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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  no.223 Lisboa jun. 2017

 

ARTIGO

 

Usos e meios de transporte na Área Metropolitana de Lisboa: uma abordagem qualitativa da mobilidade

Urban mobility in the Lisbon Metropolitan Area: a qualitative approach

 

Rita Ávila Chachado*, Renato Miguel do Carmo*, Daniela Ferreira* e Sofia Santos*

*CIES-IUL, ISCTE, Av.das Forças Armadas — 1649-026 ­Lisboa, Portugal. E-mails: rita.cachado@iscte.pt, renato.carmo@iscte.pt, daniela.ferreira77@gmail.com e saogms@gmail.com

 

RESUMO

 

Inserido num projeto de investigação sobre desigualdades e mobilidades na Área Metropolitana de Lisboa, este artigo pretende ser um contributo para o aprofundamento do debate sobre a produção das mobilidades espaciais em contexto urbano. Partindo de um conjunto de entrevistas a residentes em três municípios, o estudo desenvolvido reponde a dois objetivos fundamentais. Primeiro, descrever os principais usos e formas de deslocação, no sentido de identificar uma tendência que aponta para o crescente recurso a transportes motorizados a partir de marcos nas trajetórias dos entrevistados. Em segundo lugar, descortinar os fatores de diferenciação e as razões que fundamentam as escolhas entre o uso do transporte motorizado público ou particular. Os motivos enunciados derivam tanto das diversas experiências acumuladas ao longo da vida, como do impacto da crise económico-financeira, que representa um forte constrangimento relativamente à maior ponderação face aos custos implicados nas alternativas contempladas.

Palavras-chave: mobilidades; transportes; espaço metropolitano.

 

ABSTRACT

 

This article results from a research project on inequalities and transportation in the Lisbon Metropolitan Area, and contributes to the scientific debate on the production of urban mobility. Through the analysis of a set of interviews addressed to residents in three municipalities, this study achieves two main goals. First, it describes the main transportation modes in order to identify a general trend toward an increasing use of motorized transport as a consequence of certain stages in the interviewee’s life. Second, it unveils the differentiated factors and reasons behind the choice of using public or private motorized transport. The motives mentioned by interviewees stem from the diverse experiences over their lives, and also from the impact of the current economic and financial crisis, which imposes significant constraints due to the rising costs of the various transportation modes.

Keywords:mobility; transportation; metropolitan space.

 

INTRODUÇÃO

 

Os trajetos de mobilidade e a alteração no uso de determinados transportes decorrem normalmente de mudanças ocorridas na vida das pessoas. Muitas vezes a entrada na universidade ou o ingresso num novo emprego produz uma alteração nas deslocações quotidianas e nos transportes utilizados. Na verdade, não é possível caracterizar devidamente a produção da mobilidade espacial no contexto de uma densa área metropolitana como a de Lisboa, sem analisar a relação entre trajetos de mobilidade e alguns marcos fundamentais nas trajetórias de vida dos indivíduos.

A base de análise para este artigo concentra-se num conjunto de entrevistas a 16 indivíduos de 11 agregados familiares, residentes em três municípios da AML – Alcochete, Odivelas e Oeiras – no âmbito do projeto de investigação “Localways. Ways of local sustainability: mobility, social capital and inequality” (PTDC/ATP-EUR/5023/2012). Embora do ponto de vista geográfico as zonas residenciais destes concelhos sejam globalmente denominadas como suburbanas, estamos perante territórios com características demográficas e socioeconómicas bastante diversas. Tendo por base uma tipologia socioterritorial adaptada (Santos, 2014) verificámos que cada um destes concelhos se enquadra nessa tipologia de forma distinta. Esta diferenciação foi aprofundada através dos dados qualitativos reunidos, que permitiram compreender até que ponto as características do local de residência condicionam os usos e meios de transporte público e particular.

Assim, após enquadrar teoricamente a nossa proposta, este artigo tem como primeiro objetivo descrever as principais formas de deslocação descritas pelos nossos interlocutores e desse modo contribuir para identificar proximidades e distanciamentos em diferentes práticas de mobilidade. Em termos gerais, verificámos que determinados marcos nas trajetórias de vida, como o ingresso no mercado de trabalho ou a entrada na universidade, só para referir os mais comuns, conduzem a mudanças na utilização de transportes. A principal regularidade foi encontrada na importância do modo de deslocação “andar a pé” até à entrada no mercado laboral ou até à formação superior, momentos a partir dos quais raramente se continuam os trajetos a pé. Se à partida esta exposição pode parecer tautológica, efetivamente os estudos de mobilidade têm negligenciado, nas abordagens que compreendem vários tipos de transportes, as formas como os utentes narram sobre as suas opções e condicionamentos no que respeita às mobilidades metropolitanas (Camarero e Oliva, 2008). Esta tendência identificada à escala individual revela como as práticas de mobilidade se alteraram no sentido de um crescente uso de transportes motorizados que se generalizou e tornou-se dominante à escala da AML, como certos estudos têm identificado (Nunes, 2011; Santos, 2014). Com esta análise pretende-se captar como em diferentes agregados familiares situados em distintos concelhos da AML, se identifica uma relativa sintonia no modo como se produziu essa alteração.

Contudo, essa relativa sintonia não significa que as razões que motivam certos usos de transportes e de práticas de mobilidade sejam consensuais entre os vários agregados familiares. Ao descortinar as razões que emergem na escolha entre o transporte motorizado público ou particular, iremos verificar que os motivos enunciados derivam tanto das diversas experiências acumuladas ao longo da vida em relação ao uso de diferentes tipos de transporte, como do contexto atual de crise, que surge como forte constrangimento que está a contribuir para uma maior ponderação nas alternativas existentes. Assim, se o primeiro objetivo pretende captar regularidades que emergem das entrevistas, este último tenta apresentar diferenças nas razões enunciadas pelos diversos entrevistados.

De forma a melhor descortinar os motivos que sustentam essa racionalidade, apresentaremos breves retratos sociológicos1 a partir dos testemunhos recolhidos em entrevistas aprofundadas e através de incursões etnográficas realizadas junto de seis agregados familiares residentes nos três concelhos nomeados. Estes testemunhos foram recolhidos durante os anos de 2014-2015, que correspondem a um período de forte impacto da crise económico-financeira. Assim, podemos explicitar um objetivo secundário do artigo que pretende perceber até que ponto esse impacto da crise poderá estar a alterar não só o conteúdo das práticas de mobilidade como, sobretudo, os significados que se atribuem a determinadas opções, designadamente, o uso de transporte particular.

 

A PRODUÇÃO DAS MOBILIDADES EM CONTEXTO URBANO

 

O tema da mobilidade espacial está presente nas ciências sociais em perspetivas urbano-funcionalistas (pela sociologia do planeamento; geografia; urbanismo; economia regional) ou com um enfoque temático, nomeadamente no estudo das migrações internacionais ou do turismo, campos relativamente autónomos. Encontra-se ainda retratado em estudos sobre território em engenharia, geografia humana, demografia, sociologia, história ou antropologia. Está mais presente na área interdisciplinar dos estudos urbanos, designadamente através da relação entre mobilidade geográfica e o desenvolvimento das áreas metropolitanas. Neste âmbito, a história urbana no contexto anglo-saxónico foi durante décadas a grande promessa dos estudos de mobilidade 2, mas mais recentemente a força dos diferentes ramos disciplinares complexifica-se (Sheller e Urry, 2006; Cresswell, 2009, p. 36).

A produção de mobilidades tem sidoportanto abordada através de vários enfoques: dos migrantes aos turistas, dos movimentos pendulares aos refugiados, da apropriação dos modos, equipamentos e espaços de transporte (o aeroporto, a estrada, o carro) ao pedestrianismo, entre tantas outras experiências de mobilidade (Carmo e Simões, 2009; Cresswell e Merriman, 2011, entre outros). Alguns autores, como Sheller e Urry (2006), Cresswell (2006) ou Kaufmann, Manfredo and Dominique (2004), defendem que o estudo das mobilidades configura um novo paradigma nas ciências sociais, apontando claramente para a necessidade de uma visão interdisciplinar, ainda que raramente incorporando aspetos etnográficos.

Por sua vez, na antropologia a mobilidade urbana tem acompanhado os debates noutras ciências sociais e humanas, nomeadamente no que toca à relação entre o conceito de mobilidade e a abordagem às migrações transnacionais (Schiller e Salazar, 2013). Tarrius aponta mesmo o conceito de antropologia do movimento (Tarrius, 1989), concordando com um conceito de mobilidade que implica a ideia de acessibilidade como apresentada por Kaufmann et al. (20043), quer dizer, que compreenda na análise os atores sociais, tipos de deslocação necessários à vida quotidiana, e os modos como o fazem, bem como a representação que as populações têm sobre a eficácia dessas escolhas.

Ainda na contextualização, a partir do final do século XIX a introdução do automóvel dá origem a um sistema de automobilidade (Sheller e Urry, 2006; Featherstone, 2005), que impulsionou a dispersão dos lugares de residência, de trabalho, lazer, que antes eram vividos de forma mais compacta e próxima. Sobretudo na segunda metade do século XX, a generalização do uso do automóvel, em que se concretiza este sistema, levantou problemas de sustentabilidade ecológica, cuja visibilidade, com o advento do paradigma do desenvolvimento sustentável, tem contribuído para o seu questionamento. A diversificação e multiplicação dos tempos e lugares das deslocações urbanas nas últimas décadas desafiam a conceção tradicional dos sistemas de transportes públicos, planeados sobretudo para a pendularidade casa-trabalho (Viegas, 2003; Ascher, 2010). O desenvolvimento dos meios e sistemas de transporte é acompanhado pelas tendências de fragmentação social e enclausuramento espacial (Ascher, 2010, p. 73).

Na análise da evolução das cidades, designadamente no território nacional, são estreitas as relações entre o desenvolvimento dos sistemas de transportes, as alterações dos padrões de mobilidade e a expansão da malha urbana. Também alguns trabalhos realizados em Portugal referem o papel da mobilidade geográfica, e sua diferenciação social, na produção do espaço (Costa, 1999; Carmo, 2007; Pinto e Queirós, 2010; Carmo e Santos, 2011; Oliveira, 2014).

Na passagem da cidade pedestre à metrópole do automóvel, identificada por exemplo por João Pedro Nunes (2011), há várias abordagens que identificam as políticas (ou ausência delas) e os movimentos populacionais que contribuíram para a formação da Área Metropolitana de Lisboa, designadamente numa perspetiva mais alargada no tempo (Vieira, 1982; Ferreira, 1983; Salgueiro, 2001; Marques, 2003; Pinheiro, 2012). Também na mobilidade se observam bloqueios à concretização das políticas públicas, nomeadamente na proliferação de documentos orientadores cujos princípios continuam a carecer de materialização. Como resultado, estamos perante um modelo de ocupação do território assente no transporte privado devido a um investimento superior na rede viária e à conservação de uma rede de transportes públicos que penaliza quem escapa aos movimentos clássicos periferia-centro.

Na AML, a consolidação urbana associa-se à maior utilização dos transportes públicos e à menor duração dos movimentos pendulares. A importância de grupos com rendimento mais elevado nalguns destes espaços contraria esta tendência e tende a produzir mobilidade privada. Porém, também a idade, a situação familiar ou o género influenciam a escolha do modo de deslocação (Santos, 2014), bem como por vezes alguns aspetos culturais (Cachado, 2012). Para este artigo focámo-nos na alteração dos trajetos de mobilidade observados ao longo de etapas marcantes da vida em função dos diversos modos e usos de transporte, estabelecendo uma relação com a trajetória profissional, escolar e residencial. Esta abordagem é, em parte, subsidiária da de Camarero e Oliva (2008), que incide nas estratégias de mobilidade familiar no dia-a-dia, aplicando uma grelha com todos os pontos dos trajetos diários dos interlocutores. Na análise qualitativa que realizámos optou-se por desenvolver esta metodologia, no sentido de perceber melhor como atualmente se configuram as mobilidades na AML.

 

ABORDAGEM METODOLÓGICA

 

A construção analítica inspirada nos retratos sociológicos como proposto por Lahire (2002) permitirá identificar com mais profundidade as formas como a mobilidade espacial se produz à escala de agregados familiares residentes em três concelhos distintos. A conceção de retrato sociológico desenvolvida por Lahire assentava em entrevistas aprofundadas a partir das quais se reconstituiam as disposições incrustadas em cada indivíduo, assim como os diferentes quadros de socialização e das respetivas experiências sociais (Lahire, 2002). Neste artigo concebemos metodologicamente o retrato sociológico a partir do cruzamento de diferentes testemunhos de pessoas pertencentes ao mesmo agregado familiar. Ao mesmo tempo, o nosso enfoque não será em torno da análise das disposições sociais, mas na racionalidade das escolhas relativas ao uso de transportes e no tipo de mediações quotidianas que assegura a produção das práticas de mobilidade. Ou seja, inspiramo-nos na metodologia base utilizada na construção de retratos sociológicos, enquadrando-a no estudo das práticas de mobilidade em contexto metropolitano. O foco será o agregado familiar e a análise cruzará metodologias qualitativas.

Este artigo insere-se no projeto de investigação “Localways” referido antes, no qual se desenvolveram duas vertentes metodológicas complementares, uma quantitativa e outra qualitativa. A primeira foi executada através da conceção e aplicação de um inquérito por questionário realizado a 1500 residentes na AML com idade igual ou superior a 18 anos, abrangendo 75 freguesias, ­oferecendo uma representatividade elevada. Para que este inquérito fosse representativo da AML, foi elaborada uma amostra com base numa tipologia territorial (Santos, 2014)4atoriamente um número proporcional de freguesias. Depois de realizado o inquérito, construímos uma tipologia socio-territorial composta por quatro perfis: suburbano massificado 5; urbano qualificado6; rural, suburbano recente ou desqualificado7urbano antigo e em renovação.8

Central para este artigo é a segunda vertente metodológica do projeto, qualitativa, que se concretizou na realização de entrevistas semi-estruturadas a 16 indivíduos pertencentes a 11 agregados familiares e à realização de incursões etnográficas junto de alguns dos agregados. Ao mesmo tempo, o acompanhamento feito pela equipa do projeto às deslocações de alguns agregados, conhecendo de perto os transportes e os percursos em causa, permitiu-nos aceder a uma visão mais completa daquilo que nos era relatado em entrevista. Embora sem carácter sistemático (não estamos perante uma pesquisa de terreno antropológica clássica com recurso à observação participante), recorremos aos dispositivos da etnografia para complementar a utilização de entrevistas e seguimos o repto de Françoise Weber, que defende o trabalho de campo como ferramenta, entre outras, para perceber melhor os fenómenos em análise (Weber, 2001, p. 482). Assim, além daquelas, foi fundamental um conjunto de conversas informais e seu registo em diário de campo e sua posterior análise (Ottenberg, 1990; Johnson e Johnson, 1990), bem como a utilização deste para a descrição das próprias trajetórias de mobilidade, realizadas por vezes com os nossos interlocutores, permitindo assim aceder aos pontos de vista dos entrevistados de forma mais aprofundada, conhecendo os lugares onde moram e os trajetos que realizam nos seus quotidianos, bem como utilizando a observação participante para a realização das entrevistas gravadas (Lofland e Lofland, 1995, p. 83).

O guião da entrevista baseou-se numa linha temporal, partindo do passado até ao futuro para podermos entender a trajetória de vida do indivíduo bem como os seus planos e projetos. Contudo, o enfoque foi sobre o espaço-tempo quotidiano, nomeadamente a relação entre o agregado e o meio que o rodeia, a sua gestão entre trabalho e lazer, consumos e mobilidade. Embora baseadas num guião detalhado, as entrevistas decorreram de forma aberta. Os interlocutores detiveram-se mais numas dimensões do que noutras, nomeadamente os aspetos relativos à mobilidade, que se revelaram particularmente interessantes. Embora a maior parte das entrevistas tenha sido realizada individualmente, a escala fundamental da análise qualitativa centrou-se no agregado familiar. É tendo por base esta abordagem que se enquadram os retratos sociológicos apresentados na última parte do artigo. Dos agregados estudados, salientaram-se seis (dois por concelho) que apresentam uma diversidade de opções de mobilidade ao longo da vida e que refletem mais aprofundadamente sobre essas mesmas opções, permitindo-nos aceder a representações e racionalidades diversas sobre esta temática.

Os agregados entrevistados distribuem-se por três municípios da AML selecionados como estudos de caso do projeto (Figura 1): Oeiras, Odivelas e Alcochete, escolhidos de acordo com a tipologia territorial criada mencionada acima. Oeiras corresponde à tipologia urbano qualificado, com elevada percentagem de população qualificada que trabalha no setor terciário. Odivelas, apesar de ter elevadas densidades populacionais como Oeiras, insere-se na tipologia sub/urbano massificado, com baixos valores de população com ensino superior. Por último, Alcochete insere-se na tipologia rural, suburbano recente ou ­desqualificado, um território com baixas densidades ­populacionais e valores reduzidos de população qualificada. A escolha destes municípios teve como objetivo espelhar a heterogeneidade territorial e social da AML, o que poderá refletir-se nos trajetos de mobilidade mais adiante apresentadas.

 

 

Se olharmos para a distribuição geográfica da AML e para o sistema de transportes em termos gerais, há uma diferenciação à partida evidente: se em Alcochete a ponte e o rio separam o concelho da capital, em Oeiras é o comboio que a aproxima e em Odivelas é o metropolitano o meio mais rápido de acesso ao centro de Lisboa. No entanto, esta simplificação não retrata os ­quotidianos e, por isso, vamos olhar mais de perto para os agregados familiares.

A seleção dos agregados familiares assentou em três critérios básicos, além da tipologia territorial: i) composição do agregado, tomando em consideração as alterações na composição dos agregados familiares, donde a família clássica passa a ser apenas uma entre várias formas de composição de agregado; ii) escolaridade, garantindo variedade ao nível das qualificações; iii) faixa etária, obtendo deste modo diversidade geracional.

Procurámos assim garantir diversidade sociológica suficiente para estabelecer uma análise que responda ao objetivos enunciados na introdução. Contudo, convém ressalvar que esta amostra não pretende almejar uma representatividade estatística. O seu intuito é sobretudo compreensivo no sentido de, por um lado, identificar um conjunto de regularidades no uso de transporte e práticas de mobilidade e de, por outro lado, perceber como, apesar dessas regularidades, se produzem distintas interpretações relativas aos motivos que estão na base desses usos e práticas. Ou seja, a estratégia metodológica foi empreendida de maneira a captar regularidades na evolução das práticas e apreender os fatores de diferenciação que levaram a determinadas opções nos usos dos transportes.

 

POLÍTICAS DE MOBILIDADE EM OEIRAS, ODIVELAS E ALCOCHETE: TRÊS SITUAÇÕES DISTINTAS

 

Importa conhecer sumariamente as políticas de mobilidade9dos municípios em foco, no sentido de analisar melhor as trajetórias de mobilidade dos indivíduos entrevistados, e compreender o impacto daquelas nas escolhas individuais.

Entre os três municípios analisados, Alcochete é o que tem tido mais dificuldades na construção das políticas de mobilidade e transportes. Várias decisões de construção de grandes infraestruturas de acessibilidade ficaram suspensas desde a entrada do XIX governo (CDS-PSD 2011-2015). Por sua vez, o Programa Regional de Ordenamento do Território da Área Metropolitana de Lisboa (PROT AML) foi suspenso e iniciou-se um processo de revisão, uma vez que as linhas estratégicas dirigidas aos municípios deixaram de fazer sentido em muitos casos. Sem estarem acordadas as linhas estratégicas de intervenção regional, os municípios da AML encontram-se num impasse, especialmente Alcochete, pois era o município onde estava prevista a localização da 3.ª travessia do Tejo e o novo aeroporto (agora suspensos). Além disso, ficaram por terminar as ligações entre os núcleos urbanos do município, fazendo com que as freguesias periféricas se tornassem territórios mais isolados. Apesar disso, as ligações intermunicipais ficaram consolidadas, sobretudo para a capital, ­Lisboa.

Perante esta situação, Alcochete encontra-se numa fase de reivindicação de infraestruturas para a garantia da acessibilidade dentro do município e entre os municípios vizinhos. Destaca-se a iniciativa “vem à vila” – do Plano de Desenvolvimento Social da Câmara Municipal e através de alguns agentes locais (e. g.:Fundação Gonçalves Júnior).

Por sua vez, Odivelas enquanto município recente (autonomizado de Loures em 1999), ainda não tem PDM próprio, continuando em vigor o PDM de 1994.10 Neste concelho, o problema das acessibilidades não é tão complexo como em Alcochete, notando-se uma melhoria considerável no acesso à capital através do metropolitano em 2007, mas revelando carências em zonas mais afastadas deste meio de transporte. O desafio atual diz respeito ao melhoramento das estratégias de mobilidade. Odivelas revela criatividade nas iniciativas de mobilidade, como a colaboração com a Rodoviária de Lisboa; colmatando lacunas de cobertura através do “Voltas Odivelas” (um mini-autocarro de circulação contínua no concelho); e a criação de transporte escolar para territórios com maior carência.

Finalmente, Oeiras está num patamar distinto dos municípios atrás referidos. No seu “Estudo de mobilidade e acessibilidade no concelho de ­Oeiras” é feito um diagnóstico e um conjunto de orientações estratégicas para o município. Aqui, o enfoque é na resolução de questões relacionadas com estacionamento e congestionamento, sendo defendido o aumento da utilização dos transportes públicos. A aposta do concelho parece concentrar-se nos modos “suaves” para reduzir emissões de dióxido de carbono, como a bicicleta e a promoção de veículos elétricos. Ao contrário de Alcochete e de Odivelas, ­Oeiras tem infraestruturas garantidas e possui uma rede de transportes ­coletivos ­rodoviários muito abrangente: 96% da população reside a menos de 400 metros de uma paragem.11

 

MEIOS E USOS DE TRANSPORTE: ALGUMAS REGULARIDADES

 

Para analisar as mobilidades identificámos em cada entrevistado as formas de mobilidade ao longo da vida e, como era expectável, identificámos aspetos comuns entre elas. Na maioria dos casos existe um processo de transição nos tipos de mobilidade recorrendo a diferentes modos de transporte. Para a quase totalidade dos indivíduos entrevistados “andar a pé” representava o meio fundamental e quase único de deslocação que, numa dada altura da vida, se altera para uma utilização frequente de meios de transporte motorizados. Geralmente, essa alteração para um meio de transporte motorizado acontece, em primeiro lugar, por via dos transportes públicos e, mais tarde, pelo uso do automóvel individual. Portanto, a regularidade encontrada nos trajetos de mobilidade é que, apesar de a maioria dos indivíduos andar a pé inicialmente nas suas vidas, a utilização de transportes motorizados mais tarde se torna quase imperativa.

Os indivíduos entrevistados andam a pé na sua juventude até concluírem os estudos do ensino básico ou ensino secundário. Ilustramos com alguns dados concretos: J.12 (21 anos), passa a utilizar transportes públicos porque entra na universidade em Lisboa, e K. (18 anos) do mesmo agregado, faz o ensino secundário em Lisboa e por isso também utiliza autocarro e metro. O mesmo aconteceu com o casal F. e G. na sua transição para a escola secundária. Temos ainda H., que depois do ensino secundário continuou a sua formação e passou a deslocar-se de barco e de autocarro. A partir do momento em que iniciam estudos universitários ou entram no mercado de trabalho, transitam para outro modo de transporte. Como vemos, o fator principal para se deixar de andar a pé prende-se normalmente com razões escolares ou profissionais, ou seja, com uma alteração forte no quotidiano. Por vezes, estas mudanças na trajetória estão ainda associadas a mudanças de residência.

Por seu turno, outros indivíduos continuam a andar a pé por um período mais longo na sua trajetória de vida, caso mantenham a possibilidade de fazer o seu quotidiano próximo da área de residência. No caso da B., atualmente com 45 anos, apenas há 3 anos começou a utilizar transportes públicos. Até aos 42 anos andou sempre a pé no dia-a-dia. De qualquer modo, para os nossos interlocutores, andar a pé significa conseguir organizar o quotidiano pessoal e profissional perto de casa.

A mudança para os transportes públicos surge, como referimos, quando se torna imperativo percorrer distâncias impraticáveis a pé. No início da vida adulta, o facto de não terem carta de condução, ou a ausência de meios próprios de subsistência, influencia a opção por um ou outro modo de deslocação.

Num dos agregados entrevistados residente em Odivelas, J. entrou na faculdade há 3 anos e tem de apanhar um autocarro e depois o metro para lá chegar ou para aceder a qualquer outro ponto do centro de Lisboa. Nos seus trajetos, lamenta que a oferta de acesso à capital seja sobretudo promovida por uma empresa de transportes privada e que haja apenas um autocarro da rede pública que vai até Odivelas, encarecendo o passe social. Ou seja, para chegar à primeira estação de Metro (transporte público com gestão semiprivada), tem de ir num autocarro que pertence a uma empresa privada. O irmão K., 3 anos mais novo, começou a ir para Lisboa na mesma altura, pois fez o secundário numa escola no centro da capital. Recorda assim esse momento:

 

Foi bom porque não estava sempre fechado na mesma área, podia conhecer pessoas novas. Até as visitas de estudo, íamos muitas vezes a pé da escola para os sítios onde íamos visitar (…). Quando entrou a crise, as escolas deixaram de ter dinheiro para alugar um autocarro [K., 19 anos, Odivelas].

 

Além destes casos, também as mudanças de emprego e as mudanças residenciais, associadas a períodos mais avançados na vida, implicam alterações nos modos de deslocação. B., a trabalhar no centro de Lisboa e residente em Paço de Arcos, Oeiras, apanha o comboio e também o autocarro há pouco tempo. Tem a carta, mas não conduz. Quando se divorciou ficou sem carro, e além disso ganhou medo, pois era o marido quem conduzia sempre.

Assim, temos dois tipos de situações que levam a alterações nas trajetórias de mobilidade e que representam gerações distintas: a extensão do percurso escolar ou acesso ao primeiro emprego; as mudanças de emprego.

Por último, refletimos com os nossos entrevistados sobre a utilização regular do automóvel privado, que surge nas trajetórias analisadas após a utilização regular dos transportes públicos e/ou após as deslocações a pé. O transporte privado é utilizado numa fase mais tardia das vidas. A falta de alternativas é o motivo mais indicado para a sua utilização. Nestes casos, são as mudanças de emprego para zonas com falta de transportes adequados que faz com que utilizem o carro. Como exemplo, H. (32 anos, Alcochete) utilizava transportes públicos numa fase de estudos, mas começou a trabalhar por turnos, e precisa do carro, dada a falta de horários nos transportes públicos. M. (59 anos, Alcochete), residente em Alcochete e motorista de autocarros em Alcochete e Montijo, paradoxalmente tem de utilizar o carro para se deslocar até ao local onde começa a carreira. Retrata assim a necessidade de andar de carro:

 

Amanhã de manhã vou entrar às 6h e 30 da manhã para meter a primeira carreira às 7h. Poderia ir em transporte público daqui para lá mas tinha de ir às 5h20, para apanhar o autocarro das 6h00 para depois ir a pé até lá à garagem e chegava por lá por volta das 6h25. Entro às 6h30, dava-me tempo. Só que atenção, eu tinha que abalar daqui às 5h20, significava que tinha que me levantar às 5h00 da manhã, certo?” [M., Alcochete].

 

Um exemplo da falta de alternativas é o de A. Teve um acidente de trabalho e viu-se incapacitada de se deslocar de outras formas. Por isso, precisa de um carro adaptado. “Tenho mesmo de andar de carro. De transportes não consigo entrar neles” (A., 58 anos, Odivelas).

Importa aqui referir a componente quantitativa do nosso projeto: os dados do inquérito indicam que 41,7% da população que usa carro fá-lo pela rapidez e 14,5% pelo conforto. Mas 16,4% indica não ter alternativa. De resto, outros estudos em Portugal vêm indicando o transporte individual como meio de transporte preferencial, sobretudo devido à comodidade (Nunes, 2011;Santos, 2014). O carro para os nossos interlocutores surge em última instância, ou seja, quando os transportes públicos não funcionam em quatro vertentes: i) falta de cobertura territorial; ii) poucos horários; iii) tempo de viagem elevado; iv) mobilidade pessoal condicionada. Como veremos a seguir pela análise da composição dos retratos sociológicos, as razões enunciadas para a opção do uso do transporte particular tende a incorporar alguns dos constrangimentos económico-financeiros provocados pela crise. Isto significa que no âmbito dos agregados estudados, o argumento da falta de alternativa tende a sobrepor-se às outras razões.

Em síntese, existem algumas tendências identificadas após esta análise. Por um lado, andar a pé é consequência de uma localização geográfica cercana ao percurso escolar. Por outro lado, a utilização dos transportes públicos ou o uso do carro particular traduz um passo seguinte na trajetória de vida: nuns casos, ganho de autonomia, com quotidianos que se desenvolvem para lá da área de residência; noutros, trata-se de uma opção rentável que atende às necessidades de cada um. Por sua vez, a opção pelo carro tende a corresponder à ausência de alternativas viáveis

À microescala do indivíduo e do agregado familiar, estas tendências revelam como as alterações estruturais provocadas pela generalização dos transportes motorizados na AML se foram incrustando nos quotidianos vividos pelas pessoas entrevistadas. É essa generalização – que se dá simultaneamente por via do alargamento da oferta de transportes públicos e pelo aumento ­considerável do uso de automóvel particular – que determina, em grande parte, esta regularidade na alteração dos usos de transporte vivida em cada um dos agregados estudados.

 

RETRATOS: DIFERENCIAÇÃO NAS RAZÕES E NAS ESCOLHAS DAS PRÁTICAS DE MOBILIDADE

 

Algumas entrevistas a elementos dos agregados familiares ilustram as principais linhas de força que acabámos de referir e, mais do que isso, componentes de discussão. O conjunto de agregados foi eleito de acordo com a diversidade geográfica e de trajetórias de vida apresentadas, permitindo observar mais de perto os três concelhos da Área Metropolitana de Lisboa escolhidos para compreender melhor os contornos da mobilidade quotidiana na atualidade. Assim, se na análise anterior tentámos identificar algumas tendências relativamente coincidentes, nesta parte iremos incidir sobre os aspetos de diferenciação quer nos meios e usos de transportes usados, quer nas razões explicitadas. De maneira a contextualizar estes aspetos, iremos considerar o concelho de residência como elemento de diferenciação. Procurámos ir ao encontro da vida das pessoas, ilustrando desta forma que, apesar de certas regularidades, cada agregado familiar representa um microcosmo específico onde a mobilidade se produz e se reproduz por intermédio de uma infinidade de configurações e de modalidades que se vão alterando em função das vivências e dos respetivos contextos socioespaciais.

 

ALCOCHETE

 

Apresentamos F. e G., um casal residente em Alcochete. Têm atualmente três filhos e trabalham ambos em Lisboa. Ela tem 38 e o marido tem 48 anos. Ambos defendem e utilizam os transportes públicos nos seus percursos diários. G. é consultor informático, e F. é professora numa escola secundária e artista. A rotina diária implica uma gestão conhecida pelas famílias com filhos pequenos. O dia começa cedo; depois de levar as crianças às escolas na zona de residência apanham transportes (neste caso autocarro e metro) e vão trabalhar. Ao fim do dia contam por vezes com a ajuda dos avós paternos para ir buscar as crianças às escolas e, antes de voltar a casa, “é preciso alguma coisa?” é a pergunta chave do fim da tarde ao telefone. Em geral fazem compras ­semanais em Alcochete e nas imediações, embora lamentem o fecho recente de uma mercearia e frutaria perto de casa.

Tanto ela como ele têm percursos de vida bastante plurais antes deste período familiar em Alcochete. F. viveu em Lisboa até ao fim da adolescência, e depois em Barcelona, onde andava quase sempre de bicicleta e, por vezes de metro. Ficou com o hábito e, ao voltar para Portugal, tendo ido viver para um anexo da casa dos avós no concelho de Alcochete, continuou a andar de bicicleta. Há mais de 10 anos que dá aulas em Lisboa, e precisa dos transportes públicos. Apanha diariamente o autocarro para o interface mais perto da ponte já em Lisboa (a Gare do Oriente) e dali segue de metro para o seu destino numa zona central de Lisboa. Há algum tempo que prescindiu do carro, e agora o casal apenas tem um, que ambos utilizam. Em situações de urgência com as crianças, F. sente falta de um segundo carro, mas como vive perto de uma das irmãs, se for preciso tem a quem recorrer.

G. nasceu em Angola e veio pequeno para Portugal, viver primeiro um ano na aldeia dos pais, no Alentejo, e depois para o concelho da Moita (tal como Alcochete, a sul do Tejo na Grande Lisboa). Durante a infância ia a pé para a escola. Quando da licenciatura em Lisboa experimentou um lo lang=EN-US style='mso-ansi-language:EN-US'>ngo lang=EN-US style='mso-ansi-language:EN-US'> commuting diário, de quase duas horas em cada sentido. Apanhava o comboio para o Barreiro, onde tomava o barco para Lisboa (Terreiro do Paço), ia a pé até ao Rossio (cerca de 1km), depois de metro até à Cidade Universitária, do outro lado da cidade. Mais de dez anos depois, um percurso semelhante leva metade do tempo. Este exemplo ilustra como o sistema de transportes melhorou no sentido de encurtar a duração dos percursos, sobretudo por via fluvial, cujas rotas encurtaram para metade com a aquisição dos catamarãs e a extensão das linhas do metropolitano.

Enveredou pela informática e em projetos empresariais, em vários locais da cidade de Lisboa. No total, mudou de local de trabalho sete vezes, em diversos sítios da cidade, e só sentiu necessidade de tirar a carta quando trabalhou em zonas suburbanas de concelhos vizinhos à capital (Oeiras e Loures), ou seja, quando não havia transportes eficazes e cuja relação preço/duração do percurso compensasse. Recorda o seu Citroën AX com saudades, mas é de transportes que gosta de andar. Não gosta de procurar sítio para estacionar, gosta de aproveitar o tempo para ler. Sentiu que deixou de conseguir ler quando teve de conduzir. Agora usa um telefone onde pode consultar as notícias e pesquisar informações de temas que lhe sejam interessantes, compensando, a preço reduzido, a compra de jornais. Muitas vezes, é assim que ocupa o seu tempo nos transportes.

Se no caso de F. a justificação mais importante para o uso de transportes e de bicicleta é a ecológica, no caso de G., embora isso seja importante, é ­precisamente a tranquilidade que os transportes, na sua opinião, facultam. O passe social tem um custo elevado, 94 euros mensais, e por isso nenhum dos dois aponta razões económicas para o seu uso. Reconhecem que o passe aumentou muito nos últimos anos, mas sem comparação com aquilo que representaria os gastos com dois carros. Apesar de viverem longe do centro da capital, onde trabalham, preferem o autocarro e o metro ao carro.

Apresentamos agora M. e N. (ambos com 59 anos), também residentes em Alcochete. Vieram muito jovens de Mora, no Alentejo. O marido sempre esteve ligado aos transportes desde que foi viver para Alcochete e N. começou por trabalhar na indústria das flores no Montijo, depois na indústria do bacalhau em Alcochete e, quando esta última fechou, no início dos anos 2000, passou a trabalhar nas limpezas em vários patrões. Estão ambos ligados a uma importante coletividade local, onde M. tem cargos diretivos.

A diferença relativamente ao casal anterior em termos de utilização dos transportes tem a ver com a localização dos seus empregos: não trabalham em Lisboa. M. é motorista de autocarros e a esposa trabalha nas limpezas. Fazem a sua vida no concelho e imediações. Ela não precisa do carro, mas ele sim. Apesar de pegar no autocarro no concelho do Montijo que é um concelho vizinho, não há transportes eficazes que o levem lá. O que até seria vantajoso, uma vez que, sendo motorista, usufruiria gratuitamente dos transportes da mesma empresa.

Estes dois casais residentes num concelho em franco crescimento da AML como é Alcochete, contrabalançam a ideia de que os percursos longos numa área metropolitana seriam mais facilitados através do uso do carro e que os percursos curtos poderiam ser percorridos a pé ou através do uso de transportes públicos locais. Localmente a oferta de transportes não satisfaz as necessidades dos residentes, levando-os a optar pelo transporte pessoal, salvaguardando as situações em que há consciência ecológica ou necessidade económica de utilizar a bicicleta. No caso dos percursos longos para o trabalho, os transportes públicos oferecem boas condições de acesso à capital. Mesmo com passes sociais de custo elevado, a opção pelos transportes públicos é a primeira.

Estes casos contrariam em parte a ideia vigente do transporte privado como espaço associado à liberdade individual e ao lazer (Lyons e Urry, 2005), e vai ao encontro do argumento de que as novas tecnologias e a duração média dos percursos de transportes constituem uma vantagem para os utilizadores no sentido de oferecer tempo útil (Lyons, Jain e Holley, 2007), sobretudo através da ligação a redes laborais e sociais e a interfaces noticiosos. De facto, a utilização das tecnologias contribui para uma maior aceitação de tempos elevados de transportes públicos (Schwanen, Dijst e Dielemaen, 2002). Resumidamente, em termos de mobilidade, e de acordo com os entrevistados, Alcochete ­apresenta uma efetiva falta de cobertura de transportes públicos locais, apesar de ali existirem transportes públicos eficazes (em horário laboral) para e da capital.

 

ODIVELAS

 

Para este concelho, focamos em primeiro lugar o caso de E. (filha, 35 anos) e de D. (mãe, 63 anos). A filha mora em Lisboa, mas vai muitas vezes a casa da mãe. A mãe mora em Odivelas, um município recente em termos institucionais e com uma história importante no contexto das mobilidades nos arredores de Lisboa. Está situado num vale, cujo acesso rodoviário desde a capital é a Calçada de Carriche, estrada com grande desnível conhecida pelos lisboetas por décadas de entupimento diário de trânsito automóvel. Odivelas cresceu nos anos 1970 e 1980 dependente daquele acesso altamente congestionado até ao alargamento do metropolitano com destino a Odivelas, em 2007. E. diz mesmo que “a Calçada de Carriche define a tua vida” referindo-se às longas esperas para chegar ao Campo Grande, onde se iniciava a linha de metropolitano. De resto, os agregados entrevistados residentes em Odivelas refletem a importância desta alteração. Este agregado foi aquele que sublinhou mais esta situação. “O metro melhorou muito Odivelas”, como referiu a mãe.

D. nasceu numa cidade do Algarve em 1950, e foi viver para a capital de distrito, Faro, aos 2 anos, onde andou na escola até aos 8 anos. Viveu também em Angola alguns anos e fez os estudos universitários já em Lisboa. Integrou-se em sindicatos logo depois do 25 de Abril, com um passado ativista, tal como o marido. Reformou-se há sete anos, e desde aí tem ocupado o seu tempo com voluntariado, a Universidade Sénior, um conjunto de atividades que decorrem em Odivelas e em Lisboa: “não gosto de conduzir e sempre que posso não levo o carro. Por isso vou de metro. E em Lisboa ando, mais para cima, mais para baixo, mas ando. Se houver metro, vou”, sublinhando assim a importância do metro nas suas atuais deslocações.

Durante a vida profissional, tanto ela como o marido trabalhavam em ­Lisboa: “Eu ia de transportes. O meu marido ia de carro. Foi sempre assim”. Trabalhou muitos anos perto do Campo Grande, mas suficientemente longe para ter de mudar de transporte. Demorava 50 minutos ou mais no total para fazer um percurso que, de carro e sem trânsito, tardaria 10 minutos no máximo. Trabalhou também perto de casa, a 10 minutos a pé. O carro é a sua última opção, mesmo se a crise económica atual não afetasse o orçamento.

E. segue a mãe no uso do transporte público. Viveu no concelho de ­Odivelas até há três anos, e vive agora em Lisboa. Mas a maior experiência residencial é no concelho de Odivelas, no crescimento e na idade adulta. Gosta muito do centro de Lisboa para poder estar perto dos amigos e chegar mais rápido onde quer. Iniciou a atividade profissional perto de Belém, zona turística da capital, a cerca de 15 km de Odivelas. Essa experiência profissional iniciou-se antes de o metro chegar a Odivelas, pelo que demorava quase duas horas a chegar ao local de trabalho. Tal como G., de Alcochete, nota que hoje em dia o mesmo percurso demorará metade do tempo. No início dos anos 2000, E. levava marmita para o local de trabalho e não lhe custou voltar a utilizá-la para poupar dinheiro quando a crise económica se instalou. Como ela diz, teve “sorte”, ­porque na altura em que muitos colegas ficaram sem emprego foi quando conseguiu melhor posição laboral, embora recentemente tenha passado por uma fase de desemprego.

As mudanças têm sido variadas sobretudo devido à instabilidade laboral. Além disso, também a mãe registou um corte na reforma de quase metade, tendo agora alguma dificuldade em ajudar os filhos quando estão em desequilíbrio orçamental. E. valoriza a vida em Odivelas, tal como no bairro onde mora em Lisboa, equiparando assim de certa forma um local suburbano com a capital: “aqui [n]esta casa, tu consegues ir a pé comprar pão, beber café”, acrescentando que estas pequenas coisas são essenciais para a sua qualidade de vida.

Outro caso, em Odivelas, é o da família de I. A mãe e os filhos J. e K. (54 anos, 21 e 18) vivem numa das urbanizações mais recentes de Odivelas, desde 2007. Separada nesse ano, I. ficou a viver em Odivelas com os filhos, e o pai voltou para a Damaia, no vizinho concelho de Amadora, onde antes todos viviam. A vida familiar de J. e K. concentra-se, pois, em Odivelas, mas com várias idas à Damaia, onde ambos andaram na escola, e onde mantêm amizades. De resto, o final do percurso escolar de cada um dos irmãos leva-os a Lisboa num registo diário.

Os transportes públicos estão no centro das suas preferências, uma vez que se tornaram autónomos muito cedo e os seus percursos múltiplos levaram-nos a conhecer de perto uma grande variedade de percursos na Área Metropolitana de Lisboa, já que têm de aceder não só à capital, como à Damaia. Tanto J. como K. já optaram por ir para a Damaia acedendo ao Campo Grande de autocarro ou de metro, depois de metro até um interface ferroviário, onde apanham o comboio para a Damaia. Também há um percurso com dois autocarros através dos concelhos na fronteira com a capital. De carro, o percurso entre a casa da mãe e a casa do pai, sem trânsito, faz-se em 10 minutos. De transportes, raramente leva menos de uma hora. Por isso, a mãe, que dá aulas a 8 km para sul da sua casa, opta diariamente pelo transporte pessoal, mesmo depois de ver o seu salário de professora reduzido e ter de arcar com mais despesas domésticas.

De resto, a crise económica afetou bastante esta família, levando-os a ter considerado a mudança de casa (comprada, com empréstimo ao banco); no entanto, após fazerem as contas, as desvantagens económicas da mudança pareceram-lhes maiores. Assim, optaram por outros ajustes no orçamento, como comer mais vezes em casa, gastar menos nas saídas à noite e estarem mais atentos ao mercado de trabalho em idade de completar os estudos. Neste agregado familiar, a Calçada de Carriche e a importância do metropolitano não se revelaram centrais para falar das questões de mobilidade naquele concelho, precisamente porque foram apenas residir para aquela localidade depois de o metro ter chegado a Odivelas, em 2007. Notam fragilidades nos ­transportes, sobretudo ao nível local, no acesso aos pontos de interface, como é o caso do Campo Grande, e mesmo até às estações de metro do concelho.

Tal como referido pelos entrevistados residentes em Alcochete, a oferta de transportes locais é, na sua opinião, rarefeita, e cara, com a agravante geográfica de Odivelas ser um concelho com o relevo acidentado e não plano como Alcochete, de onde a alternativa da bicicleta não surgir nos discursos. Tipicamente, a mobilidade é analisada tendo em conta o acesso à cidade central, no caso Lisboa. Mas, chegando ao concreto dos agregados e à diversidade das suas trajetórias de mobilidade, vemos como em Odivelas a circulação também se faz entre cidades mais pequenas vizinhas da capital, mas nem por isso menos habitadas e menos vivenciadas. Também o concelho de Oeiras e os agregados entrevistados nos dão pistas nesse sentido.

 

OEIRAS

 

Em Oeiras apresentamos igualmente dois casos: B. e C. A primeira interlocutora (com 45 anos) foi diretamente prejudicada pela crise económica: esteve desempregada quatro anos e só há pouco tempo recomeçou a trabalhar. Se nos primeiros empregos, sempre em supermercados, trabalhava na área de residência, deslocando-se a pé, no atual emprego, em Lisboa, tem de apanhar o comboio e depois um autocarro que a leva perto da casa da patroa onde é ama de um bebé.

A filha vai começar em breve a universidade, mas já começou a ir para Lisboa desde o início do secundário. Assim, depois de 9 anos de escolaridade onde andar a pé era a forma de chegar à escola, começou a andar de transportes no seu dia-a-dia. Mas para ambas, esta situação não representa um problema, porque os transportes são bons. Além disso, ao contrário do que acontece em Alcochete, e de certa forma em Odivelas, para os percursos dentro do concelho de Oeiras, a oferta é considerada boa. Tal como em Odivelas, há um transporte promovido pela autarquia a baixo custo, o SATU (Sistema Automático de Transporte Urbano), embora neste caso também ecológico pois funciona como um elevador (é elétrico e acionado por chamada). De resto, tanto para B. como para C., como veremos a seguir, as políticas autárquicas são em geral boas e o concelho de Oeiras tem melhorado nos últimos anos; a crise parece não ter afetado a autarquia.

Residente em Linda-a-Velha, C. (40 anos) viveu primeiro num bairro (classicamente designado de) histórico de Lisboa, tendo-se mudado para o concelho de Oeiras aos 14 anos. Quando se casou foi viver para o vizinho ­concelho de Sintra, num bairro suburbano com grande concentração residencial, mas sem transportes públicos adequados. Dali “dependíamos do carro para tudo”. Além disso, o clima cercano à Serra de Sintra fazia com que o filho mais velho, que ali cresceu até aos 4 anos, tivesse muitos problemas respiratórios. Como entretanto o filho foi para um Jardim de Infância em Oeiras, “a vida proporcionou-se em virmos para aqui”, concelho de Oeiras, zona mais solarenga e seguramente mais bem equipada ao nível dos serviços de mobilidade:

 

Há muitas diferenças. O concelho de Oeiras tem bons transportes. [Dantes] estava presa ao carro. Tinha um autocarro, é verdade, mas tinha a possibilidade financeira de andar de carro de um lado para o outro, mas [era] muito mau de transportes” [entrevista a C., Oeiras, 05-05-2014].

 

Andar de carro desde casa até ao interface ferroviário, onde apanha diariamente o comboio para o centro da capital, é para C. uma opção. Pode ir a pé ou de transportes. Já o marido de C., dependente do carro durante mais de 10 anos, utiliza agora os transportes públicos para o concelho de Sintra onde trabalha. O autocarro passa à porta de casa e deixa-o à porta do emprego. Com esta possibilidade, não foi difícil deixarem um dos dois carros que tinham quando começaram a fazer contas ao orçamento familiar no contexto da crise económico-financeira.

Os exemplos referidos nos três concelhos ilustram o facto de os transportes públicos surgirem como meio de transporte preferencial, desde que se reúnam as condições consideradas satisfatórias em termos de ligações entre meios de transporte, e a viatura própria surge como solução necessária na ausência de alternativas. Não é de descurar que a crise económica sublinhe mais fortemente esta situação. Isto é, em situação de melhoria das condições económicas, é possível que parte destes agregados optasse mais rapidamente pela utilização do carro. Além disso, o valor dos passes é elevado, levando muitos utentes a refletir seriamente antes de optar pelos transportes públicos. Há ainda um fator a sublinhar: é que, de acordo com os nossos dados, os transportes públicos na AML parecem cumprir as necessidades de deslocação de e para o centro. Ao contrário, algumas localidades estão desprovidas de transporte público local eficaz (relação qualidade/preço), como é o caso de Alcochete, e de Odivelas em menor medida.

Sublinhamos, por fim, exemplos como o de o G. (Alcochete), que só tirou a carta quando não teve outra hipótese de deslocação, ou de C. (Oeiras) e de F. (Alcochete) que, mesmo com carta, prescindiram do carro com relativa facilidade, indiciando que o argumento do carro como última hipótese a considerar, bem depois dos transportes públicos, é forte.

 

CONCLUSÃO

 

Este artigo procurou identificar mudanças verificadas nos trajetos de mobilidade num conjunto de residentes em três concelhos da AML, focando em particular a alteração dos modos de utilização dos transportes. A análise qualitativa permitiu identificar, através do cruzamento de diferentes metodologias, uma tendência na alteração dos usos e modos de transporte. Na verdade, emerge uma regularidade relativamente saliente que evolui em função de um conjunto de marcos ao longo da trajetória de vida. Andar a pé representa o meio de deslocação dominante até ao ingresso num nível de ensino superior ou até à entrada no mercado de trabalho. Alguns entrevistados mantêm este meio de deslocação nos primeiros anos de trabalho quando o emprego se situa perto do local de residência.

A mudança do andar a pé para outros meios de deslocação (públicos ou privados) deve-se a fatores que ultrapassam a capacidade de escolha numa dada fase da vida, ou seja, andar apenas a pé passa a ser inviável face às mudanças ocorridas. Por sua vez, é importante discernir as motivações, o uso de transporte público ou particular. Muitos dos entrevistados são ou foram utentes habituais de transportes públicos. Essa experiência não é representada negativamente, e em certas situações é sublinhada a melhoria que estes tiveram nos últimos anos. Aliás, alguns entrevistados destacam a qualidade dos transportes públicos e o facto de propiciarem conforto e lazer. Esta avaliação é particularmente importante, significando que há uma satisfação geral com os transportes públicos no acesso ao local de trabalho, situação que é comprovada pelos resultados do inquérito aplicado.13

De qualquer modo, no que diz respeito aos fatores de diferenciação que emergem por via dos retratos apresentados, é claro o desagrado com a oferta de transportes públicos no interior das áreas mais periféricas e menos urbanizadas, como é o caso de Alcochete, e mesmo com os transportes além do horário laboral, sobretudo para os entrevistados mais jovens. Também é sublinhada a deficiência de transportes públicos na interconexão entre municípios contíguos, na medida em que, no entender de alguns entrevistados, as redes e as linhas de transporte tendem a ser desenhadas no sentido de dar prioridade à ligação com a cidade de Lisboa, descurando-se as ligações entre municípios não centrais, independentemente da sua maior proximidade geográfica. O uso de transporte particular é, assim, preferido quando os trajetos cruzam concelhos suburbanos, uma vez que a rede de estradas suburbanas tem sido ­intensificada nas últimas décadas, ou para percorrer distâncias intraconcelhias, por vezes comprometendo o costume de andar a pé, como se verifica no caso das atuais crianças e jovens pertencentes a famílias que usam regularmente o carro e que se encarregam diretamente pela mobilidade dos seus dependentes. Só ocasionalmente é que os transportes públicos satisfazem as necessidades de quem precisa de circular dentro dos seus concelhos.

Curiosamente, as razões que são referidas para justificar o uso de transporte particular refletem a falta de alternativa como o motivo mais importante. No contexto da atual crise económico-financeira, que surge como constrangimento efetivo, este motivo parece tornar-se preponderante. Os nossos interlocutores demonstram um cuidado suplementar relativamente à opção de usar regularmente o automóvel, na medida em que pode significar um acréscimo relevante de custos. Assim, só no caso de o transporte público representar um esforço maior, quer em termos de desperdício de tempo, quer em termos de custo financeiro implicado, é que se opta pelo uso regular do carro.

Tendo em conta os nossos testemunhos, tendemos a concluir que a crise levou a que o automóvel seja encarado como uma opção a considerar apenas quando as outras se tornam inviáveis. Ou seja, a deslocação diária em transporte particular tende a ser encarada como sendo uma espécie de bem de luxo. Seria importante que em contexto de crise e face a esta razoável predisposição para um maior uso dos transportes públicos, as políticas públicas de transporte e de mobilidade incrementassem a sua utilização, através da melhoria das suas condições de acessibilidade.

 

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Recebido a 07-01-2016. Aceite para publicação a 14-02-2017.

 

NOTAS

 

1Aproximamo-nos da conceptualização de B. Lahire de retratos sociológicos (2002), embora sem pretender corresponder a todos os requisitos que tal metodologia implica (v. adiante abordagem metodológica).

2 V. a produção da revista The Journal of Transport History.

3 Estes autores desenvolvem uma abordagem do conceito de “motilidade” que explica, em suma, o potencial de mobilidade de um ator social.

4Esta tipologia foi inicialmente concebida por Sofia Santos no âmbito do seu projeto de doutoramento e posteriormente adaptada e desenvolvida pelo presente projeto de investigação (Localways – Trajetos de sustentabilidade local: mobilidade espacial, capital social e desigualdade). Utilizou-se a antiga divisão administrativa ao nível da freguesia, ainda vigente na apresentação dos dados dos Censos 2011. A tipologia foi construída a partir de variáveis sociodemográficas disponibilizadas pelos Censos 2011 aplicado pelo Instituto Nacional de Estatística. Para mais pormenores v. Santos (2014).

5Sub/urbano massificado é composto por 78 freguesias urbanas e suburbanas (correspondente a 58% da população da AML) que apesar de se relacionarem negativamente com a qualificação também se definem por uma associação negativa ao despovoamento e desqualificação.

6Urbano qualificado é composto por 48 freguesias urbanas (28% da população residente na AML) associadas positivamente à qualificação e negativamente ao despovoamento e desqualificação.

7 Rural, suburbano recente ou desqualificado (59 freguesias onde residem apenas 11% da população da AML), define-se por um povoamento muito mais escasso que os outros grupos, e desqualificação da população e das habitações. Apresenta também uma relação negativa com o envelhecimento e consolidação urbanos e um comportamento mais neutro com a renovação, sugerindo alguma dinâmica.

8 Urbano antigo e em renovação, corresponde a 26 freguesias urbanas antigas e apresenta a maior transformação: sendo definido pela associação ao envelhecimento e consolidação urbana é também um território, ainda que desqualificado, em renovação.

9Efetuou-se um levantamento das políticas encontradas nas fontes oficiais de informação de cada município.

10  Ratificado pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 54/94, de 14 de julho.

11 De acordo com o Estudo de Mobilidade e Acessibilidade no concelho de Oeiras, 2008.

12 Este e os demais interlocutores são identificados no nosso artigo através de uma inicial que não corresponde ao nome da pessoa em causa. Apesar de a maior parte dos nossos entrevistados terem concordado com a exposição dos resultados sem necessidade de anonimato, o facto de nem todos o terem referido claramente levou-nos a homogeneizar o procedimento ético.

13 Segundo o inquérito aplicado (Localways, 2014) 35,5% da população residente na AML faz uma avaliação positiva dos transportes públicos e 35,7% faz uma avaliação razoável.

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