existência de um uso dual do conhecimento na ação, desde que não se confunda o conceito de dualidade social com as noções extremadas de separação dicotómica e de oposição hierárquica, que suportam as teorias sociais da desigualdade cultural e simbólica.

 

SABEDORIA PRÁTICA E DICOTOMIAS CULTURAIS: O PROBLEMA SOCIOCOGNITIVO

 

A reflexão sobre o uso do conhecimento na vida quotidiana foi formulada, segundo Paul Laudrière (1990), como problema da filosofia por Aristóteles. Foi designada como sabedoria prática e entendida como uma reflexão sobre a associação da razão e do conhecimento da verdade com a ação. Assim, pode-se dizer que o interesse pela análise do saber é bem antigo e, segundo o mesmo autor, nesta formulação inicial foi desde logo equacionada a existência de uma dualidade da mente humana.

Na perspetiva aristotélica, reinterpretada por este autor, a sabedoria prática desenvolve-se a partir da hipótese de que a mente humana tem uma organização dual, que a subdivide em duas partes, uma parte racional, ligada à atividade intelectual das razões que suportam a verdade, e uma outra irracional, ligada aos desejos que suportam as crenças morais. Mas mais interessante é que cada uma destas partes é regulada por diferentes princípios, sendo que ambas têm de ser convocadas para se poder agir com sabedoria prática, por forma a desenvolver-se ações e decisões prudentes e virtuosas capazes de inibir os excessos humanos da vida em sociedade. Assim, nesta primeira formulação do saber, segundo este autor, a existência de uma dualidade da mente humana não implica uma qualquer oposição entre mente e corpo, redução do conhecimento a uma aplicação técnica, ou qualquer pressuposto de realização voluntarista de uma razão subjetiva na ação.

Paul Laudrière refere que a parte racional da mente está centrada no conhecimento que, por via da atividade intelectual, procura a verdade. Mas esta procura de verdade precisa de ser aperfeiçoada para que não seja apenas especulativa e contemplativa. Precisa, para que a razão não se feche sobre si própria, de ser desdobrada numa outra componente virada para a ação, capaz de investir “a razão nas coisas da vida para as tornarcoisas humanas” e para se poder tomar decisões (Laudrière, 1990, p. 25). A parte irracional da mente está centrada na realização do desejo, primeiro por via da satisfação das necessidades materiais e de sobrevivência da espécie (referida como vida vegetativa) e, depois, por via de uma atividade moral que procura, a partir da componente inconsciente e involuntária da mente, assegurar um juízo sobre o bem e o mal na vida humana. A atividade moral da mente irracional precisa de aperfeiçoamento, porque o desejo inconsciente pode permanecer apenas no sonho e numa moralidade limitada a opções imediatas. Assim, o aperfeiçoamento do desejo permite desenvolver a ética enquanto “realização de um ideal humano universalista baseado no bem e na felicidade comum” (Laudrière, 1990, p. 32).

Julgo que a contribuição filosófica de Paul Laudrière pode ser facilmente relacionada com algumas das formulações teórico-sociológicas de Raymond Boudon (2003) sobre a racionalidade axiológica weberiana, nas quais se recusam as epistemologias racionalistas e relativistas para pensar a associação entre as razões e crenças, salientando que umas não se podem reduzir às outras. Nesta perspetiva, a hipótese sobre a dualidade da mente humana supõe admitir que para o desenvolvimento da sabedoria prática preciso a coexistência de dois modos e formas de conhecer e de organizar o conhecimento, isto é, duas epistemologias: (a) uma epistemologia consciente e racional que explica “verdade e a razão das coisas” (mais à frente identificada como sistema sociocognitivo 2 (b) e outra epistemologia pouco consciente, moral e prática (mais à frente designada de sistema sociocognitivo 1, que exprime as crenças que existem sobre o que se acredita poder ser a realidade. Esta coexistência não põe em causa a possibilidade das razões e das crenças sociais poderem operar de modo autónomo e separado (e.g. pensamento especulativo, expressão artística, atitude natural quotidiana, tradição comunitária, etc.), desde que o racionalismo e o relativismo, que obrigam à subordinação de uma à outra ou à sua separação estanque, dicotómica, não sejam vistos como uma inevitabilidade.

Uma abordagem muito semelhante pode ser encontrada em Gérard­Malgraive (1995), no âmbito da temática da educação de adultos: o saber teórico-científico permite introduzir um pensamento eficaz sobre a ação que, simultaneamente, se articula e se distingue do saber processual, porque este último, mais do que pensar a prática, pretende atuar para encontrar a solução desejada.

Saliento a possibilidade mista, de separação e coexistência, porque historicamente a redução da dualidade da organização do conhecimento a dicotomias-hierarquias epistemológicas sempre teve bastante influência nas ciências sociais, com particular evidência no pensamento científico e teórico da antropologia social, dada a associação que esta disciplina sempre estabeleceu entre conhecimento social e ação quotidiana para melhor entender o objeto cultura, ainda que o tivesse feito preferencialmente a partir de teorias sociais evolucionistas e etnocêntricas sobre o conhecimento das relações multiculturais (­Levi-Strauss, 1975; Copans, 1982; Goody, 1988; Shweder, 1997; Quintais, 2009). Em várias versões, a visão dicotómica e hierárquica da mente e das formas culturais de conhecer tentou salientar as virtudes gerais e abstratas de uma forma de pensar sobre a outra (uma parte da mente sobre a outra) como se as duas epistemologias tivessem de estar sempre em competição – como se fosse uma luta entre o mal e o bem, para dominar a cognição humana – e não pudessem, para gerar sabedoria prática, cooperar regularmente e/ou operar de modo independente na vida quotidiana, em função das exigências práticas dos contextos sociais em que se atua.

Como mostrou Raúl Iturra (1990), baseado numa abordagem antropológica da educação, a transformação da dualidade cognitiva numa dicotomia resulta de um estilo de conhecer, específico à divisão do trabalho nas sociedades capitalistas que, numa das suas formas mais típicas, se exprime através da institucionalização de uma escolaridade massificada. Nesta linha de análise, em anteriores trabalhos, para melhor salientar esta institucionalização dicotómica da escolarização da cultura e do conhecimento – inibidora da sabedoria na ação e para a ação, e por isso sempre capaz de excluir saberes e identidades das aprendizagens escolares – tomei de empréstimo de Iturra a conceção sobre a existência de duas mentes sociais: a mente cultural-prática-contextual e a mente positiva-racional-descontextual (Caria,2000; 2002a). Assim, a exemplo do que acontece com a instituição escolar, a dicotomia nas formas de organização do uso do conhecimento deve ser entendida como um resultado histórico possível: um estilo extremado de dissimulação de uma certa forma de conhecer que anula a dualidade cognitiva da mente em condições sociais e culturais de hierarquização do uso do conhecimento.

Uma dicotomia em que, (a) por um lado, o conhecimento consciente e explícito, para melhor afirmar uma verdade a-histórica, geral e descontextualizada (formulações dos sistemas abstratos de conhecimento e ciência – SAC), oculta as formas práticas, implícitas e involuntárias de conhecer que o suportam; (b) por outro lado, em que o conhecimento prático e de senso comum para melhor resistir a uma dominação simbólica exterior (vinda de outros contextos sociais por via do capital cultural) silencia (torna implícitos) saberes e experiências coletivos de ação e/ou restringe o seu uso apenas a finalidades pragmáticas, que nas suas formas extremas de dominação impessoal por via do mercado pode chegar a ser apenas um agir alienado e utilitarista. Neste âmbito, como salientou Jean Lave (1996) a partir dos estudos sociais sobre a ciência, esta dicotomia remete, na atualidade, para a oposição entre um modo idealizado (descontextualizado) de produzir ciência, no qual se esquece e ilude as formas práticas do fazer científico, e as práticas sociais quotidianas, como se estas, ao não terem nada de formal e abstrato, e terem muito de não consciente e implícito, fossem inevitavelmente primárias, socialmente ineficazes e vazias de lógica e complexidade.

É daqui que, em geral, decorre a oposição dicotómica, tão recorrentemente reconhecida na vida social quotidiana dos grupos profissionais, entre teoria e prática, na qual se oscila entre os dois lados (Caria, 2014a): (a) uma absoluta naturalização da separação, como se a teoria apenas pudesse ser uma especulação sem qualquer interesse para os práticos; (b) uma feroz crítica à separação, como se a fusão entre teoria e prática dependesse apenas de um uso crítico dos SAC e da vontade (político-ideológica?) dos académicos de pensar e de agir além da ciência instituída e da reflexividade individual.

Um dos resultados históricos desta dicotomia está no modo como o saber profissional tende a ser conceptualizado pela tradição anglo-americana de investigação em sociologia das profissões quando aborda o poder profissional. Na medida em que o estatuto social e a legitimidade cultural dos grupos profissionais com maior poder simbólico está dependente de uma escolaridade prolongada e de um diploma de ensino superior, tendeu-se a considerar que o saber para a ação profissional dependia, no essencial, dos sistemas abstratos de conhecimento (SAC) institucionalizados na universidade e nas suas hierarquias cognitivo-culturais. Em grande medida, esta tradição subdisciplinar da sociologia esqueceu que os profissionais não são produtores de conhecimento nos mesmos termos em que os cientistas, filósofos e tecnólogos (não são analistas simbólicos) o são, pois os primeiros, ao contrário dos segundos, não estão centrados na produção de verdade e na construção de novos problemas sobre o mundo, não atuam globalmente e têm uma componente relacional decisiva (Reich, 1996). Os profissionais são, no essencial, utilizadores e consumidores especializados de conhecimento, em virtude de serem práticos-especializados (experts), centrados na construção da realidade quotidiana dos problemas da sociedade com relevância para a intervenção profissional (Caria, 2011). Sem dúvida, os profissionais usam conhecimento racional, formal e teórico para que a sua ação tenha uma adesão à “verdade dos problemas” sobre os quais agem e lidam, mas como práticos-experts, precisam da sabedoria prática e prudente da ação, de que a Aristóteles falava, porque precisam de crenças morais e práticas que suportem a suas orientações éticas e racionais, tendencialmente apresentadas como universais e abstratas.

Em trabalhos anteriores, tive oportunidade de aprofundar as limitações teóricas da sociologia das profissões quanto ao modo como desenvolve o conceito de trabalho profissional, tendo frisado a importância de considerar uma componente técnico-prática inscrita numa cultura coletiva e nas estruturas organizacionais da atividade (Caria, 2005a, 2008b, 2009, 2013a). Neste contexto, a título de exemplo, será de salientar as conclusões do estudo que realizámos com médicos veterinários sobre as carreiras deste grupo profissional, onde se evidencia que não é uma inevitabilidade a existência de estilos dicotómicos de uso do conhecimento profissional que carecem de sabedoria prática, a saber: (a) os práticos-experts desta atividade eram capazes de identificar como essencial ao seu desenvolvimento profissional (a exemplo do que também acontece com outras profissões médicas) a existência de um saber que denominavam de “olho clínico”; (b) nenhum veterinário o sabia definir e explicar, mas todos estavam de acordo que se tratava de algo que lhes permitia, no contexto de ação profissional,implementar uma orientação para conseguir um diagnóstico mais provável, sem que se tivesse consciência de como se procedia para o aprender e qual era exatamente o uso que se estava a fazer do conhecimento abstrato e da ciência para lá chegar. Este saber emergia nos momentos em que se interagia com o animal e com o cliente, dono do animal, e parecia ter tanto valor quanto o da sofisticação dos meios auxiliares de diagnóstico disponíveis, associados aos SAC. Existiam várias representações sobre o valor relativo desta crença sobre o “olho clínico veterinário”, mas era consensual que este saber-expertise dependia da experiência de interação direta com o animal e com o cliente, tornando, por esta via, os veterinários sabedores, simultaneamente, do problema-doença geral e do caso-contexto em que o problema ocorria (Caria, 2005d, 2008a).

A reflexão clássica de Donald Shon (1983) sobre o saber profissional vai ao encontro destas conclusões, pois este autor, ao criticar os modelos racional-instrumentais nos quais tradicionalmente o profissionalismo é formado, salienta quanto a educação formal baseada na ciência positivista está longe de levar em consideração a “habilidade pessoal” e a “arte” dos profissionais como um recurso e uma competência relevantes para entender a atividade sociocognitiva quando se age em contexto de trabalho profissional. Esta habilidade e arte remetem para o conceito de saber tácito da prática profissional, linha de investigação que hoje é amplamente reconhecida como uma componente decisiva do saber profissional, embora esta seja geralmente desenvolvida a partir de uma análise com fraco conteúdo sociológico5(Sternberg e Horvath, 1999; Eraut e Hirsh, 2007).

Em síntese, a existência de uma dualidade na mente humana não equivale a pressupor que teoria e prática se poderão articular de modo automático e espontâneo.6 Como veremos em seguida, é necessário entender com mais profundidade como é que na mente humana os sistemas cognitivos são ativados e mobilizados para a ação, pois não basta o voluntarismo subjetivo do cientista social e a “arte” do profissional, de crítica à dicotomia e à hierarquia de uso do conhecimento, para que o saber contido na ação, de habilidades e crenças sociais, possa emergir nos contextos de trabalho profissional.

 

OPERAR COM DOIS SISTEMAS COGNITIVOS: A HIPÓTESE SOCIOCOGNITIVA

 

Para que possamos levar mais longe a noção de saber na ação profissional e para que não fiquemos presos a uma simplificação sociológica da mente social e humana, importa começar por referir as contribuições mais recentes da investigação em psicologia cognitiva sobre a dualidade da mente humana, denominadas de cognitive dual-process theory (Evans e Frankish, 2009a), que, traduzido para português, passaremos a identificar como teoria do processamento cognitivo dual (PCD).

Segundo Evans (2004), esta perspetiva de explicação da cognição foi também influenciada pela antiga filosofia grega e numa das suas interpretações mais correntes, durante séculos, foi associada a uma conceção de mente separada do corpo, ou que salientava as virtudes (em competição) de uma parte da mente face à outra, considerada como mais humana, mais primária, mais invariante, mais disciplinadora, mais inteligente, mais lógica, etc.7 Esta separação é rejeitada por estes autores em favor de formulações filosóficas e psicológicas, de final dos séculos XIX e início do século XX, que tratam do inconsciente e o associam com a ação social do seguinte modo8(Evans e Frankish, 2009b): (a) o inconsciente deve ser entendido não como uma organização invisível, interna e individual da mente, de representação do mundo exterior, mas como um pensamento em ato, em ação no mundo, que se baseia em crenças sociais e em aprendizagens implícitas; (b) estas são reguladas por processos cognitivos internos de organização do pensamento que são pragmáticos e espontâneos; (c) processos que são adaptados a reproduzir hábitos e costumes sociais, dos quais os atores sociais só deles têm consciência prática na interação social, em contextos e atividades sociais específicos.

Com base nesta orientação geral, fica claro que, e ao contrário do cognitivismo, os psicólogos do PCD não vêm a mente apenas como um conjunto de representações internas ao sujeito, nem apenas como um piloto automático mental exterior à ação social. Raciocínio sobre resolução de problemas quotidianos, tomadas de decisão em contexto e desenvolvimento de crenças sociais são objetos comuns (entre outros) da investigação em PCD (Evans, 2008) que concebem a cognição psicológica como imersa na atividade social. Deste modo, podemos concluir – no mesmo entendimento sociológico que Louis Quéré (2003) tem para as ciências cognitivas – que estas teorias psicológicas têm uma visão da cognição como uma questão social, isto é, estão em condições de contribuir para uma teoria social da cognição: não opõem o inconsciente à consciência da ação em sociedade, não estabelecem uma relação de causa-efeito entre cognição e comportamento social e admitem que a organização do pensamento (a mente) está associada à nossa capacidade de agir no mundo.

Mais especificamente no que se refere à organização dual da mente, as propostas sobre o PCD partem da hipótese sobre a existência de dois sistemas cognitivos, autónomos e complementares, denominados, em geral, por sistema 1 e sistema 2 (Evans, 2008; Evans e Frankish, 2009b; Sun, 2002; Carruthers, 2009): (a) o sistema 1 é geralmente descrito na literatura dos PCD como uma forma de organização do pensamento que é involuntária e não consciente, e que é aprendida implicitamente durante a ação; (b) o sistema 2 é geralmente descrito como uma forma de organização do pensamento intencional, consciente e explícita. O sistema 1 permitiria um processamento prático, rápido e paralelo do conhecimento versus um processamento planeado, lento e sequencial do sistema 2.

Jonathan Evans (2008) refere, ainda, que existe algum consenso sobre outras propriedades que podem ser atribuídas a cada um destes dois sistemas de organização cognitiva, embora também refira, com base em vários estudos de diferentes origens, as inconsistências e as ambiguidades que se verificam nesta teorização e que justificam investigação psicológica mais aprofundada. Refere ainda alguns dos problemas que se encontram em aberto, designadamente quanto à relação de cada um dos sistemas com o desenvolvimento da inteligência geral e da metalinguagem, quanto ao papel que a verbalização do conhecimento pode desempenhar em cada um dos dois sistemas e quanto à especificidade humana de cada um dos dois sistemas, em comparação com outros hominídeos e primatas.

A maioria dos autores que subscrevem as teorias dos PCD tendem a procurar apresentar uma listagem geral e abstrata das propriedades estruturais e funcionais que cada um dos sistemas de processamento cognitivo possui. Esta formulação não é de interesse para as ciências sociais, pois nestes termos o problema em análise é estritamente psicológico, porque apenas relativo à arquitetura da mente e ao modo como cada ser humano organiza o mundo exterior em representações mentais internas a cada sujeito. Assim, importa não cair no erro de reduzir a investigação sobre a dualidade dos processos cognitivos à especificação de cada sistema em oposição ao outro, até porque esta redução poderá redundar num novo tipo de dicotomia e hierarquização cognitivo-simbólica centrada, agora, na organização psicológico-dualista da mente.

Esta orientação da investigação em PCD para a especificidade de cada sistema ainda parece ocupar um lugar privilegiado, porque, como referem Sun, Matheus e Lane (2007), a análise da passagem do sistema 1para o sistema 2, e vice-versa, só começou a ser estudada de modo sistemático e coerente, como problema psicológico, na década de 1990. Anteriormente, o que mais se fazia era mostrar quanto o sistema 2ficava aquém de poder explicar tarefas e atividades cognitivas típicas da vida quotidiana (e do modo de operar do sistema 1 e quanto o sistema 1 estava aquém de poder gerar um conhecimento de regras e princípios de aplicação geral para a ação em contextos de ação diversos (típico do modo de operar do sistema 2). Assim, segundo o mesmo autor, só no século XXI é que se começaram a criar as condições para que a teoria do PCD deixasse definitivamente de estudar apenas as propriedades e os atributos estruturais e epistemológicos de cada um dos dois sistemas, para passar a centrar-se nas modalidades de passagem (e de coexistência) de um sistema para (com) o outro.

Na mesma linha de análise, Richard Samuels (2009) assinala que falar em geral e no singular de cada um dos sistemas cognitivos será sempre uma abstração da mente humana, pois o que se sabe existir sãovários sistemas e subsistemas que coexistem em diferentes modalidades e combinações de processamento cognitivo (consciente, inconsciente, baseado em regras, baseado em associações, planeados e controlados, pragmáticos e automáticos, etc) sendo, por isso, de evitar demasiadas generalizações quanto à hipótese do PCD da mente humana.

Neste contexto, não tomarei em consideração as contribuições mais recentes da antropologia cognitiva de Sperber (2001), Sperber e Mercier (2009) ou de Cristina Toren (2012), porque para uma teoria do saber profissional a discussão sobre qual o efeito mútuo do psicológico e do social-cultural na arquitetura da mente humana é um assunto lateral ao nosso objeto de análise. O que nos interessa (em alguns dos autores) do PCD é a possibilidade que esta teoria apresenta de distinguir, tal como Evans (2009) faz, a hipótese sobre a organização estrutural dos sistemas 1 e 2, da hipótese sobre os dois modos de processamento, de tipo 1 e 2. Enquanto a primeira hipótese é estritamente psicológica, e em parte influenciada pelo cognitivismo, a segunda pressupõe um diálogo interdisciplinar, porque o que está em discussão passa a ser a possibilidade dos processos cognitivos que suportam a ação social permitirem a validação de hipóteses sobre a existência de diferentes modalidades de coexistência dos dois sistemas.

Assim, segundo este autor, a articulação entre os dois sistemas cognitivos só pode ocorrer porque: (a) dentro do sistema 1 não existe apenas processamentos de tipo 1 (totalmente automáticos e inconsciente), mas também processamentos de tipo 2 (não deliberativos e não planeados, mas com alguma capacidade de verbalização-descrição da prática e com capacidade de extrair regularidades sem a consciência de regras); (b) dentro do sistema 2 não existem apenas processamentos cognitivos de tipo 2 (planeados e explícitos, baseados em regras conscientes e lentos), mas também processamentos de tipo 1 (que aplicam de modo rotineiro e pouco consciente planos e regras, tornando implícito e rápido o que antes foi aprendido de modo explícito e lento).

Este modo de pensar o processamento cognitivo na ação pela coexistência, mais ou menos desigual e tensional, dos dois sistemas encontra validação em inúmeras pesquisas empíricas. Keith Stanovich (2009) denomina o sistema 2de mente analítica e deteta a existência de dois tipos de processamento cognitivo diferenciados dentro dela: (a) o processamento hipotético-analítico totalmente divorciado da ação (tipo 2), porque centrado apenas numa metarepresentação do conhecimento e/ou numa explicação alternativa e crítica da realidade, sem qualquer possibilidade interface com o sistema 1, dado depender apenas de uma lógica metodológico-formal; (b) o processamento analítico-justificativo que opera em associação com a ação (tipo 1) permitindo ao sistema 2 ter antecipadamente um modelo para ação, que se vai ajustando progressivamente à realidade à medida que se atua, e ter, à posteriori, uma garantia de justificação, dando como certa a escolha, ao pressupor uma adequação interpretativa, sem alternativa ou crítica, entre o modelo formal e a realidade. As conclusões desta autora, bem como a de Peter Carruthers (2009) e de Richard Samuels (2009) a partir de outros estudos centrados no sistema 2, são as seguintes: (a) mesmo quando o sistema 1 não está presente isso não quer dizer que ele não esteja a ser ativado indiretamente, não deixando por isso de influenciar o modo como o sistema 2 é operado; (b) logo para que um sistema seja ativado não é preciso que os seus processamentos mais típicos estejam presentes, basta que a ação requeira as modalidades de processamento cognitivo do outro sistema.

Estes e outros estudos centrados no sistema 2, apesar de tratarem das modalidades de articulação dos dois tipos de processamento têm, segundo Sun (2002) a limitação de estarem excessivamente baseados na lógica de processamento top-down, que vai do sistema 2 para 1, precisando a investigação sobre a lógica e processamento inversos, bottow-up, do sistema 1 para o 2, de ser mais aprofundada pela teoria do PCD. De facto, a maioria dos autores da psicologia cognitiva considera que o sistema e os processamentos de tipo 1 são em grande medida inatos (e por isso partilhados com outros hominídeos e primatas), pressupondo que a especificidade da mente humana só poderia estar no sistema e processamento de tipo 2, daí que este seja privilegiado na investigação mesmo quando se pretende estudar a coexistência dos dois sistemas. Deste ponto de vista, pode-se dizer que a agenda de investigação em psicologia cognitiva reproduz, em novos termos, a hierarquia de subordinação simbólica do sistema 1ao sistema 2.

Em conclusão, podemos dizer que uma teoria do saber na ação profissional depende do entendimento que se tiver sobre a articulação dos dois modos e tipos de processamento cognitivo, incluindo as suas possíveis e parciais coexistências e oposições. Numa perspetiva de oposição um dos sistemas pode ser concebido como tendo o poder de se sobrepor ao outro em determinadas condições e atividades sociais, sendo certo que a transformação da dualidade sociocognitiva nestas oposições entre sistemas cognitivos faz parte da evolução da espécie e da história social e cultural da humanidade, incluindo da história do pensamento antropológico como vimos na secção 2. Assim, a separação e a possibilidade de subalternização entre os dois sistemas cognitivos fará com que haja uma reprodução subalternização e uma continuidade sociocognitiva estanque de um sistema face ao outro: (a) o sistema 1opera apenas com operações de tipo 1, como se não tivesse uma lógica-epistemologia própria que o distinguisse do sistema 2; (b) o sistema 2 opera (ou aparenta operar) apenas com operações de tipo 2, silenciando totalmente (tornando totalmente inconscientes) as operações de tipo 1 que possam existir.

Ao inverso, a possibilidade de coexistência parcial dos dois sistemas torna evidente que pode ocorrer uma descontinuidade nas operações cognitivas mais típicas de cada sistema: (a) o sistema 1passa a operar com operações misturadas de tipo 1 e de tipo 2 quando se procura (para evitar a subalternização e oposição entre sistemas) a conexão de baixo-para-cima (bottow-up interface) com o sistema 2 de uso do conhecimento; (b) o sistema 2 passa a operar com operações misturadas de tipo 2 e de tipo 1 quando se procura (para evitar a total opacidade do uso implícito do conhecimento) a conexão de cima-para-baixo (top-down interface) com o sistema 1 de uso do conhecimento.

 

COGNIÇÃO E LINGUAGEM: A HIPÓTESE DE MEDIAÇÃO CULTURAL

 

Para melhor se perceber o processamento cognitivo de baixo-para-cima ( bottow-up), menos investigado pela psicologia cognitiva, importa abordar com maior profundidade as relações entre cognição e linguagem, começando por referir uma perspetiva desenvolvimentista, de inspiração piagetina, na qual se procura entender a dinâmica da formação das estruturas da mente sempre no interfacecom a atividade social, evitando-se entendê-las como fixas e inatas. Para este efeito será de salientar as contribuições de Anne Karmiloff-Smith (1996)9sobre o desenvolvimento psicolinguístico, nas quais se comprova que os processos cognitivos e o desenvolvimento da linguagem operam por redescrição dos níveis mais simples, práticos e automáticos do conhecimento (usos implícitos) para os níveis mais complexos, formais e reflexivos do conhecimento (usos explícitos).

Segundo esta autora no primeiro nível de uso da linguagem e do conhecimento apenas temosuma competência prática, sem representação e sem consciência (em muita literatura psicológica também designado como skill quando associado apenas a uma aprendizagem pessoal), que apenas está apta a fazer o reconhecimento implícito de um padrão de regularidade num dado contexto e a replicá-lo, desde que se seja estimulado para o fazer. Ao repetir-se algo que depende de um padrão difuso para agir em contexto, no qual não fomos instruídos, nem há regras explicitáveis, mas no qual somos socialmente ativos para conseguir encontrar regularidades, pode-se afirmar que se identifica uma competência prática que não ocorre passivamente por condicionamento externo. Uma competência prática (simultaneamente pessoal e social, diria) que tem apenas a intencionalidade prática de reproduzir e interiorizar um modelo-identidade externo dado, de modo inconsciente e automático e que por isso parece ser equivalente às operações sociocognitivas do designado sistema 1, evitando pressupor que ele seja apenas inato.

Sobre esta base inicial de organização implícita do conhecimento dá-se, segundo Karmiloff-Smith, uma redescrição primária da linguagem que permite uma representação mental com consciência prática e sem verbalização do conhecimento, capaz de reconhecer as coisas por associação de similitudes, contiguidades e familiaridades entre contextos e de atualizar esse reconhecimento em novas atividades, para além da reprodução imediata de um modelo-identidade já organizado. De seguida, segundo a mesma autora, pode ainda ocorrer uma redescrição secundária que tem em vista conseguir-se uma verbalização das associações e comparações implícitas realizadas e representadas simbolicamente na consciência prática.

Finalmente, pode correr uma redescrição terciária quando há uma mudança de linguagem através da consciência reflexiva e da lógica formal, ao conseguir-se desenvolver um conhecimento sobre a própria linguagem e conhecimento usado. Segundo esta autora, é só neste nível de redescrição superior que passa a haver uma consciência explícita de regras para agir e de princípios de organização do conhecimento, isto é, é só a este nível que se desenvolve um metaconhecimento linguístico e um pensamento lógico-formal para a atividade que podemos considerar como equivalente às operações sociocognitivas do sistema 2.

A ter validade, esta formulação teórica que associa o PCD e o desenvolvimento psicolinguístico, se a competência prática inicial da aprendizagem psicolinguística corresponde ao funcionamento do sistema 1e se a redescrição terciária do desenvolvimento psicolinguístico corresponde ao funcionamento do sistema 2, então poderemos colocar a hipótese de que o essencial da lógica de baixo-para-cima de passagem do sistema 1 para o processamento de tipo 2 está no modo como se desenvolvem os níveis intermédios de redescrição (primário e secundário) para os quais, penso, ser decisivo o uso não-formal da linguagem, relativo à linguagem oral e à fala social no curso da ação, situada numa dada cultura.

A este propósito, para melhor entender as relações entre cognição e linguagem e seus desdobramentos na fala e na oralidade social, importa considerar os estudos históricos e antropológicos de Jack Goody sobre o impacto da escrita nas relações sociais. A contribuição deste autor torna claro que a fala e a oralidade social podem ter uma forma dual10 (1) desenvolver-se na dependência do registo escrito e da sua tecnologia de aprendizagem e memorização, geralmente com propósitos de formalização e legitimação universalista de uma cultura; (2) ou desenvolver-se na dependência de narrações e descrições orais situadas e de recursos locais, como ocorre tipicamente na vida social quotidiana e nos grupos sociais e nas atividades em que a escrita não é usada ou não tem especial relevância social (Goody, 1993).

Como refere este autor, o uso da linguagem oral pode ser reduzido a uma dicotomia cultural, pois sempre que está em causa ainstitucionalização de formas de dominação política e de controlo social à distância nas relações multiculturais torna-se necessário que a palavra escrita do Estado e dos sábios (desenvolvido historicamente pelo modelo cultural escrito ocidental) se sobreponha à palavra falada usada em contexto de ação. Torna-se usual admitir que as culturas escritas se sobreponham às culturas orais, como se a fala e a oralidade sociais só pudessem existir na dependência do escrito, pressupondo-se, erradamente, que existe uma tradução espontânea e automática das palavras entre o registo da fala, com relato fluído e ambíguo, e registo sistémico da ­linguagem por via da escrita, ou vice-versa (Goody, 1993, pp. 265-293). Mesmo numa perspetiva estritamente psicológica, a fala e a escrita são consideradas processos de uso da linguagem que pertencem a dois domínios cognitivos diferenciados, que nada têm de equivalente e automático entre si (Castro, 2000).

A relação entre a linguagem oral e a linguagem escrita pode, ainda, ser mais bem mais complexa, porque as várias culturas humanas desenvolveram vários tipos de escrita, alfabéticas e não alfabéticas. Contudo, é na escrita alfabética, aprendida na escolaridade ocidental, que a correspondência entre o grafema-escrito e o fonema-oral foi levada mais longe e, portanto, o impacto da escrita sobre a oralidade parece ser bem mais relevante. Vários trabalhos de investigação em neuropsicologia (Ardila et al., 2010), alguns dos quais começaram por ser realizados em Portugal no final dos anos 90, têm provado a existência de diferenças significativas na morfologia e na organização cerebral dos adultos alfabetizados e dos adultos analfabetos quando processam em atividades formais, por repetição oral, palavras que não tem significado social (pseudo-palavras) e palavras que têm significado social por relação com a vida quotidiana (Castro-Caldas e Reis, 2000). Estes estudos mostram que nos escolarizados a escrita alfabética e a sua estrutura (exterior ao significado pragmático da ação) coloniza o cérebro humano, a ponto de poderem ser processadas com êxito palavras que apenas podem ter uma existência escrita, completamente exterior à palavra falada na oralidade social. Hoje sabe-se, com base na investigação em psicologia cognitiva, que o impacto da aquisição da linguagem escrita alfabética na potenciação de capacidades cognitivas de memória e de perceção visual e auditiva é muito significativa (Gabriel et al., 2016).

Em consequência, não é estranho que seja na cultura escolar ocidental – em forte associação com a colonização política e cultural realizada no passado no mundo – que a oralidade é mais facilmente concebida como dependendo de um código externo e explícito de conhecimento escrito, fora da fala e da ação sociais. E, também não será surpresa verificar, que muita da investigação em psicologia cognitiva sobre a escrita tende a considerar a escrita alfabética ocidental como cognitivamente superior a outras, ainda que se saiba, hoje, que as várias escritas possam ter vários méritos e usos sociais, podendo, como ferramenta cultural, potenciar diferentes tipos de tarefas cognitivas e, portanto, ter implicações culturais e sociais variadas (Morais, 2013, pp. 26-37).

Sabemos, inspirados nas contribuições da psicologia cultural de Lev Vygostky (1987), que não existem operações cognitivas e usos da linguagem que sejam independentes das aprendizagens culturais e dos contextos culturais de uso da fala (Wertsch, 1988; Lampreia, 1999). Daí que o que está em causa não é apenas a existência de um contexto psicolinguístico que junte pensamento, linguagem e ação. Na perspetiva vygotskyana, o que permite a um qualquer indivíduofazer um uso (pessoal) autónomo e independente do conhecimento é ter antes apreendido, em colaboração com os mais experientes do seu grupo de pertença, a agir através da mediação da linguagem e da cultura do grupo. Daqui decorre a tese de que há uma primazia do social sobre o psicológico que permite uma aprendizagem cultural competente mesmo quando não se tem, ainda, competências psicológicas parase transferir o conhecimento em uso para outras atividades sociais fora da cultura de pertença (Cole e Wertsch, 1996).

Em consequência, direi, pela minha parte, que se a cognição e os usos da linguagem dependem da cultura, então a oralidade social aprendida e desenvolvida a partir de uma cultura escrita e/ou de um contexto que tenha por referência um registo escrito, não é equivalente ao falar social desenvolvido na mesma atividade quando este se faz por via de uma cultura oral, na qual o registo escrito seja desvalorizado como forma de ação.

Noutros estudos de psicologia cognitiva que tomam por objeto de análise a organização da memória semântica (organização dos conhecimentos e das relações de significado que temos sobre objetos externos à consciência individual) indicam que a memória de palavras que está associada a figuras e imagens que representam experiências pessoais – palavra falada envolvida em tarefas de identificação, por via do reconhecimento, nomeação e localização dos objetos – é significativamente diferente da memória que temos das palavras quando estas estão associadas a ideias abstratas – palavras conceptuais envolvidas em tarefas de análise, pela via da procura do detalhe, da seleção e dos critérios de classificação dos objetos (Ventura et al., 2002). Deste modo, pode dizer-se que as diferenças encontradas na mente não dependem das competências cognitivas desiguais dos indivíduos, nem dos objetos que são tomados como referente das palavras. Dependem, simplesmente, dos tipos de tarefas que estão associadas às palavras, isto é, da forma cultural de como se pretende conhecer quando se usa a linguagem.

No âmbito específico do saber profissional, será oportuno relembrar o estudo etnográfico que realizei sobre a cultura profissional dos professores na educação básica, no qual foi evidenciado, o seguinte: (a) conforme o foco do saber profissional dos professores sobre os alunos se centrava mais na antecipação, na orientação geral e na justificação da ação, mais a oralidade se desenvolvia na dependência da escrita da administração escolar e mais o uso do conhecimento era visto como um constrangimento institucional; (b) conforme o foco do saber profissional dos professores se centrava mais na comparação de experiências, na formulação de juízos e na reação a imprevistos, mais a oralidade ficava na dependência da interação social e da pragmática dos ­resultados que se iam obtendo no curso da ação. No segundo caso, mesmo que existissem registos escritos, estes eram desvalorizados pelos professores, mesmo quando se referiam aos mesmos alunos, porque o que passa a ser considerado como determinante para escolher a forma de uso do conhecimento era a sua adequação contextual e social, face à natureza, mais ou menos formal-escrita ou mais ou menos oral-prática, das atividades sociais e culturais desenvolvidas (Caria,1999, 2000, pp. 309-375).

No mesmo sentido vão as contribuições da sociologia do conhecimento desenvolvidas por Louis Quéré (1994), quando, para melhor relacionar o conhecimento social com a cognição, considera que o ato de classificar o mundo social, isto é, de dividir, organizar e agrupar a realidade pelas significações e relações que a constituem, pode ser desdobrado em dois tipos de operações sociolinguísticas: a operação de categorizar e a operação de conceptualizar. As duas operações de classificação coexistem, não são estanques, e ao mesmo tempo têm especificidades que permitem distingui-las, evidenciando a sua dualidade. Segundo este autor, a categorização procura na construção intersubjetiva da realidade tornar o mundo objetivável, comparando os predicados e os atributos que tornam as coisas semelhantes por relação com um protótipo. Este protótipo codifica a experiência comum que temos das coisas, permitindo-nos dizer o que é mais ou menos típico ocorrer e existir, produzindo um julgamento de tipicidade que tolera graus variados e desiguais de aproximação de uma dada coisa ao que se significa como seu típico (Quéré, 1994, pp. 13-16). Na conceptualização, o significado não deriva de comparações entre as coisas, mas sim de pressupostos dedutivos de interpretação da realidade nos quais as coisas são fixadas em sistemas abstratos de conhecimento, sobrevalorizando-se apenas alguns dos seus atributos e predicados, e não outros. A conceptualização permite dar à interpretação das coisas um valor predicativo, porque define o que é a realidade ao selecionar o que é pertinente considerar na sua classificação, e não tanto as semelhanças que podem ocorrer entre as coisas em cada momento.

Deste modo, fica evidente que categorizar tem uma relação estreita com o modo de processamento do conhecimento que parte do sistema 1, ligado à fala e à oralidade que acompanha o pensamento na ação quotidiana, dado estar inscrita em tarefas de identificação, de reconhecimento e de comunicação interpessoal. Conceptualizar está ligado à forma de uso do conhecimento que parte do sistema 2, em que o significado e a palavra dependem, em primeiro lugar, de um sistema abstrato de conhecimento que deduz o significado das coisas, dado que a oralidade ocorre em contexto de atividade de análise e explicação da ação. O uso de uma forma de linguagem não impede o desenvolvimento de outra forma, nem o facto de ser competente numa forma de conhecer nos impede de ser competente noutra, porque ambas as formas de conhecer e de usar socialmente a linguagem fazem parte de uma mente dual.

Retomando a investigação em psicolinguística, agora quanto à aprendizagem da escrita alfabética, sabe-se hoje que a possibilidade de aprender a escrever palavras num registo alfabético correto não depende apenas do conhecimento explícito, exterior e geral do código de regras que subordina a oralidade dos fonemas à sua representação escrita em grafemas. A escrita alfabética também depende do conhecimento ortográfico, sendo que este contém irregularidades e ambiguidades cuja aprendizagem se duvida que possa depender apenas da aplicação de um sistema de regras e princípios abstratos exteriores ao ato de ler e escrever (Vale et al., 2014). A maioria dos estudos existentes não são consistentes para se poder tirar uma conclusão, mas pode-se admitir que o ato prático e social de escrever com e para outros, isto é, a prática e a experiência acumuladas de lidar com as irregularidades da ortografia, e em muitos casos de errar e ser corrigido na interação com letrados, será capaz de permitir encontrar semelhanças e diferenças entre diferentes contextos ortográficos, extraindo regularidades parciais durante o curso da ação de escrever, que não passam por uma consciência reflexiva (metacognição) sobre o conhecimento ortográfico. Assim, podemos, por hipótese, dizer que em atividades de escrita de palavras, o uso do conhecimento ortográfico tanto se faz por via da aplicação das regras gerais e abstratos do sistema 2, como por via da extração de um sentido da prática, adquirido pela experiência acumulada de escrever com e para outros, organizado no sistema 1.

Em síntese, o que está em causa quando pensamos as articulações entre os dois sistemas sociocognitivos, por via da cultura e da linguagem social, éa de que, do ponto de vista da dualidade sociocognitiva existe uma coexistência parcial entre linguagem oral e linguagem escrita e que esta varia de modo desigual conforme as características e as exigências sociais das atividades em que os indivíduos estão envolvidos. Assim, a hipótese que podemos colocar é a de que a fala e a cultura do quotidiano social dão conta das operações sociocognitivas que extraem-elicitam sentido da prática e da componente emocional e afetiva e pouco consciente da vida social (concretizando a aproximação do processamento cognitivo de tipo 1ao sistema 2), de modo a tornar os indivíduos cada vez mais conscientes da experiência social acumulada. Ao inverso, a oralidade que parte do registo escrito e das culturas que suportam (e promovem) os poderes sociais formais, dão conta das operações sociocognitivas que usam o conhecimento baseado em princípios abstratos e regras gerais para provar a nossa capacidade de tornar cada vez mais controlada e previsível a realidade em que atuamos (concretizando a aproximação do processamento de tipo 2ao sistema 1), de modo a tornar os indivíduos cada vez mais capazes de corrigir erros e disfunções da atividade prática, face ao conhecimento que se têm sobre o que será a “verdade” do contexto onde se atua.

Retomando a teoria do PCD, a conclusão geral é a de que (a) os processos sociocognitivos de tipo 2 (operando pela regra abstrata e de cima-para-baixo) podem ser descritos como dedutivos, proposicionais e analíticos e precisam de crenças e de uma linguagem heurística e categorial que os aproxime da interação social derivada do sistema 1; (b) os processos cognitivos de tipo 1 (operando de modo situado-implícito e de baixo-para-cima) podem ser descritos como associativos e intuitivos e precisam de uma reflexão focalizada, seletiva e indutiva, que os aproxime da linguagem analítica derivada do sistema 2 (Gawronski e Payne, 2010; Evans e Frankish, 2009a e 2009b).

 

DUALIDADE DA REFLEXIVIDADE E DO IMPROVISO PRÁTICO: UMA RELEITURA SOCIOLÓGICA

 

Mas será que do ponto de vista sociológico não existe margem para pensar a dualidade da mente humana e dos usos sociais do conhecimento, que não seja no âmbito macro social das dicotomias e das hierarquias culturais e simbólicas? Será que a dualidade sociocognitiva apenas pode ter uma leitura sociológica na condição de esta depender de desigualdades de poder cultural e simbólico?

Penso que na teoria social é possível encontrar alguns autores e algumas obras que nos podem ajudar nesta tarefa de pensar a atividade sociocognitiva de uma forma dual. Refiro-me a algumas das formulações teóricas de Pierre Bourdieu, de Anthony Giddens e de Erving Goffman, desde que se faça uma reinterpretação destes contributos e sem iludir as grandes diferenças teórico-metodológicas que existem entre eles. É claro que só é possível fazer uma releitura conjunta destes autores, porque é relativamente consensual nas ciências sociais que os três recusam, simultaneamente, o objetivismo (o funcionalismo e o estruturalismo) e o subjetivismo (a hermenêutica e o relativismo) como princípios organizadores da análise do social. Sem dúvida, que as abordagens de cada autor variam no seu pendor mais macro-histórico, mais fenomenológico ou mais micro-interacionista, mas os três, penso, partilham a perspetiva teórica de que a prática e a ação social é um resultado estruturado da vida social e ao mesmo tempo um processo estruturante do quotidiano social que contém, simultaneamente, reprodução e mudança sociais. Julgo que esta perspetiva pode ser encontrada nos conceitos centrais, de cada um dos autores, de habitus (Bourdieu, 1972), de dualidade da estrutura (Giddens, 2000) e de quadros sociais (Gooffman, 1991).

A contribuição de Giddens é aquela que tem uma relação mais direta com o conceito de dualidade, dado que o autor usa-o explicitamente para salientar que, ao contrário da tradição anglo-saxónica filosófica e sociológica da ação social, a agência social para ser objeto de análise não precisa da ­autoconsciência e da racionalização discursiva individual para conseguir captar a reflexividade dos sujeitos face aos constrangimentos institucionais da vida social (Giddens,1989). Numa abordagem que o autor reconhece ter uma forte inspiração na fenomenologia social (Giddens, 1996), a realidade social nunca é concebida como exterior aos sujeitos sociais. Daí que, mesmo nas atividades mais rotineiras e de maior continuidade das práticas, os agentes sociais precisem sempre de fazer uma monitorização reflexiva do cenário em que ocorre a interação social, da reação que o “outro” gera em “mim” e da expectativa que “eu” crio em relação ao “outro” em seguida, pois a realidade social parte da existência de um conhecimento social mútuo que precisa de serrecorrentemente regulado no quotidiano da vida social. Esta monotorização reflexiva, de natureza intersubjetiva, gera uma consciência prática (um saber prático com uso implícito do conhecimento) que resulta apenas da co-presença atuante dos agentes na vida social e que, por isso, não precisa da consciência discursiva para se expressar socialmente, dado não criar nenhum hiato ou opacidade face ao inconsciente (Giddens, 1989). Assim, antes de qualquer racionalização discursiva e antecipação consciente, calculada e planeada da ação social, existe uma intenção prática, uma ação em movimento, um fluxo da consciência partilhada com o “outro”. O ato de consciência reflexiva é já uma segmentação espaciotemporal do fluxo da atividade, que pode, entretanto, em resultado do processo histórico, ser fixado no tempo gerando instituições que constrangem a ação social diária sem com isso anular ou inibir o desenvolvimento continuado da consciência prática, em movimento (Giddens, 1996).

Este modo de analisar o social foi algumas vezes confundido com uma abordagem estritamente micro. No entanto, como o próprio autor esclarece (Giddens, 1996), independentemente do conteúdo da consciência prática e ou discursiva que os agentes sociais tenham da vida social, existe uma rotinização continuada e regular da vida social que produz efeitos de estruturação da sociedade à escala macro-histórica, e que está sempre aquém da consciência dos agentes e das instituições sociais, nunca chegando a formar totalidades sociais com efeitos homogeneizadores globais nas práticas sociais (Giddens, 1989). No entanto, os agentes sociais não são inconscientes sobre o efeito que as suas ações provocam na sociedade. Incluem esses efeitos na sua ação quotidiana rotineira com os outros e são deles tanto mais (discursivamente) conscientes, quanto mais eles provocam efeitos perversos face às (entram em contradição com as) suas omissões e intenções. Neste processo são ajudados na sua reflexividade social por instituições especializadas baseadas em conhecimento científico e abstrato sobre a vida (reflexividade institucional, nos quais se inclui o trabalho dos analistas simbólicos e dos profissionais), capazes de gerarem autoconsciência e identidade pessoal em cada agente social a uma escala mais vasta (Giddens, 1992).

Em conclusão, nesta reinterpretação do conceito de dualidade social de Anthony Giddens, direi que existe uma relação muito estreita com a diferenciação da vida social quando se consideram as escalas micro e macro de análise e ação social. As duas escalas da vida social estão articuladas e coexistem,por via daquilo que é designado como rotinização da vida social e como reflexividade social, mas cada uma delas tem um formato para o uso do conhecimento que é distinto: (a) a rotinização à escala micro do quotidiano promove a criação de uma ordem social à escala da interação social da qual os agentes sociais são conscientes e que, por isso, podem controlar no imediato com o “outro”, mas ao mesmo gera um efeito macro em instituições e/ou em mudanças sociais que estão para além da consciência prática e que, portanto, constrangem os agentes sociais nos seus efeitos de feed-back do macro sobre o micro; (b) o encadeamento de múltiplas rotinas da vida social gera um efeito macro de integração sistémica da sociedade que só pode ser em seguida reintegrado na vida social quotidiana se, entretanto, por via da reflexividade institucional, os agentes sociais desenvolverem uma consciência discursiva que lhes permite perceber o movimento da sociedade à distância, como se fossem exteriores a ela e dela tivessem controlo, fazendo uso de conhecimento científico e abstrato sobre as regularidades sociais que estruturam a vida social. Na escala micro há o uso do conhecimento orientado pela consciência prática e pela interação social, sendo este determinante para a criação de uma certa ordem social primária na vida social. Na escala macro há o uso do conhecimento que depende das instituições e dos sistemas abstratos (e periciais) orientado pela consciência discursiva, sendo este dependente do poder que os agentes sociais têm para usar de modo diferente (de modo não rotineiro) os recursos disponíveis nas rotinas da vida social.

Dito noutros termos, para Giddens a rotinização da vida social assegura de modo automático a continuidade entre os constrangimentos institucionais e o poder da agência social, mas simultaneamente existem descontinuidades ao nível da consciência, dado que a consciência (prática) do nível primário e micro do conhecimento social mútuo estáseparada da consciência discursiva e da reflexividade institucional que contém o conhecimento sobre as regularidades macro da sociedade. Uma forma de consciência não é equivalente à outra, ainda que a modernização da vida social imponha a sua coexistência nos encontros interativos entre leigos e profissionais-peritos, pois para se gerar confiança social é preciso que às garantias de confiança simbólica nos sistemas periciais de conhecimento abstrato (descontextualizadoras da vida social) sejam acrescentadas e sobrepostas as garantias de confiança interpessoal que recontextualizam a validade do conhecimento abstrato no reconhecimento de evidências empíricas e na orientação do sentido prático da interação social (Giddens, 1992). Assim, a descontextualização da vida social pode ser equiparada ao funcionamento do sistema sociocognitivo 2 de atividade sociocognitiva desde que, para haver uma aproximação ao sistema 1, o uso do conhecimento permita em seguida a recontextualização do conhecimento abstrato nos encontros leigos-profissionais. O estabelecimento de confiança nas relações interpessoais pode ser equiparado ao funcionamento do sistema 1 de atividade sociocognitiva, desde que, para haver aproximação ao sistema 2, aos processos automáticos de rotinização da vida social, estejam associados os não automáticos e descontínuos de uma consciência prática não totalmente divorciada da reflexividade institucional.

No que se refere às possíveis contribuições de Pierre Bourdieu, a maioria dos autores-intérpretes desta obra não reconhece a existência de qualquer noção de dualidade social. Genericamente, acusam este autor de não deixar espaço para pensar a agência e a mudança social, interpretando a teoria do habitus e dos campos sociais como sendo reprodutivista, isto é, pressupondo um mecanismo automático que, condicionaria,absolutamente a subjetividade humana às condições materiais de existência e às posições sociais adquiridas (capitais) prévias à ação social, e apenas dependentes de esquemas inconscientes (disposições do habitus) de perceção, antecipação e apreciação social.

Nesta lógica de interpretação reprodutivista não se deixa de admitir que o habitus, para além de ser uma estrutura interna aos indivíduos, também é estruturante da vida social (também se manifesta externamente em práticas sociais), podendo gerar mobilidade social nas trajetórias individuais e lutas simbólicas, por via da consciência reflexiva, em campos sociais (Bourdieu, 1979). Assim, mesmo nesta lógica reprodutivista de interpretação não se deixa de admitir a existência de mudanças ao nível macro-histórico, ou a longo prazonos itinerários de vida dos indivíduos, mas entende-se que estas escapam à subjetividade humana, porque seriam sempre dependentes de estruturas sociais prévias aos processos de socialização dos atores sociais e, por isso, seriam sempre incorporadas sem recurso à consciência humana (Bourdieu, 1972). Dentro desta lógica, o habitus asseguraria sempre automatismos sociais de reprodução da vida social, sem que a consciência pudesse identificar descontinuidades neste ciclo reprodutivo entre práticas-capitais e discursos-campos, que não dependessem das desigualdades de poder, fazendo as estruturas mentais e simbólicas serem ajustadas, continuadamente, às condições objetivas de existência material.

Em anterior texto produzido sobre a teoria da prática de Bourdieu salientei que não subscrevo esta interpretação reprodutivista e exclusivamente ­disposicional da prática social (Caria,2002b, 2007b). No entanto, admito, tal como Bernard Lahire (2001) refere,que a teoria do habitus está excessivamente condicionada pela teoria dos campos sociais. Esta teoria também foi condicionada por uma época histórica, em França, muito influenciada pelas teorias psicológicas de Jean Piaget nas quais o desenvolvimento psicológico (e portanto toda a atividade cognitiva) era concebida como partindo da prática do indivíduo no mundo social, mas para o qual apenas se tinha uma explicação estrutural, única e genérica, sem deixar muito espaço para se poder pensar as variações do desenvolvimento psicológico por via da interação social e de dimensões contextuais e micro de aprendizagem cultural (Bronckart e Schurmans, 2001). Em conjunto estes dois condicionamentos levam a que Bourdieu esteja sempre apenas centrado numa perspetiva macro-histórica e vertical de explicação do social e das relações multiculturais (Caria, 2014a), e portanto inibido de procurar tomar por objeto teórico os processos de uso do conhecimento na vida quotidiana.

É o próprio autor, em resposta aos seus críticos, que recusa a interpretação estruturalista da sua obra, salientando que a prática social contém um improviso social que está para além das estruturas mentais aprendidas, dado poder haver uma “décalage” entre o habitus e um dado campo social, um envelhecimento (por inércia) do herdado-aprendido das velhas gerações para novas condições históricas que desafiam os jovens (histereses do habitus), ou, simplesmente, situações novas (de hiato na vida quotidiana, exteriores aos campos sociais) para as quais não se foi socializado e que se constituem como momentos críticos em que os mecanismos automáticos do habitus ficam em suspenso (Bourdieu, 1998; Bourdieu e Wacquant, 1992). Numa formulação que consideraria muito próxima da teoria da dualidade de Giddens, Bourdieu afirma que “os agentes sociais são determinados apenas na medida em que se determinam” (Bourdieu, 1992, p. 111)

Em conclusão, na interpretação que fazemos da teoria do habitus de Bourdieu a regra geral é a existência de um automatismo entre práticas,habitus e discursos-campos, isto é, de uma continuidade entre as estruturas objetivas interiorizadas pela socialização (equiparado ao sistema 1da atividade sociocognitiva) e as estruturas subjetivas da ação exteriorizadas em campos sociais (equiparado ao sistema 2 da atividade sociocognitiva). No entanto, como não se exclui a possibilidade de este automatismo ter exceções, então pode-se passar a admitir que a regra é dual, dado que habitus e campos coexistem de modo interdependente, mas também em separado. Digo de modo separado, porque ao nível micro da aprendizagem social e do uso do conhecimento pode ocorrer algo de não-automáticoque introduz descontinuidade dentro de uma continuidade macro-histórica, mesmo quando o efeito do micro sobre o macro não introduza nenhuma crise de poder legítimo. Para isso, é preciso que as práticas sociais deixem de ser analisadas apenas pelos efeitos de regularidade social e histórica em disposições de produção cultural, para passarem a ser analisadas, também, pelos seus efeitos de aprendizagem na consciência prática da construção cultural da realidade, e, portanto, de descontinuidade microssocial entre o esperado e o antecipado por “mim” e a reação e ou a manipulação não-naturalizadado “outro” para fazer crer algo de diferente e gerar improviso social.

Deste modo, diria que a perspetiva de Bourdieu sobre a subjetividade humana e a consciência social não se centra no efeito recontextualizador do discurso nas práticas, que, julgo, se encontra em Giddens, mas antes no inverso: centra-se no efeito improvisador da prática, sempre que numa situação há uma perturbação do naturalizado, fazendo com que o habitus fique em suspenso. E, assim, permitir que a ação passe a ser regulada pela consciência prática da (inter)ação social, relativa aos pequenos planos e pequenas intenções (para o futuro de curto prazo) e às pequenas razões e pequenas causas (do passado de curto prazo) projetados e partilhados com o outro na situação presente que se acredita ser (poder ser) nova. Situação nova do quotidiano, que se pode admitir poder ainda estar demasiado distante dos campos sociais – dos grandes interesses-planos e das grandes razões-explicações da consciência discursiva organizada pela disputa simbólica e pelo debate público de um tema – para que possa resultar de um qualquerprocesso de recontextualização dos SAC.

Julgo que é nesta dimensão de procura de um melhor entendimento sobre o que é o improviso da prática social que poderemos encontrar a contribuição de Erving Goffman para a dualidade da vida social. Aqui o foco da análise já não está na relação dual (de continuidade e descontinuidade) entre o micro da consciência prática e da enculturação social e o macro da reflexividade institucional e dos campos sociais. Na obra de Goffman a análise da vida social não está centrada na organização e estruturação da sociedade como um todo, dado que está apenas focada na análise micro, de como se organiza a experiência quotidiana do social e de como cada self se movimenta na interação social para assegurar esta organização experiencial com “os outros” (Goffman, 1979).

O foco de análise deste autor nunca é o de estabelecer qualquer tipo de oposição ou dicotomia entre a realidade objetiva exterior à consciência do indivíduo e a realidade construída pelos indivíduos na interação social. A perspetiva de Goffman parte sempre da realidade construída, daquilo que os indivíduos acreditam ser a realidade (mesmo que não o seja), porque o que conta para a vida social ao nível micro é a crença naquilo que é vivido em comum e não aquilo que se apresenta como exterior e objetivado “por outros” e “por eles” ao self (Lemert e Branaman, 2005 [1997]).

Percebe-se facilmente que orientação teórica deste autor é assumidamente não-objetivista, mas não se percebe imediatamente como é que ela contém uma dualidade social que a faz também não-subjetivista. De facto, não é por a realidade ser assumidamente construída na escala micro do quotidiano social que ela não deixa de ser um objeto diferenciado de apropriação intersubjetiva. O melhor exemplo desta visão não-subjetivista está no contraponto que se pode fazer sobre as conclusões de duas das mais importantes obras deste autor (Goffman, 1968 e 1974): (a) no estudo sobre as instituições totais reconhece-se que existe um enorme constrangimento institucional sobre os indivíduos que, inevitavelmente, os leva a ter uma conduta que depende de um ajustamento (primário) ao papel social atribuído; no entanto, isto não impede que os mesmos indivíduos noutras situações, no âmbito das mesmas instituições, não deixem de fazer ajustamentos secundários e periféricos que contrariam as determinações institucionais; (b) ao inverso, nos estudos sobre as interações sociais em espaços públicos, não parece haver constrangimentos institucionais e, no entanto, as interações sociais estão suportadas por convenções e rituais no face-a-face que reproduzem uma ordem social, ao mesmo tempo que cada ator social procura atuar de modo autónomo para garantir e promover uma adequada deferência e respeito de si perante o outro.

Em ambas as abordagens, percebe-se que existe algo de exterior aos indivíduos que os constrange (com mais ou menos peso e força institucional), mas essa determinação externa só é relevante a partir do momento em que os atores sociais a tomam por real e efetiva (acreditam nela, naturalizam-na) e passam a atuar (de modo intersubjetivo) para tirar partido em benefício próprio da existência dessa própria realidade (ainda que as margens de liberdade que têm para o fazerna interação social possam ser maiores ou menores). Há, assim, nesta visão sobre a construção intersubjetiva da realidade, duas operações sociocognitivas que coexistem e que permitem compreender a dualidade social à escala micro, sem cair em qualquer individualismo explicativo do self: (a) a parte naturalizada da vida social que é assumida como tendo uma aparência normal, como óbvia e garantida (tomada como implícita e exterior à consciência prática das convenções e dos rituais quotidianos) e tomada como suporte básico e primário de qualquer interação social, como se fosse apenas de natureza biofísica; (b) a parte negociável, contingente e estratégica de cada ator social, para definir e atuar na situação, de modo a conseguir apresentar-se aos “outros” como alguém respeitável, como alguém que naquela situação tem um valor que está para além do momento e dependente apenas do self de cada um. Na visão de Louis Quéré (2003), esta dualidade microssocial é identificada como paradoxal, pois o sentido da prática que ocorre no fluxo da interação social contém, em simultâneo, a ordenação e contingência da ação.

Repare-se que o problema central de Goffman não é o de saber quem tem mais ou menos poder simbólico para melhor fugir aos constrangimentos ou para melhor se promover perante os outros. Basta conceber que todos os agentes sociais poderão em diversas situações (à escala micro) expressar na interação a dualidade da vida social. Deste modo, o que interessa salientar é que todos os atores sociais são constrangidos por quadros sociais primários que naturalizam a realidade de modo intersubjetivo (acreditando nessas circunstâncias que ninguém está a ser determinado por fatores externos) e, ao mesmo tempo, todos podem situacionalmente construir quadros sociais secundários, dado que todos estão a procurar garantir deferência e respeito perante o “outro”, também de um modo intersubjetivo.

Em conclusão, será na conjugação dual dos dois quadros sociais que, julgo, poderemos encontrar as afinidades teóricas de Goffman com Bourdieu, desde que se equipare os quadros primários ao funcionamento regular e recorrente do habitus e os quadros secundários ao que existe de improviso da prática na interação social. Assim, podemos admitir que para ambos os autores existe uma dualidade, porque (a) tanto podemos encontrar a continuidade social do quadro primário, quando o improviso não gera qualquer hiato relevante entre o habitus e a reflexividade, na medida em que se consegue manter a aparência de normalidade intersubjetiva, não se dando relevância a factos que podem ser menos consistentes com esta crença; (b) como podemos encontrar a descontinuidade social do quadro secundário, quando o improviso revela um hiato entre o normal-natural do habitus e a consciência prática da necessidade de atuar na interação para corrigir a definição da situação e diminuir a tensão ocorrida. Definitivamente o que passa a contar para a análise da experiência social, enquanto dualidade social, já não são os usos das regras e dos recursos, não são os poderes-capitais que cada ator social tem para jogar; são as jogadas de cada ator social, o uso que cada self faz de si quando atua na interação social e mostra ter saber para jogar “com outros”.

Retomando o paralelismo que temos estado a estabelecer entre a teoria do PCD e esta releitura da teoria social, podemos dizer que a organização social da experiência, salientada por Goffman pode ser equiparada às operações sociocognitivas do sistema 1, sendo que estas se podem desdobrar nas operações de tipo 1, de continuação do uso implícito e pouco consciente do conhecimento inscritas nos quadros primários intersubjetivos (com eventual crença numa reprodução inata e ou reprodutivista do inconsciente do habitus). Ou desdobrarem-se nas operações sociocognitivas de tipo 2do sistema 1, de extração-elecitação de sentido da prática na interação social nas quais a oralidade social, como vimos atrás, se torna central a fim de preparar a passagem para o sistema 2, através de sucessivas rediscrições da linguagem para suporta as operações cognitivas.

 

CONCLUSÃO: DA VALIDADE DO CONCEITO DE DUALIDADE SOCIOCOGNITIVA

 

Ao longo deste artigo usei um esquema de análise que designei de “dualidade sociocognitiva” para melhor descrever e explicar o uso do conhecimento na ação profissional. Quando me referi à existência desta dualidade salientei sempre a interdependência-articulação entre sistemas e operações duais de conhecer que, atendendo aos atributos e propriedades de cada um deles, nunca podem chegar a superar as suas diferenças. A dualidade pode mesmo originar a separação entre os dois sistemas e operações, ainda que a coexistência continue a ocorrer, dado que se admite uma influência recíproca, mesmo quando um deles está distante, parecendo ausente num dado contexto de ação.

Para desenvolver este esquema de análise baseei-me numa hipótese desenvolvida por uma corrente da psicologia cognitiva e transpus o seu esquema dual de explicação para as ciências sociais de dois modos: (a) mostrando que ele pode ser encontrado em três clássicos da teoria social (Anthony ­Giddens, Pierre Bourdieu e Erving Goffman), quando se trata de explicar o uso do conhecimento na estruturação e na reflexividade da vida social, à escala macro e micro; (b) mostrando que, suportado no esquema dual, torna-se mais fácil perceber por que é que, tão repetidamente, as teorias antropológicas e sociológicas sobre as relações multiculturais tenderam, ao longo da história, a dicotomizar-hierarquizar as duas formas de conhecer da mente humana em epistemologias, linguagens culturais e tarefas cognitivas opostas.

Para poder evidenciar a validade deste esquema dual de análise tive o cuidado de, ao longo deste artigo, excluir da conceptualização do saber profissional dois estilos de uso do conhecimento opostos, a saber: (a) excluir o uso do conhecimento abstrato que oculta o sentido da prática que o suporta, em particular quando as abstrações sociocognitivas são usadas de um modo exclusivamente dedutivo, proposicional e analítico (incluindo a forma do conhecimento profissional que aparece nos planos de estudos, currículos e manuais de educação formal dos profissionais) ao ponto de descontextualizar a reflexividade e as evidências empíricas que lhe deram origem (estilo dogmático e ideológico de usar conhecimento em que a “teoria” é apresentada numa forma idealizada sobre o que a realidade deve ser, sem recontextualização prática); (b) excluir o uso prático e incorporado do conhecimento (o sentido prático da prática interiorizado no habitus) que é totalmente opaco à consciência prática, ao ponto dos processos contextuais, pragmáticos e intuitivos de uso do conhecimento para agir não poderem ser expressos através da linguagem oral intersubjetiva de categorização-apreciação e de descrição-perceção de organização da experiência social comum.

Dei particular atenção a esta forma dual da atividade sociocognitiva, porque ela postula a coexistência de usos do conhecimento na vida social que têm particular relevância para aquilo que é a especificidade do saber profissional: (a) a coexistência, em contexto de trabalho profissional, do uso de conhecimento abstrato para agir, por via da consciência discursiva que permite justificar as razões-regras e os valores-princípios que suportam as evidências empíricas e a ação na vida social, (b) com o uso de conhecimento prático existente no fazer-pensar na interação social, por via da consciência prática que permite elicitar as crenças sociais e o saber prático comum que suportam aquilo que acreditamos ser o normal-natural das práticas sociais.

Em síntese, a dualidade das operações sociocognitivas envolvidas na constituição do saber profissional pode ser explicada como a coexistência de duas operações sociocognitivas inversas: (a) a operação cognitiva (de baixo-para-cima, de aproximação do sistema 1ao sistema 2) que permite desenvolver o saber profissional que elícita o sentido da prática no curso da ação quando a situação vivida apresenta alguma descontinuidade em relação ao já conhecido pela prática, antes interiorizado; (b) a operação sociocognitiva inversa (de cima-para-baixo, de aproximação do sistema 2 ao sistema 1) que permite desenvolver o saber profissional que recontextualiza conteúdos de conhecimento em novas práticas quando o contexto em que se atua apresenta alguma descontinuidade em relação ao já conhecido em geral, de modo descontextualizado.

 

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Recebido a 08-04-2016. Aceite para publicação a 10-04-2017.

 

NOTAS

 

1Refiro-me à linha de investigação ASPTI (Análise Social das Profissões em Trabalho Técnico-Intelectual). Para se conhecer a atividade multifacetada desta linha de investigação, v. Caria (2005a: 13-14; 2013a: 9-12) Caria, et al. (2009: III-V) Caria e Pereira (2014a, pp. 12-13).

2Sobre o modo como na linha de investigação ASPTI e no âmbito da tradição de pensamento em sociologia das profissões se tem conceptualizado e operacionalizado os conceitos de profissão e de trabalho profissional, v. Caria (2005c, 2005d, 2009, 2012b, 2013a); Caria, T. e Pereira (2014b).

3Este tópico, das relações entre ciência e senso comum, não será desenvolvido neste artigo, dado considerar tratar-se, como se verá mais à frente, de uma problemática paralela ao problema central que irei tratar: forma dual de uso do conhecimento no saber profissional. Para melhor se perceber como, mais recentemente, tenho tratado este tema, ver Caria (2014a); Caria,César e Biltes (2012).

4Sobre a definição de SAC, v. Caria (2002a, p. 806, 2012b, p. 60; 2014a, pp. 801-802).

5A problemática do saber tácito e do saber incorporado na ação não será abordada neste artigo, pois não trata, geralmente, da dualidade do uso do conhecimento. Para um adequado esclarecimento sobre a problemática geral do saber tácito considero serem essenciais ascontribuições teóricas de Collins (2010).

6A crítica a este reducionismo sociológico, aplicado à reflexão sobre a prática científica e o ensino em sociologia, pode ser encontradoem Caria, César e Biltes (2012).

7A separação analítica entre mente e corpo tende hoje a ser uma das conceções mais criticadas pelas ciências cognitivas de inspiração fenomenológica. Para melhor se perceber os fundamentos psicológicos e filosóficos desta crítica fenomenológica, v. o livro clássico de Varela, Thompson e Rosch (2003).

8A síntese a seguir é minha.

9Apesar da inspiração piagetiana desta autora, ela não reduz o desenvolvimento cognitivo a um processo estrutural único, formal e lógico, distanciando-se por isso das interpretações mais clássicas das teorias psicológicas de Jean Piaget que vigoraram até aos anos de 1980 (Santana e Dias, 2006).

10O uso da expressão dual aplicada à oralidade social é minha, não é de Goody.

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