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Análise Social

versão impressa ISSN 0003-2573

Anál. Social  n.192 Lisboa set. 2009

 

Henry Burnay no contexto das fortunas da Lisboa oitocentista**

Nuno Miguel Lima*

 

O estudo da fortuna e do património de Henry Burnay, a partir do seu inventário post mortem, pretende debater a definição de tipologias nas grandes fortunas de Lisboa da segunda metade de Oitocentos, com especial ênfase para a relação entre negócios do Estado e iniciativa privada e para a diferenciação patrimonial face às distintas estratégias de investimento. A análise do trajecto empresarial deste capitalista e da sua assinalável fortuna, na qual a firma Henry Burnay & C.ª é fundamental, conduzirá à comparação com perfis marcados pela participação nas oportunidades garantidas pelo Estado liberal e pela actividade comercial.

Palavras-chave: Henry Burnay; Lisboa; fortunas; inventários post mortem; século xix.

 

Henry Burnay in the context of Lisbon's nineteenth century fortunes

The study of Henry Burnay's fortune and patrimony, after his post mortem inventory, intends to address the definition of typologies at Lisbon's highest fortunes during the second half of the nineteenth century, with special attention to the relationship between the state's businesses and private initiative and to the patrimonial differentiation set by the distinct investment strategies. The analysis of Henry Burnay's business life and remarkable fortune, on which Henry Burnay & Co. is founded, leads us into the comparison with profiles derived from participation in the opportunities guaranteed by the liberal state and by the commercial activity.

Keywords: Henry Burnay; Lisbon; fortunes; post mortem inventories; 19th century.

 

Introdução

Ainda que falecido no final da primeira década do século xx, Henry Burnay (1838-1909) é uma personagem incontornável no que respeita a diversas facetas do Oitocentos português. O estudo sobre a dimensão da fortuna e a composição do património deste capitalista, feito a partir do seu inventário post mortem, representa apenas uma perspectiva parcelar sobre a sua vida.

Na verdade, o recurso a este tipo de documentação, uma vez que se circunscreve a um momento específico da vida do indivíduo (a data do seu falecimento), não nos relata a história da acumulação da fortuna arrolada. Não obstante, a riqueza do conteúdo processual destes inventários tem permitido um leque alargado de abordagens1.

Na historiografia portuguesa, nomeadamente a que percorre o final do Antigo Regime e o liberalismo, há a considerar apenas um trabalho centrado exclusivamente nos inventários (Madureira, 1989). Nos demais poder-se-ão diferenciar, desde logo, duas vertentes de utilização desta documentação: nas monografias, por um lado, e nas biografias, por outro. As primeiras têm-se enquadrado entre estudos de elites e estudos dos universos populacionais locais, servindo os inventários, no primeiro caso, como elemento caracterizador da preeminência económica e social destes grupos (Almeida, 1997; Cruz, 1999; Fonseca, 1996; Pedreira, 1995; Sousa, 1998) e, no segundo, como instrumentos para a avaliação da distribuição dos principais recursos locais, nomeadamente o acesso à propriedade fundiária (Rocha, 1994). Em ambos os casos, a análise tem-se centrado nos níveis de riqueza, nas estruturas patrimoniais e nas tendências da cultura material. Ainda entre os estudos monográficos poderemos identificar aqueles que, a jusante do próprio processo, abordam as práticas sucessórias (Brandão, 1994).

Já entre os estudos de cariz biográfico, os inventários constituem elementos-chave para avaliar o processo de acumulação de fortuna e as estratégias para tal adoptadas. Aqui os inventários têm servido claramente como fonte complementar à documentação da gestão quotidiana, nomeadamente de casas agrícolas (Fonseca, 1984; Martins, 1992), comerciais (Dias, 1999), financeiras (Damas, 2002; Fonseca e Reis, 1987; Sardica, 2005) ou industriais (Faria, 2004).

O presente trabalho procura conciliar duas escalas de análise: num primeiro momento introduz o debate sobre a configuração patrimonial de algumas das grandes fortunas lisboetas da monarquia constitucional; noutro, e a partir do inventário post mortem de Henry Burnay, intenta identificar a estratégia desta personagem e enquadrá-la entre as distintas configurações apontadas. No entanto, devemos afirmar de antemão que este trabalho não pretende advogar verdades insofismáveis sobre a constituição das grandes fortunas na Lisboa do liberalismo (até porque o nosso universo analítico é limitado) nem assumir-se como uma muito necessária biografia de Henry Burnay.

Este texto tem, então, como objectivo analisar fortunas e patrimónios, perspectivando-os para lá da dimensão localista das monografias, aqui largamente suplantada pela grande projecção de certas figuras da capital, entre as quais se contava a de Henry Burnay. Assim, fará todo o sentido identificar nesses indivíduos as estratégias e oportunidades de enriquecimento no Portugal oitocentista, nomeadamente as que se desenvolveram sob o patrocínio do Estado liberal, e diferenciar os perfis patrimoniais das fortunas que tais estratégias e oportunidades geraram.

Desta forma, e dando seguimento à destrinça monografia/biografia, parece-nos acertado começar por caracterizar fortunas e patrimónios entre o universo dos maiores contribuintes de Lisboa da segunda metade de Oitocentos, do qual Henry Burnay fez parte. A esta caracterização seguir-se-á idêntica tarefa para o caso de Burnay, momento em que procuraremos enquadrar o seu património nas actividades de negócio em que se envolveu ao longo da vida, analisar as manifestações de cariz simbólico através dos seus interesses artísticos e literários e qualificar a sua fortuna face à de outros magnatas, não só lisboetas, como também nacionais e internacionais2.

Estaremos, então, em condições de discutir a identificação de perfis de fortuna, assente no princípio de que as composições patrimoniais das grandes fortunas lisboetas de Oitocentos são influenciadas, por um lado, pelas diferentes modalidades/estratégias/oportunidades de investimento (com repercussão sobre a estrutura do património) e, por outro, pela forma de obtenção da fortuna (reflectindo-se no consumo de bens de valor predominantemente simbólico). Em face destes perfis, procuraremos, finalmente, destacar o contributo do percurso de Henry Burnay, comparando-o com os perfis traçados, e questionar a pertinência do estabelecimento das tipificações patrimoniais plasmadas neste texto, elaboradas a partir de inventários post mortem.

 

Património e fortuna dos maiores contribuintes de Lisboa

Ao estudar recentemente os maiores contribuintes de Lisboa na segunda metade de Oitocentos (Lima, 2007), num universo de 522 indivíduos, procedemos à identificação de 66 inventários post mortem a partir do fundo cível antigo do Tribunal da Boa Hora3, distribuídos cronologicamente entre 1869 (inventário do 1.º conde do Farrobo) e 1937 (inventário de Manuel José Monteiro)4. Um intervalo temporal tão alargado impedia a identificação das condições económicas e patrimoniais que asseguravam a inclusão nos maiores contribuintes, restringindo-se, então, a selecção a inventários realizados em anos próximos àqueles em que os inventariados haviam integrado os maiores contribuintes, num intervalo máximo de dez anos. Em consequência desta triagem e da impossibilidade de consulta de alguns processos pelo seu mau estado de conservação, o universo de análise ficou restringido a 34 inventários post mortem. A recente revisão desse trabalho e a gentileza do Prof. Doutor Jaime Reis, ao partilhar dados por si trabalhados no âmbito da história do Banco de Portugal, contribuíram para a incorporação de mais três inventários.

Apesar da limitação imposta pelo critério de selecção dos inventários, os 37 processos distribuem-se por um período de cerca de 33 anos, delimitados pelo já mencionado inventário do 1.º conde do Farrobo (1869) e pelo inventário de Manuel Machado Franco (1902). Devido às flutuações de preços que ocorreram durante estes anos, e para permitir a avaliação comparativa das fortunas, foi necessário recorrer a um índice geral de preços, tomando como referência o "índice geral de preços por grosso em Portugal, 1810-1912", construído por David Justino (1989, vol. 2, pp. 14-16), adoptando-se o ano de 1869, ano do primeiro inventário, como "base 100". Deste exercício resultou o anexo n.º 1, contendo o "mapa geral de bens dos inventários (valores de 1869)".

A significativa confluência da composição dos patrimónios é uma das principais notas de referência da análise conjunta dos inventários. O padrão geral identificou indivíduos para quem o imobiliário urbano localizado em Lisboa, independentemente do seu valor, era uma componente de extrema relevância. A concentração do património imobiliário na área de residência enquadra-se numa tendência já detectada entre os negociantes de Lisboa do final do Antigo Regime (Pedreira, 1995), entre a burguesia portuense oitocentista (Cruz, 1999) e entre a elite económica eborense (Fonseca, 1996). Face à preponderância dos bens de raiz urbanos na generalidade dos maiores contribuintes, as restantes categorias patrimoniais revelaram-se periféricas.

O conforto em que vivia a maioria dos inventariados, ou mesmo o luxo que rodeava alguns, consumia muito pouco dos seus capitais, como se percebe pela limitada relevância do recheio da casa no universo dos patrimónios. Esta categoria reflecte a importância dos bens urbanos, pois estava representada predominantemente pelo mobiliário das residências, e permite determinar o tipo de utilização a que estavam consagrados os bens rústicos e mistos. Os primeiros obedeceriam a uma estratégia de obtenção de receitas através do provável arrendamento das terras, com o pagamento das rendas a ser feito, possivelmente, em metal, dada a escassez de alfaias e géneros agrícolas. Quanto aos segundos, a sua localização nos limites da cidade de Lisboa e concelhos limítrofes indica que eles serviriam um desígnio menos produtivo do que representativo de afirmação social.

Os papéis de crédito e acções estavam representados principalmente por títulos do Estado, com destaque para as inscrições da Junta do Crédito Público. Estes eram secundados pelas acções de companhias, entre as quais pontificavam as sociedades transportadoras e seguradoras, as empresas de mineração e as lisboetas Companhias das Águas e de Iluminação a Gás. Da capital eram também as instituições bancárias que recebiam os investimentos dos maiores contribuintes, os quais colocavam também aí a maior parte do dinheiro que possuíam, deixando na sua posse apenas valores menores.

Finalmente, as dívidas activas e o passivo revelavam uma grande similitude. Nestas categorias, em especial na última, destacava-se a presença de particulares, sobretudo familiares dos maiores contribuintes, sendo as viúvas as mais representadas.

A segunda nota relevante do exame destes inventários diz respeito à coabitação de indivíduos de estatuto económico bastante diversificado no seio dos maiores contribuintes de Lisboa. Uma desigualdade que não só hierarquiza o grupo, como também o fracciona no padrão geral da composição patrimonial, destacando um pequeno núcleo de indivíduos com uma posição económica de maior relevo. Na verdade, o cruzamento entre a fortuna e o património demonstrou que os activos patrimoniais mais valiosos pertenciam àqueles que faziam das aplicações financeiras as suas principais formas de investimento. Assim, com excepção do 1.º conde do Farrobo, os sete activos de montante mais elevado, isto é, os únicos que ultrapassavam os 400 contos, não tinham no imobiliário a principal categoria patrimonial dos seus activos. Esta tendência é também coincidente com a realidade portuense (Cruz, 1999, p. 333)5. No mesmo sentido, em Paris, se no princípio do século xix eram os proprietários que detinham as maiores fortunas, progressivamente, essa posição foi tomada pelos homens de negócio ligados às actividades comerciais, industriais e financeiras (Daumard, 1973, p. 158).

O património do 1.º conde do Farrobo assentava largamente nos bens de raiz, o que é justificado, primeiro, pelo peso da instituição vincular de que foi titular até 1863, o morgado do Farrobo, e depois pelo seu investimento industrial na mina de carvão de pedra de São Pedro da Cova, em Gondomar. José Maria Camilo de Mendonça tinha 43,43% do activo em dinheiro. Nos restantes contribuintes em análise, José Pereira Soares, o 2.º visconde de Valmor, Gaspar José Viana, Sebastião José de Freitas e João Rodrigues Cardoso, a categoria mais importante era a dos"papéis de crédito e acções".

Para esta relação entre fortuna e património também parecia influir a actividade profissional que exerciam, perspectiva esta muito notada entre os negociantes, sobretudo os que tinham capitais mais volumosos. Destacavam-se categorias patrimoniais como os "papéis de crédito e acções", como se verifica pelos casos de José Pereira Soares, João Rodrigues Cardoso e Joaquim António de Moura, o "dinheiro", parcela mais importante do património de José Maria Camilo de Mendonça, ou as "dívidas activas". Esta última categoria patrimonial tinha, aliás, uma forte ligação aos negociantes. Entre os que maiores importâncias registavam nas "dívidas activas" encontravam-se José Ferreira Pinto Basto, José Pereira Soares, José Maria Camilo de Mendonça, João Rodrigues Cardoso e António Teodoro de Barros. E, com excepção do segundo, eram as relações comerciais que caracterizavam as parcelas desta categoria6. Outra classe profissional que evidenciava essa relação entre ofício e património era a dos industriais, nomeadamente António da Costa Lamego e José Caetano de Almeida Navarro. Sendo certo que não dispunham de grandes fortunas e que estas se compunham principalmente pelo imobiliário urbano, é de notar que as suas fábricas, os utensílios das mesmas, e até mesmo as dívidas activas que tinham, reflectiam as suas actividades, atingindo proporções de considerável valor nos seus activos. Exemplo que poderá ser estendido ao 1.º conde do Farrobo, embora este não possa ser considerado um industrial. Não era, porém, de desprezar a influência que a mina de São Pedro da Cova tinha no seu activo patrimonial.

Finalmente, outro aspecto importante para a caracterização dos níveis de riqueza destes indivíduos relacionava-se com o estrangeiro. É sintomático que entre as seis maiores fortunas inventariadas se encontrassem dois negociantes brasileiros, um diplomata e um negociante de longo curso. João Rodrigues Cardoso e José Pereira Soares tinham o seu património influenciado pelas suas passagens pelo Brasil. O 2.º visconde de Valmor fazia notar através dos diversos títulos e acções estrangeiras a sua longa carreira diplomática. José Maria Camilo de Mendonça alargava a sua actividade a mercados tão distantes como Hong-Kong. Mesmo Sebastião José de Freitas, que não tinha qualquer histórico pessoal fora de Portugal, tinha cerca de um terço do capital de papéis de crédito e acções empregue em títulos de empréstimos brasileiros, espanhóis, belgas, holandeses e russos. Só em relação a Gaspar José Viana não foi possível identificar o seu percurso biográfico, embora não conste do seu património qualquer referência ao estrangeiro.

 

Património e fortuna de Henry Burnay

Escassos dias após o falecimento de Henry Burnay, ocorrido a 29 de Março de 1909, teve início o processo de inventário dos seus bens, cuja realização foi motivada pela imposição de interdição por prodigalidade a um dos seus nove filhos, Jorge Burnay, decretada desde Março de 1907. Este factor, se foi determinante na obrigatoriedade de realização do inventário, foi também preponderante no seu prolongado curso, que só terminou em finais da década de 30.

Mapa de bens de Henry Burnay

[quadro n.º 1]

Fonte: ADL, "fundo cível antigo do Tribunal da Boa Hora", 6.ª vara, 3.ª secção, cx. 525-533.

 

A participação de Henry Burnay no capital social da firma Henry Burnay & C.ª marca, sem dúvida alguma, o padrão patrimonial e o volume da fortuna. No inventário foi considerado o balanço da firma fechado a 30 de Junho de 1909 (v. quadro n.º 2), no qual as parcelas de Henry Burnay surgem já referidas como pertencentes aos herdeiros do conde de Burnay.

 

Balanço da firma Henry Burnay & C.ª

[quadro n.º 2]

Fonte: ADL, "fundo cível antigo do Tribunal da Boa Hora", 6.ª vara, 3.ª secção, cx. 526, fls. 951 v.º a 953.

 

Constituída em 1875, a casa Henry Burnay & C.ª traduzia o desenlace lógico de uma visão empresarialista que não descurava qualquer boa oportunidade de negócio. A partir dela, Henry Burnay, que progressivamente reforçou a sua posição no capital social da firma, tornou-se uma figura sempre presente nos empreendimentos económicos e financeiros nacionais desde o último quartel do século xix até 1909.

No momento do balanço acima exposto, o valor pertencente à herança na casa comercial, entre a quota de 65% do capital social da firma ("papéis de crédito e acções") e o saldo da conta individual ("dinheiro"), era de 1 496 229$071 réis, representando 58,03% do activo patrimonial de Henry Burnay. À herança não era arrolado o valor proporcional da conta de reserva (1 306 447$588 réis), montante apenas considerado se então se procedesse à liquidação da firma, o que não era o caso. A categoria dos "papéis de crédito e acções" completava-se com uma carteira de cerca de 50 contos, assente maioritariamente em títulos de fundador da Companhia de Tabacos de Portugal.

Mas qual era e como se distribuía o activo da Henry Burnay & C.ª a 30 de Junho de 1909? Sob a genérica designação de "negócios e participações financeiras", principal parcela então identificada, estariam algumas das múltiplas áreas de actividade nas quais Burnay se envolveu e que espelham a sua orientação estratégica7. Embora o balanço não detalhe as actividades em causa no ano de 1909, é sobejamente conhecido o histórico das intervenções empresariais da Henry Burnay & C.ª, ou melhor dizendo, de Henry Burnay, em áreas como a metalurgia, os lanifícios, o papel, os vidros, o sabão, o imobiliário, os caminhos de ferro, a navegação, a mineração, os tabacos, a hotelaria, o mercado colonial, as exportações ou o periodismo.

Cerca de uma década depois do falecimento de Burnay, Vieira da Rocha realçava a capacidade da Henry Burnay & C.ª "comme créatrice de richesse et comme organisatrice de travail" (1921, p. 121), listando o extenso rol de empresas por ela criadas ou desenvolvidas e traçando o panorama das actividades que então desenvolvia. Um panorama que se enquadrava num processo de reorganização motivado pela primeira guerra mundial e que levou à criação de secções dentro da firma, reflectindo as suas diferentes áreas de actividade (Rocha, 1921, pp.119-134). De entre estas dedicou ainda particular atenção aos transportes marítimos e à actividade mineira, aliás explicitamente registada no balanço de 1909 ("negócios mineiros").

Em muitas destas áreas, a intervenção de Burnay foi tudo menos pacífica. A demonstrá-lo estão actuações como a desenvolvida no sector vidreiro, no qual procurou com perseverança alcançar uma posição monopolista (Barosa, 1996; Mendes, 2003), nos caminhos-de-ferro, em particular no negócio da ligação da linha do Douro a Salamanca (Sousa, 1978; Mata, 2005), ou nos tabacos, em que logrou a restituição do monopólio no sector (Mónica, 1992; Mata, 2005). Estes dois últimos exemplos permitem mesmo identificar a política como outra área de intervenção empresarial. Na verdade, o restabelecimento do monopólio do tabaco em 1891 é não mais do que um negócio político em que um conjunto de casas, entre elas a Henry Burnay & C.ª, acordou com o governo a permuta do monopólio por um empréstimo de 36 mil contos (Mónica, 1992, p. 473; Mata, 2005, pp. 10-11). Burnay tornou-se, então, parceiro indispensável do Estado português, capaz de influenciar qualquer decisão governamental, estabelecendo-se uma relação incestuosa de permanente negociação e cooperação (Mata, 2005, p. 13).

Se o capital social da firma e o saldo da conta individual eram já suficientemente reveladores da importância da casa comercial no activo de Henry Burnay, o património imobiliário não deixa quaisquer dúvidas sobre a estreita relação entre a empresa e o seu sócio maioritário. Na verdade, era à Henry Burnay & C.ª que competia a administração dos imóveis dos sócios da firma, estando os de Henry Burnay avaliados em cerca de 675 contos. Ou seja, na Henry Burnay & C.ª circulavam quase 85% do património do inventariado.

O imobiliário de Henry Burnay caracterizava-se pela elevada importância assumida pelos bens urbanos e pela sua significativa concentração patrimonial no concelho de Lisboa (c. 98% da avaliação dos bens de raiz), com especial incidência para a Rua da Junqueira, e tomando como pólo central o palácio onde residia a família Burnay. Além de vários outros prédios em Lisboa, Burnay não dispensava a fruição lúdica de outros espaços, sendo proprietário da famosa quinta das Laranjeiras e de uma casa apalaçada na praia da Granja, concelho de Gaia, onde a família veraneava, e que era frequentada pela família real (Mónica, 2003, p. 26). Ainda entre os seus imóveis contavam-se o Asilo de Santo António, albergue de famílias pobres localizado na mesma rua onde residia, e umas casas no concelho de Ferreira do Zêzere que serviam de escola do sexo feminino e que denotam o seu papel enquanto benfeitor. Note-se que esta utilização das casas de Ferreira do Zêzere terá sido, porventura, uma contrapartida pela sua eleição para deputado pelo círculo de Tomar em 1892, à semelhança do que sucedeu com a edificação da igreja de Águas Belas, no mesmo concelho (Vairo, 2003a, p. 34).

A ornamentação do imobiliário pertencente a Henry Burnay fazia jus à sua posição social, apesar de ter uma expressão relativamente modesta no conjunto da sua fortuna. Quase 90% do recheio da casa estava localizado na Junqueira, ultrapassando os 92 contos, montante que por si só patenteia a excelência do ambiente que rodeava o dia a dia da família Burnay. O remanescente dispersava-se pelas Laranjeiras, pela praia da Granja e pelo Asilo de Santo António.

Sem sombra de dúvida que os elementos mais distintivos desta sumptuosidade eram as colecções de quadros e de jóias, ambas consideravelmente valiosas. A sua importante colecção de pintura estava avaliada em 14 contos, valor amplamente superior a colecções como a do 1.º conde do Farrobo (c. 2,5 contos) ou a do 2.º visconde de Valmor (3639$000 réis). Já a colecção de jóias suplantava os 25 contos e incluía, para além de peças especialmente valiosas, as condecorações de cavaleiro da Ordem de Cristo, de comendador da Ordem de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa e a grã-cruz da Ordem de S. Gregório Magno, atribuída pelo papa Leão XIII.

Em sentido inverso, a biblioteca de Henry Burnay pouco se adequava ao seu estatuto social, valendo o total dos 940 volumes presentes pouco mais que 300$000 réis. Esta biblioteca era relativamente modesta, se comparada com outras importantes bibliotecas particulares da segunda metade de Oitocentos. O 1.º conde do Farrobo tinha mais de 3000 exemplares (c. 900$000 réis). A biblioteca de José Maria Eugénio de Almeida contava, em 1872, com 2031 volumes (Sardica, 2005, pp. 268-271). A do 1.º visconde de Benagazil, organizada e inventariada por idioma, integrava mais de 4000 unidades (1231$700 réis). E, finalmente, a do 2.º visconde de Valmor cifrava-se em 7719$000 réis, dela fazendo parte cerca de 4900 volumes, 1902 folhetos, centena e meia de opúsculos, oitenta fascículos e ainda diversos pacotes, contendo cartas geográficas, estampas, retratos e gravuras.

A derradeira parcela do activo patrimonial de Henry Burnay, as dívidas activas, tinha nos filhos e na viúva o principal núcleo de devedores (c. 90 contos). Um segundo núcleo era composto por sociedades, à cabeça das quais a própria Henry Burnay & C.ª O terceiro e último núcleo integrava alguns devedores a título individual, sugerindo a prática de concessão de créditos particulares. Entre estes destacam-se, tanto pelos montantes envolvidos como pelas personalidades em presença, os 20 contos que devia D. Maria Pia de Sabóia e os 9938$510 réis devidos pela condessa de Edla.

O parco passivo arrolado determinava, então, que a fortuna de Henry Burnay ascendia a 2 559 303$244 réis. Entre as fortunas do século xix e primeiras décadas do século xx inventariadas e estudadas até ao momento não se conhecem valores iguais nem tão-pouco aproximados. A fortuna que mais se assemelha à de Henry Burnay é já posterior à morte deste e pertencia a Inácia Ramalho, viúva de José Maria Ramalho Dinis Perdigão (falecido em 1884) e do conselheiro Dr. Francisco Barahona (falecido em 1905), avaliada em 1 827 593$100 réis no ano de 1918 (Fonseca, 1996, p. 489).

Ao longo do século xix podemos destacar algumas fortunas avultadas, como a de José Maria Eugénio de Almeida (Sardica, 2005), a da casa São Romão/José Maria dos Santos (Martins, 1992) e as presentes no anexo n.º 1, nomeadamente a do 1.º conde do Farrobo, a do 2.º visconde de Valmor e a de José Pereira Soares.

Reduzindo os dois primeiros casos a preços de 1869, tal como o processado para os maiores contribuintes na secção anterior, podemos observar a diferença entre a fortuna de Henry Burnay e a dos restantes. Em 1872, José Maria Eugénio de Almeida teria uma fortuna a rondar os 1677 contos. Por morte de Maria Cândida, em 1878, a fortuna da casa São Romão/José Maria dos Santos estaria próxima dos 590 contos. Da fortuna do 1.º conde do Farrobo muito se diria, ou não tivesse ele, à conta da sentença decretada pelos tribunais relativa à sublocação do contrato do tabaco nas décadas de 1830 e 1840, um apuramento líquido deficitário de quase 1300 contos, de pouco lhe valendo os mais de 500 contos de património. A fortuna do 2.º visconde de Valmor situar-se-ia próximo dos 1450 contos e a de José Pereira Soares ficaria muito próximo dos 1700 contos. Quanto a Henry Burnay, somaria, a preços de 1869, a impressionante fortuna de cerca de 3100 contos, muito superior às fortunas de qualquer dos outros.

Se em Portugal Henry Burnay parecia não encontrar fortunas ao nível da sua, fora do país a sua posição, não sendo tão proeminente, era, ainda assim, honrosa. Em Paris, onde Burnay tinha ligações importantes e onde se deslocava frequentemente, a fortuna mais importante registada em 1911, única acima dos 50 milhões de francos, pertencia a um banqueiro e ascendia a 89 milhões de francos. Ao câmbio da época, a fortuna de Burnay valeria perto de 13 milhões de francos. De acordo com Adeline Daumard (1973), contar-se-iam em Paris nove indivíduos com fortunas entre os 10 e os 50 milhões de francos. Burnay incluir-se-ia, portanto, neste grupo e gozaria em Paris de um estatuto no limiar das dez principais fortunas da época.

Por sua vez, na Grã-Bretanha tinha uma posição mais modesta. O câmbio em vigor situava a fortuna de Burnay próxima das 500 000 libras. Bastará analisar a listagem elaborada por William Rubinstein (1987, pp. 30-32), relativa às fortunas superiores a 2 milhões de libras registadas entre 1909 e 1914 (num total de quarenta), para perceber o patamar em que se encontrava Burnay face à realidade britânica. Porém, entre os seus congéneres banqueiros de Londres, Henry Burnay poderia figurar, certamente, entre as 70 a 100 maiores fortunas, de acordo com os cálculos apresentados por Youssef Cassis (1994, p. 198).

Mas, se do ponto de vista da dimensão da fortuna a comparação com a França e com a Grã-Bretanha não é favorável a Burnay, no que se refere à composição patrimonial é possível registar uma maior confluência com as práticas dominantes, nomeadamente em França. Na verdade, a significativa importância da sua participação no capital social da Henry Burnay & C.ª destaca os capitais móveis em detrimento do imobiliário. Uma situação bem visível em França desde meados do século xix. No inquérito às fortunas dirigido por Adeline Daumard (1973), apenas em Toulouse o imobiliário se manteve como investimento patrimonial preferencial. Nas restantes cidades, nos primeiros anos do século xx, os imóveis já não representavam mais de 31% dos patrimónios.

Contudo, é interessante observar que esta composição patrimonial de Burnay estava em clara oposição com a tendência detectada em Portugal. Aqui, no final do século xix, o imobiliário impunha-se de forma crescente como principal opção patrimonial. No Porto, a partir de meados da década de 70 do século xix, a burguesia operou um "desvio para o investimento imobiliário dos capitais disponíveis face à crise financeira que então se vivia" (Cruz, 1999, p. 329). Em Évora, a evolução patrimonial destacou, igualmente, "o aumento acentuado da componente imobiliária" (Fonseca, 1996, p. 230), que rondava, nas últimas três décadas do século xix, os 80%. E entre os maiores contribuintes de Lisboa nas duas últimas décadas do século xix os imóveisrepresentavam, em média, 71% do seu património. Assim, importa enquadrar a fortuna e o património de Henry Burnay em função da tipificação de alguns dos principais perfis de fortuna existentes na Lisboa oitocentista para perceber a razão das particularidades evidenciadas.

 

Perfis de fortuna na Lisboa Oitocentista

De acordo com a observação e caracterização dos maiores contribuintes lisboetas, é nosso entendimento que a definição de tais perfis resulta de diferentes estratégias, as quais são influenciadas pelas oportunidades que, num certo momento, se perspectivam para a constituição de uma grande fortuna. Muitos desses indivíduos alcançaram posições económicas de grande relevo explorando iniciativas/concessões do Estado, seja ele o do Antigo Regime ou o da monarquia constitucional. O que não significa que não tenha havido espaço para a iniciativa privada, nomeadamente nos casos das fortunas solidamente ancoradas na actividade comercial.

Portanto, a capacidade de enriquecimento repartia-se, em boa parte, entre a participação nos negócios públicos e a actividade comercial. Estas duas vertentes não eram incompatíveis, antes se conjugavam com frequência.

Destacaremos quatro grupos integrados nos maiores contribuintes de Lisboa. Três deles tiveram uma ligação muito próxima com as oportunidades proporcionadas pelo Estado: a aristocracia titulada antes da revolução liberal de 1820, os descendentes dos homens de negócio do final do Antigo Regime e a "clientela farta" do regime liberal. O quarto grupo é representado pelos elementos do corpo de comércio dedicados à sua actividade comercial.

Conforme poderemos testemunhar de seguida, estes grupos não só se diferenciam pelas oportunidades de negócio a que estão ligados, como também são distintas as estruturas patrimoniais que apresentam na segunda metade de Oitocentos. Além disso, parece-nos evidente uma diferente atitude face ao consumo de bens de valor predominantemente simbólico.

De acordo com Nuno Gonçalo Monteiro, as casas dos "grandes" do reino tiveram origem na doação de senhorios por parte da dinastia de Avis e em vínculos fundados nos séculos xvi e xvii, a que se seguiram "as doações régias, sobretudo em comendas", cada vez mais numerosas. No século xviii os rendimentos dos "grandes" do reino dependiam maioritariamente dos bens da Coroa e ordens, sendo o restante proveniente de bens patrimoniais, em particular dos rendimentos dos prédios rústicos. Segundo o mesmo autor, "este modelo `ultra-rentista' da estrutura e da administração dos patrimónios conduziu a uma dificuldade generalizada dos rendimentos reais das casas acompanharem a subida dos preços, quando estes dispararam nos anos 80 de Setecentos" (Monteiro, 2003, p. 496). O endividamento crescente colocou muitas destas casas em graves dificuldades, firmando a ideia da generalização deste fenómeno entre a alta aristocracia no final do Antigo Regime.

Num dos poucos estudos sobre as condições económicas da antiga aristocracia no período liberal, Pedro Urbano (2008) mostrou como a casa de Palmela enfrentava dificuldades financeiras nos primeiros anos da década de 1830. Para enfrentarem a sua débil situação económica, os Palmela adoptaram uma estratégia que passou, primeiro, pela celebração de um acordo matrimonial com uma casa em condições económicas bem mais favoráveis e, depois, pela abertura ao investimento noutras áreas, apesar de a componente predial se manter predominante. Assim, o 1.º duque de Palmela ajustou com o 1.º conde da Póvoa o casamento do seu filho, sucessor no título, com a filha do segundo, que após o falecimento do irmão veio a herdar a casa da Póvoa. Esta aliança garantiu à casa Palmela um importante afluxo de capital, proporcionando a sua sustentação. Em 1854 as duas casas juntas apresentavam um rendimento anual de cerca de 48 contos, 38 dos quais provenientes da casa da Póvoa. As propriedades eram responsáveis por 62% dos rendimentos conjuntos das duas casas, cabendo às acções os restantes 38%. A casa Palmela evidenciava-se pela aposta em diversos sectores: "transportes, seguros, exploração mineira e indústria, sendo superior o investimento no sector dos transportes" (Urbano, 2008, p. 96). Ou seja, sectores muito em voga nas carteiras de acções da época.

A casa adaptou-se convenientemente à mudança de regime, reorientando a sua gestão patrimonial. De tal forma a adaptação foi bem sucedida que, quando, em 27 de Julho de 1859, a filha segunda dos 2.os duques de Palmela efectuou a escritura de renúncia às legítimas materna e paterna em favor da irmã, foi estabelecida uma indemnização de 400 contos. Este valor constituiria, na melhor das hipóteses, metade da avaliação do património dos 2.os duques, pois não é de crer que a sucessora, a primogénita, fosse prejudicada. O património seria superior a 800 contos, atendendo ainda ao valor dos bens vinculados da casa Palmela, aquando da extinção dos morgados: apenas estes valiam quase 835 contos. Um montante a que acresceriam, pelo menos, os bens vinculados provenientes da casa da Póvoa.

A dimensão de tal património colocava-o entre os mais avultados de todo este período. A oportuna estratégia utilizada pelo 1.º duque de Palmela garantiu a sustentação que os encargos excessivos ameaçavam. Já na segunda metade do século xix, a renúncia da segunda filha e a indemnização que lhe coube permitiram suster a ameaça de desagregação que pendia sobre o património da casa com o fim da instituição vincular.

É certo que a casa de Palmela esteve do lado vencedor da guerra civil. A situação económica e as estratégias adoptadas pela facção afecta a D. Miguel durante o regime liberal são matérias pouco estudadas na historiografia nacional. Atendendo a alguns percursos, poderemos avançar a hipótese de que as suas condições económicas dependeriam da adaptação à realidade dos investimentos da época, à imagem do que pudemos constatar em relação à casa Palmela, embora não esclareçam sobre a importância que poderiam ter nos seus patrimónios.

O segundo grupo integra os descendentes dos homens de negócio estudados por Jorge Pedreira, entre os quais se destacam algumas famílias: Sobral, Braamcamp, Machado, Caldas, Quintela, Bandeira e Pinto Basto. No fim do Antigo Regime, estas famílias encontravam-se entre os principais protagonistas do corpo mercantil graças à "contratação de rendimentos e monopólios régios" (Pedreira, 1995, p. 154), nomeadamente o contrato do tabaco, o qual se manteve quase em exclusivo nas suas mãos até às vésperas da revolução liberal (Santos, 1974). Esta posição era consolidada pela participação nos grandes empreendimentos industriais e no tráfego ultramarino. As actividades em que se envolviam reflectiam-se na composição dos seus patrimónios, em que era evidente a posição superior das dívidas activas, categoria patrimonial intimamente ligada ao giro comercial (Pedreira, 1995, p. 307).

Chegados à segunda metade do século xix, os descendentes destas famílias registam patrimónios com uma importante presença do imobiliário, apesar de algumas excepções que devemos considerar. O 1.º conde do Farrobo, já sem metade do morgado de que era administrador, e a braços com uma situação deficitária, mantinha ainda interesses industriais, como a sua mina em Gondomar, responsável por metade do valor do seu património. José Ferreira Pinto Basto e o 1.º visconde de Benagazil eram negociantes, o primeiro mantendo actividade na fábrica de louças Vista Alegre, com significativas verbas de dívidas activas e com forte ligação à actividade comercial, enquanto o segundo, já retirado, recolhia os dividendos dos prédios que possuía no centro de Lisboa, construídos pela sua família após o terramoto de 1755. Apenas os irmãos Anselmo José Braamcamp e José Augusto Braamcamp não tinham qualquer actividade de negócio, tendo ambos três quartos do seu património em propriedades urbanas.

Desta forma, naquilo que se refere às composições patrimoniais privilegiadas, estes dois primeiros grupos denotam uma maior propensão para a componente predial. Relembramos o peso dos bens de raiz na casa de Palmela em 1854: 62% dos rendimentos (Urbano, 2008). Os herdeiros dos homens de negócio do final do Antigo Regime, com fortunas criadas a partir de contratos com o Estado e de outras actividades, como a reconstrução da cidade de Lisboa após o terramoto, tornaram-se, principalmente, proprietários, ainda que as actividades de negócio não estivessem em absoluto afastadas dos seus horizontes. Outro aspecto que merece amplo destaque é o da vida faustosa e dos interesses culturais a que estão associados vários elementos destes dois grupos.

O terceiro grupo foi identificado por Oliveira Martins como sendo a "aristocracia nova de aventureiros", grupo que o novo regime liberal procurou fortalecer com o fito de o colocar no lugar da "velha aristocracia de Corte e dos mosteiros" (1996, vol. ii, p. 17). E fê-lo, inicialmente, através da venda dos bens nacionais, com a qual comprou a adesão dos seus arrematantes ao regime liberal.

Ao longo das décadas seguintes, o Estado alargou as possibilidades que, sob a sua protecção, permitiam a diversos indivíduos a constituição de fortunas volumosas. Foi o caso da manutenção do monopólio da arrematação do tabaco até 1864 (Santos, 1974), da criação de diversas companhias financeiras ou ainda da constituição do Banco de Portugal em 1846, resultado da fusão do Banco de Lisboa com a Companhia Confiança Nacional (Reis, 1996). Já bem dentro da segunda metade do século xix, as autorizações para a formação dos diversos bancos sediados em Lisboa são mais um exemplo deste tipo de acção do Estado.

O grupo que emergiu a partir daqui incluiu gente de proveniência distinta. Muitos destes indivíduos estavam ligados a actividades comerciais, funcionando a aplicação de capitais nestas iniciativas como uma diversificação do seu negócio. A composição patrimonial dos elementos deste grupo é claramente influenciada pelas várias oportunidades que o Estado liberal lhes possibilitou. A variedade de opções de investimento que tinham à sua disposição (desamortização, tabacos, companhias financeiras, banca) reflecte-se nos seus patrimónios.

Veja-se o caso de Manuel José Gomes da Costa São Romão (Martins, 1992) ou o de José Joaquim Teixeira (Fonseca, 1984), cujos patrimónios mostram uma acentuada adesão às iniciativas financeiras do cabralismo. De igual modo, os bens constantes do inventário do 2.º visconde de Valmor parecem evidenciar as opções do seu tio José Isidoro Guedes, mais inclinado para o sector financeiro. Por isso a categoria dos "papéis de crédito e acções" era a mais valiosa, destacando-se nela a participação em companhias e bancos. Em sentido oposto temos o caso de José Maria Eugénio de Almeida, que, quando faleceu, tinha 79% do seu património em imobiliário (Sardica, 2005, p. 19), o que nos parece o resultado da participação na venda dos bens nacionais, em particular na década de 1860, altura em que só no cabido e Misericórdia de Évora despendeu mais de 180 contos (Fonseca, 1996, pp. 492-493). Segundo Hélder Fonseca e Jaime Reis (1987), esta configuração patrimonial enquadra-se na derradeira fase da história empresarial de Eugénio de Almeida, mostrando até que ponto a conjugação e a diversificação de investimentos ao longo da vida destes homens eram uma realidade.

Como dissemos, o quarto, e último, grupo integra os negociantes dedicados à actividade comercial. Estes não se envolveram na desamortização, nas companhias financeiras, nos tabacos ou na banca. Os patrimónios de figuras como Joaquim António de Moura e José Maria Camilo de Mendonça, ambos com carreiras desempenhadas em Lisboa, António Teodoro de Barros, com actividade em Cabo Verde, João Rodrigues Cardoso, Joaquim Machado Caires e José Pereira Soares, negociantes no Brasil, expressam a importância das suas actividades comerciais.

Nestes seis casos, apenas António Teodoro de Barros e Joaquim Machado Caires tinham no imobiliário a sua principal categoria patrimonial, pouco passando dos 50%. Nos restantes eram os papéis de crédito e acções que se evidenciavam, com excepção de José Maria Camilo de Mendonça, para quem o dinheiro era a componente mais valiosa. Os seus negócios eram visíveis ainda nas dívidas activas que tinham, em especial este último.

À margem dos negócios do Estado, os grandes negociantes, quer fizessem fortuna em Lisboa, no Brasil ou nas possessões ultramarinas, tinham nos capitais do negócio a componente preferencial da sua fortuna (v. José Maria Camilo de Mendonça), consolidando a sua situação económica no momento da retirada do activo através de uma carteira de títulos e acções diversificada (v. José Pereira Soares). No entanto, a composição destas carteiras poderá indiciar que estes homens não estariam assim tão afastados dos negócios do Estado, nomeadamente no plano colonial, pois é corrente a presença de papéis ligados a companhias ultramarinas de navegação, transportes ferroviários e mineração.

Os principais grupos identificados dividem-se, num primeiro nível, entre os que participavam nas iniciativas económicas e financeiras patrocinadas pelo Estado e os que estavam ligados à actividade comercial. Definimos três momentos de enriquecimento com base em negócios públicos, fazendo-os corresponder a diferentes grupos. A estes adicionámos um quarto grupo afastado desses empreendimentos e mais concentrado nos seus negócios particulares.

Porém, esta repartição não é absolutamente estanque. A casa de Palmela aderiu às oportunidades que surgiram nas primeiras décadas do liberalismo.

A burguesia pombalina diversificou as suas áreas de investimento: a família Pinto Basto não se limitou ao monopólio do tabaco, fundou a fábrica da Vista Alegre, arrematou bens nacionais (Silva, 1997, pp. 487-508), criou e administrou bancos (Marques, 1989, pp. 18-20). Eugénio de Almeida conciliou os negócios financeiros do cabralismo com a desamortização e até mesmo com a intervenção nos sectores agrícola, industrial e mercantil (Fonseca e Reis, 1987, pp. 884-890). Até mesmo os negociantes afastados das iniciativas do Estado acabaram, de alguma forma, por obter rendimentos do erário público, ao subscreverem empréstimos, comprarem títulos de dívida pública e inscrições da Junta do Crédito Público, ou quando se envolviam nos negócios coloniais.

A nosso ver, o que parece uma forte dependência face ao Estado não é mais do que uma objectiva gestão patrimonial que visava a obtenção de lucros e o incremento da fortuna. Hélder Fonseca e Jaime Reis (1987, pp. 878-879) chamaram já a atenção para este facto, considerando-o um objectivo fundamental da vida empresarial de Eugénio de Almeida, enfatizado pelo conceito de "rendabilidade aceitável", sobre o qual este último recorrentemente reflectia. Todos estes negócios, que giraram à volta do novo regime, se prefiguraram como os mais rentáveis da época. Daí que estes indivíduos marcassem presença nos diversos investimentos patrocinados pelo Estado. Por outro lado, o Estado liberal dispôs dos recursos ao seu alcance para garantir a paz social necessária à manutenção do regime, sabendo que só o poderia fazer alimentando as ambições destes homens de negócio.

Refira-se ainda a menor apetência por bens de consumo cultural entre os indivíduos com fortuna recente, claramente identificados com o quarto grupo. Em sentido contrário, nas famílias com maior tradição de notoriedade económica e social a dimensão simbólica está mais presente, destacando-se a fruição de bibliotecas e de colecções de pintura. Assim, a antiguidade das famílias dos herdeiros conduz, em termos patrimoniais, a um processo de acumulação de elementos de valorização qualitativa, mais do que quantitativa. A diferenciação e hierarquização dos indivíduos não se faz apenas com base no capital económico, mas também no capital social conferido por estas manifestações, sendo este segundo processo mais longo e difícil de realizar no espaço de uma geração familiar.

 

Conclusão

Em face da estrutura narrativa adoptada, a abordagem sobre a definição de perfis patrimoniais na Lisboa oitocentista conduz-nos, inevitavelmente, a uma tripla reflexão: em primeiro lugar, a necessidade de encerrar o ciclo monográfico/biográfico através do enquadramento de Henry Burnay entre os perfis de fortuna esboçados na secção anterior; depois, a interpretação do conjunto de perfis definidos no âmbito de outros trajectos individuais não contemplados pelos quatro grupos indicados; por fim, testemunhar o contributo dos inventários post mortem para o estabelecimento de tipificações patrimoniais.

No que diz respeito à primeira questão, parece-nos sustentável inserir Henry Burnay no terceiro grupo, o da "clientela farta"do regime liberal. Na verdade, Burnay foi intérprete central, não das primeiras iniciativas deste novo regime, mas da grande política de melhoramentos da Regeneração, de que é melhor exemplo a sua intervenção na construção e exploração das linhas de caminhos de ferro.

Porém, à semelhança da dimensão da sua fortuna, a actividade de Burnay acabou por introduzir traços muito próprios que o individualizam e destacam entre os quatro grupos delineados. Em primeiro lugar, porque se tornou preponderante na política financeira do Estado a partir do último quartel do século xix, objectivo que muito poucos podiam ter a pretensão de alcançar. Se os demais participavam nas iniciativas patrocinadas ou apoiadas pelo Estado liberal, Henry Burnay negociava-as directamente, como sucedeu com o regresso do monopólio do tabaco em 1891. Em segundo lugar, porque a sua actividade nunca foi exercida a título individual, mas sim no seio de uma casa comercial. O resultado desta ligação estrutural à firma foi um património fortemente ancorado na Henry Burnay & C.ª, não só pelos capitais que pertenciam à herança, mas também pelo enquadramento do imobiliário de Henry Burnay, o qual era administrado pela casa comercial. Em terceiro lugar, diferencia-se também pelas manifestações de consumo de bens predominantemente simbólicos. Embora tenha revelado um profundo interesse pelas práticas artísticas, parece tê-lo feito enquanto investimento, não só económico como social, pois estaria orientado pelo "desejo de ostentação de riqueza e de prestígio", não obedecendo as aquisições a "um programa decorativo devidamente planeado" (Vairo, 2003b, p. 50). A virtude artística de Burnay era conduzida pelo objectivo sentido de capitalização, uma postura nada comum na realidade portuguesa, mas que pela Europa já se fazia notar. Certamente que os seus contactos e as estadas no estrangeiro tiveram um papel preponderante nesta atitude vanguardista.

Se estas particularidades de Burnay não nos parecem suficientes para o excluir dos quatro perfis traçados, noutros casos é evidente o seu desajustamento. Tenha-se em atenção que esses perfis se circunscrevem a um universo com características próprias, os maiores contribuintes de Lisboa, e que o quadro analítico é forçosamente limitado. Daí resultam duas limitações às tipificações patrimoniais: alguns perfis não podem ser definidos por ausência de casos representativos de grandes fortunas, de que podemos dar como exemplo os industriais; outros, embora estejam estudados, não fazem parte do universo dos maiores contribuintes lisboetas. Cite-se, por exemplo, o empresário agrícola José Maria dos Santos (Martins, 1992). Embora residente em Lisboa, a sua estratégia patrimonial estava completamente virada para a gestão agrícola, o que o fez investir em património rústico fora da capital. Sendo os maiores contribuintes seleccionados a partir das contribuições pagas dentro do concelho de domicílio, naturalmente José Maria dos Santos não estava em condições de ser englobado neste grupo. Além disso, também não é viável defini-lo de forma semelhante à de Eugénio de Almeida (englobado no terceiro perfil), pois, apesar de terem operado uma idêntica estratégia de investimento na terra, este último fê-lo no âmbito do processo de desamortização, o que não parece ter sucedido com José Maria dos Santos.

Em 1984, numa fase ainda embrionária dos estudos sobre fortunas e patrimónios por parte da historiografia portuguesa, Hélder Fonseca fazia depender o estudo (quantitativo) da evolução da fortuna de uma casa ou família da "existência de dois ou mais momentos em que houve uma avaliação ou declaração de bens e rendimentos" (Fonseca, 1984, p. 26). Mais complexo lhe parecia, no entanto, o estudo (qualitativo) da composição da fortuna. Se o primeiro identificaria o ritmo de edificação da fortuna, o segundo definiria o "conjunto de atitudes de negócio e empresariais" (id., ibid., p. 27).

No caso presente, como na maioria dos trabalhos subsequentes ao panorama traçado por Hélder Fonseca, é da segunda vertente que temos tratado. Na verdade, se já é suficientemente escassa a existência de um momento de avaliação sobre um agregado familiar, muito mais o é relativamente a dois. Nesse sentido, os inventários post mortem possuem duas características que contribuem para o estabelecimento das tipificações patrimoniais e que podem revelar as estratégias adoptadas por um indivíduo. Em primeiro lugar, é maior a possibilidade de conterem o arrolamento de todos os bens do inventariado, e de forma mais detalhada, uma vez que são sempre realizados no foro judicial. O detalhe destes inventários é, regra geral, muito superior ao de outras fontes, como os testamentos, os inventários particulares, as escrituras de partilhas ou outros instrumentos legais de transmissão sucessória de propriedade. Em segundo lugar, eles retratam a incerteza associada à morte, o que garante a fiabilidade sobre a estratégia que regia a composição patrimonial, podendo esta espelhar a tendência vigente na época. Esse é o testemunho biográfico de São Romão, cuja inesperada morte, em 1852, o apanhou num momento de crucial mudança estratégica, depois do fim do cabralismo, em que o imobiliário se afigurava como investimento mais seguro. Mas a identificação de tais tendências só pode ganhar consistência se inserida, "quando possível, [n]o quadro do movimento geral das fortunas privadas, para o período considerado" (Fonseca, 1984, p. 27). Ou seja, tal como aqui tentámos realizar, através da conjugação das perspectivas monográfica e biográfica.

 

Mapa geral de bens dos inventários (valores de 1869)

Anexo

Fonte: ADL, "fundo cível antigo do Tribunal da Boa Hora".

 

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Notas

1Sobre a riqueza informativa e as limitações dos inventários, v., por exemplo, Brandão (1994, pp. 335 e segs.).

2 V. os trabalhos de Adeline Daumard (1973), para a França, e os de William Rubinstein (1987) e Youssef Cassis (1994), para a Grã-Bretanha.

3 Dadas as limitações arquivísticas, apenas foi possível aceder à documentação das seguintes varas e secções: 2.ª vara (4.ª secção); 3.ª vara (3.ª secção); 4.ª vara (3.ª e 4.ª secções); 5.ª vara (1.ª a 4.ª secções); 6.ª vara (1.ª e 3.ª secções).

4 Foi ainda localizado o inventário de partilha do morgado do Farrobo, de 1863, administrado pelo 1.º conde do Farrobo.

5 A autora destaca que "os mais ricos tinham tendência para aumentar a percentagem da sua fortuna aplicada em acções e obrigações".

6 O inventário de José Pereira Soares não especifica o teor das suas dívidas activas.

7 Como Maria Eugénia Mata salienta, "Burnay based his strategy on minimising risks, diversifying assets, and learning by doing" (Mata, 2005, p. 4).

 

* Instituto de História Contemporânea, Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa, Av. de Berna, 26-C, 1069-061, Lisboa, Portugal. e-mail: nunolima@fcsh.unl.pt.

** O presente artigo enquadra-se na dissertação de mestrado em História dos séculos xix e xx, secção de História do século xix, defendida na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa sob o título "Os `homens bons' do liberalismo. Os maiores contribuintes de Lisboa (1867-1893)", a publicar no presente ano na colecção de "História Económica" do Banco de Portugal. A metodologia e o teor da análise deste artigo remetem substancialmente para o capítulo 3 da dissertação. Esta é uma versão revista de uma comunicação apresentada no XXVII Encontro da Associação Portuguesa de História Económica e Social, realizado em Lisboa a 16-17 de Novembro de 2007. Agradeço os comentários então realizados por Conceição Andrade Martins, Magda Pinheiro, Carlos Bastien e Paulo Jorge Fernandes, bem como a avaliação realizada pelos referees da revista Análise Social.

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